Acórdão nº 350/09.0TBANS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução04 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. O (…) instaurou, no Tribunal Judicial de Ansião, a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra a Caixa Geral de Aposentações (CGA), pedindo que a Ré seja condenada a reconhecer que a A. é titular das prestações por morte referentes ao beneficiário da CGA A (…) (pensão de sobrevivência e subsídio por morte), com todas as consequências legais.

Alegou, em resumo, que o dito beneficiário faleceu a 05.4.2009; este e a A. viveram em união de facto desde 1992; tem como únicos rendimentos a quantia de € 322,62 de reforma por invalidez e € 257,00 de renda de um prédio mas que não é certo, valores que, face à sua situação (incluindo doença), são insuficientes para suportar as suas despesas; a herança do de cujus não deixou quaisquer bens, os seus pais já faleceram e não pode receber alimentos de outras pessoas, designadamente dos seus filhos.

A Ré contestou, impugnando alguns dos factos articulados pela A. e concluindo que “o subsídio por morte que a Autora peticionou juntamente com a pensão de sobrevivência não pode ser-lhe concedido, enquanto não o requerer, no prazo de um ano a contar da data do falecimento do pensionista A (…)” e que a A. deverá provar os factos conducentes à atribuição da requerida pensão de sobrevivência, sob pena de improcedência da acção.

Na réplica, a A. disse ter sido informada que só com a presente acção poderia obter o mencionado subsídio e reafirmou o alegado (inclusive, a inexistência de ascendentes ou familiares da linha colateral) e o peticionado no articulado inicial.

Foi proferido despacho saneador (tabelar) e seleccionada, sem reparo, a matéria de facto (assente e controvertida).

Efectuado o julgamento e decidida a matéria de facto, o tribunal recorrido julgou a acção totalmente procedente, declarando “improcedente a excepção da caducidade invocada pela Ré, Caixa Geral de Aposentações, condenando esta a reconhecer que a Autora, O (…), é titular das prestações por morte referentes ao beneficiário da Caixa Geral de Aposentações, A (…), beneficiário com o n.º 291285-0”.

Inconformada com o decidido e visando a revogação da sentença e a sua absolvição do pedido, a Ré interpôs a presente apelação, formulando as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - O pensionista da CGA, A (…), faleceu a 2009.4.05, pelo que os direitos previdenciais decorrentes do seu decesso dependem da produção, por parte da apelada, de toda a prova que a jurisprudência considera necessária nestes casos, nomeadamente, do direito a alimentos e de não os poder obter das pessoas identificadas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art.º 2009º, do Código Civil (CC), dispositivo para o qual remete o art.º 2020º do mesmo Código.

  1. - Uma vez que o filho da apelada, (…), é solteiro e vive sozinho, gera rendimentos mensais elevados, suficientes para auxiliar a sua mãe, a qual, por sua vez, também dispõe de rendimentos, parece ser de concluir que, das duas uma, ou a apelada não carece de alimentos, ou, carecendo deles, existe uma, de entre as pessoas identificadas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art.º 2009º, do CC, que lhos pode prestar, neste caso, o referido (…).

  2. - A obrigação alimentar decorrente da união de facto consagrada no art.º 2020º, do CC, reporta-se, tão-somente, ao indispensável ao sustento, habitação e vestuário do alimentando, correspondendo, num justo equilíbrio, à realidade económica e social do País, sendo que só nos casos em que este não possa obter esses alimentos da herança do companheiro falecido é que podem estar reunidos os requisitos para lhe ser atribuída pensão a cargo da previdência social.

  3. - A sentença recorrida, ao apreciar a carência de alimentos à luz de um critério meramente formal, sem atender à devida ponderação entre os rendimentos assentes e a realidade económica e social do País, violou os art.ºs 41º, n.º 2, do Estatuto das Pensões de Sobrevivência e 2020º, do CC, bem como a referida jurisprudência.

A A. respondeu à alegação da recorrente, sustentando a improcedência do recurso.

Atento o referido acervo conclusivo (delimitativo do objecto do recurso - art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, na redacção conferida pelo DL n.º 303/07, de 24.8), colocam-se duas questões fundamentais: qual o regime jurídico aplicável (e, não obstante, se ficaram provaram os requisitos previstos na Lei n.º 7/2001, de 11.5, na redacção anterior à conferida pela Lei 23/2010, de 30.8); se a pretensão formulada pela A. deve proceder.

* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: a) No dia 05.4.2009, faleceu, na freguesia e concelho de Ansião, no estado civil de divorciado, A (…), que era residente na Rua Rainha Santa Isabel, Ansião. (A) b) A (…) era reformado, beneficiário da Caixa Geral de Aposentações, com o n.º 291285-0. (B) c) A A. nasceu em 29.4.1939, sendo filha de (…) e (…). Encontra-se no estado civil de divorciada, tendo tal divórcio sido decretado por sentença transitada em julgado em 25.9.1991.

[1] (C e D) d) A A. viveu com A (…) desde 1992 e até à data do seu óbito, de forma ininterrupta, na mesma habitação, partilhando a mesma cama, relacionando-se afectiva e sexualmente, tomando as refeições em conjunto, passeando e saindo juntos, cada um contribuindo com o que auferia para a aquisição dos bens alimentares, electrodomésticos, vestuário e tudo o necessário à vida em comum, cuidando a A. de A (…) quando este se encontrava doente e o mesmo fazia o mesmo em relação à A. e auxiliando-se mutuamente no dia-a-dia, pois juntavam as suas receitas e pagavam em conjunto as suas despesas. (1º a 8º) e) A A. e A (…) eram ambos reputados, por amigos, vizinhos e conhecidos, como marido e mulher. (9º) f) A A. é reformada por invalidez, recebendo uma pensão mensal no valor de € 322,62 (trezentos e vinte e dois euros e sessenta e dois cêntimos). (E) g) Actualmente, a A. aufere ainda uma renda no valor de € 257 (duzentos e cinquenta e sete euros), proveniente de um imóvel que possui em Maçãs de D. Maria. (F) h) Os montantes referidos em II. 1. alíneas f) e g) são os únicos rendimentos da A., sendo que no que se refere ao montante da aludida renda o mesmo nem sempre é recebido pela A., dadas as variações de mercado, o local onde se situa o imóvel arrendado, a falta de procura quando não está arrendado e a existência de atrasos e faltas de pagamento das rendas. (resposta ao art.º 10º) i) Encontra-se junta a fls. 30 a 35 cópia de declaração de IRS da A. referente ao ano de 2008, apresentando o rendimento bruto anual de € 7 516,68 (sete mil quinhentos e dezasseis euros e sessenta e oito cêntimos). (G) j) A A. tem dois filhos, a saber: - L (…) solteiro, de quarenta e sete anos de idade, residente em Póvoa de Santa Iria, sendo o agregado familiar composto pelo próprio; - G (…), solteiro, de quarenta e seis anos de idade, residente no lugar do Brejo, freguesia e concelho de Ansião, sendo o agregado familiar composto pelo próprio e dois filhos menores de idade. (H) k) L (…) aufere o rendimento de € 41 921,36 (quarenta e um mil novecentos e vinte e um euros e trinta e seis cêntimos), conforme declaração de IRS referente ao ano de 2008 e tem as seguintes despesas fixas: - Habitação, cerca de seiscentos euros, referentes a duas casas; - Empréstimo no valor de € 175 000, para aquisição de imóvel, cuja prestação mensal se cifra em cerca de € 1 400 (mil e quatrocentos euros); - Sustento mensal, cerca de € 1 000 (mil euros), o que também inclui electricidade, água, gás, telefone, condomínios, comida, transportes, seguros, impostos, vestuário e calçado. (I) l) G (…) aufere o rendimento de € 4 050 (quatro mil e cinquenta euros), conforme declaração de IRS referente ao ano de 2008, tendo o encargo de contribuir para o sustento de dois filhos menores. (J) m) P (…) e S (…) faleceram em 19.02.1948 e 06.8.1970[2], respectivamente. (L) n) D (…), filho de P (…) e S (…), faleceu em 13.3.1982. (M) o) A /…), filho de P (…) e S (…), faleceu em 19.8.2000 (doc. de fls. 122 e seguintes dos autos).

p) A A. sofre de diabetes e de doença crónica do foro cardíaco e tem problemas de visão. (resposta ao art.º 11º) q) Face à referida doença do foro cardíaco, a A. é portadora de “Pacemaker”. (resposta ao art.º 12º) r) O referido em II. 1. alíneas o) e p) obriga a A. à toma diária de adequada medicação, no que despende uma quantia mensal de cerca de € 60, e a consultas e exames de diagnóstico, no que despende quantia não concretamente apurada, e à aquisição de óculos. (respostas aos art.ºs 13º e 14º) s) A A. tem de efectuar deslocações, dado ser seguida no Hospital de Santa Cruz em...

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