Acórdão nº 571/04-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Maio de 2004

Magistrado ResponsávelANSELMO LOPES
Data da Resolução03 de Maio de 2004
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

TRIBUNAL RECORRIDO Tribunal Judicial de Braga – 1º Juízo Criminal – Pº nº 58/02.8TABRG ARGUIDOS F…; S…; e B...

DEMANDANTE CIVIL Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social – Delegação de Braga.

DEMANDADOS CIVIS Os arguidos.

RECORRENTE A arguida S….

RECORRIDO O Ministério Público OBJECTO DO RECURSO No Tribunal recorrido, os arguidos foram acusados, os dois primeiros, pela prática de um crime continuado de abuso de confiança previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 7.º, 9.º, n.º 2, 27.º-B, 24.º, n.ºs 1, 2 e 4 do Dec.-Lei 20-A/90, de 15 de Janeiro, na redacção dada pelo Dec.-Lei n.º 394/93, de 24 de Novembro (RJIFNA), com referência ao art. 5.º, n.ºs 2 e 3 do Dec.-Lei n.º 103/80, de 9 de Maio, art. 18.º do Dec.-Lei n.º 140-D/809, de 14 de Junho e artigos 30.º, n.º 2 e 79.º do Cód. Penal, actualmente previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 7.º, 12.º, n.º 2, 105.º, 107.º do RGIT (aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho), com referência ao art. 5.º, n.ºs 2 e 3 do Dec.-Lei n.º 103/80, de 9 de Maio, art. 18.º do Dec.-Lei n.º 140-D/86, de 14 de Junho e artigos 30.º, n.º 2 e 79.º do Cód. Penal.

A arguida B… foi acusada do cometimento do mesmo crime, nos termos dos artigos 7.º e 9.º do RJIFNA e, actualmente, nos artigos 7.º e 12.º, n.º 2 do RGIT.

*O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social deduziu pedido civil de indemnização contra os arguidos, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia global de € 58.904,78 (cinquenta e oito mil novecentos e quatro euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal, os já vencidos no montante de € 49.050,48 e os vincendos até integral pagamento.

A final, foi proferida a seguinte decisão: CONDENO os arguidos F… e S… pela prática em co-autoria de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na forma continuada, do tipo previsto e punível pelo artigo 107º n.º1 e 105º n.º 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias, 30º n.º 2 e 79º do Cód.Penal, na pena de dez meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de quatro anos e seis meses, subordinada à condição de pagarem à Segurança Social, no prazo de quatro anos, a quantia global correspondente às contribuições em dívida e acréscimos legais.

CONDENO a arguida “B…”, pela prática do mesmo crime e nos termos do artigo 7º do R.G.I.T., na pena de a pena de 200 (duzentos) dias de multa à taxa diária de € 20,00 (vinte euros).

* Julgo totalmente procedente o pedido civil e em consequência condeno os demandados a pagar solidariamente ao demandante a quantia de € 58.904,78 (cinquenta e oito mil novecentos e quatro euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora calculados desde o 15º dia do mês seguinte àquele a que as contribuições discriminadas na matéria de facto provada dizem respeito, à taxa legal prevista no artigo 3º nº 1 do Decreto-lei 73/99 de 16.03, até integral pagamento.

*É dessa decisão que vem interposto o presente recurso, no qual a arguida S… reclama alteração de certa matéria de facto; diz que, com as respectivas consequências na continuação criminosa e na escolha e medida da pena, estão amnistiados todos os crimes imputados relativos a contribuições de valor inferior a 250.000$00 e bem assim que, nos termos do artº 62º, nºs 2 e 3 da Lei nº 17/2000, de 8 de Agosto, estão prescritas todas as contribuições anteriores a Março de 1997, reduzindo-se a indemnização civil a 5.194.743$00 (€ 25.911,27).

*FACTOS PROVADOS Ipsis verbis, tal decisão assentou na seguinte matéria de facto: A arguida B… tem por objecto o fabrico e comércio de carteiras, malas e marroquinaria.

Os arguidos F… e S… desempenharam as funções de sócios-gerentes daquela sociedade, desde 1995 a 1999, exercendo em conjunto a gestão e administração da empresa.

A sociedade arguida encontrava-se legalmente obrigada a deduzir e entregar a cotização de 11% dos salários dos seus trabalhadores dependentes, a título de contribuição para a Segurança Social, até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que as contribuições diziam respeito.

No âmbito das suas funções de gerentes da arguida B…, os arguidos F… e S… decidiam da afectação dos meios financeiros ao cumprimento das respectivas obrigações, sendo responsáveis pelo desconto das contribuições devidas à Segurança Social no montante dos salários pagos aos trabalhadores, bem como pelo preenchimento e envio mensal, aos Serviços da Segurança Social, das folhas de remunerações pagas no mês anterior aos trabalhadores da empresa.

No cumprimento de tal obrigação remeteram regularmente as folhas de remunerações relativas aos meses de Junho a Agosto 1995, Novembro de 1995 a Janeiro de 1999 inclusive, e procederam no mesmo período à retenção das quantias devidas a título de contribuições à Segurança Social.

