Acórdão nº 321/06 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Helena Brito
Data da Resolução17 de Maio de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 321/2006

Processo n.º 1043/05

  1. Secção

    Relatora: Conselheira Maria Helena Brito

    Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

    I

    1. O juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa proferiu, em 7 de Março de 2005, despacho do seguinte teor (constante de fls. 52 e seguintes dos presentes autos):

      “Requerimento de fls. 493/496:

      Notificado do teor do despacho de fls. 380, no qual a Magistrada do Ministério Público declarou a suspensão do presente processo, nos termos do art. 47° n.º 1 do RGIT, o arguido A., apresentou requerimento, no qual alega que o referido despacho do Ministério Público é inexistente por usurpador de funções jurisdicionais.

      A Magistrada do Ministério Público pronunciou-se sobre o alegado, promovendo o indeferimento do requerido.

      Apreciando e decidindo.

      Dispõe o art. 47° n.º 1 do Regime Geral para as Infracções Tributárias, que:

      se estiver a correr processo de impugnação judicial ou tiver lugar oposição à execução, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o processo penal suspende-se até que transitem em julgado as respectivas sentenças

      .

      Da leitura e interpretação que fazemos da referida disposição legal concluímos que uma vez verificada a situação objectiva referida na previsão da norma – isto é, «se estiver a correr processo de impugnação judicial ou tiver lugar oposição à execução, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário...» – deve ser declarada a suspensão do processo penal fiscal.

      Assim, a declaração de suspensão do processo penal, nas circunstâncias previstas no art. 47° n.º 1 do referido RGIT, não é uma faculdade e não depende de critérios de oportunidade, sendo antes o reconhecimento da verificação de uma situação objectiva à qual a lei atribui efeitos no processado.

      Nesta consonância e ainda porque o estabelecido no RGIT, enquanto norma especial, prevalece sobre as normas do Código de Processo Penal, nomeadamente sobre o disposto no art. 7° n.º 2 do C.P.P., invocado pelo requerente no seu requerimento, não faz sentido a exigência de que a declaração de suspensão do processo, nos termos em causa, tenha que ser feita por juiz numa fase não judicial do processo, como é o Inquérito.

      Só assim se compreende o teor do art. 40º a 42° do RGIT, donde manifestamente decorre que cabe ao titular do Inquérito, o Ministério Público, a responsabilidade pela tramitação do processo até ao despacho de encerramento do Inquérito.

      Note-se que o efeito que o arguido pretende evitar – a paralisação do processo, normalmente por longo período de tempo – é uma consequência da verificação da situação objectiva que fundamenta e determina a suspensão do processo, e ocorre independentemente da declaração ser feita por Magistrado do Ministério Público ou por juiz.

      Alega o arguido que já antes havia requerido o arquivamento dos autos e que «O Ministério Público porém, à revelia e contra os interesses do arguido, decidiu, por despacho de 22/10/2004, suspender os presentes autos...».

      Não pode porém o arguido, com o requerimento apresentado querer forçar o Ministério Público a proferir despacho de arquivamento, nem suscitar a apreciação judicial da existência ou não de indícios da prática do crime, porquanto esta é uma realidade diversa e sindicável noutro momento e por outros meios.

      Entendemos pois que a Magistrada do Ministério Público actuou dentro da mais estrita legalidade, ao proferir o despacho agora em causa, não padecendo o mesmo de qualquer vício processual.

      Assim, por manifesta falta de fundamento legal indefiro o requerido.

      […].”.

    2. Deste despacho recorreu A. para o Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 2 e seguintes), tendo na motivação respectiva formulado as seguintes conclusões:

      “1ª – O despacho recorrido decidiu que, estando a correr impugnação judicial, ou oposição à execução, incumbe ao Mº. Pº., nos termos do n.º 1 do artigo 47º do R.G.I.T., determinar a suspensão do processo, até que transitem em julgado as respectivas sentenças, independentemente de quando isso vier a ocorrer, por entender não haver lugar à aplicação do disposto no artigo 7º do C.P.P. no Processo Penal Tributário.

  2. – Tal entendimento incorre em erro de direito, uma vez que o C.P.P. (artº 7º) é aplicável subsidiariamente ao R.G.I.T. nesta matéria, pois o citado n.º 1 do artº 47º é omisso quanto à entidade competente para determinar a suspensão do processo e o prazo concreto da mesma.

  3. – Além disso, aquela norma (n.º 1 do artº 47º do R.G.I.T.), interpretada, nos termos em que o fez o despacho recorrido, sem limite do período de suspensão, a não ser o do trânsito em julgado das sentenças a proferir na impugnação judicial, ou na execução – o que pode determinar a suspensão do processo por dez, doze, quinze ou mais anos – viola o direito do arguido a ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, bem como o princípio do Estado de direito democrático e ainda a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e princípios de Direito Comunitário.

    […].”.

    O Ministério Público respondeu (fls. 75 e seguintes), sustentando que devia negar-se provimento ao recurso.

    O despacho recorrido foi mantido, por despacho de fls. 81.

    Notificado da resposta do Ministério Público, A. veio ainda dizer o seguinte (fls. 84 e seguintes):

    “1 – Salvo o devido respeito, a tese sufragada pelo Exm.º Sr. Magistrado do Ministério Público é incompatível com as garantias constitucionais do processo criminal e do acesso ao direito e aos tribunais. Matéria, que, aliás, o despacho recorrido e a resposta do Ministério Público à motivação do recurso do arguido omitiram por completo.

    2 – Tal entendimento, na sua aplicação concreta, impossibilitaria ainda, em muitas situações, que fosse proferida no processo crime uma decisão jurisdicional em prazo razoável como impõe o Artigo 20º, n.º 1 da C.R.P. e o Artigo 6º, parágrafo 1º da Convenção dos Direitos do Homem.

    3 Acresce que o não cumprimento desse preceito legal faz incorrer o Estado Português em responsabilidade civil...

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