Acórdão nº 01031/06.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Março de 2007
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 01 de Março de 2007 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.
RELATÓRIO M… C…, devidamente identificado a fls. 02, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 18/09/2006, que indeferiu a providência cautelar deduzida pelo mesmo contra “HOSPITAL SÃO JOÃO, EPE” e a contra-interessada M… S…, ambos também devidamente identificados nos autos, e o condenou como litigante de má-fé.
Formula, nas respectivas alegações (cfr. fls. 160 e segs.
- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(...) 1ª A nomeação de um director de serviço, maxime num Hospital Central, como o Hospital de S. João, com um quadro amplo de chefes de serviço e de assistentes, é feita de entre os chefes de serviço e só pode deixar de sê-lo se as características pessoais do nomeado se impuserem de tal forma que seja de postergar a nomeação de um chefe de serviço; 2ª É o que resulta do art. 41.º, n.º 3, do DL n.º 73/90, de 6 de Março (Diploma das Carreiras Médicas), na redacção do DL n.º 396/93, de 24 de Novembro, conjugado com o art. 15.º, n.º 1, do DL n.º 233/2005, de 29 de Dezembro, na sua expressão de que o director de serviço é nomeado de entre os chefes de serviço ou, na sua falta ou mediante proposta fundamentada, de entre assistentes graduados que, em qualquer dos casos, manifestem notórias capacidades de organização e qualidade de chefia; 3ª A fundamentação da alternativa na nomeação é um elemento essencial do acto e não uma mera questão de forma ou de fundamentação do acto administrativo em si; 4ª Mas o curriculum do recorrente é de tal força que a nomeação da recorrida particular só se justifica por uma mera posição política (como a omissão descarada da fundamentação da proposta inculca); 5ª O acto de nomeação é clara e afrontosamente ilegal, pelo que a providência se justifica per se, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA e, como tal, devia, ter sido, logo, deferida; 6ª E nem se diga que o recorrente não provou factos de que resulta dano para o hospital, pois que não se procedeu à inquirição das testemunhas arroladas, não obstante se terem feito démarches para a inquirição; 7ª E foi pena que não se tivesse feito a audiência, porque haveria a possibilidade de melhor esclarecimento do fundo da questão; 8ª A condenação como litigante de má fé confirma que não se compreendeu nem conhece o regime das carreiras médicas e a lei da gestão hospitalar; 9ª É óbvio que não há contradição entre uma informação técnica sobre uma assistente (hospitalar) para efeitos de concessão do regime da dedicação exclusiva das 42 horas e as exigências para a nomeação de um director de serviço, pois que no caso do assistente se trata de competência para a prática pessoal de actos médicos e no caso do director de serviço estão em causa, essencialmente, actos de gestão e de orientação do serviço e dos actos médicos a praticar pelos médicos do serviço.
(…).” Conclui no sentido da revogação da decisão recorrida e decretação da providência requerida “(…) liminarmente ou depois da produção de prova.
(…).” A entidade demandada, ora recorrida, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 179 e segs.
) nas quais pugna pela manutenção da decisão judicial recorrida formulando as seguintes conclusões: “(…) I. A douta sentença recorrida não padece de qualquer vício, não merece qualquer censura e o Recorrente louva-se nos seus fundamentos.
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Não se verifica o requisito previsto no artigo 120.º, n.º1, alínea a) do CPTA do fumus boni iuris e há probabilidade séria de a acção principal não ter qualquer sucesso.
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A legislação aplicável ao Recorrido (Entidade Pública Empresarial) é o Decreto-Lei 558/99, de 17.12 e o Decreto-Lei 233/2005, de 29.12.
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Atento o factualismo constante dos autos que aqui se reproduz por maior facilidade de exposição, inexiste periculum in mora – artigo 120.º, n.º1, alínea b) do CPTA.
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O Recorrente litiga com má fé. (…).” De igual modo a contra-interessada apresentou contra-alegações (cfr. fls. 173 e segs.
) concluindo nos termos seguintes: “(…) I. A douta sentença recorrida não padece de qualquer vício, improcedendo a alegação do recorrente.
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Não se verifica o requisito previsto no artigo 120.º, n.º1, alínea a) do CPTA do fumus boni iuris e há probabilidade séria de a acção principal não ter qualquer sucesso.
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Dos factos provados resulta inequivocamente que inexiste periculum in mora – artigo 120.º, n.º1, alínea b) do CPTA.
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A legislação aplicável ao Recorrido (Entidade Pública Empresarial) é o Decreto-lei 558/99, de 17.12 e o Decreto-lei 233/2005, de 29.12.
