Acórdão nº 235/05 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução03 de Maio de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 235/2005

Processo n.º 201/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:

A – Relatório

1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão do relator de não conhecimento do recurso interposto para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de Fevereiro de 2005, que decidiu rejeitar o recurso para fixação de jurisprudência para ele interposto pela ora reclamante.

2 – A reclamante fundamenta a sua discordância com o decidido no Tribunal Constitucional num longo articulado, do seguinte teor:

A arguida interpôs recurso para fixação de jurisprudência para o pleno das secções criminais do STJ, alegando a existência de diferente entendimento jurisprudencial no que respeita à interpretação dada ao art. n.º 400º, nº 1, al. f), CPP, porquanto o conceito "aplicável" referido na norma em apreço, tem sido interpretado, ora no sentido de considerar a pena abstractamente aplicável, tal como sucede com o Acórdão fundamento indicado (Ac. do STJ de 09/10/2003, retirado do processo 03P2850) ora no sentido de considerar a pena concretamente aplicada, tendo nas suas conclusões referido:

A- Existem acórdãos opostos sobre a mesma questão fundamental de direito, ou seja, à mesma disposição legal – art. 400º, n.º 1, al. f), CPP- foram dadas diferentes interpretações/aplicações, ora se entendendo que o vocábulo "aplicável" se refere à pena abstractamente considerada, ora se entendendo que se refere à pena em concreto.

B- Verifica-se uma identidade das situações de facto e respectivo enquadramento jurídico, contempladas nas decisões em confronto, e neste sentido conferir o ensinamento do Prof. Alberto dos Reis, em "Breve Estudo sobre a Reforma do Processo Civil", 2ª ed., pág. 666, no qual se ensina "Para que seja admissível recurso (...) não é forçoso que a oposição entre acórdãos se manifeste na decisão, isto é, que a questão final a resolver num e noutro caso fosse a mesma. (...) O fundamento de uma decisão final pode, por sua vez, corresponder à duma questão preliminar. Por outras palavras: a decisão final pode ser a consequência ou o corolário lógico duma decisão anterior."

C- A oposição entre acórdãos é explicita.

D- Ambos os acórdãos, quer o proferido nos presentes autos, quer o invocado como fundamento, transitaram em julgado.

E- Os acórdãos foram proferidos no domínio da mesma legislação.

F- Assim, deve o Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, uniformizando a jurisprudência, proferir acórdão no sentido de que:

"É admissível recurso para o STJ, nos termos do art. 400º, nº 1, al. f), CPP, do acórdão condenatório da Relação que confirme a decisão de primeira instância, sempre que, em abstracto a moldura penal aplicável ao caso seja superior a oito anos de prisão, e mesmo que em concreto não seja já possível a aplicação de uma pena superior a oito anos."

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Posteriormente, foram os autos presentes à conferência e aí foi decidido rejeitar o recurso de fixação de jurisprudência, defendendo-se em suma:

I) "Os acórdãos em confronto - recorrido e fundamento foram proferidos pelo STJ precisamente na mesma data e secção - 9 de Outubro de 2003 – 5ª secção ainda que o trânsito de um e do outro tenham ocorrido (por razões que se desconhecem) em datas distintas. O acórdão recorrido transitou em 21.04.04; o acórdão fundamento transitou a 27.10.2003. Neste particular aspecto afigura-se-nos óbvio - até pela natureza das coisas e pelo objectivo do recurso que, relevante será apenas a data da prolacção dos acórdãos e não do seu trânsito (...) acórdão anterior, anterior no sentido de ter sido proferido (e não transitado antes).

II) Por outro lado, entendeu-se que não haveria oposição de julgados por não haver "identidade de situações fáctico jurídicas nem há identidade de questões de direito", nomeadamente, "(...) no Ac. recorrido a questão foi resolvida tendo em vista a interpretação e aplicação dos normativos dos art. 400º, n.º 1, al. f) (dupla conforme), e o art. 409º (proibição da reformatio in pejus), ambos do CPP, o que conduziu à rejeição de determinado recurso; no outro, o Acórdão fundamento, a questão foi resolvida com base na "norma essencial" (como se diz) do art. 432º, al. d), do CPP e que conduziu à admissão de um recurso, directamente para o STJ, de acórdão proferido pelo colectivo visando apenas o reexame da matéria de direito, independentemente da pena aplicada ou aplicável. Para que se tenha por existente a oposição de julgados, é necessário que os mesmos dispositivos sejam interpretados e aplicados diversamente a factualidades idênticas, sendo ainda de exigir que uma das decisões tenha estabelecido de forma expressa entendimento contrário ao fixado na outra. (....)

