Acórdão nº 238/07 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução30 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 238/2007

Processo n.º 584/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.O representante do Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto interpôs, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, recurso para este Tribunal das decisões proferidas em 3 de Maio de 2005 e 7 de Junho de 2005 pelo Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do processo de expropriação por utilidade pública movido por Instituto para a Conservação e Exploração da Rede Rodoviária, em que figura como expropriado A. e mulher, B., que recusou, com fundamento em inconstitucionalidade material, a aplicação da norma decorrente do preceituado no artigo 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91, de 9 de Novembro, quando interpretada por forma a excluir da classificação de “solo apto para construção” os terrenos que, segundo o Plano Director Municipal (PDM) em vigor à data da expropriação, se situam em zona florestal de produção condicionada, expropriados para neles se implantarem vias de comunicação rodoviária. Lê-se na primeira decisão, de 3 de Maio de 2005, no que ora importa:

    […]

    Passando à questão da classificação do terreno como solo apto para a construção.

    O art.º 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações equipara a solo para outros fins o terreno que por lei ou regulamento não possa ser utilizado na construção.

    Contudo, este preceito tem de ser interpretado em harmonia com o princípio de que a expropriação por utilidade pública só pode ser efectuada com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização – art.º 62.º, n.º 2, da Constituição.

    A equiparação a solo para outros fins não pode, assim, basear-se numa interpretação meramente literal. As próprias disposições dos PDM não são inalteráveis, em qualquer altura podem ser modificadas em razão de novos critérios de ordenamento urbano.

    Por isso, tem-se entendido que as disposições dos PDM não podem por si só determinar a qualificação do solo para efeitos de indemnização, para mais quando se verificam os requisitos do art.º 24.º, n.º 2, do Código das Expropriações (neste sentido, vide, entre outros, o acórdão desta Relação de 02.06.25, processo n.º 506/02).

    No caso, trata-se de um prédio situado cerca de 12 metros de terrenos onde estão a ser levadas a cabo infra-estruturas destinadas a loteamentos para construção. E na área envolvente, cujo perímetro exterior se situa a 300 metros do limite da parcela expropriada, já na área do concelho de Paredes, existem edifícios destinados à habitação unifamiliar de 2 e três pisos.

    Com base nestes elementos, os peritos, à excepção do designado pelo expropriante, nas duas avaliações consideraram que o terreno expropriado era apto para a construção.

    O facto de a parcela estar inserida numa zona florestal de produção condicionada, segundo o Regulamento do Plano Director Municipal de Paços de Ferreira em vigor à data da declaração de utilidade pública, não é assim razão suficiente para o equiparar a solo para outros fins.

    Pelo que deve ser classificado como solo apto para a construção.

    Em relação às benfeitorias, o art.º 216.º, n.º 1, do Código Civil só considera como tais as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa.

    No caso, a conservação ou melhoria terá de ser apreciada em função do tipo construção existente no local – habitações de 2 ou 3 pisos com índice de ocupação de solo de 0,5/m2.

    As árvores e o muro de vedação podem ser aproveitadas nessa construção, e têm de ser removidas. Por isso, não faria sentido acrescentar o valor das benfeitorias que serão eliminadas para possibilitar a construção (neste sentido, cfr. acórdão desta Rel. de 19 de Novembro de 1996, proc. 019903).

    Quanto às partes sobrantes, o laudo maioritário refere que a parte norte deixou de ter possibilidades de construção. E que a parte sul tem uma configuração triangular com profundidade pontual máxima de 40 m e média de 20 m, de onde se depreende que também não permite a construção de uma habitação.

    O art.º 28.º, n.º 2, do Código das Expropriações manda acrescentar ao valor da expropriação os prejuízos ou encargos da depreciação parte não expropriada resultante da divisão.

    Os expropriados têm, pois, direito à indemnização correspondente ao prejuízo da depreciação das partes sobrantes, no total de € 65 800,02.

    Nestes termos julga-se a apelação parcialmente procedente, e revoga-se a sentença recorrida, fixando-se o montante da indemnização devida pela expropriação em € 178 798,10, actualizada com referência à data da declaração de utilidade pública, de acordo com o índice de preços no consumidor, excluindo a habitação.

    E disse-se na referida decisão de 7 de Junho de 2005:

    O Ministério Público vem ao abrigo do disposto no art.º 669.º, n.º 1, a), do Código de Processo Civil requerer a aclaração do acórdão que conheceu do recurso, sobre os seguintes pontos:

    Se a indemnização global de € 65.800,02, arbitrada pela desvalorização das partes sobrantes, resulta da soma das quantias de € 51.987,04 e de € 13.812,98, respectivamente, de desvalorização da parcela sobrante a norte e de desvalorização da parcela sobrante a sul; e,

    Se o acórdão decide que todo o prédio (a parte expropriada e as partes sobrantes norte e sul) tinha potencialidade edificativa e é classificado como solo apto para a construção.

