Acórdão nº 2299/03.1JFLSB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelCARLOS BERGUETE COELHO
Data da Resolução21 de Junho de 2011
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1.

RELATÓRIO Nos autos de processo comum, perante tribunal singular, n.º 2299/03.1JFLSB, do Tribunal Judicial de Almeirim, realizado o julgamento, decidiu-se, por sentença proferida (e depositada) em 17.12.2009, além do mais, condenar o arguido Ricardo como autor material de um crime de difamação através de meio de comunicação social agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º 1, 183,º, n.º 2, e 184.º, do Código Penal, na pena de 400 (quatrocentos) dias de multa à razão diária de €8,00 (oito euros).

O arguido, por requerimento de 22.12.2009, pediu que lhe fosse facultada cópia da prova gravada em audiência, juntando um “cd”.

Em 08.01.2010, apresentou novo requerimento, referindo ter recebido em 29.12.2009 o referido “cd” e alegando não ter sido possível ouvir a gravação da prova, juntando outro “cd” e devolvendo o anterior.

Em 29.01.2010, novo requerimento apresentou, reiterando essa impossibilidade e invocando que, até à data, não havia obtido resposta a esse requerimento de 08.01.2010, o que inviabilizava de, em tempo, poder recorrer da matéria de facto e, assim, presumindo que, atento o lapso de tempo decorrido, as declarações em audiência não haviam sido documentadas, configurando nulidade, concluindo pedindo a suspensão do prazo para recorrer a partir de 29.12.2009, data da notificação do requerido em 22.12.2009.

Por despacho de 03.02.2010, após informação prestada nos autos por técnico de informática, exarou-se o seguinte: Perante o teor da informação que antecede, resulta clara a impossibilidade em se proceder à disponibilização dos CDs, tal como requerido pelo arguido.

Face ao exposto, e perante o teor do requerimento que antecede, determino que se notifique o MP, assim como o Assistente, para querendo se pronunciarem, nos termos do art. 107.º n.º 2 do CPP.

Em 12.07.2010, proferiu-se o despacho (recorrido), segundo o qual, no que ora releva: Como resulta claro nos autos, o sistema informático deste Tribunal não permite a reprodução da prova produzida em audiência de julgamento por vícios que desconhecemos.

Assim, o conhecimento pelo Tribunal de recurso, da impugnação ampla em matéria de facto, pressupõe e exige que o mesmo tenha acesso à prova produzida em audiência e que relevou para a formação da convicção do tribunal, nos concretos pontos impugnados.

Sendo que, por outro lado, só a documentação da prova produzida em audiência permite ao recorrente, que pretendem impugnar a decisão proferida sobre matéria de facto, dar cabal cumprimento ao ónus previsto no n° 4 do artº 412º do CPP.

Como se refere no Acórdão da Relação do Porto de 21-03-07, Proc. n? 0642928, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.

a solução jurisprudencial da questão tem passado pela consideração de que a incompleta gravação da prova produzida em audiência ou o seu deficiente registo, impeditivos do conhecimento amplo em matéria de facto, conforma uma irregularidade

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Especialmente, após o Acórdão de fixação de jurisprudência n° 5/2002, de 27 de Junho de 2002, in DR, I-A Série, de 17-07-02, que fixou jurisprudência nos seguintes termos: «A não documentação das declarações prestadas oralmente na audiência de julgamento, contra o disposto no artigo 363º do Código de Processo Penal, constitui irregularidade, sujeita ao regime estabelecido no artigo 123º, do mesmo diploma legal, pelo que, uma vez sanada, o tribunal já dela não pode conhecer.» Equiparando-se à falta absoluta de documentação a falta parcial de documentação ou a deficiente documentação (quando a deficiência atinge um grau tal que impede o efectivo conhecimento da prova produzida) e na constatação de que o vício não integra o elenco das nulidades insanáveis ou sanáveis, dos artigos 118º e 119º do CPP, nem, para ele, em qualquer outra disposição legal, mormente nos artigos 363º e 364º do CPP, é cominada a nulidade.

Se se pode considerar pacífico o entendimento de que o vício só pode qualificar-se como mera irregularidade, nos termos do nº 2 do artigo 118º do CPP, sujeita ao regime do artigo 123º do mesmo Código, já se detectam divergências jurisprudenciais quanto ao regime da sua sanação.

Encontram-se decisões que sustentam que a irregularidade está sujeita ao regime do n° 1 do artigo 123° do CPP, devendo ser arguida, perante o tribunal do julgamento, no próprio acto, ou seja, no decurso das sessões da audiência de julgamento em que a omissão foi praticada ou, não sendo detectada no próprio acto, no prazo de 3 dias a partir do momento em que as respectivas actas, acompanhadas dos suportes técnicos com o registo das gravações ficaram à disposição dos sujeitos processuais, sob pena de dever considerar-se sanada, o que obsta ao seu posterior conhecimento pelo tribunal, em sede de recurso.

A sanação da irregularidade produz ainda, como consequência, a impossibilidade do recurso da matéria de facto, ao abrigo do disposto no artigo 412°, nº 3, do CPP.