No acórdão recorrido, deparamos com esta situação: a recorrente A. foi condenada em primeira instância como autora de um crime de branqueamento de capitais, p. e p. pelo art. 23º do DL. n.º 15/93, de 22.01, na pena de 8 anos de prisão. Recorreu para a Relação que, dando provimento parcial ao recurso, baixou a pena para 6 anos e 6 meses de prisão. Recorreu ainda para o STJ, onde se suscitou a questão prévia da rejeição do recurso, por inadmissível - questão que foi julgada procedente, vindo o recurso a ser rejeitado com base na aplicação conjugada dos art. 400º, n.º 1, al. f), e 409º do CPP.

Entendeu-se que havia dupla conforme quanto a uma pena aplicada em medida inferior a 8 anos de prisão (embora a pala aplicável fosse superior a 8 anos) e que, por o MP não ter recorrido, já não podia ser aplicada pena mais grave.

No acórdão fundamento, a situação apresenta-se assim: o arguido F.. foi condenado pelo tribunal colectivo pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, numa pena de multa.

Recorreu directamente para o STJ, visando apenas o reexame de matéria de direito.

No STJ foi suscitada pelo MP a questão prévia da irrecorribilidade da decisão para o STJ que não cuida (ou não devia cuidar) da pequena ou média criminalidade, que seria competência da Relação.

O STJ julgou improcedente essa questão e considerou-se competente para conhecer do recurso, por força do disposto no art. 432º, al. d), CPP.

(...)"

Inconformada com esta decisão, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional tendo sido proferida decisão de não admissão do recurso, sendo aí defendido, em suma:

3.1. "Em primeiro lugar, a recorrente não identificou durante o processo – maxime no requerimento de interposição de recurso para este Tribunal – qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.

Na verdade , é patente que a Recorrente apenas se insurge contra o teor da decisão recorrida, imputando-lhe directa e imediatamente o vício da inconstitucionalidade (...).

Ora, o objecto da fiscalização jurisdicional da constitucionalidade são apenas normas jurídicas, não podendo o Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre uma (eventual) "inconstitucionalidade da decisão judicial", como, de resto, tem sido unanimemente acentuado pela jurisprudência deste Tribunal (...) - o que exige que, ao suscitar-se a questão da inconstitucionalidade, se deixe claro qual o preceito constitucional cuja legitimidade se questiona, ou, no caso de se questionar certa interpretação de uma determinada norma, qual o sentido ou dimensão normativa do preceito que se tem violador da lei fundamental.

Por isso se reconhece que os recursos de constitucionalidade, embora interpostos de decisões de outros tribunais, visam controlar o juízo que nelas se contém sobre a violação ou não violação da Constituição por normas mobilizadas na decisão recorrida como sua ratio decidendi, não podendo visar as próprias decisões jurisprudenciais, identificando-se, nessa medida, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objecto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objecto de tal recurso (...).

3.2. Mas, mesmo a admitir-se - sem se conceder - que a Recorrente suscitou e pretende impugnar uma dimensão interpretativa ao art. 437º do Código de Processo Penal em termos de individualizar uma norma que presidisse à resolução do caso ao nível "da interpretação de que a expressão - acórdão proferido em último lugar - se refere apenas ao dia e não à hora, porque pode um acórdão ter sido proferido em último lugar, no mesmo dia, se foi proferido em hora posterior (...) não estando provado no processo qual dos acórdãos foi proferido em último lugar, apesar de terem sido proferidos pela mesma secção, uma interpretação do art. 437º citado implicaria a admissão do recurso dado nas suas decisões os tribunais estarem obrigados a respeitar as normas constitucionais e os princípios consignados na Constituição, nos termos do art. 204º da CRP", sempre haveria de concluir-se que, em tais circunstâncias, também o Tribunal Constitucional não poderia conhecer do objecto do recurso uma vez que a ratio decidendi do juízo recorrido não deixa de assentar no reconhecimento de que, para além desse facto, improcedia, no plano substantivo-material, a invocada oposição de julgados, afirmando-se ai "que a recorrente invoca como acórdão fundamento, uma decisão do STJ que se pronunciou sobre uma questão de direito que nada tem a ver com a questão de direito apreciada no acórdão recorrido. Aliás, nessa mesma linha, esclareceu o Juiz Conselheiro Relator que "de todo o modo o acórdão agora posto em crise, apenas se limitou a decidir pela não verificação da oposição de julgados, ainda que, a latere, se aludisse à situação inédita (para nós) de ambos os acórdãos, em confronto, terem sido proferidos na mesma data, sem que daí se retirasse argumentação decisiva para a solução adoptada." Pelo que, também por esta base não se poderia tomar conhecimento do objecto do recurso, porquanto, qualquer que fosse o resultado que tal recurso...

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