Acórdão nº 330/07 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução29 de Maio de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 330/2007

Processo n.º 297/07

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

A – Relatório

1 – A., melhor identificado nos autos, reclama, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na versão actual (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator na qual se decidiu não tomar conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto pelo ora reclamante.

2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:

“1 – A., com os demais sinais dos autos, recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de Janeiro de 2007, dizendo o seguinte, no respectivo requerimento:

“As normas cuja inconstitucionalidade, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, que o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie são:

  1. - os artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”, 13º, números 1 e 2 e 17º, nº1 do Regulamento das Inspecções Judiciais (aprovado pelo Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura em 19 de Dezembro de 2002, publicado nas páginas 666 a 670 do Diário da República de 15.1.2003, II série);

  2. - os artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da Lei nº 15/2002, de 22.2 e alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº 1, do Código de Processo Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e os artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10);

  3. - os artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais.

    As normas constitucionais que o recorrente considera violadas são as constantes nos artigos 2O3º, 2O2º, nº 2, 268º, nº 4 e 2O2º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

    O recorrente suscitou parte das questões de inconstitucionalidade que vem invocar, quer no requerimento de interposição do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quer nas alegações no mesmo processo nº 584/05, da 2ª Secção. Quanto a outra parte desse vício, só agora a suscita porque está contida no acórdão de que se recorre, designadamente por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, não podendo, segundo as regras processuais - artigos 666º, 667º, 668º, 669º e 677º do Código de Processo Civil, aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais Administrativos -, ter sido objecto de reclamação, com arguição de nulidades e pedido de reforma.

    Foram, salvo o devido respeito, especialmente violados os seguintes segmentos das seguintes normas constitucionais:

    - artigo 203º: “Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei”.

    - artigo 268º, nº 4: “É garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, [...], a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos...”;

    - artigo 202º, nº2: “Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, [...] e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.”;

    - artigo 202º, nº 1: “Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo”.

    **********************************************

    1. Admissão de utilização de meio de prova ilícito, ainda para mais subtraído ao contraditório, em conflito com o princípio da independência dos tribunais.

      O Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido (folhas 28 e 29) admitiu como lícita a conversa do Ex.mo Sr. Desembargador Inspector com o Ex.mo Sr. Advogado delegado da Ordem dos Advogados em Sintra, no âmbito da Inspecção ordinária nº 217/2004, como meio de prova, subtraído ao princípio do contraditório, dizendo mesmo que “tudo indica que tal audição deva ter lugar”. Expusemos nas partes I.1. do requerimento de interposição do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e das respectivas alegações, os antecedentes que agravam ainda mais, no caso concreto, a admissão de tal diligência. Como já dissemos na resposta ao relatório da Inspecção, “a audição do delegado da Ordem dos Advogados deve ocorrer no âmbito das inspecções aos tribunais – artigo 11º, nº 1, g) do Regulamento das Inspecções Judiciais –, mas não, como se retira até “a contrario” dessa norma e do artigo 17º, nº 1 do mesmo Regulamento, no âmbito da inspecções aos juízes. Os perigos são evidentes”.

      Não nos foi dada oportunidade de contrariar os resultados de tão inusitada conversa, havendo meio de prova subtraído ao princípio do contraditório e que receamos que tenha influenciado a Inspecção. E isso inquina todo o processo de inspecção, não podendo ele ter efeito negativo para o recorrente.

      Conclui o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (folha 28), acompanhando o Conselho Superior da Magistratura, que o relatório da Inspecção nada reflecte sobre quaisquer elementos avaliativos que tenham resultado da audição. Mas não levou em conta que logo dissemos que justamente parte do que está em causa é, como resulta do parágrafo anterior, a omissão, no relatório do Ex.mo Sr. Desembargador Inspector, da menção dos elementos de avaliação obtidos através da referida conversa.

      A permissividade admitida e até aconselhada pelo Supremo Tribunal de Justiça abala, como já o dissemos, no recurso, nas referidas partes 1.1, o princípio da independência dos tribunais, consagrado no artigo 203° da Constituição da República Portuguesa, pois através da influência exercida junto de Inspector Judicial poderia um qualquer profissional forense, ainda que imbuído de uma concepção puramente mercantilista da sua profissão, sem cuidar da Justiça, conseguir, mediante a atribuição de classificação negativa, a suspensão de funções de Juiz que lhe seja incómodo.

      Por isto que dissemos neste nº I, a interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça aos artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”: 13º, números 1 e 2 e 17º, nº 1 do Regulamento das Inspecções Judiciais, viola o artigo 203º da Constituição da República Portuguesa.

