Acórdão nº 185/19 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução27 de Março de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 185/2019

3ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em que é recorrente A. e recorrido o Conselho Superior da Magistratura (CSM), foi proferida Decisão sumária de não conhecimento do objeto do recurso (cfr. Decisão Sumária n.º 35/2019, fls. 487-517), com fundamento na falta de preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do recurso relativos ao objeto normativo e à utilidade do recurso (quanto à primeira questão de constitucionalidade colocada pela recorrente) e ao objeto normativo (quanto à segunda questão de constitucionalidade colocada pela recorrente), nos termos seguintes (cfr. II- Fundamentação, n.º 5 e ss., a fls. 492-517):

«5. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do Tribunal a quo, com fundamento no n.º 1 do artigo 76.º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal.

Segundo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, a admissibilidade do recurso apresentado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC depende da verificação, cumulativa, dos seguintes requisitos: ter havido previamente lugar ao esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC), tratar-se de uma questão de inconstitucionalidade normativa, a questão de inconstitucionalidade normativa haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (artigo 72.º, n.º 2, da LTC) e a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionalidade pelo recorrente (vide, entre outros, os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 6138/98 e 710/04 – também disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).

Faltando um destes requisitos, o Tribunal não pode conhecer do recurso.

6. Na resposta apresentada pela recorrida, veio a mesma suscitar uma questão prévia relativa à data da apresentação do requerimento de interposição de recurso pela recorrente, sustentando que há lugar ao pagamento de multa, nos termos do artigo 145.º, n.ºs 6 e 7, do Código de Processo Civil (atual artigo 139.º, n.ºs 6 e 7, do CPC), já que o requerimento, segundo a recorrida, apenas teria dado entrada no STJ no dia 17 de maio de 2016.

Cumpre, a este respeito, sublinhar tão só que dos autos decorre que o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade deu entrada no STJ desde logo, por fax, no dia 16 de maio de 2016, conforme carimbo e data a fls. 432 – não obstante o mesmo ter sido reiterado, com data de entrada de 17/5/2016, a fls. 441.

7. Cabendo aos recorrentes delinear o objeto do recurso (norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada), a aferição do preenchimento dos requisitos de que depende a admissibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional e, bem assim, a delimitação do objeto do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade devem ter por base o invocado no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e reportar-se à decisão recorrida (ou decisões recorridas), tal como identificada(s) pela recorrente no requerimento de interposição de recurso e que fixam o respetivo objeto – in casu, o acórdão do STJ, proferido em 26/04/2016, que indeferiu o recurso interposto pela ora recorrente das deliberações onde se se procedeu à graduação dos concorrentes do XIV Concurso Curricular de acesso ao STJ.

A ora recorrente vem submeter ao Tribunal Constitucional duas alegadas questões de constitucionalidade.

Vejamos quanto a cada uma delas.

A) Primeira questão de constitucionalidade

8. A primeira questão de constitucionalidade reporta-se a um alegado entendimento normativo retirado do artigo 27.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) então vigente, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de novembro e revisto pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de janeiro (cujo regime se mostra hoje regulado no artigo 34.º do novo CPA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro), em conjugação com o artigo 52.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de julho.

É esta a redação do artigo 27.º do CPA então vigente:

«Artigo 27.º

Ata da reunião

1 - De cada reunião será lavrada ata, que conterá um resumo de tudo o que nela tiver ocorrido, indicando, designadamente, a data e o local da reunião, os membros presentes, os assuntos apreciados, as deliberações tomadas e a forma e o resultado das respetivas votações.

2 - As atas são lavradas pelo secretário e postas à aprovação de todos os membros no final da respectiva reunião ou no início da seguinte, sendo assinadas, após a aprovação, pelo presidente e pelo secretário.

3 - Nos casos em que o órgão assim o delibere, a ata será aprovada, em minuta, logo na reunião a que disser respeito.

4 - As deliberações dos órgãos colegiais só podem adquirir eficácia depois de aprovadas as respectivas atas ou depois de assinadas as minutas, nos termos do número anterior.»

Já o artigo 52.º do EMJ tem a seguinte redação:

«Artigo 52.º

Avaliação curricular, graduação e preenchimento de vagas

1 - A graduação faz-se segundo o mérito relativo dos concorrentes de cada classe, tomando-se globalmente em conta a avaliação curricular, com prévia observância do disposto no número seguinte e, nomeadamente, tendo em consideração os seguintes factores:

a) Anteriores classificações de serviço;

b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais;

c) Currículo universitário e pós-universitário;

d) Trabalhos científicos realizados;

e) Actividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino jurídico;

f) Outros factores que abonem a idoneidade dos requerentes para o cargo a prover.

2 - Os concorrentes defendem publicamente os seus currículos perante um júri com a seguinte composição:

a) Presidente do júri - o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, na qualidade de presidente do Conselho Superior da Magistratura;

b) Vogais:

i) O juiz conselheiro mais antigo na categoria que seja membro do Conselho Superior da Magistratura;

ii) Um membro do Conselho Superior do Ministério Público, a eleger por aquele órgão;

iii) Um membro do Conselho Superior da Magistratura, não pertencente à magistratura, a eleger por aquele órgão;

iv) Um professor universitário de Direito, com a categoria de professor catedrático, escolhido, nos termos do n.º 5, pelo Conselho Superior da Magistratura;

v) Um advogado com funções no Conselho Superior da Ordem dos Advogados, cabendo ao Conselho Superior da Magistratura solicitar à Ordem dos Advogados a respectiva indicação.

3 - O júri emite parecer sobre a prestação de cada um dos candidatos, a qual é tomada em consideração pelo Conselho Superior da Magistratura na elaboração do acórdão definitivo sobre a lista de candidatos e que deverá fundamentar a decisão sempre que houver discordância face ao parecer do júri.

4 - As deliberações serão tomadas por maioria simples de votos, tendo o presidente do júri voto de qualidade em caso de empate.

5 - O Conselho Superior da Magistratura solicita, a cada uma das universidades, institutos universitários e outras escolas universitárias, públicos e privados, que ministrem o curso de Direito, a indicação, no prazo de 20 dias úteis, do nome de um professor de Direito, com a categoria de professor catedrático, procedendo, subsequentemente, à escolha do vogal a que se refere a subalínea iv) da alínea b) do n.º 2, por votação, por voto secreto, de entre os indicados.

6 - A repartição de vagas faz-se sucessivamente do seguinte modo:

a) Três em cada cinco vagas são preenchidas por juízes da relação;

b) Uma em cada cinco vagas é preenchida por procuradores-gerais-adjuntos;

c) Uma em cada cinco vagas é necessariamente preenchida por juristas de reconhecido mérito;

d) As vagas não preenchidas nos termos da alínea b) são atribuídas a juízes da Relação;

e) As vagas não preenchidas nos termos da alínea c) não podem ser preenchidas por outros candidatos.

7 - Na nomeação de juízes da relação e de procuradores-gerais-adjuntos deve ter-se em conta a antiguidade relativa dos concorrentes dentro de cada classe.»

9. A ora recorrente veio invocar perante o STJ, em sede de alegações de recurso (de fls. 4 a 47), por cautela, a inconstitucionalidade «do eventual entendimento normativo que venha a ser adoptado quanto ao art. 27.º, n.º 1 do C.P.A., devidamente conjugado com o art. 52.º do E.M.J., no sentido de que a acta de uma reunião do júri de um concurso de avaliação curricular para acesso ao STJ, onde se procedeu à finalização da graduação dos concorrentes necessários, não tenha obrigatoriamente de incluir os termos em que essa finalização teve lugar, por violação do direito a um processo equitativo, tal como previsto no art. 20.º, n.º 4 da C.R.P., bem como do princípio da imparcialidade, tal como previsto no art. 266.º, n.º 2 da C.R.P.», como resulta do teor das seguintes conclusões das alegações de recurso para o STJ (cfr. fls. 38-40):

«A. O júri procedeu à graduação dos concorrentes necessários nas reuniões de 25 de Junho, 14 de Julho e 22 de Julho de 2014, tendo, nesta última reunião, finalizado a graduação dos concorrentes necessários. Na acta respectiva consta que tal reunião teve como único ponto da ordem de trabalhos o seguinte: "finalizar a graduação dos concorrentes necessários". E...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT