Acórdão nº 9606/2006-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Janeiro de 2006
Magistrado Responsável | CARLOS SOUSA |
Data da Resolução | 12 de Janeiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa: I - A) No presente processo especial abreviado, NUIPC 307/05.0S6LSB do 1º Juízo - 1ª Secção do T.P.I.C. de Lisboa, o digno magistrado do MºPº, ao abrigo do artº 16º, nº 2, als. a) e b), do CPP, deduziu acusação, em 02/05/05 (fls. 49-51), contra o arguido J (vide fls. 49-51), na qual lhe imputa a prática, em concurso real, como autor material e na forma consumada de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, p. e p. pelo artº 347º do Código Penal, e de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artºs 181º, nº 1 e 184º, com referência ao artº 132º, nº 2, al. j), todos do Código Penal.
Foram os autos remetidos e distribuídos àquele tribunal - em 20/01/06 (cfr. fls. 61).
Porém, o Mmº juiz, titular daquele 1º Juízo, por despacho de 2/02/06 (vd. fls. 62-63), considerou, além do mais, que, no caso, não se verificam os requisitos do processo abreviado, constantes do artigo 391º-A do CPP, o que consubstancia nulidade insanável e, face ao disposto nos artºs 119º, als.
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e f), 311º, nº 1, e 391º-D, todos daquele CPP, determinou a remessa destes autos ao DIAP para tramitação "sob outra forma processual".
II - A) Inconformado, recorre o digno magistrado do Ministério Público para esta Relação de Lisboa, extraindo, da sua motivação, as seguintes conclusões (que se transcrevem): « 1. Sendo o interesse especialmente protegido pelo artº 347º do Código Penal o da autoridade do Estado, conforme desde logo resulta da sua inserção sistemática, a conduta do arguido, apesar de ter visado dois agentes da PSP, preencheu apenas uma única vez o tipo do crime em apreço, pelo que se verifica apenas um crime, e não dois.
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Com efeito, não sendo o ilícito penal em apreço um crime contra as pessoas, é indiferente o número de funcionários visados pela conduta criminosa do agente para efeitos da qualificação do crime, ou seja, a pluralidade de funcionários não provoca a pluralidade de crimes, tendo tal circunstância apenas relevância para a medida da pena.
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Tal foi, aliás, a solução adoptada pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 28/04/1999, in CJ-STJ, tomo II, pág. 193, e no Acórdão de 18/02/2004, in CJ-STJ, tomo I, pág. 205, e tal é, também, a posição adoptada pela doutrina.
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Quanto ao concurso de tal crime com o crime de injúria agravada, o Mmº Juiz "a quo" não teve em conta o estatuído na al. a) do nº 2 do artº 16º do Código de Processo Penal.
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Com efeito, o crime de resistência e coacção a funcionário, p. e p. pelo artº 347º do Código Penal, está precisamente inserido em tal parte especial do Código Penal, pelo que a competência para o seu julgamento, nos termos da lei, caberá sempre ao tribunal singular, não sendo a moldura penal de tal crime de levar em conta para efeitos da al. b) do nº 2 do artº 16º do Código de Processo Penal, e não sendo, como tal, necessário utilizar o mecanismo previsto no nº 3 de tal norma, "ex vi" artº 391º-A do Código de Processo Penal.
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Todavia, à cautela, e apesar de perfilharmos tal entendimento, fez o Ministério Público, por despacho proferido a fls. 41 dos autos, uso do mecanismo processual previsto no artº 16º, nº 3 do Código de Processo Penal, "ex vi" artº 391º-A do mesmo diploma legal, invocando para o efeito terem todos os factos imputados ao arguido sido praticados no mesmo circunstancialismo e não terem resultado consequências relevantes dos mesmos.
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Só existe falta de inquérito se a lei processual penal o impuser como fase obrigatória no processo abreviado - artº 391º-A nº 1 e 262º, nº 2, ambos do Cód. Proc. Penal.
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Ora, a lei processual penal, ao não impor a existência de inquérito no processo abreviado, aponta inequivocamente para a legalidade processual da acusação em processo abreviado sem a realização do mesmo.
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No caso em apreço não houve falta de inquérito por a lei processual penal o não exigir, não se verificando, consequentemente, a nulidade prevista na al. d) do artigo 119º do Cód. Proc. Penal.
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A prova constante dos autos é simples e evidente quanto à verificação de crime e de quem foi o seu agente, não se verificando, consequentemente, a nulidade prevista na al. f) do artigo 119º do Cód. Proc. Penal.
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Desta forma, encontram-se preenchidos todos os requisitos do processo abreviado, não sendo de considerar, como tal, nulo o despacho de acusação proferido.
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O despacho proferido pelo Mmº Juiz é recorrível por nele se terem apreciado nulidades.
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O despacho recorrido violou o disposto nos artºs 181º, 184º e 347º do Código Penal e 119º, al. f), 311º, nº 1 e 391º-A, nº 1 e nº 2 do Código de Processo Penal.
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Por todo o exposto, o despacho ora impugnado deve ser revogado e substituído por outro que receba o despacho de acusação proferido e determine data para julgamento em processo abreviado.
Termos em que se requer que o presente recurso seja julgado procedente e que, em consequência, seja o despacho a quo revogado e, em seu lugar, proferido novo despacho que receba o despacho de acusação proferido e determine data para julgamento em processo...
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