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O Recorrente litiga como recorrente com má fé. (…).” Termina sustentando a improcedência do recurso e a manutenção do julgado.
O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts.146.º e 147.º ambos do CPTA veio a apresentar parecer no qual se limita a suscitar questão da deficiente elaboração de conclusões (cfr. fls. 206/207), parecer esse que mereceu resposta do recorrente (cfr. fls. 216) e cuja questão foi desatendida pelo despacho de fls. 226.
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
*2.
DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”, pelo que os recursos jurisdicionais são “recursos de ‘reexame’ e não meros recursos de ‘revisão’” [cfr. Prof. J. C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições)”, 8ª edição, págs. 459 e segs.
; Prof. M. Aroso de Almeida e Juiz Cons. C. A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, pág. 737, nota 1; Dr.ª Catarina Sarmento e Castro em “Organização e competência dos tribunais administrativos” - “Reforma da Justiça Administrativa” in: “Boletim da Faculdade de Direito Universidade de Coimbra - Stvdia ivridica 86”, págs. 69/71].
As questões suscitadas e de que cumpre ainda decidir, após a prolação do despacho de fls. 226 resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão recorrida: A) Ao indeferir a providência cautelar requerida violou ou não o disposto no art. 120.º, n.º 1, al. a) do CPTA em conjugação com os arts. 41.º, n.º 3 do DL n.º 73/90, de 06/03 (redacção dada pelo DL n.º 396/93, de 24/11) e 15.º, n.º 1 do DL n.º 233/05, de 29/12; B) Ao indeferir a providência cautelar requerida violou ou não o disposto no art. 120.º, n.º 1, al. b) do CPTA; C) Ao condenar o recorrente como litigante de má-fé violou ou não, ao que subentendemos nós, o disposto no art. 456.º do CPC [cfr. conclusões supra reproduzidas].
*3.
FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: I) O Requerente/Autor é Chefe de Serviço Hospitalar da Especialidade de Otorrinolaringologia do Hospital de S. João (HSJ) e foi Director de Serviço do Serviço do Otorrinolaringologia do mesmo Hospital de 3 de Janeiro de 1983 a 31/12/2005 (art. 1.º do r.i., na parte não impugnada); II) O Requerente é também Professor Associado com Agregação da Faculdade de Medicina do Porto da Especialidade de Otorrinolaringologia, sendo que o Requerido HSJ é um hospital universitário, que ministra ensinamentos práticos aos alunos da Faculdade de Medicina, nos termos do protocolo aprovado pela Portaria n.º 320/86, de 27 de Junho (arts. 2.º e 13.º do r.i., não impugnados); III) O Requerente tem um curriculum ligado à Especialidade de Otorrinolaringologia de renome internacional, desde a inauguração da primeira unidade Cirúrgica Laser CO2 da Península Ibérica na Casa de Saúde da Boavista com a colaboração da Fundação Calouste Gulbenkian, à criação do Instituto da Voz com sede no Porto em Fevereiro de 1991 e de que tem sido o Presidente, à organização de várias reuniões científicas de carácter nacional e internacional, à Presidência das Sociedades Latinas de Otorrinolaringologia e da Associação Mundial World Voice Consortium, à participação em diversas associações científicas e em comissões e grupos de trabalho da Comissão Europeia, à obtenção de 9 prémios científicos e a 7 condecorações, com que foi agraciado (art. 3.º do r.i., não impugnado); IV) O Requerido, em reunião do Conselho de Administração de 04 de Abril de 2006, deliberou aprovar a proposta do Director Clínico de nomeação de todos os Directores de Serviço que integram a Unidade Autónoma de Gestão de Cirurgia, entre os quais a Dr.ª M... S... para Directora do Serviço de Otorrinolaringologia, conforme docs. juntos com o r.i. sob o n.º 1 e com a oposição da entidade demandada também sob o nº 1, que aqui dou por integralmente reproduzidos; V) A nomeada Dr.ª M… S… iniciou no Hospital Réu as funções de médica interna do internato complementar de otorrinolaringologia, em 05/01/1987, tendo concluído em 26/01/1991 o exame final do internato, com a classificação final de 19,4 (dezanove valores e quatro décimas), obtendo assim o grau de Assistente de Otorrinolaringologia, sendo que aquele exame constou de discussão de “curriculum vitae”, de prova prática e prova teórica, e foi Presidente do Júri o ora Autor (cfr. docs. 3 e 4 juntos com a oposição da entidade demandada, cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido); VI) Tal contra-interessada, nos dias 27, 28 e 29 de...
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