Acórdão nº 07B2382 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução13 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA, BB, representado pela primeira, CC e DD intentaram, no dia 2 de Dezembro de 2004, contra a Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial SA, acção declarativa de condenação com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhes € 350 227 com juros de mora desde a citação, com fundamento nos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, no dia 6 de Junho de 2003, no embate entre o velocípede sem motor conduzido por EE e o veículo automóvel com a matrícula nº 51-57-00, conduzido por FF, com excessiva velocidade, no entroncamento das estradas municipais de ligação das Caldas do Eirogo e de Barcelos/Freixo, e no contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel celebrado entre o último e a ré.

A ré, em contestação, afirmou terem os autores sido indemnizados por danos patrimoniais pela Companhia de Seguros Império-Bonança SA e que o acidente é exclusivamente imputável à vitima, por não ter respeitado o sinal de stop, e impugnou os danos e requereu a intervenção principal daquela seguradora, que foi admitida, a qual pediu a condenação da ré a pagar-lhe € 33 496,26 por ela pagos aos autores a título de pensão, subsídio por morte, despesas de funeral, deslocações e capital de remissão, e o que venha a pagar-lhes, e juros.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 15 de Maio de 2006, por via da qual a ré foi condenada a pagar a AA, CC, DD e BB € 50 000 pelo dano moral sofrido pela perda da vida de EE e € 197 879,04 pelos danos patrimoniais sofridos, e à primeira e aos últimos € 25 000 e € 15 000, respectivamente, pelos danos não patrimoniais próprios e juros, e a pagar a Império-Bonança, Companhia de Seguros SA € 32.247,96 e juros.

Apelou a ré, impugnando a decisão da matéria de facto, pretendendo a sua alteração no que concerne à dinâmica do acidente, e invocando o erro de julgamento da que foi considerada provada, e a Relação, por acórdão proferido no dia 22 de Fevereiro de 2007, negou provimento ao recurso.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a via configura no local do acidente uma recta com cerca de 600 metros de cumprimento e quem chegue ao entroncamento provindo de Eirogo pode avistar toda a faixa de rodagem para o lado de Barcelos a distância superior a 300 metros; - como a faixa de rodagem, na confluência do entroncamento, era dividida ao eixo por via de linha longitudinal descontínua, face ao sinal stop existente no entroncamento para quem viesse de Eirogo, era permitida a ultrapassagem, nos termos do artigo 41º, nº 4, alínea a), do Código da Estrada; - e era permitida a ultrapassagem porque o condutor do veículo que circulava à sua frente sinalizou a manobra de mudança de direcção para a direita e virou, no entroncamento, para esse lado; - se a vítima, ao chegar ao limite da faixa de rodagem da estrada municipal nº 306, tivesse olhado para o seu lado esquerdo, teria observado que o condutor do veículo nº 51-57-00 já havia iniciado a ultrapassagem do outro veículo; - cabia à vítima, em cumprimento do sinal stop, face ao artigo 32º, nº 4, do Código da Estrada, aguardar a passagem do veículo automóvel nº 51-57-00, não reiniciando a sua marcha antes dela; - o facto de o embate ter ocorrido entre a frente do veículo e a parte lateral do velocípede revela que a vítima e o velocípede se encontravam perpendicularmente ao eixo da via e que tal ocorreu no entroncamento; - os factos provados revelam que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima ao infringir o sinal stop e os artigos 3º, nº 2, 29º, nº 1 e 32º, nº 4, do Código da Estrada; - não se justifica a atribuição de quantia superior a € 40 000 pela perda do direito à vida da vítima; - a indemnização pelos danos morais próprios não deve ser superior a € 15 000$ para a mãe e a € 10 000 para os filhos; - releva a idade da vítima, a natureza da sua profissão, o seu rendimento e respectiva origem; - à data do acidente tinha a vitima tinha 40 anos de idade, exercia a profissão de tipógrafo por conta própria, auferia o rendimento anual bruto de € 34 000 proveniente de venda de mercadorias e produtos da sua tipografia, e devem deduzir-se os custos dos factores de produção; - deve considerar-se ser a vítima trabalhador independente, estar a sua actividade em extinção por virtude das novas tecnologias, ser obrigada a descontar para a segurança social 17% da remuneração e a pagar o respectivo imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e o prémio do seguro de acidentes de trabalho, e que ele gastava consigo um terço do seu rendimento; - como o rendimento líquido anual da vítima, cuja vida activa seria até aos sessenta e cinco anos, não era superior a € 10 000, o seu contributo para o sustento do respectivo agregado familiar não excedia € 6 500 anuais; - como a recorrida AA aufere de salário € 1 500 e recebeu no foro laboral, em relação à vítima, € 26 075,27, não necessitava de alimentos dela, e os seus filhos receberão pensões actualizáveis até entrarem no mercado de trabalho ou obterem as habilitações; - os filhos maiores em breve farão vidas autónomas e independentes, pelo que não necessitariam de alimentos da vítima; - não deve ser arbitrada aos recorridos pela perda da contribuição da vítima, quantia indemnizatória não superior a € 50 000, sobre a qual, porque calculada à data da sentença, só devem incidir juros desde aquela data; - o acórdão recorrido não subsumiu correcta e adequadamente a matéria de facto, omitiu e não interpretou nem aplicou correctamente os artigos 3º, nº 2, 29º, nº 1, 32º, nº 4 e 41º, nº 4, alínea a), do Código da Estrada, certo que a vítima violou o sinal stop, pelo que deve ser revogado e a recorrente absolvida dos pedidos formulados no seu confronto.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. EE nasceu no dia 24 de Agosto de 1962 e faleceu no dia 6 de Junho de 2003, no estado de casado com AA desde 20 de Junho de 1982, formando um casal feliz.

