Acórdão nº 634/04 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução08 de Novembro de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 634/04 Processo n.º 568/04 3.ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão

Acordam, em Conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I – Relatório

  1. Por despacho da M.ma Juíza do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras, de 2 de Dezembro de 2002, foi o ora recorrente, A., pronunciado como autor material de um crime de corrupção passiva para acto lícito, previsto e punido pelo artigo 373º, nº 1, do Código Penal.

  2. Notificado desta decisão o arguido veio arguir irregularidades e nulidades da mesma, bem como manifestar a sua discordância com a condenação em taxa de justiça, requerimento que foi indeferido por despacho de 13 de Dezembro de 2002.

  3. Inconformado com este despacho o arguido veio recorrer dele para o Tribunal da Relação de Lisboa, recurso que, através do despacho de fls. 1131, foi admitido “a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo”.

  4. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 21 de Maio de 2003, decidiu “alterar o momento de subida e o efeito do recurso, atribuindo-lhe efeito meramente devolutivo e determinando que ele suba com o recurso que vier a ser interposto da decisão que tiver posto termo à causa”, decisão que fundamentou nos seguintes termos:

    “[...] O presente recurso tem por objecto o despacho que indeferiu um requerimento em que o recorrente arguia nulidades e irregularidades do despacho de pronúncia, manifestando também, a final, a sua discordância quanto à condenação em taxa de justiça. Não tem por objecto a própria decisão instrutória, a qual, de acordo com o artigo 310º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na medida em que tiver pronunciado o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público, é irrecorrível.

    O recorrente fundamenta a admissibilidade do recurso, na parte em que o despacho indeferiu a arguição de nulidade, no disposto no n.º 2 do artigo 310º e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 309º daquele diploma legal.

    Uma vez que não se trata de um recurso expressamente mencionado nas diversas alíneas do n.º 1 do art. 407º, nem de um caso em que a retenção o tornaria absolutamente inútil, tal recurso, na parte em que tem por objecto a questão da nulidade da decisão instrutória cominada no artigo 309º, não tem subida imediata, devendo, pelo contrário, subir e ser instruído e julgado conjuntamente com o recurso da decisão que vier a pôr termo à causa (n.º 3 do mesmo artigo 407º), não suspendendo nem a tramitação normal do processo, nem os efeitos da decisão recorrida (artigo 408º, n.ºs 1 e 2).

    Diga-se ainda que, quanto ao segmento em que o despacho recorrido indeferiu o pedido de reforma da decisão instrutória quanto à condenação em taxa de justiça, pedido esse que só pode ter como fundamento legal o disposto nos artigos 666º, n.º 3, e 669º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, aplicáveis ao processo penal por força do artigo 4º do respectivo Código, não há recurso, de acordo com o n.º 2 do artigo 670º daquele mesmo diploma legal, disposição que, juntamente com aquelas outras, forma um todo incindível.

    Desta forma, não se pode deixar de alterar o momento da subida e o efeito atribuído ao recurso interposto e admitido, o qual passará a ter efeito meramente devolutivo (artigo 408º) e subirá apenas conjuntamente com o recurso que vier a ser interposto da decisão que tiver posto termo à causa (n.º 3 do artigo 407º).

  5. Novamente inconformado o arguido recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, recurso que, por decisão do M.mo Relator do processo no Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de Junho de 2003, não foi admitido. Esta decisão vem fundamentada nos seguintes termos:

    “[...] De acordo com o artigo 399º do Código de Processo Penal, disposição que define o princípio geral quanto à admissibilidade dos recursos, «é permitido recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei». Porém, o artigo 400º do mesmo diploma considera irrecorríveis, nomeadamente, «os acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não ponham termo à causa».

    É o que se passa no presente caso. O acórdão de que se pretende recorrer foi proferido em recurso interposto pelo arguido de anterior decisão da 1ª instância, limitando-se a alterar, no uso de poderes conferidos pelo artigo 414º, n.º 3, do Código de Processo Penal, o modo e o momento da sua subida.

    Desse acórdão não pode, portanto, ser interposto recurso.

    Uma vez que nele se apreciou uma questão suscitada pelo recurso interposto, não se trata de uma decisão proferida em 1ª instância. Daí que não possa submeter-se ao regime estabelecido para este tipo de decisões. Acrescente-se apenas que, se o fosse, a sua recorribilidade derivaria da aplicação do princípio geral contido no citado artigo 399º e não na alínea a) do artigo 432º, disposição que se limita a repartir a competência para a apreciação dos recursos”.

  6. Novamente inconformado o arguido reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que, por decisão de 29 de Janeiro de 2004, indeferiu a reclamação. Escudou-se, para o efeito, na seguinte fundamentação:

    “No caso em apreço, está em causa um acórdão da Relação que alterou o momento da subida e o efeito do recurso interposto do despacho da 1ª instância em que o recorrente arguia nulidades e irregularidades do despacho de pronúncia.

