Acórdão nº 0061911 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Fevereiro de 1993

Magistrado ResponsávelAMARAL BARATA
Data da Resolução18 de Fevereiro de 1993
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

O Estado demandou Amorim & Irmão, Lda., a fim de obter a condenação desta no pagamento 6078333 escudos e 50 centavos, com juro de mora da taxa legal desde a citação até integral pagamento, para o que alega, em síntese, que a demandada comprou em 1979/01/16 à Unidade Colectiva de Produção Agrícola "1 de Maio" determinada quantidade de cortiça pelo valor de 11652400 escudos, produto que a ré recebeu, aquisição que estava sujeita à disciplina do artigo 9 do Decreto Lei número 260/77, de 21 de Junho - entrega na Caixa Geral de Depósitos desse preço à ordem do Instituto dos Produtos Florestais; porém, a ré apenas fez o legal depósito pelo valor de 3000000 escudos; é assim devedora do remanescente, cujo encontra compensação pelo valor de 2574066 escudos e 50 centavos, pelo que estão em dívida 6078333 escudos e 50 centavos. Contestou a ré para afirmar em síntese que tudo pagou à Unidade Colectiva de Produção, e que obteve do referido Instituto permissões para levantamento da cortiça, o que implica que validou esses pagamentos. Produziu o Sr. Juiz saneador-sentença, no qual deu total procedência ao pedido, assim condenando a ré. Inconformada, recorre esta, estabelecendo na alegação estas conclusões: 1 - O recorrido Estado não tem legitimidade para reclamar da recorrente o pagamento e depósito de parte do preço do contrato em causa por não haver qualquer norma legal na qual surja como beneficiário do preço ou parte do preço de transacções de cortiça extraídas de propriedades expropriadas; 2 - Este tipo de contratos encontrava-se sujeito ao regime do DL 260/77, de 21 de Junho, e posteriormente aos DL 119/79, de 5/5 e DL 98/80, de 5/5; 3 - O valor, preço, resultante da transacção da cortiça, sempre teve destinos previstos na própria Lei, não constando o Estado do elenco dos beneficiários; 4 - Os adquirentes da cortiça, tal como a recorrente, não contratavam com o recorrido Estado, mas com as entidades alienantes, a quem caberia uma percentagem do produto da venda na distribuição do que pago era no cumprimento do contrato; 5 - O recorrido Estado não goza de legitimidade substantiva para pedir o pagamento do preço, o que se invoca expressamente e é de conhecimento oficioso, pelo que nunca poderia proceder a presente acção; 6 - Sem prescindir, na presente acção o recorrido Estado invoca como causa de pedir o incumprimento por parte da recorrente da obrigação de depósito do preço prevista no DL 260/77, de 21/6, formulando o pedido de condenação da recorrente a cumprir a obrigação de pagamento de parte do preço da cortiça que adquiriu; 7 - Tal como o recorrido Estado configura a causa de pedir incumprimento de obrigação legal de depósito - há uma manifesta inadequação do presente processo, face ao regime legal específico da relação jurídica em causa, donde decorre não se tratar de situação de responsabilidade contratual nem questão a ser encarada ao nível do incumprimento da obrigação de pagar o preço de um normal contrato de compra e venda; 8 - O DL 260/77, de 21/6, refere no seu preâmbulo "sanções de natureza civil, penal e administrativa, para as infracções mais intensamente lesivas dos interesses a proteger" e para o incumprimento das obrigações impostas no número 2 do artigo 2 - em que se incluia a obrigação de depósito - estabelecia o artigo 15, número 3, sanções de cariz penal, correspondentes a penas patrimoniais; 9 - A inobservância das obrigações impostas na lei acarretava a aplicação de sanções, traduzidas em penas patrimoniais, instaurando-se processos de de transgressão, estando em causa uma responsabilidade criminal (Acórdão da Relação de Évora, de 18/03/1980, in Col. Jur. 1980, Tomo 2, página 101); 10 - O processo adequado para o recorrido Estado reagir em relação a situações de incumprimento de obrigações às quais correspondem legalmente sanções de índole penal é o exercício da acção penal, pelo que também por esta razão nunca poderia proceder a presente acção; 11 - Sem prescindir, como resulta das conclusões anteriores, é manifesto que para a apreciação da situação em apreço não se pode atender apenas ao DL 260/77, de 21/6 e que tal DL não impunha que se procedesse necessariamente ao depósito do preço; 12 - Assim, porque o pagamento se efectuava directamente pelos compradores às U. C. P. S., é que, designadamente o DL 119/79, de 5/5, e o Despacho Normativo do Ministério do Comércio e Turismo número 106/78, de 21/04/78, prescreviam que o Instituto dos Produtos Florestais devia deduzir à importância correspondente a 35% do valor global do contrato, as quantias pagas directamente pelo comprador à entidade alienante; 13 - O próprio DL 260/77, de 21/6, no seu artigo 12 previa que o Instituto dos Produtos Florestais concedesse a autorização de levantamento de transporte, com dispensa do pagamento das obrigações impostas nesse Decreto Lei; 14 - O recorrido reconhece que mesmo sem ter depositado o preço, mas tendo-o pago à U. C. P., a recorrente procedeu ao levantamento de toda a cortiça; 15 - E encontrava-se junta aos autos uma guia de "autorização de levantamento e transporte de cortiça (DL n. 260/77, de 21 de Junho)", com o número 287/79, na qual se autorizou a recorrente a proceder ao levantamento de cortiça adquirida no âmbito do contrato em causa nos autos e "... correspondente ao pagamento de 1500000 escudos, efectuado directamente à U. C. P., na vigência do Decreto-Lei número 119/79"; 16 - Que a U. C. P. actuava como representante, do Estado resulta de o Estado ter reconhecido que a referida U. C. P. foi sua intermediária, agindo em nome e no interesse do Estado (artigo 16 da petição inicial); 17 - E o Estado ratificou toda a actuação do Instituto de Produtos Florestais, reconhecendo este como seu intermediário, actuando em seu nome e interesse, arrogando-se sucessor legal desse mesmo Instituto; 18 - Quer o contrato de compra e venda quer os recibos emitidos pela U. C. P. e que titulavam pagamentos que directamente a esta eram feitos pela recorrente, eram do conhecimento do I. P. F. (documentos juntos aos autos pelo recorrido e referida autorização n. 287/79); 19 - O I. P. F. a quem o recorrido sucedeu aceitou todos os pagamentos feitos pela recorrente, quer directamente à UCP, quer por depósito, como liberatórios, emitindo as autorizações de levantamento da cortiça; 20 - A sentença recorrida não atendeu a tais documentos, nem apreciou o reconhecimento - confissão do recorrido reconhecendo a U. C. P. como sua representante, pelo que a sentença sempre seria nula, nulidade que se invoca para todos os devidos e legais efeitos (artigo 668, n. 1, alínea c) do Código de Processo Civil); 21 - Sem prescindir, dir-se-à que a guia de autorização junta pela recorrente aos autos, emitido pela IPF, de quem o Estado é sucessor, constitui um documento particular que goza de força probatória plena (artigo 376 do Código Civil), pagamentos feitos pela recorrente, quer directamente à UCP, quer por depósito, como liberatórios; 22 - Resulta do artigo 770, alínea a) do Código Civil que a prestação feita a terceiro extingue a obrigação se assim é consentido pelo credor e o Instituto de Produtos Florestais consentiu expressamente em que alguns dos pagamentos fossem efectuados à UCP; 23 - O recorrido ao suceder ao referido Instituto em 1988 sucedeu na titularidade de direitos desse Instituto tal como eles existiam na esfera jurídica deste; 24 - Mesmo que se entendesse que o recorrido seria o credor originário, e não o Instituto de Produtos Florestais, o mesmo sucederia pois o artigo 769 do Código Civil admite que a prestação seja feita ao credor ou ao seu representante e o recorrido reconhece que quer a UCP, quer o IPF, intervieram no contrato em causa agindo em seu nome e interesse; 25 - Há representação sempre que alguém intervém num negócio jurídico em nome e no interesse de outrem e o recorrido confessa que foi em seu nome e no seu interesse que...

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