  1. CC, nascido no dia 30 de Março de 1983, DD, nascido no dia 26 de Agosto de 1985 e BB , nascido a 13 de Maio de 1990, são filhos de EE e de AA.

  2. Representantes de Jóia Minhota Bordados e Confecções Ldª, por um lado, e da Companhia de Seguros Mundial Confiança SA, por outro, declararam por escrito consubstanciado na apólice nº 000000000, no dia 15 de Março de 2003, a última assumir, mediante prémio a pagar pela primeira, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com a circulação do veículo automóvel com a matrícula 51-57-00 até ao montante de € 648 438.

  3. EE, por um lado, e representantes da Companhia de Seguros Bonança SA, por outro, declararam por escrito, consubstanciado na apólice nº AT 000000000, no dia 1 de Janeiro de 1999, a última assumir, mediante prémio a pagar pelo primeiro, os riscos de acidente na ida e no regresso ao local de trabalho com base na retribuição anual correspondente a € 6 084,54.

  4. No dia 6 de Junho de 2003, cerca das 11,30 horas, no Lugar do..., no concelho de Barcelos, EE, que exercia a profissão de tipógrafo por conta própria, circulava com o seu velocípede sem motor pela estrada municipal que liga as Caldas do Eirogo à Estrada Municipal Barcelos/Freixo, que entroncava do lado direito desta, atendo o sentido Barcelos-Freixo, quando havia sol e o piso betuminoso da estrada estava seco.

  5. No lado direito da estrada que liga as Caldas do Eirogo à estrada municipal nº 306, segundo este sentido, existia um sinal vertical de stop, junto à intercepção daquela estrada com esta.

  6. No local do embate, a estrada configura uma recta com cerca de 600 metros de comprimento, ladeada de habitações com saídas para a estrada, o entroncamento onde ocorreu o embate encontra-se assinalado com o sinal vertical B9b e é antecedido, atento o sentido Barcelos - Freixo, de uma passadeira para peões, assinalada com o sinal vertical H7 e marcada no pavimento com o sinal horizontal M 11.

  7. No mesmo local, a estrada tem marcada no pavimento uma linha contínua (sinal horizontal M-1) e bandas cromáticas de abrandamento de velocidade (sinal horizontal M 20).

  8. A cerca de oitenta metros do referido entroncamento, atento o sentido Barcelos-Freixo, existe um sinal vertical de limitação de velocidade a 40 Km/hora (sinal C 13) e um sinal vertical de proibição de ultrapassagem.

  9. EE pretendia circular na estrada municipal nº 306, no sentido Freixo-Barcelos, e nesta, no sentido Barcelos-Freixo, e conduzia o seu velocípede sem motor dando a esquerda ao ilhéu central existente na confluência da estrada municipal donde provinha com a estrada municipal nº 306.

  10. Ao chegar ao local onde a estrada municipal onde seguia entronca com a estrada municipal nº 306, EE parou o veículo onde circulava, e verificou que naquela estrada se aproximava o veículo automóvel referido sob 12, e que no sentido Freixo-Barcelos não circulava nenhum veículo.

  11. Aproximava-se um veículo automóvel cujo pisca-pisca direito foi accionado, e atrás deste seguia o veículo automóvel com a matrícula nº 51-57-00, conduzido por FF, sócio-gerente da proprietária do mesmo, Jóia Minhota- Bordados e Confecções Ldª, no interesse e sob as ordens dela, a cerca de 90 quilómetros por hora.

  12. A cerca de 20 ou 30 metros do entroncamento, o veículo referido sob 12, primeira parte, abrandou a sua marcha, encostou-se à sua direita e mudou de direcção para esse lado, entrando na estrada municipal Barcelos-Eirogo.

  13. EE iniciou a travessia da metade direita da faixa de rodagem da estrada municipal nº 306, atento o sentido Barcelos-Freixo.

  14. FF invadiu a metade esquerda da faixa de rodagem, atento o sentido Barcelos-Freixo, procedendo à ultrapassagem do veículo referido na primeira parte de 12, sobre a passadeira referida no ponto 18..

  15. Quando o EE já se encontrava na metade esquerda da faixa de rodagem da estrada municipal nº 306, atento o sentido Barcelos-Freixo, o seu veículo foi embatido na parte lateral pela parte frontal do veículo automóvel com a...

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