Acórdão nº 0617261 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO DIAS
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO 1. No inquérito nº ……/03.4JAPRT, em 13/11/2003, deferindo promoção do Ministério Público, o Sr. Juiz de instrução proferiu o seguinte despacho decisório (fls. 12 destes autos de recurso): "Compulsados os presentes autos, há fortes indícios de que na(s) residência(s) situada na Rua ……., nº ….., ….., no Porto, pertencente a um tal "B………..", se ocultem produtos e/ou objectos relacionados com o crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21 do DL nº 15/93 de 22/1 em investigação nos presentes autos ou que com este estejam relacionados.

Assim, nos termos dos arts. 269, 174 e 177 com as formalidades previstas no art. 176º, todos do C.P.Penal, autorizo que se proceda a uma busca à(s) citada(s) residência(s), para eventual apreensão daqueles artigos, dispensando a minha presença por me encontrar impedida com outras diligências neste Tribunal.

Extraia cópia autenticada desde despacho.

Prazo: o reputado por conveniente.

Notifique e devolva." 2. A mencionada busca domiciliária veio a ser realizada, por inspectores da Polícia Judiciária, Directoria do Porto, em 29/11/2005, entre as 13h10m e as 13h45m, na presença do visado C…………., ao qual foi entregue cópia do respectivo mandado de busca, conforme consta do respectivo auto de busca e apreensão (fls. 19 destes autos de recurso, correspondente a fls. 329 dos referidos autos de inquérito), sendo apreendidos os objectos e produto ["oito embalagens contendo um produto que se presume tratar-se de haxixe (…) uma balança digital de precisão, de marca Balvi mod. EK5055"] aí indicados.

  1. Na sequência da busca domiciliária, o arguido foi detido e submetido a primeiro interrogatório judicial (fls. 28 a 37 destes autos de recurso, correspondentes a fls. 343 a 354 dos autos de inquérito).

  2. Findo o primeiro interrogatório judicial do arguido detido C…………… foi, em 30/11/2005, proferido (no que aqui interessa), o seguinte despacho judicial (cf. fls. 35 destes autos de recurso): "Nos termos do disposto nos arts. 174 nº 1 e nº 4-b) do ex vi do nº do art. 177º ambos do Código de Processo Penal, declaram-se válidas, para todos os efeitos legais, a busca efectuada, devidamente autorizada no auto de fls. 329, bem assim, validadas as apreensões efectuadas. (…)".

  3. O despacho judicial supra referido na sequência do interrogatório judicial do arguido, foi notificado nessa mesma data ao próprio arguido e ao seu mandatário, subscritor do recurso aqui em apreço.

  4. Em 29/3/2006 foi deduzida acusação contra o arguido C………….., nos moldes que constam de fls. 48 a 55 destes autos de recurso, sendo-lhe imputada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art. 21 nº 1 do DL nº 15/93 de 22/1, com referência à Tabela I-C anexa ao referido diploma legal, cometido no período compreendido entre pelo menos Outubro de 2003 e 29/11/2005.

    Foi alegado, além do mais, na peça acusatória que, durante a realização da busca domiciliária supra referida, foram apreendidos "20 (vinte) placas de um produto vegetal prensado, com o peso líquido de 3.938,460 g. (três mil novecentos e trinta e oito vírgula quatrocentos e sessenta gramas), laboratorialmente identificado como Canabis (resina) - numa das placas estava um vestígio digital correspondente ao dedo médio do arguido, uma balança digital de precisão, marca "Balvi", modelo EK 5055 (…)", acrescentando-se que "o arguido destinava à venda a totalidade do sobredito produto estupefaciente" apreendido na sua residência".

    Entre as provas indicadas que interessam à decisão deste recurso, constam as que foram obtidas através da busca domiciliária supra mencionada e respectiva prova pericial.

  5. Em 3/5/2006, o arguido C…………. requereu a abertura de instrução nos moldes que constam de fls. 56 a 65 destes autos de recurso.

    Nesse requerimento, além do mais, arguiu a nulidade das buscas efectuadas nos seguintes termos: "II - DA NULIDADE DAS BUSCAS EFECTUADAS 29. No dia 29 de Novembro de 2005, foi efectuada pelos agentes da Polícia Judiciária do Porto, uma busca ao domicílio do arguido, sita na Rua ……….., n° ….., ….., onde foram efectuadas as apreensões que constam do auto de fls., e que se encontram descritas na acusação.

  6. A referida diligência foi ordenado por despacho proferido pelo JIC, no passado dia 13 de Novembro de 2003.

  7. Não obstante, e apesar de a realização da diligência estar devidamente autorizada desde Novembro de 2003, certo é que a mesma apenas foi realizada em finais do ano de 2005, mais concretamente em 29 de Novembro.

  8. Ora a diligência em causa - Busca Domiciliária - para ser validamente efectuada depende da verificação dos requisitos formais fixados pelo artigo 177.° do Código de Processo Penal.

  9. Entre esses requisitos e para aquilo que agora importa, está a dependência de autorização da autoridade judicial competente para a realização da diligência em causa, ou seja é necessário um despacho que a autorize.

