Acórdão nº 515/07 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução16 de Outubro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 515/2007

Processo nº 849/07

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

Relatório

1 – A. reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, que não conheceu do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 24 de Maio de 2007, que confirmou em recurso o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por sua vez, negara provimento ao recurso interposto de acórdão da 1.ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia que o condenara, como co-autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de cinco anos e seis meses de prisão.

2 – Fundamentando a sua reclamação, assim discorreu o reclamante:

1. Por douta decisão sumária do Exmo. Juiz Conselheiro Relator, proferida a 04 de Setembro do corrente ano, decidiu o Tribunal Constitucional não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto pelo ora Reclamante por entender que durante o processo, o Reclamante, dispondo de oportunidade processual para o fazer, não suscitou cm termos adequados qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.

2. Salvo o devido respeito e a mais subida vénia, carece de razão a decisão sumária cm apreço, pelos motivos que infra melhor se explanarão.

Vejamos:

3. Nos presentes autos, o Reclamante foi julgado pela 1ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia, tendo sido condenado na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

4. De tal douto acórdão, o Reclamante interpôs recurso para o Venerando Tribunal da Relação do Porto, o qual julgou improcedente o mesmo, mantendo a decisão de primeira instância.

5. Novamente inconformado, o Reclamante interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que julgou, igualmente, improcedente o recurso interposto.

6. Decidiu o douto acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 2007 julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo Reclamante A., mantendo, assim, a condenação do Reclamante na pena de 5 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime p. e p. pelo art. 21º, nº 1 do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro.

7. Interpôs então o ora Reclamante recurso para o Tribunal Constitucional de harmonia com o disposto no art. 70°, nº 1, alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional.

8. Na motivação do recurso que interpôs para o Supremo Tribunal de Justiça, do douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto, o Reclamante expôs de forma cabal as razões que o levam a entender que tal aresto violou os art°s 27° e 32° da Constituição da República Portuguesa, ao interpretar da forma que o fez o disposto no art. 25° do D.L. 15/93 e dos arts 50° e 51° do Cód. Penal.

9. De facto, ao entender que os factos considerados como provados pela primeira instância não poderão ser subsumidos ao crime de tráfico de menor gravidade não se asseguraram o direito à liberdade do Reclamante, bem como as suas garantias de defesa, constitucionalmente consagradas, nomeadamente nos arts 27° e 32°, nºs 1 e 2 da C.R.P.

10. Tais garantias constitucionalmente consagradas foram também violadas pelo douto Tribunal “a quo” ao manter a condenação do Reclamante a uma pena de prisão efectiva de 5 anos e 6 meses, face à materialidade considerada como assente, coarctando o direito de liberdade do Reclamante, ofendendo assim os mais fundamentais direitos, liberdades e garantias, quando apenas poderia condená-lo pela pratica de um crime de tráfico de menor gravidade, numa pena junto ao limite mínimo da moldura penal abstracta e sempre suspensa na sua execução.

11. E mesmo que não se entendesse serem os factos considerados como provados subsumíveis ao crime de tráfico de menor gravidade – o que não se consente e apenas por hipótese se refere – e se concluísse definitivamente pela condenação do Reclamante pelo crime de tráfico p. e p. pelo art. 21° do D.L. 15/93 sempre seria de concluir pela excessividade da pena em que o Reclamante foi condenado.

12. Conforme o Reclamante devidamente expôs nas conclusões do recurso interposto do douto acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto, os factos considerados como provados permitem concluir pela diminuta ilicitude do comportamento do Reclamante, pela sua boa integração familiar, profissional e social, pela ausência de antecedentes criminais, factos que deveriam ter sido devidamente valorados em sede de apreciação e determinação da medida concreta da pena.

13. A moldura penal abstracta do crime p. e p. pelo art. 21° do D.L. 15/93 permite uma “margem de manobra

bastante elevada, sendo possível distinguir as situações mais graves das situações que possuem menor gravidade, pelo que o caso sub judice não poderá de modo algum ser enquadrável numa situação de gravidade elevada, impondo-se, portanto, a devida destrinça, pelo que a pena a que o Reclamante foi condenado sempre se deveria situar muito próximo do limite mínimo previsto pela moldura penal abstracta do art. 21° do D.L. 15/93 que, pese embora não passível de suspensão da sua execução, permitiria ao Reclamante beneficiar de medidas graciosas com maior facilidade, nomeadamente, saídas precárias e liberdade condicional, o que promoveria a sua ressocialização e integração na sociedade.

14. Daí o Reclamante entender ser inconstitucional a interpretação feita pelo tribunal de primeira instância, a qual logrou obter provimento do Venerando Tribunal da Relação do Porto e do Supremo Tribunal de Justiça, do disposto nas citadas normas legais, tendo, assim, sido violado o disposto nos arts 21° e 25° do D.L. 15/93, os arts 50° e 51° do Cód. Penal e ainda os arts 27° e 32° da Constituição da República Portuguesa.

15. Entende, assim, o Reclamante, salvo o devido respeito por melhor opinião, que a interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça ao inserto nos arts 40°, 50°, 51°, 71° e 72° do Código Penal e arts 21° e 25° do D.L. 15/93 de 22/01 não assegura todas as garantias de defesa do arguido, nomeadamente o seu direito constitucionalmente protegido à liberdade, violando o disposto nos arts 27° e 32° da Constituição da República, questão já suscitada pelo Reclamante no recurso que interpôs para o Supremo Tribunal de Justiça do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto a 19 de Julho de 2006.

16. Todo o exposto foi, salvo o devido respeito por melhor opinião, adequada e convenientemente explanado nas motivações do recurso interposto do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto, pelo que é forçoso concluir que a questão da inconstitucionalidade das ditas normas, na interpretação dada, foi devida, correcta e oportunamente suscitada no processo, motivo pelo qual se encontra preenchida a exigência do art. 70º, nº 1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional.

17. Assim se conclui, se encontrarem verificados todos os requisitos legais para o recurso interposto pelo Reclamante tivesse sido admitido por esse Tribunal Constitucional.

18. Destarte, e porque a questão da inconstitucionalidade das normas em apreço, na interpretação que lhe foi dada pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça, foi devidamente suscitada durante o processo, não sendo a decisão já passível de qualquer recurso, deveria tal inconstitucionalidade ter sido devidamente apreciada pelo Tribunal Constitucional.

Nestes termos, deve ser atendida a presente reclamação e, em consequência, ser admitido o recurso em toda a sua extensão, tudo com as legais consequências.

.

3 – O Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, pronunciou-se pelo indeferimento da reclamação, por ser manifestamente improcedente, porquanto “na verdade a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da decisão reclamada, no que respeita à evidente inverificação dos pressupostos do recurso de fiscalização concreta interposto”.

4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

«1 – A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua redacção actual (LTC), pretendendo que seja apreciada a inconstitucionalidade “dos artigos 40.º, 50.º, 51.º, 71.º e 72.º do Código Penal e artigos 21.º e 25.º do D.L. 15/93, de 22/01, na interpretação atribuída a tais normas pelo Supremo Tribunal de Justiça”.

2 – Compulsados os autos, cumpre relatar com interesse para o caso sub judicio:

2.1 – O arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19 de Julho de 2006, que confirmou a decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Gaia que o condenara na pena de cinco anos e seis meses de prisão, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes.

Da motivação do recurso, o arguido-recorrente extraiu as seguintes conclusões:

“(...)

I – Venerando Tribunal da Relação do Porto, em 19 de Julho de 2006, que julgou improcedente o recurso interposto pelo Recorrente do acórdão proferido em 1ª instância, que o condenou como autor de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21 do DL. 15/93 de 22/01, na pena de cinco anos e seis medes de prisão.

II – A factualidade dada como assente, conduz a uma qualificação jurídica diversa da que foi levada a efeito pelo Tribunal de 1ª Instância, já que apenas permitiria a condenação do Recorrente pelo crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25° do DL 15/93, de 22/01, e nunca pelo crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21° do mesmo diploma legal.

III – Não colocou o Recorrente em crise a fundamentação da convicção do Tribunal de 1ª instância acerca da matéria de facto considerada como provada apenas tendo impugnado a matéria de facto considerada como provada, nos termos e para os efeitos previstos no art. 412°, nºs 3 e...

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