Acórdão nº 0712170 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelGUERRA BANHA
Data da Resolução27 de Junho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.

I 1. Nos autos de instrução que correm termos no .º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da comarca de Vila Nova de Famalicão com o nº …/04.1TAVNF, a assistente B………., LDA, não se conformando com o despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público, requereu a abertura de instrução contra os arguidos C………., sócios gerentes da sociedade D………., lda. E………. e F………., sócios gerentes da sociedade G………., lda, pretendendo que estes fossem pronunciados por factos que, em seu entender, constituíam a co-autoria de um crime de burla, da previsão do art. 217º do Código Penal, que lhe causara um prejuízo patrimonial superior a 25.000 euros.

  1. Por despacho proferido em 10-11-2006, a fls. 363-367, o Sr. Juiz rejeitou a abertura de instrução com os fundamentos seguintes: «(...) A assistente apresentou queixa criminal contra os arguidos C………. e H………., na qualidade de sócios gerentes da empresa D………., Lda, E………. e F………., na qualidade de sócios gerentes da sociedade G………., Lda, e ainda contra I………. .

    O Ministério Público deu início ao procedimento criminal, efectuando a investigação, onde constituiu formalmente como arguidos: - C………. (cfr. fls. 127); - H………. (cfr. fls. 131); - F………. (cfr. fls. 136); - E………. (cfr. fls. 141); - J………. (cfr. fls. 231); - K………. (cfr. fls. 236).

    Não foi formalmente constituído como arguido I………., em virtude de se desconhecer o paradeiro do mesmo.

    Finda a investigação, conforme referido, o Ministério Público determinou o arquivamento dos autos.

    Ora, tendo a assistente requerido a abertura de instrução, constata-se que a mesma descreve factualidade reportada a uma alegada burla, mencionando o envolvimento das cinco pessoas por si denunciadas e ainda de duas outras pessoas que no inquérito foram constituídas arguidas (as mencionadas J………. e K……….), mas pugna apenas pela prolação de despacho de pronúncia de quatro dessas pessoas, ou seja: não requer a pronúncia do I……….. (contra quem também apresentou queixa), nem da J………., nem da K………., quando descreve factualidade integrante de um crime de burla, previsto e punido pelo art. 217º, nº 1, do Código Penal, segundo a qualificação jurídica efectuada pela mesma, burla essa em que todas as pessoas teriam estado envolvidas.

    Ora, no caso em que o procedimento criminal depende de queixa, como é o caso do crime de burla, previsto e punido pelo art. 217º, nº 1, do Código Penal, à assistente impunha-se, porque em causa se encontra, inequivocamente, um caso de comparticipação, requerer a pronúncia de todos os arguidos supra mencionados e não apenas de parte dos mesmos.

    E nem se diga que os mesmos desconheciam essa factualidade material e processual.

    Efectivamente, por um lado, relativamente ao arguido I………., resulta inequívoco que logo na queixa por si deduzida, a assistente imputa matéria criminal, declarando expressamente desejar procedimento criminal contra este arguido.

    E relativamente às duas outras arguidas, embora não tenha apresentado qualquer queixa contra as mesmas, a assistente descreve, de forma inequívoca, matéria factual que as insere na comparticipação da burla.

    Ora, no caso dos autos, em que em causa se encontra um inconformismo com um despacho de arquivamento, a formulação de um requerimento de abertura de instrução, por parte da assistente equivale à dedução de uma acusação, que se pretende ver confirmada pelo Juiz de Instrução Criminal (razão pela qual, tal peça processual define e delimita o objecto dos autos).

    Na verdade, nos termos do art. 89º, nº 1, do Código de Processo Penal, a assistente tem acesso ao processo sempre que necessário para requerer a abertura de instrução, dentro do prazo a que alude o art. 287º, nº 1, do Código de Processo Penal, tanto mais que este requerimento corresponde a uma verdadeira acusação.

    Assim das duas uma: ou a assistente desconhecia os termos processuais porque não consultou, como se lhe impunha, os autos; ou então consultou e foi negligente nesse seu ónus.

    Afigura-se-nos inequívoco estarmos perante esta última situação, atendendo à própria apreciação da prova produzida em sede de inquérito que a assistente efectua, assim como da própria matéria factual sustentada no respectivo requerimento de abertura de instrução formulado pela mesma.

    Nesta sequência, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 116º, nºs 1 e 3, e 117º, ambos do Código Penal, aplicável por interpretação extensiva às situações de abertura de instrução subsequente a um despacho de arquivamento, a assistente terá praticado actos (por omissão: não pugnar pela pronúncia dos três mencionados arguidos, sendo certo que lhes imputa, também, a comparticipação na burla) que inequivocamente implicam uma renúncia à queixa, que aproveita aos quatro primeiros arguidos, verificando-se, assim, uma causa de extinção da responsabilidade criminal, que, no caso vertente, é sinónimo de inadmissibilidade legal da Instrução.

    Em conformidade com o exposto e ao abrigo das normas legais supra citadas, o tribunal decide: Julgar legalmente inadmissível o procedimento criminal em curso contra os arguidos C………. e H………., sócios gerentes da D………., Lda, e ainda dos arguidos E………. e F………., sócios gerentes da sociedade G………., Lda, e, nessa sequência, rejeitar o requerimento de abertura de instrução formulado pela assistente B………., Lda.

    Fixa-se a taxa de justiça devida em 2 (duas) UC a cargo da assistente, a compensar com o já pago, nos termos e com o alcance do art. 519º, nº 1, do Código de Processo Penal.» 3. A assistente também não se conformou com este despacho e recorreu para esta Relação, formulando as conclusões seguintes: 1º. A decisão recorrida julgou legalmente inadmissível o procedimento criminal contra os arguidos C………, H………., E……… e F………., rejeitando o requerimento de abertura de instrução, por entender que, tratando-se de um caso de comparticipação, a instrução deveria ser dirigida contra todos os arguidos, entendimento que se filiaria naquele outro de que a não dedução da instrução contra todos implicava a "renúncia queixa" contra os restantes.

    1. Resulta dos autos, nomeadamente do valor do prejuízo, referido na queixa - € 25.000,00 - e do despacho de arquivamento, que, no caso, se trata de burla qualificada.

    2. E tratando-se de um crime público, mesmo que, por hipótese, se aceitasse o entendimento vertido no despacho em crise, tal entendimento, em consequência, não seria aplicável no caso (nº 3 do art. 116º do C. Penal).

    3. Ainda que se tratasse de crime particular ou semi-publico (burla simples, art. 217º, nº 1, do C. Penal), não colheria o entendimento sustentado pelo Senhor Juiz, já que não ocorre qualquer "causa de extinção da responsabilidade criminal", ou seja, renúncia ou desistência de queixa.

    4. Quanto às arguidas J………. e K………., a queixa não foi contra elas dirigida por nenhum facto permitir sustentar, no entendimento da Recorrente, a sua comparticipação na burla, pelo que relativamente às mesmas não tinha a Recorrente que dirigir a instrução.

    5. Relativamente àquelas, as referências que na queixa lhes são feitas destinaram-se apenas a identificar as contas bancárias em que os cheques foram depositados.

    6. Nenhum facto foi alegado na queixa de que pudesse extrair-se a ideia de qualquer comparticipação.

    7. Daí que relativamente às arguidas não pudesse falar em renúncia à queixa.

    8. No que diz respeito ao denunciado I………., não foi contra si dirigido o requerimento...

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