  10. Efectivamente existe um despacho a autorizar a realização da diligência, só que o mesmo foi emitido dois anos antes da realização da diligência.

  11. O JIC autorizou a realização da diligência em Novembro de 2003, e esta apenas se veio a realizar em Novembro de 2005, ou seja, mais de dois anos depois da autorização ter sido concedida.

  12. Acontece que, e de acordo como o disposto no artigo 276.° do Código Processo Penal, a investigação tem a duração máxima, no caso de não haver arguidos presos, de oito meses, findo os quais, o Ministério Publico terá que deduzir acusação ou arquivar o processo.

  13. O que não aconteceu nos presentes autos, ou seja, não obstante ter decorrido o prazo máximo para a realização do inquérito, não foi deduzida acusação, nem arquivado o processo, tal como impõem o referido preceito.

  14. Muito pelo contrário, aquilo que sucedeu nos presentes autos foi que mesmo depois de decorrido o prazo máximo de duração do inquérito, continuou a investigação, sem que dos autos conste qualquer autorização judicial nesse sentido.

  15. Tendo sido utilizado um despacho proferido durante o inquérito, para realizar uma diligência - Busca Domiciliária - muito para além daquilo que seria o prazo máximo do inquérito. 40. O que tem como consequência directa e necessária a caducidade do despacho que a autorizou a realização da diligência em causa.

  16. Assim sendo, e de acordo com o disposto nos artigos 118.n.° 3 e 126° ambos do Código de Processo Civil, as provas obtidas através de um método proibida são totalmente inúteis, e nessa conformidade não pode ser utilizadas. (…)" 8. Aberta a instrução (que assumiu o nº …../03.4JAPRT), em 10/10/2006, foi proferida decisão instrutória (fls. 463 a 471, correspondentes a fls. 75 a 83 destes autos de recurso), na qual, além do mais, se conheceu da arguida nulidade da busca domiciliária, nos seguintes termos: "II - Da alegada nulidade da busca domiciliária: A busca domiciliária à residência do arguido, sita na Rua ……, …., …., Porto, foi autorizada, por despacho judicial de 13/11/2003, mas só veio a concretizar-se no dia 29/11/2005. Convenhamos que a situação não é muito comum, um inquérito decorrer durante mais de dois anos, com mandados de busca já emitidos para a residência do principal suspeito. O certo é que os mandados de busca não estabeleceram um prazo para o seu cumprimento, deixando à autoridade policial e ao Ministério Público plena autonomia para a execução dos mandados no momento que reputassem conveniente, de acordo com a estratégia e eventuais condicionalismos da investigação.

    As disposições legais relativas à busca domiciliária não estabelecem um prazo de duração ou de caducidade da autorização judicial para a busca, e os prazos processuais para actos das autoridades de investigação não se revestem de natureza peremptória.

    A nulidade só ocorre quando a lei expressamente prevê essa consequência - artigo 118.°, n.° 1, do Código de Processo Penal - o que não se verifica num caso como o dos autos, em que a autorização judicial para a busca não estabeleceu um prazo para a realização da mesma, em face das disposições legais aplicáveis dos artigos 174.° a 177.°, e 103.° a 106.° do Código de Processo Penal.

    O Supremo Tribunal de Justiça já teve oportunidade de afirmar o entendimento que "não tendo o juiz de instrução prescrito um prazo para a efectiva realização da diligência, ela pode sempre vir a ter lugar até à conclusão do inquérito" (Acórdão de 16/02/1994).

    Assim, e na esteira do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 5/11/2003, publicado, como o anterior, em www.dgsi.pt, consideramos que o juiz de instrução não tem que fixar um prazo de validade para a autorização judicial para a busca, devendo a mesma manter-se, independentemente do decurso do tempo, desde que subsistam os pressupostos que fundamentaram a realização da diligência. No caso dos presentes autos, como naquele que foi objecto do referido acórdão da Relação, mantinham-se esses pressupostos: o suspeito residia no local a buscar e existiam indícios que nesse mesmo local poderiam ser encontrados, como foram, produtos estupefacientes e outros objectos com interesse para a prova. A situação que justificou a autorização judicial para a busca continuava a existir, mesmo decorridos dois anos, confirmando-se assim que o indiciado tráfico era uma actividade continuada no tempo. Consequentemente, julga-se improcedente a invocada nulidade." 9. Inconformado com essa decisão judicial, o arguido C…………… dela interpôs recurso (fls. 86 a 93 destes autos de recurso), formulando as seguintes conclusões: "A - A busca realizada ao domicilio do arguido foi efectuada mais de dois anos após ter sido proferido o despacho que autorizou a sua realização.

    B - Ou seja, o despacho judicial a autorizar a realização da diligência foi proferido em 13 de Novembro de 2003, sendo a diligência realizada em 29 de Novembro de 2005.

    C - A Lei faz depender a validade deste acto, da prévia autorização do Juiz, o qual deve verificar se estão reunidos os pressupostos que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT