Acórdão nº 0646817 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução09 de Maio de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO: Nos autos de inquérito nº …/06.7TAGDM, que correram termos pelos Serviços do Ministério Público de Gondomar, foi deduzida acusação contra B………., imputando-lhe a prática de um crime de burla para obtenção de serviços, p. p. pelo art. 220º, nº 1, al. c), do Código Penal.

Remetidos os autos para julgamento e distribuídos ao .º Juízo Criminal da comarca de Gondomar, o Mmº Juiz, conhecendo de questão prévia, rejeitou a acusação e determinou o oportuno arquivamento dos autos.

Inconformado, o M.P. interpôs recurso, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1ª) O Ministério Público deduziu acusação, para Julgamento em processo comum e com intervenção de tribunal singular, contra B………., pela prática de um crime de burla para obtenção de serviços, p. e p. pelo artigo 220º, nº 1, al. c), do Código Penal, imputando-lhe os seguintes factos: No dia 26 de Setembro de 2005, pelas doze horas e trinta e seis minutos, o arguido viajava no comboio nº ….., da empresa "Caminhos de Ferro Portugueses, EP", que realizava o percurso de Porto (S. Bento) para Penafiel, sem que estivesse munido de título de transporte válido que o habilitasse a efectuar aquele trajecto.

Ao ser detectado pelo revisor do comboio, ao Km 4,500, o arguido foi por este informado de que tinha o prazo de oito dias para proceder ao pagamento da quantia de € 50,00 (cinquenta euros), correspondente ao preço mínimo de cobrança fixado pela CP de acordo com o disposto no artigo 1º do Decreto-Lei nº 415-A/86 de 17 de Dezembro.

Contudo, o arguido não procedeu ao pagamento daquela quantia, nem nos oito dias seguintes nem posteriormente.

O arguido sabia que não podia viajar no comboio sem estar munido de título de transporte válido, actuando com a intenção de não liquidar o preço de utilização daquele meio de transporte, apesar de saber que a sua utilização pressupunha o pagamento prévio de um preço.

Agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei criminal.

  1. ) A Meritíssima Juiz entendeu que da factualidade imputada ao arguido se infere que não se mostra preenchido um dos elementos do tipo legal do artigo 220º do Código Penal e, interpretando literalmente o artigo 311º, nº 2, alínea a), e nº 3, alínea d), do Código de Processo Penal, decidiu rejeitar a acusação formulada pelo Ministério Público, por a considerar manifestamente infundada, com fundamento de que os factos descritos na mesma não constituem crime, determinando o oportuno arquivamento dos autos.

  2. ) Porém, os factos constantes da acusação deduzida pelo Ministério Público, a não integrarem o tipo legal do crime de burla para obtenção de serviços, como sustenta a Meritíssima juiz a quo no seu despacho, consubstanciam a prática, pelo arguido, de uma outra infracção penal, ou seja, da contravenção p. e p. pelos artigos 39º e 43º do Decreto-Lei 39 780, de 21 de Agosto de 1954 (Regulamento de Exploração e Polícia dos Caminhos-de-Ferro).

  3. ) Dispondo o artigo 2º do Decreto-Lei nº 17/91 de 10 de Janeiro, que regula o processamento e julgamento das contravenções e transgressões, que se lhe aplicam subsidiariamente as disposições do Código de Processo Penal, deveria a Meritíssima juiz ter feito, ao abrigo do artigo 9º, nº 1, do Código Civil, uma interpretação sistemática do artigo 311º nº 2, alínea a), e nº 3, alínea d), do Código de Processo Penal, no sentido de que a acusação deduzida pelo Ministério Público apenas seria manifestamente infundada se os factos dela constantes não constituíssem nem crime nem outra infracção penal, ou seja, contravenção, o que in casu não se verifica, já que na mesma constam factos que integram a referida contravenção.

  4. ) Pelo que, no seu despacho deveria a Meritíssima juiz conhecer as questões prévias de alteração da qualificação jurídica e da consequente alteração da forma de processo, e ter recebido a acusação pela prática da contravenção p. e p. pelos artigos 39º e 43º do Decreto-Lei 39 780 de 21 de Agosto de 1954 (Regulamento de Exploração e Polícia dos Caminhos-de-Ferro), e ter designado dia para julgamento da mesma, ao abrigo do artigo 11º do Decreto-Lei nº 17/91 de 10 de Janeiro (que regula o processamento e julgamento das contravenções e transgressões), e não, como fez, determinar o arquivamento dos autos.

  5. ) Ao considerar a acusação manifestamente infundada e rejeitar a acusação, determinando o arquivamento dos autos, a Meritíssima juiz violou os artigos 39º e 43º do Decreto-Lei 39 780 de 21 de Agosto de 1954 (Regulamento de Exploração e Polícia dos Caminhos-de-Ferro), o artigo 311º, nº 2, alínea a) e nº 3, alínea d), do Código de Processo Penal, interpretado sistematicamente no sentido de considerar acusação manifestamente infundada quando os factos não constituírem crime ou outra infracção penal (art. 9º, nº 1, do Código Civil), e os artigos 2º e 11º do Decreto-Lei nº 17/91, de 10 de Janeiro (que regula o processamento e julgamento das contravenções e transgressões).

Assim, deverão Vossas Excelências dar provimento ao presente recurso, ordenando a substituição do despacho recorrido por outro que, conhecendo da questão prévia da alteração da qualificação jurídica e alteração da forma de processo, receba a acusação pela prática da contravenção p. e p. pelos artigos 39º e 43º do Decreto-Lei 39 780 de 21 de Agosto de 1954 (Regulamento de Exploração e Polícia dos Caminhos-de-Ferro) e designe dia para julgamento da mesma em processo...

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