    A parte contrária opôs-se ao incidente, dizendo que não enferma de nenhuma confusão, nem suscita a mínima dúvida, tanto assim, que o próprio requerente reconhece que a indemnização de € 65.800,02 diz respeito à depreciação das partes sobrantes e corresponde ao somatório dos valores atribuídos pelos peritos.

    Cumpre deliberar.

    O incidente de aclaração previsto nos art.ºs 669.º, a), e 716.º do Código de Processo Civil tem por função esclarecer alguma obscuridade ou ambiguidade que a decisão contenha.

    O pedido de aclaração pressupõe, assim, que o acórdão apresente alguma expressão ininteligível (obscuridade) ou com mais de um significado (ambiguidade).

    No caso concreto, o M.º P.º não aponta qualquer termo ou frase do texto do acórdão, nomeadamente na parte decisória, que considere confusa ou com duplo sentido.

    Acresce que o art.º 666.º, n.º 1, do Código de Processo Civil impede que o Tribunal volte a pronunciar-se quanto ao mérito da causa.

    Pelo exposto, indefere-se o pedido de aclaração.

    Pode ler-se no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade:

    O Ministério Público, em representação do

    ESTADO – INSTITUTO PARA A CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE RODOVIÁRIA, notificado dos doutos acórdãos, proferidos a 05-05-03 e 05-06-07 nos autos de apelação à margem identificados, em que é apelado, sendo apelantes A. e esposa, vem, nos termos do art.º 280º, n.ºs 1, al. a), e n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, interpor recurso para o TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, com os seguintes

    FUNDAMENTOS:

    1.º

    O recurso é interposto ao abrigo dos art.ºs 70.º, n.º 1, al. a), e 72.º, n.ºs 1, al. a), e 3, da Lei n.º 28/82, de 15.11.

    2.º

    O douto acórdão recorrido recusou, implicitamente, aplicar a norma do art.º 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 438/91, de 09/11, por entender que tal norma é inconstitucional quando interpretada por forma a excluir da classificação de “solo apto para construção” os terrenos que, segundo o PDM em vigor à data da expropriação, se situam em zona florestal de produção condicionada, expropriados para neles se implantarem vias de comunicação rodoviária.

    3.º

    Na verdade, a indemnização arbitrada pelo tribunal de 1.ª instância fora calculada avaliando o prédio expropriado como solo para outros fins, nos termos prescritos no art.º 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 438/91, porquanto se trata de terreno expropriado para nele se implantar uma via de comunicação rodoviária (a variante à EN 207) e que, segundo o PDM em vigor à data da expropriação – o PDM de Paços de Ferreira, cujo regulamento foi aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 45/94, in DR, I-B, de 23/06/1994 – se situa em zona florestal de produção condicionada, logo, sem aptidão edificativa ope legis.

    4.º

    O que significa que esse terreno não tem legalmente capacidade edificativa, porque é proibido loteá-lo e apenas é viável construir com grandes limitações, nos termos previstos nos art.ºs 22.º, n.ºs 1 e 2, b), e 34.º, n.ºs 1 e 5, b), do PDM citado, o que, in casu, é agravado por se tratar de um terreno interior, com acesso em terra batida numa extensão superior a 50 m.

    5.º

    Todavia, apesar da destinação legal do prédio como terreno sem aptidão edificativa, o douto acórdão recorrido revogou a sentença de 1.ª instância e fixou uma indemnização calculada com base na classificação do prédio expropriado como solo apto para a construção e na desvalorização das partes sobrantes também em função da perda da suposta possibilidade edificativa,

    6.º

    Expressamente referindo que assim se procede porque, embora o art.º 24.º, n.º 5, do CE/91 equipare a solo para outros fins o que, por lei ou regulamento, não pode ser utilizado na construção, o certo é que esta norma tem de ser interpretada em conformidade com o art.º 62.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio da justa indemnização,

    7.º

    O que quer dizer que, implicitamente, o douto acórdão recorrido recusou aplicar o art.º 24.º, n.º 5, do CE/91 por entender padecer ele de inconstitucionalidade, em face do art.º 62.º, n.º 2, da CRP.

    8.º

    Porém, o Tribunal Constitucional, entre outros, por douto Acórdão n.º 121/2002 (in www.tribuncilconstitucional.pt), decidiu não julgar inconstitucional a norma do n.º 5 do artigo 24.º do Código das Expropriações de 1991, interpretado por forma a excluir da classificação de “solo apto para a construção” solos integrados em área reservada pelo Plano Director...

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