Acórdão nº 01005/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução07 de Junho de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A…………………, Lda, intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção declarativa de condenação com a forma de processo ordinário contra o Município de Cascais, pedindo a respectiva condenação no pagamento de diversas quantias, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual pela prática de actos administrativos ilícitos.

2.

Por sentença do TAC de Lisboa, de 28.01.13, constante de fls 338 e ss, foi a acção julgada parcialmente procedente, condenando-se a entidade demandada a pagar à A.: a) 50% do valor que venha a ser apurado pelo atraso na venda das fracções; b) 15% a 20% do valor de venda das fracções; 50% dos encargos com contribuições autárquicas das três fracções não vendidas, desde 1993 até 1996; d) 50% dos encargos com juros, imposto de selo e despesas de expediente, pelo empréstimo contraído em 1989.11.23, com a Caixa Geral de Depósitos; e) 50% dos encargos com juros e imposto de selo por livranças sacadas para garantir saques a descoberto; f) encargos e despesas com processos judiciais e honorários devidos aos advogados constituídos; g) juros correspondentes aos valores apurados ou a apurar.

3.

Inconformados com a decisão do TAC de Lisboa, ambos, a A. e o R, interpuseram recurso jurisdicional para este STA: 3.1.

Conclusões das alegações da A., ora recorrente, A………………., Lda (cfr. fls 383 e ss): “A- DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRA-CONTRATUAL 1ª. Nos termos do art. 22º da CRP dos arts. 2º e segs. do DL 48051, de 21 de Novembro de 1967 bem como dos arts. 483º e segs., 562º e segs. e 798º e segs. do C. Civil (cfr. arts. 7º e segs. da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro), e conforme se verifica in casu, a responsabilidade civil extracontratual do MC depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade – cfr.

texto nºs 1 e 2, p.p.

6 a 8; B - DA ILICITUDE E CULPA DO MC 2ª. Conforme se decidiu na douta sentença recorrida, o MC agiu ilícita e culposamente «ao indeferir ilicitamente as pretensões da A. ao que acresce o facto de não ter executado em tempo as decisões judiciais anulatórias» (V. arts. 22º e 266º da CRP, arts. 2º a 4º do DL 48051, de 1967.11.21, arts. 483º e segs., 562° e segs. e 798° e segs. do Cód. Civil e art. 3º do CPA; cfr. arts. 7º e segs. da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro) - cfr.

texto nºs 3 a 5, p.p. 9 e 10; C - DOS DANOS 3ª. Na douta sentença recorrida não foi considerada a totalidade dos prejuízos verificados na esfera jurídica da ora recorrente, resultantes das actuações ilícitas e culposas do MC e consubstanciados em lucros cessantes (v. art. 564º do Cód. Civil), que foram alegados e provados no presente processo - v. Respostas aos quesitos 5º, 8º e 9º da BI (cfr. art. 661º/2 do CPC e art. 564º/2 do Cód. Civil) – cfr.

texto nºs 6 a 8, p.p. 10 a 12; 4° A douta sentença não atendeu assim aos «benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão», não reconstituindo a sua situação hipotética actual, tendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos arts. 483º e segs. e 562º e segs. do C. Civil (cfr. art. 22º da CRP) - cfr texto nºs 8 a 10, p.p. 12 a 14; D - DO NEXO DE CAUSALIDADE 5ª. Os prejuízos suportados pela ora recorrente são consequência directa e imediata das actuações ilícitas e culposas exclusivamente imputáveis ao MC, existindo assim nexo de causalidade (v. arts. 562º e segs. do C. Civil) - cfr. texto nºs 11 e 12, p.p. 14 a 19; 6ª. Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, a responsabilidade do MC nunca poderia ser limitada ou reduzida através do recurso a critérios de equidade, ex vi do disposto nos arts. 564º/2 e 566º/3 do Cód. Civil e art. 661º/2 do CPC, nomeadamente face ao reconhecimento da ilicitude e culpa das suas actuações e à factualidade provada no presente processo, pois:

  1. O Tribunal apenas deverá recorrer a critérios de equidade nos casos em que é impossível a liquidação dos prejuízos em execução de sentença, ex vi do disposto nos arts. 564º/2 e 566º/3 do Cód. Civil e no art. 661º/2 do CPC; b) Conforme resulta expressis et apertis verbis do disposto no art. 566º/3 do Cód. Civil, «o Tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados» considerando-se que no caso sub judice estão em causa actuações ilícitas, culposas e lesivas exclusivamente imputáveis ao MC (v. art. 264º do CPC e art. 342º e 487º do C. Civil) - cfr texto nºs 13 a 15, p.p.

    14 a 19.

    NESTES TERMOS, Deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a douta sentença recorrida nos segmentos decisórios desfavoráveis à ora recorrente, com as legais consequências”.

    3.2.

    O recorrido Município de Cascais (MC) não apresentou contra-alegações.

