Acórdão nº 07B1958 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução13 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório Empresa-A, intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra Empresa-B, pedindo que seja condenada a pagar-lhe a quantia global de 782.925,31 €, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, pelos danos decorrentes da quebra de cumprimento operada unilateralmente pela ré do contrato de concessão comercial entre elas celebrado e sua posterior denúncia.

Contestou a ré, alegando, em síntese, que nunca incumpriu qualquer das cláusulas do contrato celebrado com a autora, designadamente a prática de exclusividade que não foi estipulada e que a denúncia do contrato foi da iniciativa da autora.

E com base na denúncia infundada do contrato por parte da autora, pretende ser ressarcida dos danos que essa denúncia lhe ocasionou, no montante de 865.623,47 €, pretensão que formula reconvencionalmente.

Replicou a autora para reafirmar a posição inicialmente defendida e impugnar a factualidade vertida na reconvenção.

Saneado o processo e fixados os factos que se consideraram assentes e os controvertidos, teve lugar, por fim, a audiência de discussão e julgamento.

Na sentença, subsequentemente proferida, foram a acção e reconvenção julgadas parcialmente procedentes e, operadas as correspondentes compensações, a ré condenada a pagar à autora a quantia global de 105.303,58 €, com juros de mora desde a citação até integral pagamento.

Inconformadas com o assim decidido, apelaram autora e ré, tendo o Tribunal da Relação do Porto julgado improcedente o recurso daquela e parcialmente procedente o desta, e condenado a ré a pagar à autora a quantia de 25.811,44 €, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

De novo irresignada, recorre de revista a autora para este Tribunal, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e pela atribuição da indemnização peticionada.

A recorrida não contra-alegou.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir II. Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo da recorrente radica, em síntese, no seguinte: 1- Os pedidos das alíneas a) e b) da p.i. não decorrem da falta de pré-aviso, mas de uma concreta violação contratual, que não se confunde com aquela falta de pré-aviso.

2- Os danos que fundamentam esses pedidos são passíveis de ser valorados e arbitráveis de forma autónoma.

3- À data da cessação do contrato, a autora tinha firmado com a ré encomendas no valor de 202.753,97, que esta se recusou a satisfazer, provocando-lhe danos no valor € 18.888,62, pela perda do lucro líquido que auferiria com a venda dessa mercadoria.

4- Ainda devido à não entrega dessa mercadoria, o bom nome da autora sofreu inegável dano, já que parte dos clientes cancelaram as encomendas, além de que a autora deixou de ser vista como uma sociedade que cumpria pontualmente os seus compromissos.

5- O acórdão recorrido, ao confirmar a sentença de 1ª instância, fez uma incorrecta interpretação do art. 29 n° 2 do DL n° 178/86 de 03.07, já que, para além da condenação da ré em indemnização pela falta de pré-aviso, ao abrigo do citado normativo, deveria ainda ter condenado a ré no pagamento à autora dos específicos danos sofridos por esta a título de lucros cessantes e da afectação da sua imagem comercial, decorrentes do não fornecimento das encomendas já firmadas em data anterior à cessação do vínculo contratual, conforme peticionado nas als. a) e b) da p.i.

6- Para o caso de se entender não serem autonomizáveis os pedidos das alíneas a), b) e c) da petição inicial, deverá em alternativa recuperar-se o decidido em 1ª instância, quando entendeu fixar em seis meses o período a atender para cômputo da indemnização a arbitrar à autora.

7- Considerando que o DL 178/86 de 03.07 prevê um pré-aviso de 3 meses para a denúncia dos contratos de agência que vigorem por 3 anos ou mais, com base nos princípios da aplicação analógica, ao espírito subjacente ao regime jurídico do contrato de agência e por apelo ao princípio da confiança, será adequado, nesta hipótese alternativa, fixar o prazo de pré-aviso de seis meses, como bem decidiu a 1ª instância.