Na consideração de que a falta ou deficiente gravação da prova produzida em audiência impede, efectivamente, a relação de conhecer “de facto”, sustentam outras decisões que o vício afecta o valor do acto de produção da prova, ou seja, o julgamento, estando, por isso, submetido ao regime do n° 2 do artigo 123° do CPP. Pode/deve ser oficiosamente conhecida pelo tribunal de recurso e só pode ser sanada com a realização de novo julgamento.

É nosso entendimento de que só a segunda posição enunciada é defensável, em todas aquelas situações em que não ocorre renúncia ao recurso em matéria de facto.

Ora, de facto, o Ilustre Defensor não renunciou ao recurso sobre a matéria de facto.

Mas, certo é que apresenta um requerimento, dirigido a este Tribunal, no qual pede a suspensão do prazo para recorrer até existir uma resposta concreta por parte do mesmo.

Em suma, Peticiona ao Tribunal a suspensão do prazo para recorrer, e quando, em nosso entender, não existe qualquer fundamento para suspensão do dito prazo.

Poderia sim, e deveria, ter apresentado o seu requerimento de recurso, sendo que, nesse caso, perante as deficiências nas gravações da audiência de julgamento, poderia e deveria o Tribunal de 1.ª Instância, conhecido da irregularidade em causa, uma vez que a mesma prejudicava, de todo, o direito ao recurso.

Agora, nada serve a este Tribunal anular uma decisão e repetir a audiência de julgamento quando a irregularidade verificada apenas serviria para sustentar um recurso que não foi interposto.

E melhor, o que foi requerido pelo Arguido, e a fls. 1082 a 1083, foi a suspensão do prazo de recurso até existir uma resposta concreta por parte deste Tribunal em conformidade com o por duas vezes requerido.

Acontece que a resposta concreta por parte deste Tribunal foi dada por despacho datado de 03 de Fevereiro de 2010, a fls. 1084 dos autos, devidamente acompanhada de uma informação prestada pela secretaria judicial, e a qual foi notificada ao Arguido em 24 de Fevereiro de 2010 (cfr. fls. 1086).

Ou, por outras palavras, a conceder provimento ao requerido pelo Arguido - ou seja, a deferir a suspensão do prazo de recurso até à tomada de posição pelo Tribunal - o mesmo apenas poderia estar suspenso até ao dia em que o Arguido foi notificado da posição concreta deste Tribunal, ou seja, até ao dia 28 de Fevereiro de 2010.

Assim, a decisão tomada nos presentes autos transitou em julgado uma vez que não existe motivo ou fundamento legal para suspender o prazo de recurso, sendo que, e mesmo que assim não se entendesse, tal suspensão apenas poderia vigorar até à data em que a mesma foi solicitada, ou seja, até uma tomada de posição concreta por parte deste Tribunal quanto àquela matéria, a qual teve lugar por despacho datado de 03 de Fevereiro de 2010, devidamente notificado ao Arguido em 24 de Fevereiro de 2010.

Não foi apresentado requerimento de recurso, logo a decisão transitou em julgado, em nada servindo a sanação da presente decisão.

A sanação da irregularidade invocada apenas serviria para permitir ao Arguido um pleno exercício do seu direito ao recurso, do qual este não exerceu.

Em nada afecta o processado anteriormente, afectando apenas actos futuros - recurso - o qual não foi interposto.

Face ao exposto indefere-se o requerido a fls. 1082 e 1083.

Inconformado com tal despacho, o arguido interpôs recurso, formulando as conclusões: 1 - Em 22 de Dezembro de 2010, o arguido, não se conformando com a douta sentença proferida em 17 de Dezembro de 2010 pelo Tribunal a quo, pretendendo dela interpor recurso, deu entrada a um requerimento, solicitando que lhe fosse facultada cópia da prova gravada em audiência de julgamento, juntando para o efeito um disco compacto.

2 - Por notificação datada de 28-12-2010, foi o arguido notificado pelo Tribunal a quo de que tinha sido efectuada cópia da prova gravada em audiência de julgamento, em disco compacto, o qual foi junto em anexo.

3 - O defensor oficioso do arguido, tentou por várias vezes e em vários aparelhos ouvir a aludida prova gravada, não tendo conseguido que a mesma fosse reproduzida, 4 - No dia 08 de Janeiro de 2010 dirigiu-se à Secção do Tribunal a quo, levando consigo o respectivo disco compacto, a fim de comprovar junto do respectivo funcionário, se teria ocorrido algum erro na gravação do mesmo, erro que, de facto se verificou que ocorreu, conforme se comprova através do citado disco compacto, que foi junto com o requerimento datado de 22 de Dezembro de 2010 e que depois foi remetido ao defensor oficioso do arguido por notificação datada de 28 -12-2010.

5 - Nesse mesmo dia 8 de Janeiro de 2010, o defensor oficioso do arguido, deu entrada no Tribunal a quo a um segundo requerimento, relatando o ocorrido e, atendendo a que não lhe foi possível ouvir a gravação da prova produzida na respectiva audiência de julgamento, devido a erro ocorrido na gravação do respectivo disco compacto, solicitou que lhe fosse facultada nova cópia da prova gravada na respectiva audiência de julgamento, juntando para o efeito um novo disco...

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