Acórdão nº 460/03 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Outubro de 2003

Data14 Outubro 2003
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 460/2003 Processo n.º 220/02 3ª Secção

Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção

do Tribunal Constitucional:

  1. Em 23 de Abril de 1998, A. e outros requereram, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, procedimento cautelar não especificado contra B., pedindo a intimação desta para proceder, de imediato, à emissão e entrega das declarações de titularidade das acções escriturais da sociedade C., para o efeito de comprovarem a sua qualidade de accionistas desta última sociedade, tendo em vista a sua comparência na respectiva assembleia geral anual de 1998, a realizar até ao dia 31 de Maio.

    Por despacho do Juiz do 5º Juízo Cível da Comarca de Lisboa de 25 de Janeiro de 1999, constante de fls. 158 e seguintes, foi declarada a extinção da instância por inutilidade da lide, uma vez que, quando deu entrada no tribunal o requerimento da providência, já tinha ocorrido a lesão do direito que cautelarmente se visava evitar (artigos 137º, 267º, n.º 1, e 287º, alínea e), do Código de Processo Civil), com a realização da assembleia geral anual da C., em 21 de Abril de 1998. Foi ainda decidido, na mesma sentença, que por a inutilidade não derivar de facto imputável à requerida, as custas seriam suportadas pelos requerentes, ao abrigo do disposto no artigo 447º do Código de Processo Civil e 15º, n.º 1, alínea m), do Código das Custas Judiciais.

    Inconformados, os requerentes interpuseram recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Lisboa (a fls. 160) e solicitaram a reforma da sentença nos termos do disposto no artigo 669º, n.º 2, do Código de Processo Civil (a fls. 163). Entretanto, os requerentes solicitaram a junção do pedido de declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral do artigo 490, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais, formulado pelo Provedor de Justiça junto do Tribunal Constitucional (a fls. 187).

    Por despacho de fls. 210, foi mantido o despacho de 25 de Janeiro de 1999, que declarou a extinção da instância por inutilidade da lide.

    Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20 de Julho de 1999, constante de fls. 213 e seguintes, foi anulada a decisão recorrida, para renovação dos meios de prova e devida fundamentação do facto relativo à alegada realização, em 21 de Abril de 1998, da assembleia geral da C..

    Os requerentes arguiram a nulidade do acórdão, com fundamento em omissão de pronúncia sobre o pedido de reforma da sentença (fls. 223). Por despacho do Relator de fls. 225, verso, foi indeferida a arguição de nulidade, atendendo a que, pelo despacho de fls. 210, foi cumprido o disposto nos artigos 668º, n.º 4, e 669º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

    Os requerentes solicitaram a reforma do despacho de fls. 225 verso e reclamaram para a conferência do mesmo (fls. 226). Por despacho de fls. 229, verso, foi indeferida a peticionada reforma do despacho de fls. 225 verso, vindo a ser desatendida a reclamação do mesmo despacho por acórdão de 15 de Dezembro de 1999 (a fls. 231).

    Na sequência da junção da fotocópia simples da acta da assembleia geral da C., de 21 de Abril de 1998, vieram os requerentes arguir a falsidade do documento junto (a fls. 243), o que motivou o despacho de fls. 312, ordenando a notificação da C. para juntar cópia certificada da acta da assembleia geral realizada no dia 21 de Abril de 1998.

    Junta a mencionada cópia certificada, vieram os requerentes arguir a nulidade da notificação da C., bem como a falsidade do documento, remetendo para os argumentos constantes de fls. 243 e seguintes.

    Finalmente, por despacho do Juiz da 7ª Vara Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa de 14 de Julho de 2000, de fls. 332, foram desatendidas as mencionadas arguições de nulidade e falsidade, tendo sido declarada a extinção da instância por inutilidade da lide.

    Uma vez mais inconformados, os requerentes interpuseram recurso de agravo para o Tribunal da Relação de Lisboa das decisões que desatenderam as arguições de nulidade e falsidade, bem como da decisão que declarou a extinção da instância (fls. 337).

    Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de Maio de 2001, constante de fls. 393 e seguintes, foram confirmadas as decisões impugnadas, sendo a que põe termo ao procedimento cautelar com fundamento diverso do utilizado na 1ª instância. O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a ?circunstância de já se ter efectuado a assembleia geral anual? da C. ?não permite enquadrar o caso presente no conceito de ?impossibilidade superveniente??, antes se verificando ?um verdadeiro caso de improcedência por falta de um dos fundamentos da providência cautelar, o periculum in mora, pressuposto que determina uma das características fundamentais dos procedimentos cautelares ? a sua celeridade ?, sem o que estas deixarão de preencher o fim a que se destinam?. Foi ainda decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa que ?a condenação dos requerentes nas custas do procedimento cautelar advém do insucesso da sua pretensão e decorre do estatuído no sobredito artigo 446º, n.º 1, do Código de Processo Civil?.