    Ora, o acórdão questionado não foi proferido em 1ª instância, porquanto o recurso tinha sido admitido pelo Ex.mo juiz a quo com subida imediata, nos próprios autos com efeito suspensivo, limitando-se a Relação a fazer uso dos poderes conferidos pelo art. 414º, n.º 3, do CPP, alterando o modo e o momento da subida do recurso; logo não tem aplicação o disposto no art. 432º alínea a) do CPP.

    Assim sendo, o recurso não é admissível nos termos do art. 400º, n.º 1 alínea c) do CPP, uma vez que estamos perante uma decisão que não pôs termo à causa, mas que apenas reteve o recurso, continuando o processo a seguir a sua normal tramitação”.

  7. Foi nesta sequência que foi interposto o presente recurso, através de um requerimento que tem o seguinte teor:

    “![...], tendo sido notificado da decisão desse Venerando Tribunal, de 28/01/2004, que indeferiu a reclamação relativa à decisão de 30/06/2003 do Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão 21/05/2003, alterou o momento da subida e o efeito do recurso interposto na 1ª instância e não admitiu o recurso interposto para esse Tribuna1 superior, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional.

    Assim, estando em tempo (art.º 75° LTC), tendo para tal legitimidade (art.º 72° n.º 1 al. b) da LTC) e encontrando-se devidamente patrocinado (art.º 83° n.º 1 da LTC), requer a V.ª Ex.ª. se digne admitir o presente recurso, com efeito suspensivo, subindo nos próprios autos (art.º 78° n.º 4 da LTC), o que faz nos termos e pelos seguintes fundamentos:

    I – DO RECURSO O presente recurso é interposto para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70° n.º 1 al. b), n.º 2 e n.º 3 da LTC (Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, na actual redacção) porquanto se mostram esgotados todos os meios de recurso que no caso cabiam

    II - DOS REQUISITOS DO RECURSO Interpõe-se agora recurso para o Tribunal Constitucional da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em 21/05/2003, que alterou o momento da subida e o efeito do recurso interposto do despacho da 1ª instância, atribuindo-lhe efeito meramente devolutivo e determinando que o recurso suba conjuntamente com aquele que vier a ser interposto da decisão que tiver posto termo à causa, tendo fundado a sua decisão na consideração de que não se tratava de um recurso expressamente mencionado nas alíneas do n.º 1 do art.º 407° do CPP, nem de caso cuja retenção o tornaria absolutamente inútil, razão porque o recurso não tem subida imediata.

    O despacho da 1ª instância proferido, em 2/12/2002, pela Mma. Juiz de Instrução do Tribunal Judicial de Torres Vedras está ferido de nulidade, que, imediata e atempadamente, foi arguida.

    E, foi do despacho de não atendimento da arguição da nulidade que foi interposto recurso, tendo este sido admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

    Ora, o Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça STJ) da decisão do TRL, invocando, a inconstitucionalidade que ora se suscita, dado que, só naquela decisão foram aplicadas normas do CPP cuja interpretação se entende violar princípios constitucionais - cf. art.º 72° n.º 2 da LTC.

    Na verdade, ao contrário do decidido pelo TRL, entende-se que viola os princípios constitucionais de garantia de qualquer cidadão, a interpretação de que o ju1gamento de um recurso em que são arguidas nulidades - que determinariam a sua não sujeição a julgamento - não é um caso em que a sua retenção o tornaria absolutamente inútil e, por conseguinte, deve fixar-se um regime de subida deferido com efeito meramente devolutivo, a conhecer conjuntamente com o recurso que vier a ser interposto da decisão que puser termo à causa.

    III - DO ÂMBITO DO RECURSO DE CONSTITUCIONALIDADE A suscitação e apreciação da constitucionalidade em sede de fiscalização concreta reporta-se necessariamente a normas, no entanto, esta apreciação não exclui um pronunciamento - e logo uma legitima suscitação - no que se refere à interpretação e sentido em que a norma "(...) foi tomada no caso concreto e aplicada na decisão recorrida (...)" - vide José Manuel Cardoso da Costa, in "A Jurisdição Constitucional em Portugal", 2ª ed. Coimbra, 1992, pág. 50, nota 49-0.

    In casu, o Recorrente pretende ver apreciada a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 407° n.º 2 e art.º 408° n.º 1 e n.º 2, todos do Código de Processo Penal (CPP) com a interpretação que lhe foi dada pelo TRL, por se entender ter sido violado o disposto no art.º 32° n.º 1 e n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP).

    O recurso interposto para o TRL teve como fundamento a nulidade da decisão instrutória proferida em 2/12/2002, pela Mma. Juiz de...

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