Acórdão nº 332/02 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Julho de 2002

Magistrado ResponsávelCons. Bravo Serra
Data da Resolução10 de Julho de 2002
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 332/02

Procº nº 85/2002.

  1. Secção.

Relator:- BRAVO SERRA.

1. A interpôs junto da 1ª secção do Supremo Tribunal Administrativo recurso contencioso de anulação da Portaria nº 250/95, de 17 de Agosto, emanada dos Primeiro-Ministro e Ministro da Agricultura, por intermédio da qual, ao abrigo da alínea b) do artº 30º da Lei nº 109/88, de 26 de Setembro, na redacção conferida pela Lei nº 46/90, de 22 de Agosto, foi determinada a reversão de um prédio rústico, denominado Herdade ...., sito na freguesia de Ermidas do Sado, do concelho de Santiago do Cacém, prédio esse que foi expropriado a B e que ao recorrente foi dado de arrendamento pelo anterior proprietário e, posteriormente, pelo próprio Estado.

Após ter sido provocada a intervenção principal de C, D e E - como, respectivamente, cônjuge meeiro e herdeiros do expropriado B - a fim de intervirem nos autos como recorridos particulares, o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 7 de Dezembro de 1999, concedeu provimento ao recurso, anulando a Portaria nº 290/95.

Desse aresto recorreram os recorridos particulares para o Pleno da 1ª Secção daquele Alto Tribunal tendo, na alegação que produziram, formulado as seguintes «conclusões», para o que ora releva:-

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  1. O Estado de direito democrático implica a garantia da efectivação dos direitos fundamentais - art. 2 da Const. -, e a validade das leis e dos actos do Estado e de outras autoridades depende da sua conformidade com a Constituição - art. 3 nº 2.

  2. Ora, o direito à reversão dos prédios expropriados é inerente ao direito de propriedade, partilhando da mesma natureza e regime jurídico, pelo que goza da mesma garantia a tutela.

  3. Como ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira (Const. Anotada, 3ª ed. Pag. 336), a consumação da expropriação fica dependente da efectiva aplicação dos bens a fins de utilidade pública.

    Assente que o Estado não chegou a efectuar o pagamento de qualquer indemnização pela expropriação do prédio revertido e reconhecendo o próprio legislador que o regresso à posse de facto dos anteriores titulares demonstra a não realização do interesse público visado com a expropriação (cfr. trabalhos preparatórios da revisão da Lei 109//88) qualquer interpretação restritiva que implique a não efectivação desse direito infringe a garantia decorrente dos arts. 8, 18 e 62 da Const.

  4. A interpretação da al. b) do art. 30 da Lei 109/88 (na redacção actual) no sentido de que a reversão depende, apesar da verificação daqueles requisitos legais, não só da restituição da posse mas ainda de um período prévio de exploração de facto (período esse que nem a lei nem a interpretação do Acórdão recorrido concretizam) não só inviabiliza o direito à reversão como estabelece uma distinção injustificada, desrazoável e discriminatória entre os que recuperaram a posse nas imediações da data limite (1-1-90) e os restantes, privilegiando estes, com o que se ofendem claramente os princípios de igualdade, justiça e proporcionalidade.

  5. Ao negar expressamente a um contrato de arrendamento rural particular válido a integração no conceito de ‘exploração de facto’ a que se refere a al. b) do citado art. 30, o douto Acórdão recorrido infringe directamente o disposto no art. 99 nº 1 da Const., pelo que nessa medida está também ferido de interpretação inconstitucional.

    .............................................................................................................................................................................................................................................................."

    O Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 15 de Novembro de 2001, veio a negar provimento ao recurso.

    No que ora interessa, pode ler-se nesse aresto:-

    "...............................................................................................................................................................................................................................................................

    Com efeito, tal como se decidiu no Ac. deste STA, de 17-4-97 - Rec. 31007, a ‘posse material’ a que alude o aludido preceito [a alínea b) do nº 1 do artº 30º da Lei nº 109/88, de 26 de Setembro] corresponde ao ‘corpus’ possessório, ou seja, ao exercício dos poderes de facto de detenção, guarda, conservação, uso e fruição do prédio expropriado, sendo que [a] expressão ‘exploração de facto’, a que também alude a mencionada alínea b), se traduz no conjunto de poderes e actos de fruição e exploração das utilidades económicas que podem proporcionar a actividade agrícola, silvícola e pecuária, passíveis de serem desenvolvidas no referido prédio.

    Temos, assim, que, no âmbito da citada alínea b) o que releva é a detenção imediata e efectiva ‘animo domini’ do prédio rústico expropriado e não a mera posse jurídica, exercida através de outrem (vidé o artigo 1252º do CC), enquanto que, para efeitos de integração do conceito de ‘exploração de facto’ se exige que a detenção e fruição do prédio não seja inerte ou passiva, não correspondendo a qualidade de locador do imóvel à ‘posse material e exploração de facto’ do bem arrendado, como bem se salienta no Acórdão recorrido - cfr. fls. 288.

    Só que, sendo este o sentido e alcance da referida alínea b) e, mesmo que a entrega do ‘Herdade ...’ e a cedência do seu gozo, através de contrato de arrendamento rural ao agora Recorrido tivesse ocorrido em 18-12-89, ainda assim, tal circunstancialismo não se subsume na previsão do citado preceito, daí que o acto objecto de impugnação contenciosa, como bem se concluiu no Acórdão recorrido, padeça do arguido vício de violação de lei.

    ................................................................................................................................................................................................................................................................

    3.4 Finalmente, importa conhecer da questão de inconstitucionalidade suscitada pelos Recorrentes nas suas conclusões 18 a 24.

    Neste particular contexto sustentam que a interpretação perfilhada pelo Acórdão recorrido quanto ao sentido e alcance da alínea b), do nº 1, do artigo 30º da Lei 108/88, para além de restritiva, infringindo a garantia decorrente dos artigos 8º, 18º e 62º da CRP, ofende os princípios da igualdade, justiça e proporcionalidade, atentando, ainda, contra o disposto no nº 1, do artigo 99º da CRP.

    Porém, não assiste razão aos Recorrentes.

    Em primeiro lugar, imposta salientar que a interpretação perfilhada no Acórdão recorrido e coonestada por este Pleno, cfr. o ponto ‘3.3’, não se consubstancia numa qualquer interpretação restritiva do preceito em causa, antes se tendo limitado a explicitar o seu alcance, sem que, ao proceder a tal operação, se tenha limitado o alcance aparente da lei.

    Por outro lado, as considerações que os Recorrentes fazem a propósito do alegado não pagamento de qualquer indemnização pela expropriação do prédio em causa, são destituídas de relevância em sede do juízo de constitucionalidade a emitir com referência à aludida alínea b), do nº 1, do artigo 30º da Lei 109/88, na medida em que tal circunstância não pode ser assacada ao preceito em análise, que nada estatui no sentido do não pagamento de indemnização.

    O mesmo sucedendo em relação à invocada violação do direito de propriedade, uma vez que ela, a existir, dimanaria originariamente não da dita alínea b), mas do acto expropriativo e da legislação em que este se alicerçou.

    Refira-se, ainda, que a interpretação acolhida no Acórdão recorrido não está em desconformidade com o nº 1, do artigo 99º da CRP, já que o objecto do citado preceito se circunscreve à enunciação das formas de exploraçãode terra alheia, não se vislumbrando em que medida é que a dita interpretação tenha, por...

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