Acórdão nº 241/02 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Maio de 2002
Magistrado Responsável | Cons. Artur Maurício |
Data da Resolução | 29 de Maio de 2002 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 241/02
Proc. nº. 444/01
TC - 1ª Secção
Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – L..., com os sinais dos autos, intentou em 2.03.1998, na forma de processo sumário, contra C..., no Tribunal de Trabalho de Matosinhos, acção de impugnação do despedimento, requerendo ainda a condenação da Ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e a pagar-lhe as retribuições vencidas e não pagas à data do despedimento e as vencidas depois do despedimento até efectiva reintegração.
Contestada a acção, veio a Ré requerer "a notificação da "T..." para fornecer a identificação do autor dos textos em causa neste processo", fornecendo para tanto "os seguintes elementos retirados dos documentos juntos aos autos:
>Date: Sun, 20 Jul 1997 18:1855 GMT
>NNPT-Poting-Host:
>Message-ID".
Ordenada a notificação da "T..." por despacho judicial de 28.09.1998, "(...) para fornecer aos autos documento em seu poder que identifique o A. do texto em causa nestes autos. Forneça-lhe para o efeito os elementos de identificação mencionados no final do requerimento de fls. 74 (ponto 3), em 5 dias", por apelo aos artigos 528º e 531º do Código de Processo Civil, respondeu esta, em 23.10.1998, vir "ao abrigo do disposto no artigo 519º nº 1 do CPC, informar V. Exª. de que:
Decorrido cerca de 1 ano e 3 meses sobre a data da comunicação identificada, não é tecnicamente possível identificar o seu autor e, para este efeito, recuperar o texto da mesma, em virtude de o respectivo conteúdo ter sido, entretanto, "apagado", da "memória" do sistema informático da rede.
Apenas foi possível apurar, por consulta aos suportes contabilísticos electrónicos do serviço facturado em 20/07/97, que, pela porta de acesso 194.65.178.114, foi estabelecida pelo "user" I... (adoptado por C..., Ldª) uma comunicação entre as 18:01:12 horas e as 20:09:32 horas, do mesmo dia".
Mais tarde, a "T..." informou que o "username" é l... (éle minúsculo) e ainda que "qualquer contacto entre a C..., Ldª e a T... está formalmente atribuído ao Sr. L..." (cfr. fls. 127), sugerindo a indicação da P... "relativamente aos dados sobre a prestação do serviço telefónico (identificação das linhas telefónicas)" para obtenção de outros elementos pretendidos respeitantes ao caso dos autos.
Estas informações da T... foram prestadas após a data indicada para julgamento, o que levou a Mmª. Juiz a adiar a respectiva data por despacho de 13.10.1998, despacho cuja nulidade foi arguida pelo A. e indeferida por despacho de 28.10.1998.
Deste despacho agravou o A. para o Tribunal da Relação do Porto em 11.11.1998 por, em síntese, entender que, ao deferir o pedido de notificação supra aludido à T... e marcar nova data para julgamento, "o juiz fez mau uso do poder de direcção, (...) coarctando o direito de defesa do A. (...)"
Notificada a P... para prestar informações sobre números de telefone atribuídos ao A. e à C..., Ldª., veio aos autos indicar o número de telefone atribuído ao A. na morada referenciada, juntando ainda a facturação detalhada do telefone ali instalado (cfr. fls. 144 a 148 e 160 a 165).
Do despacho que mandou notificar a P... o A. interpôs recurso de agravo por entender que "o mero poder de averiguação da verdade material consignado no artº 519º do CPC não confere competência para tal desmando" e "os despachos recorridos violam os artºs 17º da Lei nº 67/98, 26º, nº 1, da CR e 3º, 517º, nº 1 e 519º, nº 1, do CPC".
A Ré contra-alegou, defendendo o acerto do despacho recorrido, porquanto a T... no ofício de 19.11.1998 referiu que "... a revelação de dados pessoais e de dados de serviço, relativos ao cliente (...) a entidades estranhas ao serviço prestado (...) está legalmente vedada, em virtude de constituírem facto sigiloso, objecto de segredo profissional" mas "todavia, no sentido de colaborar com a administração da Justiça, no que entende não estar sujeito ao dever de sigilo, informo que ..."
Em 6 de Julho de 2000 efectuou-se no Tribunal de Trabalho de Matosinhos a audiência de julgamento, tendo sido dado com provado, entre outros factos, e "com base nos docs. juntos aos autos a fls. 4 e 5 e 6 a 8 do processo disciplinar, 259 a 260, 261 a 264, 93 a 127, 138 e segs, 144, 160 a 165 e 244 dos autos, documentos esses devidamente analisados e interpretados pelo Sr. Perito (técnico de informática) nomeado pelo Tribunal e que acompanhou esta audiência desde o seu início" que "o Autor Luis Paiva foi o autor de 2 textos com data de 20/7/97 que passaram na Internet nesse dia, às 19h20m e às 20h18m e que circularam no C... cerca de 10 dias depois ou seja em 30/7/97, textos estes constantes dos docs. juntos ao processo a fls. 4 e 5 e 6 a 8 e dos docs. juntos aos presentes autos a fls. 259 e 260 e 261 a 264 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais" (facto 12º) e em 21.09.2000 foi proferida sentença que reconheceu a justa causa do despedimento do A., e condenou a Ré no pagamento da quantia de 1.358.820$00, acrescida de juros moratórios legais até integral pagamento por créditos salariais em dívida ao A. (cfr. fls. 286 a 297).
