Acórdão nº 0610447 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelGUERRA BANHA
Data da Resolução19 de Julho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam em audiência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.

I RELATÓRIO 1. B........., assistente nos autos de processo comum nº .../04.0GAPVZ, que correm termos pelo .º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Póvoa de Varzim, interpôs o presente recurso da sentença proferida a fls. 136-146, que decidiu: a. Abster-se de conhecer do mérito da causa quanto ao crime de dano imputado aos arguidos C.......... e D.........., por ilegitimidade do Ministério Público em deduzir a acusação, por se tratar de crime cujo procedimento dependia de acusação particular da assistente, que não foi deduzida; b. Absolver os arguidos E.........., C.......... e D.......... do crime de ofensa à integridade física simples, da previsão do art. 143º, nº 1, do Código Penal, por que estavam acusados em co-autoria; c. Absolver o arguido E.......... do crime de dano, da previsão do art. 212º, nº 1, do Código Penal, por que também estava acusado em co-autoria com os restantes dois arguidos; d. absolver os três arguidos do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente, no montante global de € 5.645,00.

Da motivação do seu recurso extraiu as seguintes conclusões: 1º. A assistente não se conformando com a sentença absolutória vem dela recorrer da matéria de facto e de direito, nos termos do artigo 412º do CPP.

  1. O Tribunal "a quo" na leitura da sentença considerou como questão prévia que o crime de dano imputado aos arguidos C.......... e D.......... é um crime particular, um vez que são irmãos e cunhado da assistente, e absteve-se de conhecer do mérito da causa quanto a esse crime em relação a estes dois arguidos.

  2. O artigo 338º nº 2 do CPP refere que "a discussão das questões referidas no número anterior deve conter-se nos limites de tempo estritamente necessários, não ultrapassando, em regra, uma hora".

  3. O tribunal "a quo" na audiência de discussão e julgamento, ao detectar esta questão prévia, deveria ter-se pronunciado na própria audiência, e não somente na leitura de sentença.

  4. Logo, houve violação do artigo 338º, nº 2, do CPP.

  5. O Tribunal "a quo" deveria conhecer do mérito da causa relativamente ao crime de dano, contra os arguidos C.......... e D.........., como também do pedido cível contra eles formulado.

  6. O arguido C.......... referiu que houve uma discussão entre todos os arguidos e a assistente e que o arguido E........... deu um empurrão na sua tia (assistente).

  7. O testemunho da assistente confirmou os factos constantes da acusação pública.

  8. Todas as testemunhas de acusação confirmaram os factos constantes na acusação.

  9. A testemunha de defesa F.......... referiu que ouviu a discussão e viu a assistente a ser transportada de ambulância ao hospital, depois da contenda terminar.

  10. A outra testemunha de defesa G.......... referiu que houve empurrões por parte do E.......... (seu irmão) à assistente (sua tia).

  11. O Tribunal "a quo" deu como provado que a assistente foi assistida no M.........., no serviço de urgência, no dia 21 de Outubro de 2004.

  12. Houve erro notório na apreciação da prova pelo Tribunal "a quo" ao considerar apenas relevante para a formação da sua convicção o depoimento do arguido C.......... e da assistente.

  13. Pelo depoimento das testemunhas inquiridas em sede do julgamento conclui-se que os arguidos cometeram os crimes de que eram acusados.

  14. Devem ser transcritos os depoimentos prestados em julgamento, a fim de se verificar que tendo em conta os depoimentos prestados houve incorrecção por parte do Tribunal "a quo" na formação da sua convicção para a decisão da causa.

  15. O Tribunal "a quo" ao absolver os arguidos, violou as normas do artigo 143º, nº 1, e 212º, nº 1, ambos do Código Penal.

Pretende, assim, que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que condene os três arguidos como co-autores dos crimes de dano, da previsão do art. 212º, nº 1, do Código Penal, e de ofensa à integridade física simples, da previsão do art. 143º, nº 1, do Código Penal, bem como no pedido civil deduzido pela assistente, por danos patrimoniais e não patrimoniais, no montante global de € 5.645,00.

  1. Admitido o recurso, responderam o Ministério Público e os arguidos, concluindo ambos pelo não provimento do recurso.

  2. Nesta Relação, o ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer que consta a fls. 198-201, em que também concluiu no sentido de que o recurso não merece provimento.

    Foi cumprido, quanto a este parecer, o preceituado no nº 2 do art. 417º do Código de Processo Penal, e nenhuma resposta foi apresentada.

    Os autos foram a visto dos ex.mos Juízes adjuntos e, após, realizou-se a audiência de julgamento.

    II FUNDAMENTOS DE FACTO 4. Na sentença recorrida foram considerados provados os factos seguintes: 1) No dia 21 de Outubro de 2004, pelas 19:00 h, dentro do logradouro das casas onde habitam, sita na Rua .........., .........., Póvoa de Varzim, na sequência de desentendimentos relativos a partilhas os arguidos e a ofendida envolveram-se em contenda.

