Acórdão nº 26/07 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução17 de Janeiro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 26/2007

Processo n.º 102/2005

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

(Conselheira Maria Fernanda Palma)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    AUTONUM 1.Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 2004 foi negado provimento ao recurso de revista interposto por A. do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11 de Março de 2004, que confirmara a sentença da 17.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, de 1 de Julho de 2003, a qual havia julgado improcedente a acção declarativa intentada por aquela contra a Caixa Geral de Aposentações, em que pedia que se reconhecesse “que a convivência more uxorio entre a autora e seu marido nunca se interrompeu desde a data do seu casamento até à da morte deste e que a autora se encontra nas condições previstas no art.º 2020.º do Cód. Civil”, devendo, por isso, “ser a Caixa Geral de Aposentações condenada a pagar à autora a pensão de sobrevivência por morte do seu marido.” Consequentemente, o acórdão recorrido foi confirmado. Pode ler-se no referido aresto:

    A A., ora recorrente, faz radicar a sua pretensão à pensão de sobrevivência no art.º 41.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 142/73, de 31/3, que aprovou o Estatuto das Pensões de Sobrevivência, posteriormente alterado pelo DL n.º 191-B/79, de 25/6.

    E, com efeito, nos termos do art.º 40.º, n.º 1, al. a), do DL n.º 142/73, têm direito à pensão de sobrevivência como herdeiros hábeis dos contribuintes, os cônjuges sobrevivos, os divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens e as pessoas que estiverem nas condições do artigo 2020.º do C. Civil.

    Estatui, por seu turno, o n.º 1 desse artigo 41.º que “os divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens só se considerarão herdeiros hábeis para efeitos de pensão de sobrevivência se tiverem direito a receber do contribuinte à data da sua morte pensão de alimentos fixada ou homologada judicialmente”.

    O n.º 2 da mesma norma preceitua que “aquele que no momento da morte do contribuinte estiver nas condições previstas no artigo 2020.º do Código Civil só será considerado herdeiro hábil para efeitos de pensão de sobrevivência depois de sentença judicial que lhe fixe o direito a alimentos e a pensão de sobrevivência será devida a partir do dia 1 do mês seguinte àquele em que a requeira, enquanto se mantiver o referido direito”.

    Ora, para que a acção pudesse proceder, a A. teria de ter satisfeito, de modo cabal e conveniente, quer o ónus da alegação, afirmação ou dedução quer o ónus da prova dos factos integradores do direito invocado em juízo, ou seja, da alegação e prova dos factos que pudessem servir de suporte ao reconhecimento de direito a alimentos; “rectius” de provar, quer a existência da união de facto com o pensionista à data da morte deste, pelo espaço de tempo exigido por lei (no mínimo dois anos), quer ainda a carência efectiva da prestação de alimentos e, ainda, a impossibilidade de os obter das pessoas mencionadas no art.º 2009.º do Código Civil;

    E isto porque todos os requisitos contemplados no art.º 2020.º do Código Civil constituem os fundamentos (factos constitutivos) do direito que a mesma se arrogou (conf. art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil).

    Mas tal como já observaram as instâncias, a A. não alegou – nem sequer por forma genérica – matéria fáctica susceptível de integrar os pressupostos legais, designadamente os reclamados pelo art.º. 2020.º do Código Civil, e pelos DL n.ºs 7/2001, de 11/5, e 142/73, de 31/3, este na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 191-B/79, de 25/6.

    É líquido que à data da morte do marido da A., encontrando-se ambos separados judicialmente de pessoas e bens, esta não tinha direito a receber qualquer pensão de alimentos fixada ou homologada judicialmente, sendo, pois, inaplicável à hipótese o disposto no citado n.º 1 do art.º 41.º.

    Deste modo, seria de aplicar à situação vertente o disposto no artigo 41.º, n.º 2, do sobredito diploma, impendendo assim sobre a A., ora recorrente, o encargo de provar os requisitos previstos no artigo 2020.º, n.º 1, do Código Civil, ou seja: que no momento da morte de seu ex-marido com ele convivia há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, para que lhe assistisse o direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não pudesse obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009.º do mesmo corpo normativo.

    E, com efeito, o n.º 1 desse artigo 2009.º postula que “estão vinculados à prestação de alimentos, pela ordem indicada, os seguintes parentes do necessitado:

    a) O cônjuge ou o ex-cônjuge;

    b) Os descendentes;

    c) Os ascendentes;

    d) Os irmãos”.

    Ora, no caso sob análise o cônjuge falecido B., contraíra casamento com a A. em 22-9-76, tendo falecido em 8-1-98, ainda no estado de casado com a A., mas, todavia, separado de pessoas e bens, por decisão do Conservador do Registo Civil datada de 16-10-96 e transitada em julgado em 25-10-96 – docs. fls. 8 e 11 a 13.

    Temos pois que desde 25-10-96 até 8-1-98 não havia ainda decorrido o período de dois anos de que a lei (art.º 2020.º, n.º 1) faz depender a atribuição de alimentos ao necessitado.

    Abra-se aqui um parêntesis para observar que tendo a ora recorrente vivido com o falecido B. desde que entre si casaram, logo arredaria a subsunção da hipótese concreta na estatuição-previsão do art.º 2020.º, n.º 1, do Código Civil, isto porque não poderia deixar-se de considerar todo o tempo do casamento como integrando o requisito temporal previsto nesse inciso normativo.

    E não restam dúvidas de que incumbia também à A., ora recorrente, a prova (art.º 342.º, n.º 1, do C. Civil) de que não lhe era possível obter os alimentos nos termos das alíneas a) a d) do art.º 2009.º, sendo que a responsabilidade da herança se perfilaria sempre como meramente residual ou subsidiária da responsabilidade parental. (Prova essa que – diga-se de passagem – foi feita).

    No que tange ao requisito da carência efectiva da prestação de alimentos – salienta a Relação que, de harmonia com a prova produzida em juízo atinente à situação económica da requerente, “dúvidas não existem de que a autora não conseguiu provar que carece efectiva e concretamente que lhe sejam prestados alimentos” (sic).

    Para além de que a pensão de aposentação que a A. recebe da Caixa Geral de Aposentações – 238.110$00 mensais líquidos em 2001 – é manifestamente suficiente para a autora suportar os encargos que possui” (igualmente sic)

    A decisão das instâncias não poderia, pois, ser outra face à estatuição das normas do direito actualmente constituído.

    Havia já salientado, aliás muito enfaticamente, a decisão de 1.ª instância o seguinte:

    “a pensão de reforma que a A. recebe da Caixa Geral de Aposentações dará para suportar todos os seus encargos , pelo que, em rigor, a A. não necessita de pedir alimentos à herança do seu falecido marido.

    Ora, se a A. não está em condições de pedir alimentos à herança, falta um requisito legal previsto no art.º 2020.º do C. C., do qual o art.º 40.º, n.º 1, al. d), do DL n.º 142/73, de 31/3, faz depender o direito à prestação de sobrevivência (sic).

    Nem se diga – contra o que sustenta a recorrente – que “A decisão recorrida, na medida em faz depender o reconhecimento do direito à pensão de sobrevivência, da verificação de todos os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 2020.º, com referência ao artigo 2009.º, alíneas a) a d), ambos do Código Civil, designadamente da verificação de uma absoluta necessidade de alimentos para garantir as despesas com vestuário, alimentação e alojamento, é colidente com a Constituição, na medida em que viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, em conjugação com o n.º 1 do artigo 36.º, reconhecendo a todos o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.

    Desde logo porque a fiscalização concreta se não reporta a decisões judiciais mas sim a normas concretamente aplicadas ou interpretadas.

    E depois porque se não descortina nessa aplicação concreta qualquer discriminação negativa violadora dos princípio da igualdade perante a lei e da justiça dos cidadãos que se encontrem em idêntica situação e ainda do direito à constituição da família e à contracção de matrimónio em condições de plena igualdade.

    Assim como se não descortina na interpretação que as instâncias fizeram dos art.ºs 40.º e 41.º, n.º 1, do mencionado Estatuto (que condicionam a concessão de um importante benefício social, como o é a pensão de sobrevivência, ao recurso ao tribunal para estipulação de uma inútil pensão de alimentos, na expressão da recorrente) prejudique o equilíbrio familiar e, nessa medida, seja violadora do art.º 67.º da CRP. É que o direito social à protecção da família assegurada por esse preceito constitucional não é um direito de contornos absolutos ou irrestritos, pois que pressupõe necessariamente uma regulamentação balizada pelo binómio necessidade/possibilidadade tacitamente remetida para as opções de política legislativa a consubstanciar, por isso, através da legislação infraconstitucional

    .

    Notificada deste acórdão, a recorrente veio arguir a respectiva nulidade, tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 13 de Janeiro de 2005, decidido indeferir essa arguição. Para tal, baseou-se na seguinte fundamentação:

    (…)

    4. Alegada nulidade do acórdão por ausência de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC):

    Constituem doutrina e a jurisprudência concordantes as de que só uma ausência absoluta de fundamentação, que não uma fundamentação escassa, deficiente, ou mesmo medíocre, pode ser geradora da nulidade das decisões judiciais – conf., por todos o Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, págs. 139-140.

    Tal como se considerou no recente acórdão deste Supremo, in 16-12-04, in Proc. n.º 3896/04 – 2.ª Sec., “a deficiente fundamentação/motivação pode afectar o valor doutrinal intrínseco da sentença ou...

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