    3.3.

    Conclusões das alegações do R., ora recorrente, Município de Cascais (cfr. fls 404 e ss): “I - A Douta sentença Recorrida faz derivar o dever de indemnizar da CMC do ato administrativo anulado – decisão que indeferiu o pedido de aprovação e licenciamento de alterações à construção –, bem como da circunstância de o município apenas ter emitido a licença de utilização em 23 de outubro de 1996; II - Para que se verifique a responsabilidade civil extracontratual do réu por factos imputáveis aos seus órgãos e agentes, no exercício das suas funções e por causa delas, é necessário, ao abrigo do artigo 96º da lei nº 169/99, de 18 de setembro, e do decreto-lei nº 48051, de 21 de novembro de 1967, e na esteira dos pressupostos gerais da responsabilidade civil, a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade adequado entre o facto e o dano.

    III - A aferição da ilicitude de uma determinada conduta depende da proteção de um direito ou interesse legalmente protegido que a norma entretanto violada teria pretendido salvaguardar.

    IV - Quando a pretensão indemnizatória tenha fundamento em ato administrativo anulado, haverá que distinguir a ilicitude resultante de ilegalidades formais da ilicitude resultante de ilegalidades substantivas inerentes a atos administrativos, sendo que aquelas, só por si, não terão em regra, idoneidade para suportar um pedido de indemnização pelos prejuízos resultantes da própria decisão administrativa anulada (cfr. acórdão de 14/02/2008, processo nº 0749/07); V - A ilicitude de uma determinada conduta depende da proteção de um direito ou interesse legalmente protegido que uma norma substantiva entretanto violada teria pretendido salvaguardar; VI - Pelo que, tendo o ato sido anulado por vício de forma é o mesmo insusceptível de gerar o dever de indemnizar; VII - Mesmo para aqueles que entendem que uma ilegalidade meramente formal pode gerar o dever de indemnizar, torna-se necessário, que o vício constitua causa adequada do dano que tenha sido invocado; VIII - Haverá lugar a um direito indemnizatório quando o vício meramente formal possa influenciar o sentido da decisão de modo a permitir concluir que, se não fosse cometido, a solução jurídica do caso seria favorável ao interessado; IX - No caso vertente cabia ao autor alegar e demonstrar que caso o ato de indeferimento se encontrasse devidamente fundamentada a decisão teria sido outra, isto é, a falta ou a insuficiência de fundamentação influiu claramente o sentido da decisão tomada; X - No caso vertente, não se sabe, se e de que forma a falta ou a insuficiente fundamentação na decisão que indeferiu a pretensão formulada pelo autor. Cabia ao autor alegar e demonstrar, que se não fosse a falta de fundamentação a sua pretensão teria sido deferida. O que não fez; XI - A execução da sentença anulatória, não consistia necessariamente na emissão de uma decisão de deferimento da pretensão formulada pelo autor e muito menos na emissão da licença de utilização.

    XII - No caso vertente, a invalidade foi decretada por vício da forma, pelo que, poderia a administração em sede de execução de sentença praticar validamente um ato de igual conteúdo expurgado do vício que o inquinava XIII - mas ainda que se admitisse, sem conceder, que a execução da sentença consistiria na prolação de uma decisão com sentido oposto, esta nunca poderia consistir na emissão da licença de utilização, mas quanto muito no deferimento do pedido de licenciamento; XIV - é manifestamente abusiva e contraditória a conclusão expressa nos pontos 3 e 4 da matéria de facto dado como provada. Não ficou demonstrada a existência de qualquer atraso na venda das frações; XV - compulsada a matéria de facto dada como provada, não encontramos um único facto do qual se possa extrair a conclusão de ter existido atraso na venda das frações, nomeadamente das que foram vendidas em 1992.

    XVI - Muito menos se poderá concluir pela existência de nexo de causalidade entre o ato que indeferiu o pedido de licenciamento das alterações e a existência de atraso na alienação das frações (a admitir-se).

    XVII - A inexistência da licença de utilização não condicionou ou atrasou a venda das frações; XVIII - São abusivas e destituídas de fundamento as conclusões expressas nos pontos 5, 7, 8, 9 e 10 e consequentemente nos seguintes, pois apenas as frações B e C foram alienadas em data posterior a 1993, assim como as expressas nas alíneas a) a f) da douta sentença recorrida, nomeadamente as referidas nas alíneas a) e b).

    XIX - A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito aos factos, contem conclusões abusivas e que não se encontram suportadas pela factualidade provada e viola entre outras disposições legais, os artigos 2º do DL 48 051 de 21 de novembro de 1967 e 483º do CC. Impondo-se a sua revogação.

    Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. Doutamente suprirão deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência revogada a sentença recorrida, com o que se fará Justiça”.

    3.4.

    A recorrida A……………….., Lda, apresentou contra-alegações cujas conclusões agora se...

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