    Ainda inconformados, os requerentes interpuseram recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça (fls. 408). Todavia, nas alegações de recurso vieram os requerentes suscitar nulidade do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, as quais foram desatendidas por acórdão do mesmo tribunal de 4 de Outubro de 2001, constante de fls. 478.

  2. Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 2002, constante de fls. 483 e seguintes, foi negado provimento ao recurso de agravo, confirmando-se, em consequência, o acórdão recorrido.

    Para o que agora releva, o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se nos seguintes termos:

    ?8. Arguição de nulidades e «thema decidenda».

    Começou a Relação por salientar que a decisão de 1ª Instância proferida a fls. 332/335, embora formalmente unitária, se desdobrava em três segmentos decisórios distintos e centrais, todos alvo da discordância dos ora agravantes respeitando eles à nulidade da notificação da C., à arguição da falsidade do documento junto a fls. 314/320 (fotocópia autenticada da acta n° 52 do livro de actas de C.) e ao decretamento da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, sendo, ainda de considerar a matéria atinente à condenação em custas.

    (..)

    O que desde logo se evidenciava, (...), uma vez que o prazo cominado no artigo 382° n° 2 do CPC ? para a decisão do procedimento cautelar ? sempre seria de qualificar meramente como ordenador ou disciplinador do processo, não surtindo, por isso, qualquer efeito em termos de inversão do sentido decisório das questões submetidas ao escrutínio judicial.

    Isto sendo certo que a simples inobservância do prazo para a ultimação do procedimento não poderia produzir qualquer eficácia invalidante da decisão final no mesmo emitida, nem tão pouco pôr em crise a garantia do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa.

    Não tinha pois a Relação que pronunciar-se «ex professo» sobre todos os argumentos, motivos ou razões da discordância dos recorrentes contra a decisão de 1ª Instância, mas apenas sobre as «questões» temáticas realmente relevantes para a decisão da providência, sendo que algumas delas ficaram prejudicadas pela solução dada a outras ( artº 660° n° 2 do CPC ), pelo que não enferma o acórdão sub judice da aventada nulidade por omissão de pronúncia ( artº 668° n° 1, al. d) do CPC).

    Imputam, no fundo, os agravantes ao acórdão sob recurso «todos» os vícios previstos no artº 755° do CPC , mas o certo é que não substanciaram devidamente tais pretensas causas de nulidade, como lhes competia, pelo que se perfila como totalmente inócua tal arguição.

    Especificamente no que concerne à fundamentação do aresto, evidencia a mesma densidade suficiente para que se possam dar por satisfeitos os objectivos constitucionais e legais ( artºs 205° n° 1 da CRP e 158° do CPC): permitir aos destinatários exercitar com eficácia os meios legais de reacção ao seu dispor e assegurar a transparência e a reflexão decisórias.

    No que tange ao alegado excesso de pronúncia, não se debruçou a Relação sobre qualquer questão temática que não houvesse sido já objecto de apreciação pela primeira instância.

    E quanto às sugeridas nulidades processuais, mesmo a existirem ? o que não é o caso ? não eram elas susceptíveis de influir no exame e decisão da causa, pelo que seriam as mesmas desprovidas de eficácia invalidante (artº 201° nº 1 do CPC).

    Improcede pois, «in totum» a arguição de nulidades feita pelos recorrentes.

  3. Poderes de cognicão/matéria de facto.

    Nas suas alegações parecem os recorrentes pretender que este Supremo Tribunal sindique o não uso pela Relação dos poderes que a esta assistiam, ao abrigo do disposto no artº 712° do CPC , de alterar/modificar a matéria de facto de que a 1ª Instância se socorreu para decidir como decidiu.

    Ora, o STJ, como tribunal de revista que é, só conhece, em princípio, de matéria de direito, limitando-se a aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido ? art.ºs 26° da LOFTJ 99 aprovada pela L 3/99 de 13/1.

    Não cabe pois nos poderes do Supremo Tribunal de Justiça censurar o não uso pela Relação da faculdade de alterar aquela matéria.

    O que o Supremo poderia sindicar, isso sim, era o bom ou mau uso dos poderes de alteração/modificação da decisão de facto que à Relação são conferidos nas restritas hipóteses contempladas nas três alíneas do nº 1 daquele artº 712° do CPC; como a Relação não exercitou tal faculdade, a factualidade dada por si como assente ? assim confirmando a já elencada como provada pelo tribunal de 1ª instância ? terá de permanecer agora como incontroversa.

  4. Falsidade da fotocópia da acta n° 52 do Livro de Actas da C..

    No que concerne à alegada falsidade da fotocópia autenticada da acta nº 52 do livro de actas de C., junta a fls. 314/320, pretendem os agravantes radicá-la na...

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