Acórdão nº 154/07 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução02 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 154/2007

Processo n.º 65/02

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. A., LDA., instaurou contra o ESTADO PORTUGUÊS uma acção “para efectivação de responsabilidade civil extracontratual” (petição inicial) por actos ilícitos de gestão pública, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de Esc. 257.313.983$00, acrescida de juros à taxa legal.

    Em síntese, a autora alegou que, tendo iniciado as obras destinadas à instalação de um estabelecimento de cultura de rodovalho, devidamente aprovado e licenciado, foram as mesmas suspensas por assim ter sido determinado por despacho do Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte, de 28 de Outubro de 1991, despacho esse que veio a ser anulado, por sofrer do vício de falta de fundamentação de facto, pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Maio de 1995 (cfr. fls. 43), acórdão que considerou ficar “consequentemente prejudicada a revisão por este Supremo Tribunal da apreciação que a (...) sentença (...) fez dos restantes vícios que lhe foram imputados” (violação de lei, erro sobre os pressupostos de facto e errada fundamentação de direito).

    Assim, a autora pretende ser indemnizada pelos prejuízos que sofreu em virtude da paralisação dos trabalhos, decorrentes, conforme alega, do despacho anulado, e que nunca puderam ser retomados.

    Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo do Porto, de 29 de Maio de 1998, de fls. 982, a acção foi julgada improcedente.

    Inconformada, a autora recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo. Para o que agora especialmente releva, nas alegações de recurso (nesta parte, rectificadas a fl. 1029, cfr. despacho de fls. 1065), a recorrente sustentou que "Na interpretação que o Tribunal faz, o artigo 2º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48.051, de 21.11.67 seria inconstitucional por violação material do disposto nos artigos 22º e 271º da Constituição" (cfr. conclusão 34ª, a fls. 1016-1017).

    Por acórdão de 13 de Fevereiro de 2001, de fls. 1031, o Supremo Tribunal confirmou a sentença recorrida, sem todavia se pronunciar sobre a questão de constitucionalidade colocada pela recorrente.

    Para o efeito, deu como assente a seguinte matéria de facto:

    "Na douta sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

    1-A A. pretendeu instalar um estabelecimento de cultura de rodovalho, localizado no lugar de Cojo, freguesia de Vila Chã, concelho de Vila do Conde;

    2 - Elaborou, para tanto, um projecto que teve avaliação e parecer favorável dos seguintes organismos: Comissão de Coordenação da Região Norte, Câmara Municipal de Vila do Conde, Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza; Junta de Freguesia de Vila Chã; Capitania do Porto de Vila do Conde; Direcção-Geral dos Cuidados de

    Saúde Primários; Instituto Nacional de Investigação das Pescas;

    3 - O referido projecto foi aprovado e licenciado pela Direcção-Geral de Portos e pela Direcção-Geral de Pescas nos termos constantes de fls. 16 a 19 do processo;

    4 - Em 7/X/1991, foram iniciadas as obras de construção, após comunicação feita às diversas entidades, com um mês de antecedência;

    5 - Em 28/X/1991, por despacho proferido o Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte solicitou ao Director-Geral de Portos que fosse mandado proceder ao embargo imediato da obra em execução pela autora de construção de um estabelecimento de cultura de rodovalho, localizado no lugar de Cojo, freguesia de Vila Chã, concelho de Vila do Conde;

    6 - Foi dado como reproduzido o documento de fls. 32 dos autos;

    7 - A obra foi embargada conforme consta do documento junto a fls. 40 dos autos;

    8 - A autora recorreu contenciosamente dos despachos do Presidente da Comissão de Coordenação da Região e do Director-Geral dos Portos, de 8/X/1991 e 29/X/1991, vindo o Supremo Tribunal Administrativo a anular o despacho de 28/X/1991 nos termos constantes do respectivo acórdão junto a fls. 43 a 50 e onde, nomeadamente, se pode ler: “…contrariamente ao decidido na sentença, o despacho de 28/10/91 padece de vício de forma, por falta de fundamentação de facto, o que leva à sua anulação, ficando consequentemente prejudicada a revisão por este Supremo Tribunal da apreciação que a mesma sentença igualmente faz dos restantes vícios que lhe foram ainda imputados. Procedem, pois, nesta medida, as alegações da recorrente. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso jurisdicional, se revoga a sentença impugnada, decretando-se em sua substituição a anulação do despacho de 28/X/91, pelo apontado vício de forma. Sem custas”;

