Acórdão nº 9485/2006-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, na Secção Cível da Relação de LISBOA: Inconformada com o despacho saneador que, na acção declarativa de condenação por ela intentada contra "A, S.A." e "E, S.A.", julgou procedente a excepção dilatória de preterição de tribunal arbitral e, consequentemente, absolveu as Rés da instância, "E, S.A." interpôs recurso do mesmo, que foi recebido como de agravo, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo rematado as alegações que apresentou com as seguintes conclusões: "1. As Agravadas arguiram nos autos que a E havia incumprido com as obrigações previstas na cláusula 306 do Contrato de Empreitada, já que teria a obrigação de requerer ao Distinto Presidente do Tribunal da Relação que indicasse um terceiro árbitro que possibilitasse a constituição do Tribunal Arbitral; 2. Inversamente, o Mmo. Juiz a quo entendeu que a E não incumpriu com as suas obrigações contratuais, mas que, por ter alegadamente agido de má fé, tornou o seu direito de resolução da convenção de arbitragem inexercível; 3. Em consequência, absolveu as Agravadas da instância por preterição do tribunal arbitral; 4. Ao dar esta solução de direito à causa - solução não alegada nem vislumbrada pelas partes - o Mmo. Juiz a quo violou o princípio da proibição das decisões-surpresa, previsto no art.º 3º, n.º 3 do Cód. de Processo Civil; 4. Tal violação constitui uma nulidade processual que afecta a boa decisão da causa (art.º 201º, n.º 1 do Cód. de Processo Civil) e uma nulidade da própria sentença, dado que o Mmo. Juiz pronunciou-se sobre matérias sobre as quais não se podia pronunciar sem antes ouvir as partes (art.º 668º, n.º 1 al. d) do Cód. de Processo Civil); 5. Deve, assim, a sentença ser declarada nula, com todos os legais efeitos; Por outro lado, 6. Foi a E que procurou iniciar a arbitragem e era a E que, na qualidade de credora, tinha um interesse maior na célere resolução do litígio; 7. Não faz assim qualquer sentido considerar que a E recorreu aos tribunais comuns numa postura de má-fé.

8. A E tudo fez para obter o acordo da A relativamente ao objecto do litígio a submeter a arbitragem, tendo inclusivamente incorporado na sua proposta a contra-proposta que a A havia efectuado a este respeito; 9. Após o envio desta contraproposta, a E aguardou 9 meses pelas resposta da A e isto quando, de acordo com o Contrato de Empreitada, bastava-lhe ter aguardado 1,5 mês para resolver a convenção de arbitragem; 10. Neste momento já nem sequer estava só em causa a aceitação da proposta de objecto de litígio, mas sim a localização dos responsáveis da A, ou seja, a localização de um interlocutor; 11. Como ficou demonstrado na sentença proferida nos autos que correram termos na 14° Vara Cível, Secção, a E executou todas as suas prestações contratuais, ao passo que a A actuava de má fé, tendo mesmo desaparecido da obra; A isto acresce que, 12. A E não recebeu qualquer notificação dos dois árbitros indicados pelas partes no sentido da inexistência de acordo na designação de 3º árbitro; 13. Sem tal notificação, a E estava impossibilitada de requerer a indicação de um terceiro árbitro ao Distinto Presidente do tribunal da Relação, sob pena de serem designados dois terceiros árbitros (um pelo Distinto presidente do tribunal da Relação e outro pelos dois árbitros já indicados); 14. A cláusula 30ª, n.º 4 constitui uma cláusula de salvaguarda contratual das partes, tendente a combater quaisquer situações de atraso na constituição de tribunal arbitral e o exercício do direito de resolução da convenção de arbitragem estabelecido nessa cláusula encaixa-se perfeitamente em situações como aquela que se analisa nestes autos; 15. É manifesto que não houve qualquer violação de deveres de boa fé por parte da E em todo o processo de tentativa de constituição do Tribunal Arbitral e, consequentemente, não houve qualquer violação do art.º 762º, n.º 2 do Código Civil nem subsunção ao disposto no art.º 334º do mesmo Código.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso com o que, uma vez mais, se fará a costumada JUSTIÇA.

