Acórdão nº 614/05 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução09 de Novembro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 614/2005 Processo n.º 697/04 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, em que figuram como recorrente a Caixa Geral de Aposentações e como recorrida A., foi proferido, em 29 de Março de 2005, pela 2.ª Secção do Tribunal Constitucional, o acórdão n.º 159/2005, pelo qual se decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 41.º, n.º 2, 1.ª parte, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho, na interpretação segundo a qual a titularidade de pensão de sobrevivência em caso de união de facto depende de o companheiro do falecido estar nas condições do artigo 2020.º do Código Civil, isto é, de ter direito a obter alimentos da herança, por não os poder obter das pessoas referidas no artigo 2009.º, n.º 1, alíneas a) a d), do mesmo Código. Consequentemente, foi concedido provimento ao recurso e determinada a reforma da decisão recorrida em conformidade com o juízo sobre a questão de constitucionalidade.

    AUTONUM 2.Notificada desta decisão, a recorrida veio dela interpor recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 79.º-D da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei do Tribunal Constitucional), por considerar que “o aludido acórdão julgou em sentido divergente do que anteriormente fora decidido quanto à mesma norma (art.º 41.º, n.º 2 – 1.ª parte, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência) pelo acórdão n.º 88/2004 (3.ª Secção desse Tribunal)”.

    Admitido o recurso, e notificadas as partes para apresentarem as suas alegações, a recorrente concluiu assim as suas:

    1. A união de facto é uma relação familiar em que os sujeitos envolvidos não viram necessidade de a sujeitar a uma formalização.

    2. Acontece em qualquer fase da vida e, muitas vezes, em situações em que a ligação afectiva é extremamente forte.

    3. Estamos, no fundo, perante uma situação de facto em tudo semelhante ao casamento.

    Acresce que

    4. O art.º 36.º da Constituição estatui que

    “Todos têm direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade”.

    5. Este artigo sempre terá de ser interpretado no sentido de que a constituição de família não é apenas o resultado do casamento mas resulta também de uma situação de união de facto estável e duradoura, como a dos autos.

    6. A união de facto, é, pois uma relação familiar (cfr.- Gomes Conotilho/Vital Moreira – C.R. Portuguesa Anotada; Coimbra, 1978, pág. 200 e 351), que como tal deverá ser protegida (art.º 67.º, n.° 1, do C.P.P.). Mas mais:

    7. É desproporcionada e não se justifica constitucionalmente a diferenciação entre a posição do cônjuge sobrevivo e a do companheiro em união de facto no que concerne ao direito às prestações por morte.

    8. A Constituição não especifica nesta matéria, qualquer indício bastante da valorização do casamento relativamente à unidade “familiar” constituída pela união de facto.

    9. A norma consubstanciada na 1.ª parte do n.° 2 do art.º 41.º do Estatuto das Pensões de Sobrevivência viola o princípio da proporcionalidade tal como resulta dos art.ºs 2.°, 18.°, n.° 2, 36.º, n.° 1, 63.º, n.°s 1 e 3, da C.R.P .

    10. O art.º 2.° da C.R.P. estatui que a República Portuguesa é um Estado de Direito democrático, baseado na soberania popular ... no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais sendo que “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos” (art.º 18.º, n.° 2).

    11. O art.º 36.º, n.° 1, estatui que “todos têm direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade”.

    12. Por último o art.º 63.º, n.° 1, estatui expressamente que todos têm direito à segurança social sendo que o n.° 3 do citado preceito diz que “o sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência, ou de capacidade para o trabalho”.

    13. Importa também salientar, que o fundamento e a natureza do direito a alimentos e à pensão de sobrevivência são diversos. Na verdade

    14. O direito a alimentos resulta de relações familiares ou para-familiares e visa fazer face a uma situação de necessidade do alimentado.

    15. O direito à pensão de sobrevivência tem por base descontos obrigatoriamente realizados, ao longo da vida profissional (durante um período mínimo) pelo funcionário público entretanto falecido, sendo relevantes, para determinação do montante da pensão, não só o montante da contribuição mas também o período contributivo.

    16. Além disso a pensão de sobrevivência é paga por uma entidade pública, para a qual obrigatoriamente descontam os funcionários públicos e o seu objectivo é compensar parte da perda dos rendimentos determinados pela morte do beneficiário da Caixa Geral de Aposentações.

    17.Mas o direito à pensão de sobrevivência é também manifestamente diferente do direito sucessório.

    18. O facto de não ser reconhecida a qualidade de herdeiro legítimo ou legitimário à pessoa que viveu em união de facto não constitui qualquer argumento válido para o que se discute...

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