Porém, não entregaram à Segurança Social o montante dessas contribuições no prazo legal e não regularizaram a situação nos noventa dias subsequentes, mantendo-se em dívida as contribuições.

Assim, tendo deduzido às remunerações pagas aos seus trabalhadores o montante relativo às contribuições devidas à Segurança Social, os arguidos não efectuaram a sua entrega, nos meses e valores a seguir discriminados: - (…).

Todos estes valores que ascendem à quantia global de € 58.904,78 (Esc.

11.809.347$00) pertenciam aos cofres do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social a quem deveriam ter sido entregues.

Das declarações de rendimentos IRC, modelo 22, da arguida sociedade resulta que no ano de 1995: - realizou vendas de produtos e prestações de serviços no valor de € 967.690,63 (Esc. 184.746.933$00); - apresentou uma despesa de fornecimentos e serviços externos no valor de € 151.008,80 (Esc. 30.274.564$00); - apresentou custos com o pessoal que ascendiam a € 249.383,89 (Esc. 49.996.981$00), sendo € 21.711,97 (Esc. 4.352.865$00) de remunerações pagas aos órgãos estatutários; - apresentou disponibilidades (depósitos bancários e caixa) no montante de € 42.039,83 (Esc. 8.428.229$00); - efectuou compras no montante de € 349.190,91 (Esc. 70.006.492$00).

E no ano de 1996: - realizou vendas de produtos e prestações de serviços no valor de € 486.118,67 (Esc. 97.458.045$00); - apresentou uma despesa de fornecimentos e serviços externos no valor de € 97.698,31 (Esc. 19.568.753$00); - apresentou custos com o pessoal que ascendiam a € 169.594,63 (34.000.671$00), sendo € 17.672,47 (Esc. 3.543.012$00) de remunerações pagas aos órgãos estatutários; - apresentou disponibilidades (depósitos bancários e caixa) no montante de € 89.024,16 (Esc. 17.847.742$00); - efectuou compras no montante de € 255.857,52 (Esc. 51.294.829$00).

Todavia e apesar do conteúdo de tais declarações, a sociedade arguida atravessou dificuldades financeiras no período em que eram devidas as supra referidas contribuições à Segurança Social, dificuldades que se revelaram pelos anos de 1991 e 1992, agravando-se progressivamente nos anos seguintes, devido à crise gerada pela concorrência de empresas sediadas no estrangeiro, que introduziam no mercado nacional os produtos comercializados pela arguida a preços mais baixos, o que determinou uma diminuição no volume de vendas desta e dificuldades na cobrança dos seus créditos a clientes.

Perante a descrita situação económico-financeira da empresa, os arguidos F… e S… empenharam-se em manter a laboração da empresa, satisfazendo com prioridade o pagamento dos salários aos trabalhadores, cujo número foram reduzindo, suportando as despesas correntes e pagando a fornecedores. Para tanto utilizaram as quantias descontadas nos salários dos trabalhadores da empresa e devidas à Segurança Social e chegaram a recorrer a empréstimos junto de amigos, além do seu património pessoal.

Agiram os arguidos F… e S… livre e conscientemente, em conjugação de esforços e intentos, com o propósito concretizado de se apropriarem, em proveito da sociedade que geriam das aludidas cotizações que sabiam ser devidas à Segurança Social e de que eram meros depositários, afectando as respectivas quantias à satisfação de compromissos da empresa por conta da qual agiam, designadamente às supra referidas despesas correntes e necessárias para manter a laboração da empresa.

Sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei, actuaram durante o período de tempo supra indicado confiando na impunidade das suas condutas por falta de fiscalização dos serviços competentes.

A sociedade arguida veio a cessar a laboração nos primeiros meses do ano de 1999.

A arguida S… não tem antecedentes criminais.

Actualmente dedica-se em nome individual ao comércio de artigos de pele, prevendo a cessação de tal actividade para o final do ano, por falta de viabilidade económica do negócio.

O arguido F… é gerente de uma empresa de publicidade, tendo ao seu serviço dois trabalhadores.

Tem três filhos menores.

Sofreu uma condenação em pena de multa, em Junho de 2002, pela prática do crime de difamação agravada.

*MOTIVAÇÃO/CONCLUSÕES São as seguintes as conclusões do recurso: 1. A recorrente considera que foram incorrectamente julgados os seguintes pontos de facto: - os Arguidos procederam no mesmo período à retenção das quantias devidas a título de contribuição à Segurança Social", e, "tendo deduzido às remunerações pagas aos seus trabalhadores o montante relativo às contribuições devidas Segurança Social [ ..] não efectuaram a sua entrega", e "utilizaram as quantias descontadas nos salários dos trabalhadores da empresa", agindo com o "propósito concretizado de se apropriarem, em proveito da sociedade que geriam das cotizações que sabiam ser devidas à Segurança Social e de que eram meros depositários, afectando os respectivas quantias à satisfação de compromissos da empresa por conta da qual agiam".

2. Impõe-se considerar tais factos como não provados e, pelo contrário, dar-se por assente que - durante o período considerado nos autos, a empresa B… de que a Arguida era co-gerente, não dispunha de meios económicos e financeiros suficientes sequer paro pagar...

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