    2) A ofendida B.......... foi assistida no M.........., no SU, no dia 21-10-2004, sendo que os encargos decorrentes dessa assistência hospitalar importaram a quantia de €53,40.

    3) Os arguidos não têm antecedentes criminais.

  3. E foram considerados não provados os factos seguintes: - que na ocasião e lugar referidos no item 1) da factualidade apurada os arguidos agrediram a ofendida B.......... com murros e pontapés; - que os arguidos tenham causado à ofendida as lesões referidas a fls. 15, designadamente escoriação com 20 por 5mm de maiores dimensões ao nível do ângulo esquerdo da mandíbula, equimose no pescoço com 1cm de diâmetro na face lateral esquerda, equimose com 2cm de diâmetro na face posterior do hemitórax direito e equimose com 4cm na face posterior do hemitórax esquerdo, equimose com 6cm de diâmetro com escoriação central ao nível do ombro; - que os arguidos agiram em conjugação de esforços e acordo de vontades com o propósito conseguido de atingirem corporalmente a assistente; - que ao ser atingida pelos murros infligidos pelo arguido E.........., os óculos graduados usados pela ofendida foram partidos, causando-lhe um prejuízo de € 480,00.

    - Não resultaram provados quaisquer outros factos quer por se encontrarem em contradição com os presentes, quer por constituírem simples conceitos de direito ou meros juízos conclusivos, nomeadamente os relativos aos elementos subjectivos e os constantes do pedido cível.

  4. O tribunal recorrido fundamentou a sua decisão sobre a matéria de facto provada e não provada nos seguintes termos: «Os arguidos E.......... e D.......... não prestaram declarações.

    O arguido C.......... negou os factos que lhe são imputados e disse que não houve qualquer agressão da sua parte e dos demais arguidos à ofendida, tendo porém discutido entre todos. Mais afirmou que têm problemas de relacionamento com a sua irmã devido a questões familiares de partilhas e que, por isso, muitas vezes discutem entre si. Por fim referiu que quem assistiu aos factos foi a sua filha mais nova. Ou seja, confirma que houve discussão mas tão somente troca de palavras e que os ânimos estavam exaltados, tendo o arguido E.......... empurrado a tia, mas esta não caiu no solo nem a magoou.

    A ofendida B.......... corrobora apenas em parte e de forma confusa a versão contida na acusação. Desde logo começa por dizer que a sua cunhada, a arguida D.......... lhe tinha dito que ia cortar a luz mas não fez caso. Posteriormente apareceu o arguido E.......... e deu-lhe um murro na testa, e "dois biqueiros" nas costas, depois os outros arguidos juntamente com o E.......... empurraram-na contra a parede e que estes dois não lhe bateram com murros e pontapés, apenas a seguraram para o filho lhe bater. Posteriormente referiu que os três arguidos lhe bateram com a cabeça contra a parede. Mais referiu que não houve qualquer discussão nem que estavam a discutir por causa das partilhas. Por fim, disse que quando a testemunha H.........., seu companheiro, abriu a porta da cozinha os arguidos terminaram de imediato a agressão mas admite a hipótese de esta testemunha ter assistido através do vidro da porta. Mais disse, por fim, que a testemunha F.......... e a testemunha I.......... "pelos vistos" também assistiram.

    Ora, estas últimas testemunhas mantiveram um depoimento contraditório e mesmo apresentando contradições em relação à versão apresentada pela ofendida. O primeiro diz que viu o arguido E.......... dar um murro na ofendida mas não viu mais nada, enquanto que a última testemunha disse que viu os arguidos E.......... e C.......... a baterem na ofendida. Nomeadamente a testemunha I.......... prestou um depoimento titubeante, confuso, contradizendo-se a si própria e às leis da física, demonstrando estar zangada com a arguida D.........., não demonstrando qualquer isenção nem credibilidade.

    A testemunha J.........., vizinho, disse estar na sua casa quando ouviu discussão e que não viu qualquer agressão, apenas troca de palavras.

    A testemunha H.........., companheiro da ofendida, disse ter chegado do trabalho e que depois assistiu aos factos, mas de dentro da casa. Ninguém o viu cá fora apenas no fim da contenda. Não mostrou isenção e por isso não se mostra o seu depoimento credível.

    Assim sendo, temos a versão do arguido C.......... que admite que houve uma discussão, mas nega quaisquer agressões por parte dos arguidos.

    Temos a versão da ofendida que corrobora em parte a acusação acrescentando pontos.

    Tais declarações valem o que valem e não podemos valorar umas mais do que outras.

    O exame médico-legal como elemento objectivo de prova que é, não é bastante para afastar qualquer dúvida que advenha das versões contraditórias apresentadas.

    Tudo isto criou grandes dúvidas quanto à positividade da prova no que tange aos factos da acusação.

    Concluindo, diremos que terá havido, efectivamente, uma contenda. No entanto, a prova produzida na audiência de julgamento não nos permite concluir com absoluta segurança que os arguidos tenham levado a...

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