".

A parte contrária não apresentou contra-alegações.

O Exmº Sr. Juiz do tribunal recorrido proferiu despacho de sustentação, no qual manteve inalterado o despacho objecto do agravo interposto pela Autora.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

A DECISÃO RECORRIDAO despacho saneador que constitui objecto do presente recurso de agravo é do seguinte teor : "Atenta a simplicidade da causa, dispenso a realização da audiência preliminar, nos termos do disposto no artigo 508°-B n.° 1 alínea a) do Código de Processo Civil.

***Despacho Saneador: O Tribunal é competente em razão da matéria, da nacionalidade e da hierarquia.

***Da preterição de tribunal arbitral: Na sua contestação, veio a ré A, Lda. arguir a excepção dilatória de preterição de tribunal arbitral, considerando que a autora desrespeitou a cláusula 30° do acordo entre ambas celebrado, que denominaram de contrato de empreitada, no sentido do prévio recurso d constituição de um tribunal arbitral.

Refere, concretamente, que contactada pela autora, de imediato designou o seu árbitro, devendo o terceiro árbitro ser designado, por acordo, pelos árbitros indicados pelas partes (cláusula 30°, n.° 2); na falta de acordo, este deveria ser designado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a requerimento de qualquer das partes.

A autora não requereu ao tribunal citado a indicação do terceiro árbitro, antes intentou a presente acção, desta forma violando a convenção arbitral celebrada.

Conclui pela sua absolvição da instância.

***Sobre a matéria, veio a autora responder que: - a ré ofereceu a autora contraproposta sobre o objecto do litígio, ao que a autora respondeu, compondo as propostas de ambas as partes, e a ré nada disse; - decorreram mais de 4 meses sem que estivesse composto o tribunal arbitral, por designação do 3° árbitro, o que nos termos da cláusula 300º, n.° 4 do contrato celebrado, autorizava a autora a resolver unilateralmente a convenção de arbitragem e a recorrer aos tribunais judiciais;***Cumpre decidir.

A cláusula contratual pela qual as partes acordaram a competência, prima facie, de tribunal arbitral reza o que segue: 30ª (resolução de Litígios) 1. Todas as questões e litígios emergentes deste contrato serão decididas através de arbitragem, a realizar por um Tribunal Arbitral que funcionará em Lisboa, que julgará segundo a Lei Portuguesa e será constituído nos termos do número seguinte e, supletivamente, de acordo com o disposto na Lei n.° 31/86, de 29 de Agosto.

2. O Tribunal Arbitral será constituído por três árbitros, cabendo a cada uma das Partes designar um e a estes a escolha do terceiro árbitro, que exercerá as funções de Presidente; na falta de acordo, o árbitro presidente será designado pelo Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa a requerimento de qualquer uma das Partes.

3. O Tribunal Arbitral deverá proferir a sua decisão no prazo de três meses a contar do termo da instrução do processo ou do encerramento da audiência de discussão e julgamento, se a houver.

4. Se decorrerem mais de quatro meses sobre a data da indicação do primeiro árbitro sem que o Tribunal Arbitral esteja constituído, poderá qualquer uma das partes resolver unilateralmente a presente convenção de arbitragem, considerando-se devolvida a jurisdição aos tribunais comuns para a questão concretamente em causa.

***Antes de mais, cumpre afastar o argumento de falta de acordo quanto à matéria a submeter à decisão do tribunal arbitral, na medida em que as partes estão obrigadas a submeter àquele tribunal quaisquer questões controvertidas imanentes da relação contratual entre elas, não carecendo para o efeito de acordarem. Ou seja, autora e ré podem - e devem - cada uma por si, ou conjuntamente, oferecer à arbitragem qualquer litígio - o que não podem é recorrer directamente aos tribunais comuns, ou subtrair à contraparte qualquer questão que esta pretenda submeter.

Ainda, esta vertente não constituía termo ao funcionamento do tribunal arbitral. De facto, o acordo lavrado apenas fixa dois limites temporais: prazo de constituição e prazo de decisão.

Assim, este fundamento não licita a autora a...

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