    2. Tutela jurisdicional efectiva, com exame da causa e defesa dos direitos do recorrente.

      O artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10, sob a epígrafe “Direito a um processo equitativo”, estabelece que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada equitativamente “por um tribunal independente e imparcial”, o qual decidirá “sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil”. E o artigo 13º da mesma Convenção, sob a epígrafe “Direito a um recurso efectivo”, dispõe: “Qualquer pessoa cujos direitos e liberdades reconhecidos na presente Convenção tiverem sido violados tem direito a recurso perante uma instância nacional, mesmo quando a violação tiver sido cometida por pessoas que actuaram no exercício das suas funções oficiais”.

      As maiores inovações do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ligadas aos referidos artigos 202º, nº 2 e 268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, vão também no sentido da tutela jurisdicional efectiva e da protecção dos direitos dos cidadãos.

      **********************************************

      As eleições relativas aos vogais eleitos do Conselho Superior da Magistratura – artigo 137º, nº 1, c) do Estatuto dos Magistrados Judiciais –, estão marcadas para o próximo dia 1 de Março de 2007 (Aviso nº 13 091/2006, de 15.11.2006, publicado no Diário da República, 2ª série, nº 234, de 6.12.2006 – documento nº 1).

      O Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro B. é candidato efectivo a essas eleições para o Conselho Superior da Magistratura (documento nº 2), encabeçando uma das duas listas, havendo, pois, probabilidade de, brevemente, vir a ser Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura – artigos 138º, nº 1, 141º, nºs 1 e 2 e 142º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

      Foi ele o relator do acórdão recorrido, datado de 25.1.2007, 35 dias antes daquelas eleições.

      Atendendo ao disposto nos artigos 149º, a), 150º, nºs 1, 2 e 3, b), 151º, 152º, 154º e 158º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, parece-nos, salvo o devido respeito, que o Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro B., o qual tão brevemente deseja fazer parte do recorrido Conselho Superior da Magistratura, não podia nem deveria intervir em processo de recurso contencioso de decisão do Conselho Superior da Magistratura, ainda para mais como relator, que desempenha papel fundamental. Lavrou o acórdão em período de plena campanha eleitoral (esteve em Sintra nesse âmbito em 2,2.2007, tendo dito que já há um mês que andava a percorrer o país em campanha).

      Embora a relação de “grande intimidade” – artigo 127º, nº 1, g), 2ª parte do Código de Processo Civil – ainda não exista (aliás, sendo eleito, passará a ser parte; se bem que o Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro, segundo se diz no sítio informático do Supremo Tribunal de Justiça, seja representante do Conselho Superior da Magistratura no Conselho Pedagógico do Centro de Estudos Judiciários – documento nº 3, retirado do sítio da sua candidatura), sempre se pode pensar, salvo o devido respeito, que poderá ter agido já pensando no exercício das novas funções.

      Em anotação ao referido artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, escreve o Ex.mo Sr. Dr. Juiz Ireneu...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
  • Acórdão nº 510/18 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2018
    • Portugal
    • 17 Octubre 2018
    ...pelo menos, as normas ou princípios constitucionais que a norma sindicanda viola ou afronta» - Assim, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 330/2007, processo n.º 297/07, relator Benjamim Rodrigues. 14º) «Constitui jurisprudência uniforme e constante do Tribuna......
  • Acórdão nº 185/19 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2019
    • Portugal
    • 27 Marzo 2019
    ...pelo menos, as normas ou princípios constitucionais que a norma sindicanda viola ou afronta» - Assim, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 330/2007, processo n.º 297/07, relator Benjamim Rodrigues. «Constitui jurisprudência uniforme e constante do Tribunal Constituci......
2 sentencias
  • Acórdão nº 510/18 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2018
    • Portugal
    • 17 Octubre 2018
    ...pelo menos, as normas ou princípios constitucionais que a norma sindicanda viola ou afronta» - Assim, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 330/2007, processo n.º 297/07, relator Benjamim Rodrigues. 14º) «Constitui jurisprudência uniforme e constante do Tribuna......
  • Acórdão nº 185/19 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2019
    • Portugal
    • 27 Marzo 2019
    ...pelo menos, as normas ou princípios constitucionais que a norma sindicanda viola ou afronta» - Assim, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 330/2007, processo n.º 297/07, relator Benjamim Rodrigues. «Constitui jurisprudência uniforme e constante do Tribunal Constituci......

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT