Acórdão nº 07A2235 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução18 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Por sentença proferida em 6 de Julho de 2005, do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Montijo, transitada em julgado, foi declarada a insolvência de AA, BB e CC, tendo-se fixado em 30 dias o prazo para a reclamação de créditos.

Findo o prazo para a apresentação das reclamações, o Sr. Administrador da Insolvência juntou a lista de credores reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do disposto no artigo 129º, nº1, do CIRE.

Foram reclamados os seguintes créditos: 1 -DD - Materiais de Construção, Lda., no montante de 77.246,81 (setenta e sete mil duzentos e quarenta e seis euros e oitenta e um cêntimos), invocando o direito de retenção sobre a fracção autónoma designada pela letra "Z", descrita sob o nº 01431 da Conservatória do Registo Predial de Alcochete.

2 - CAIXA DE CRÉDITO AGRÍCOLA MÚTUO DE ENTRE O TEJO E SADO, no montante de 413.101,56 € (quatrocentos e treze mil cento e um euros e cinquenta e seis cêntimos) proveniente de financiamento e outras transacções bancárias, garantido por hipoteca voluntária até ao montante de 309.878,19 €, sobre o prédio urbano sito na Lagoa da Pedra, descrito sob o nº 00115/970618.

3 - CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL, no montante de 200.345,26 € (duzentos mil, trezentos e quarenta e cinco euros e vinte e seis cêntimos), proveniente de financiamento e outras transacções bancárias, garantido por hipoteca voluntária até ao montante de 222.483,28, sobre o lote de terreno sito na Lagoa da Pedra, fls. 5 v do livro B 56/19347 e o lote de terreno sito em S. Francisco, descrito sob o nº 1150.

4 - CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL, no montante de 90.122,68 € (noventa mil, cento e vinte e dois euros e sessenta e oito cêntimos), proveniente de financiamento e outras transacções bancárias, garantido por hipoteca voluntária até ao montante de 957.691,96 €, sobre as fracções autónomas designadas pelas letras "B", "F", "G", "Q", "R", "Z", "AA" e "AC", descrito no 01431.

5 - CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS, S.A., no montante de 200.671,60 (duzentos mil, seiscentos e setenta e um euros e sessenta cêntimos), proveniente de financiamento e outras transacções bancárias, garantido por hipotecas voluntárias até ao montante global de 414.675,63 €, sobre as fracções autónomas designadas pelas letras "A", "B" e "C", do prédio descrito sob o nº 339/19870807.

6 - DAIMLERCHYSLER SERVICES PORTUGAL - ALUGUER DE AUTOMÓVEIS, LDA., no montante de 52.014,84 (cinquenta e dois mil catorze euros e oitenta e cinco cêntimos), proveniente de um contrato de aluguer de longa duração, garantido por aval prestado pelos insolventes numa livrança, de € 42.446,38.

7 - INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL I.P. - CENTRO DISTRITAL DE SETÚBAL, no montante de 6.787,10 (seis mil setecentos e oitenta e sete euros e dez cêntimos), proveniente de contribuições não pagas.

8 -EE, no montante de 58.893,67 (cinquenta e oito mil, oitocentos e noventa e três euros e sessenta e sete cêntimos), proveniente de um contrato de mútuo, garantido por penhora sobre as fracções autónomas designadas pelas letras "A" e "B" do prédio descrito sob o nº 00115/970618.

Nenhum crédito reclamado foi impugnado.

Para a massa insolvente foram apreendidos os seguintes bens (cfr. apenso B): […] 3- Bens Imóveis - Fracção autónoma designada pela letra "Z", correspondente ao rés-do-chão do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua Constantino Rodrigues, em Alcochete, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcochete sob o nº 01431.

[…].

*** Foi proferida sentença que graduou os créditos, pela seguinte ordem: .

Bens Imóveis: I) Para serem pagos pelo produto da venda da fracção autónoma designada pela letra "Z" correspondente ao rés-do-chão do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua Constantino Rodrigues, em Alcochete, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcochete sob o nº 01431 (verba nº 4 do auto de fls. 3 do apenso B): - Em 1º lugar o crédito reconhecido ao credorDD Materiais de Construção, Lda (até ao montante máximo garantido de 77.246,81 € - cfr. fls. 11).

- Em 2º lugar o crédito reconhecido ao credor Caixa Económica Montepio Geral (até ao montante máximo garantido de Esc. 257.225.000$00 - 1.283.032,89 € - cfr. certidão da CRP de Alcochete de fls. 434).

- Em 3º lugar os restantes créditos rateadamente.

[…].

*** De tal graduação apelou a Caixa económica do Montepio Geral para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão de 639 a 646, julgou o recurso improcedente e confirmou a decisão recorrida.

*** De novo inconformado recorreu para este Supremo Tribunal e nas alegações apresentadas formulou as seguintes conclusões: 1°. A recorrente, na sua qualidade de credora hipotecária reclamou seus créditos, no âmbito do processo de insolvência a que referem os presentes autos, invocando garantia hipotecária sobre várias fracções autónomas entre as quais, a designada pela letra "Z" que faz parte do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcochete sob o n°1431.

  1. Sobre a aludida fracção a recorrida reclamou um crédito de € 77.240,80, invocando ser titular de direito de retenção sobre o aludido imóvel, não alegando, contudo, quaisquer factos constitutivos que de "per si" permitam concluir que detém tal direito de garantia limitando-se tão somente a remeter para a acção declarativa a razão pela qual no seu entendimento goza de direito de retenção sobre a fracção autónoma designada pela letra "Z".

  2. Do teor da sua reclamação de créditos, não se pode retirar nenhuma conclusão de facto ou de direito que permita concluir que a recorrida detém direito de retenção sobre a já referida fracção autónoma.

  3. Ora, o tribunal "a quo" não poderia ter conhecido do que não é invocado na petição inicial de reclamação de créditos.

  4. Ao ter reconhecido ao reclamante, ora recorrido o direito de retenção sobre a já identificada fracção autónoma, sem que tal tivesse por ele sido invocado, o tribunal "a quo" conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, o que configura, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 668°, n° 2 alínea d) do Código de Processo Civil, excesso de pronúncia, que importa na nulidade da sentença.

  5. Não articulando quaisquer factos tendentes a provar o seu direito, nem juntando qualquer documento onde tal direito lhe tivesse sido reconhecido, a petição inicial de reclamação de créditos é inepta por falta de causa de pedir. A ineptidão da petição inicial acarreta a nulidade de todo o processo, excepção dilatória essa, que o tribunal "a quo" deveria ter conhecido oficiosamente (artigo 495º do Código de Processo Civil).

  6. A recorrida não invocou qualquer facto constitutivo seja do crédito seja do direito de retenção.

  7. Competiria ao M.mo. Juiz "a quo", de forma oficiosa, sindicar ou não da existência do invocado direito de retenção, sendo certo que, pelo constante na p.i. dúvidas não poderiam existir do improcedimento de tal pedido.

  8. Ao elaborar a sentença, da forma como o fez, na parte ora controvertida, o Mmo. Juiz "a quo" não fez uma correcta interpretação do disposto no artigo 47°, n° 4, alínea a) do CIRE, pois não tendo sido alegados factos constitutivos de direito de retenção sobre a fracção "Z", o crédito da recorrida não poderia ter sido reconhecido como garantido, nem graduado à frente do crédito da recorrente credora hipotecária.

  9. Estamos, pois, perante erro manifesto, que importa a não homologação da lista de credores reconhecidos e a não graduação dos respectivos créditos, delimitada "in casu" à parte da sentença posta em crise e objecto do presente recurso. (artigo 131°, n° 3 "a contrario sensu" do CIRE) 12° A reclamação de créditos formulada pela recorrida, padece da falta de requisitos formais "ad substantiam", pelo que, não poderia o M.mo Juiz "a quo" abster-se de verificar a conformidade substancial e formal do crédito reclamado pela Apelada, como o fez.

  10. Interpretando o conceito de "erro manifesto" em termos amplos, a sentença de verificação e graduação de créditos na parte ora recorrida, padece de evidente erro devido à qualidade em que foi reconhecido e graduado o crédito reclamado pela recorrida.

  11. O artigo 755.°, n.° 1, alínea f) do Código Civil confere ao promitente-comprador, que obteve a tradição da coisa, um direito de retenção sobre o bem imóvel; 15° O direito de crédito do promitente-comprador, resultante do incumprimento pelo promitente vendedor, do respectivo contrato-promessa, prevalece sobre o crédito hipotecário, ainda que a hipoteca apresente registo anterior.

  12. Tal direito de retenção não é objecto de registo, logo, é um direito que não é publicitado.

  13. No caso dos autos, vê-se a recorrente confrontada com um direito real de garantia, não sujeito a registo, com o qual não contava; 18° Esse direito de retenção sobrepõe-se à hipoteca constituída e registada em momento anterior, relegando-a para um segundo plano; 19° O legislador ao querer proteger e defender os interesses de uma das partes na relação jurídica emergente do contrato-promessa, não poderia ter criado normas que sacrificam, efectivamente, da forma injusta e ilegítima, os interesses patrimoniais de terceiros não intervenientes e completamente alheios, por causa que não lhes é imputável, ao contrato-promessa.

  14. Proteger-se, por esta forma, um direito que não é publicitado é permitir que "ónus ocultos" afectem a posição jurídica do sujeito que levou o seu acto a registo.

  15. Está, assim, posto em causa o próprio princípio da segurança do comércio jurídico imobiliário.

  16. O regime jurídico do direito de retenção concedido ao promitente-comprador por força das citadas normas, tudo isto ignora, dado que frustra a legítima confiança que o credor hipotecário deposita no Estado enquanto garante dos seus direitos fundamentais 23° Por força da sentença de graduação de créditos vai ser pago o crédito da promitente compradora com preferência sobre...

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