8- Antes da celebração do contrato os produtos da ré eram desconhecidos em Portugal e nos E.U.A, pelo que a autora teve de criar, a partir do nada, uma nova apetência e interesse do mercado pela aquisição daqueles produtos, e sem esse trabalho jamais aqueles artigos teriam alcançado a forte posição comercial que detinham no mercado à data da cessação do contrato.

9- Não fora por força da actividade desenvolvida pela autora, a ré jamais entraria por si no mercado, com um produto novo, alcançando de imediato os resultados comerciais que veio a obter.

10- A partir da cessação do contrato, a autora, em relação aos clientes por si anteriormente angariados, deixou de receber qualquer provento da ré, pelo que se encontra igualmente verificado o requisito da alínea c) do citado normativo.

11- Encontram-se assim verificados nos autos os requisitos de que a Lei faz depender o direito do agente/distribuidor à indemnização de clientela.

12- A ré não respeitou qualquer tempo de aviso prévio na denúncia contratual que efectuou, prazo esse que era de três meses.

13- Porquanto deixou logo de cumprir normalmente o contrato.

B- Face ao teor das conclusões formuladas reconduzem-se, no essencial, a três as questões controvertidas a decidir: - natureza jurídica do contrato celebrado entre autora e ré; - razões da cessação do contrato; - apuramento e quantificação dos danos a indemnizar.

  1. Fundamentação A- Os factos Foram dados como provados no acórdão recorrido os seguintes factos: 1- A autora dedica-se com fim lucrativo à produção, comercialização e representação de portas em madeira e seus derivados, encontrando-se sedeada em Portugal.

    2- A ré dedica-se, também com fim lucrativo, à produção e comercialização de portas em madeiras e seus derivados, encontrando-se sedeada em Espanha.

    3- A área de negócio em que a autora e a ré centram a sua actividade divide-se fundamentalmente na comercialização de dois tipos de portas: portas lisas e portas decorativas.

    4- No âmbito das suas actividades, foi celebrado entre autora e ré, em Julho de 1995, um contrato verbal por ambas qualificado como de concessão comercial, nos termos do qual a autora passaria, a partir daquela data, a representar as portas decorativas que a ré produz (puertas tren), revendendo-as em todo o território de Portugal e nos Estados Unidos da América.

    5- As portas referidas em 4 possuem características e identidade próprias, designadamente em termos de «design», construção e dimensões técnicas dos seus diversos componentes.

    6- As vendas dos produtos da ré, nos termos de tal contrato, seriam efectuadas pela autora em seu nome e por sua conta, tendo-se esta comprometido a promover e distribuir os mesmos, designadamente inserindo-os na gama de produtos que representa e comercializa.

    7- Em contrapartida, em face do referido contrato, a ré concedia à autora tabelas de preços específicas, periodicamente actualizadas ao longo da vigência do contrato em apreço, com valores e condições especialmente vantajosas para a autora, bem como a possibilidade de negociação pontual de descontos extraordinários no caso de angariação e entrada de clientes com especial interesse comercial.

    8- Pelo menos a partir de Maio de 2001, as partes convencionaram ainda a garantia de quantidades mínimas e máximas de fornecimentos.

    9- Anteriormente à concretização do referido contrato, a ré não distribuía as portas decorativas em Portugal nem nos Estados Unidos da América.

    10- Após a celebração do referido contrato, a autora procedeu a um conjunto de profundas alterações na sua estrutura, orientação e estratégia comercial.

    11- Com vista a desenvolver junto do mercado uma nova apetência e interesse pela aquisição do referido produto, a autora teve de aumentar o número dos seus quadros comerciais, reconvertendo-os e dando-lhes formação específica para o efeito.

    12- Procedeu a apresentações do artigo junto de potenciais clientes e colocou nalguns destes mercadoria à consignação.

    13- No campo da divulgação e prospecção comercial, a autora participou, a expensas...

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