O A. inconformado apelou para o Tribunal da Relação do Porto, cujas alegações concluiu, com interesse para a questão ora em análise:
"8ª Ora, a junção desses documentos, com excepção dos de fls. 259 a 264, foi obtida por meio ilícito, ilegal e inconstitucional, em violação dos artºs 17º, nº 2, da Lei nº 91/97, de 1 de Agosto, 5º da Lei nº. 69/98, de 28 de Outubro, 3º, nº 2, d), do Regulamento de Exploração de Redes Públicas de Comunicações, aprovado pelo DL nº. 290-A/99, de 30 de Julho e 4º, nº 2, e), do Regulamento de Exploração dos Serviços de Telecomunicações e de Uso Público, aprovado pelo DL nº 290-B/99, de 30 de Julho, 26º, nº 2 e 34º, nº 4, da CP e 519º, nº 3 e 519º-A, do CPC;
-
De facto, os documentos juntos pela T... revelam dados de tráfego do A. e os da PT fornecem factura detalhada do telefone de casa do A. de uso pessoal exclusivo, em violação do segredo profissional a que estavam obrigadas por lei e regulamentos;
-
Nem a senhora juiz podia impor, como fez, contra a vontade do A. e sem sequer o ouvir previamente, o fornecimento desses dados, numa interpretação errada do disposto no artº 519º, nº 3, do CPC, atentatória do nº4 do artº 34º da CR;"
A Ré contra-alegou defendendo a bondade da sentença recorrida e pugnando pela sua manutenção.
Admitido o recurso, a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão em 14.05.2001, negando provimento ao recurso e mantendo a decisão recorrida do Tribunal de Trabalho de Matosinhos.
Inconformado, o A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional por requerimento de 30.05.2001 em que disse:
"A questão da inconstitucionalidade foi suscitada nas alegações do recurso de apelação nos seguintes termos:
«1º - A senhora juiz a quo, fazendo uso, ao que pensava, do poder do artº 519º do CPC, fez com que a PT e a T... violassem o segredo profissional a que estão sujeitas, em desrespeito do artº 17º, nº 2, da Lei nº 91/97, de 1 de Agosto e da regulamentação do seu regime [artº 3º, nº 2, d), do Regulamento de Exploração de Redes Públicas de Comunicações, aprovado pelo DL nº 290-A/99, de 30 de Julho e do artº 4º, nº 2, e) do Regulamento de Exploração dos Serviços de Telecomunicações e de Uso Público, aprovado pelo DL nº 290-B/99, de 30 de Julho], do artº 5º da Lei nº 69/98, de 28 de Outubro, dos artºs 26º, nº 2 e 34º, nº 4, da CR e dos artºs 519º, nº 3 e 519º-A, do CPC; que em parte invocamos no recurso entrado em 2.2.99.
Que não estávamos, nem estamos errados, demonstra-o o Parecer da Procuradoria-Geral da República, publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Agosto de 2000, de fls. 14.145 a 14.156.
De facto, o fornecimento de dados da vida íntima e particular do A., como seja a facturação discriminada do telefone da sua residência junta a fls. 160 e 165 apresentada pela PT, apesar de encimada, em cada página, da expressão a informação constante deste documento é confidencial e destina-se exclusivamente ao uso do cliente e a permitir a respectiva conferência e a revelação dos seus dados de tráfego pela T... (fls. 93, 127, 145 e 244), em desrespeito do segredo das comunicações, por ordem da senhora juiz a quo, a que não deveriam ter obedecido e obedeceram pela insistência e por canhestro temor reverencial, violam as normas citadas, como se conclui do Parecer da Procuradoria-Geral da República, cuja doutrina aqui damos por reproduzida.
E porque a sua obtenção é ilegal e inconstitucional, a resposta do ponto 12º tem que ser dada como não escrita.
E nas conclusões da alegação do recurso de apelação:
7ª: O facto 12º foi fixado, como se colhe da fundamentação feita nos termos do nº 2 do artº 653º do CPC, por remissão do nº 1 do artº 67º do CPT, com base exclusiva nos documentos juntos aos autos, de folhas do processo que nele se indicam, na interpretação que deles fez o perito nomeado pelo tribunal;
8ª: Ora, a junção desses documentos, com excepção dos de fls. 259 a 264, foi obtida por meio ilícito, ilegal e inconstitucional, em violação dos artºs 17º, nº 2, da Lei nº 91/97, de 1 de Agosto, 5º da Lei nº 69/98, de 28 de Outubro, 3º, nº 2, d), do Regulamento de Exploração de Redes Públicas de Comunicações, aprovado pelo DL 290-A/99, de 30 de Julho e 4º, nº 2, e), do Regulamento de Exploração dos Serviços de Telecomunicações e de Uso Público, aprovado pelo DL nº 290-B/99, de 30 de Julho, 26º, nº 2 e 34º, nº 4, da CR e 519º, nº 3 e 519º-A, do CPC
."
Admitido o recurso, o A. apresentou as suas alegações que concluiu do seguinte modo:
"1ª O facto 12º dos factos provados foi fixado, como se colhe da fundamentação feita nos termos do nº 2 do artº 653º do CPC, por remissão do nº 1 do artº 67º do CPT, com base exclusiva nos documentos juntos aos autos, a folhas 93, 127, 144, 160 a 165 e 244 do processo, na interpretação que deles fez o perito nomeado pelo tribunal;
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Esses documentos, com excepção dos de fls. 259 a 264, foram obtidos por...
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