    9 - O embargo referido em 7 determinou a paralisação de todo o empreendimento;

    10 - A autora pagou ao empreiteiro a quem foi adjudicada a obra de construção civil das instalações do projecto (Sociedade de Construções Gomes do Monte, Lda., com sede na Rua Gomes de Amorim, 585, Apart. 18, 4.991 Póvoa de Varzim) o montante de 10.000.000$00;

    11 - O referido valor destinou-se a pagar a instalação do estaleiro de obras e vedação da área de construção destas e materiais de construção;

    12 - Tais instalações e materiais, dado o decorrer do tempo, ficaram inutilizáveis umas e extraviaram-se outras;

    13 - O ano de arranque da exploração seria o de 1993, se não ocorresse o embargo;

    14 - Os resultados líquidos previsíveis seriam: 1993 - 7.119.000$00; l994 – 111.511.000$00; 1995 – 97.763.068$00

    Tendo por base estes factos, o tribunal “a quo” absolveu o réu Estado do pedido por a autora não ter conseguido provar os requisitos da ilicitude e do dano".

    Recorde-se que, no julgamento da matéria de facto (a fls. 968 e 969), haviam sido dado como não provados os quesitos 2º e 8º do questionário, com o seguinte teor:

    "2º. Com a elaboração de estudos de biotecnologia e de viabilidade económica-financeira do projecto dispendeu a autora PTE 12.000.000$00?

    8º. A autora destruiu a duna nos termos referidos a fls. 215 e 218 dos autos, documentos que aqui dou por integralmente reproduzidos, sendo essa a razão de se ter determinado o embargo referido na alínea g) da especificação? [Trata-se, respectivamente, de um "Memorando da visita efectuada à A.(…) realizada pela Comissão de Coordenação da região Norte em 25 de Fevereiro de 1992, e do embargo em causa nestes autos, documentado a fls. 40].

    Quanto ao direito aplicável, o Supremo Tribunal Administrativo julgou da seguinte forma:

    A recorrente funda o seu pedido de indemnização no despacho do Sr. Presidente da Comissão de Coordenação Regional Norte de 28/10/91 que ordenou o embargo da obra a que procedia para construção de um estabelecimento de cultura de rodovalho localizado no lugar de Cojo, Facho, Freguesia de Chã, concelho de Vila do Conde, despacho aquele que fora anulado por acórdão do STA de 9/5/1995 já transitado em julgado.

    Segundo a recorrente, os prejuízos adviriam de tal embargo ter paralisado todo o investimento.

    Tal qual como vem delineada a acção proposta pela recorrente, a mesma baseia-se na responsabilidade civil extracontratual do Estado pela prática de acto ilícito de gestão pública.

    Este tipo de responsabilidade está prevista e regulada no DL. N.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967.

    Regula tal diploma legal três tipos de responsabilidade: a baseada em acto de gestão pública ilícito culposo (arts. 2º a 7º), a baseada em factos casuais e fundamentada no risco (artº 8º) e, finalmente, a responsabilidade por factos lícitos (artº 9º).

    Alicerçando-se a recorrente, como acima se referiu, na responsabilidade civil extracontratual por acto ilícito culposo praticado pelo réu, não se compreende porque é que na conclusão 36ª das suas alegações, a recorrente vem pugnar pela violação do artº 9º do DL. N.º 48.051, pois neste preceito apenas se prevê a responsabilidade da Administração Pública pela prática de actos lícitos.

    Mas nesta mesma conclusão defende a recorrente que a sentença recorrida viola os arts. 271º da CRP e 2º, 4º e 6º do DL. N.º 48.051.

    Ao absolver o recorrido do pedido, o tribunal “a quo” baseou-se na não verificação da ilicitude do acto imputado ao Estado.

    Nos termos do art. 2º nº 1 do DL. N.º 48.051 “o Estado e demais pessoas colectivas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício”.

    Resulta do teor deste preceito que a responsabilidade civil extracontratual do Estado por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes corresponde, no essencial, ao conceito civilista da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos prevista no artº 483º nº 1 do Código Civil.

    Os pressupostos para este tipo de responsabilidade sãos os seguintes: a) o facto; b) a ilicitude; c) a culpa; d) o dano, e; e) o nexo de causalidade (Ac. do STA de 16/2/2000-rec. N.º 41.507, de 6/7/2000-rec. N.º 46.005 de 10/10/2000-rec. N.º...

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