Acórdão nº 178/04.4IDACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Março de 2007

Data28 Março 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, na secção criminal, do tribunal da Relação de Coimbra: I. – Relatório.

No processo supra epigrafado foram os arguidos/demandados: A...

, com o NIPC nº 501 947 043, com sede na X..., Alcobaça; B..., filho de ...... e de ....., natural de Cadaval, nascido a 26 de Março de 1955, casado, industrial, residente na Rua Y...; C...

, filha de ..... e de ......, natural da Benedita, nascida a 6 de Julho de 1957, casada, doméstica, residente na Rua Y..., condenados, em co-autoria, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 105º 1, 4 e 6º 1 da Lei 15/2001 de 5 de Junho, respectivamente: a) A.... na pena de 320 (trezentos e vinte) dias de multa à taxa diária de €10 (dez euros) num total de €3200 (três mil e duzentos euros); b) B na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa à taxa diária de €7 (sete euros) num total de €1120 (mil cento e vinte euros) a que correspondem, subsidiariamente, 106 (cento e seis) dias de prisão nos termos do disposto no art. 49º do Código Penal; c) C na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa à taxa diária de €3 (três euros) num total de €480 (quatrocentos e oitenta euros) a que correspondem, subsidiariamente, 106 (cento e seis) dias de prisão nos termos do disposto no art. 49º do Código Penal; e relativamente ás contra-ordenações que lhe eram imputadas, respectivamente: a) A....

, pela prática de uma contra-ordenação p. e p.

pelos art.s 109º e 112º do CIRC e art. 116º do RGIT na coima do montante de €750 (setecentos e cinquenta euros); b) A....

, pela prática da contra-ordenação p. e p. pelos art.s 115º do CIRC e 113º do RGIT, na coima de €1500 (mil e quinhentos euros); c) A.... pela prática da contra-ordenação ao art. 98º do CIRC e punível pelo art. 114º do RGIT na coima de €4000 (quatro mil euros); d) a A...., em cúmulo material na coima única de €6250 (seis mil duzentos e cinquenta euros), nos termos do art. 25º do RGIT.

Na procedência do pedido civil que o Estado português havia deduzido contra os demandados foram os supra indicados demandados: A...., B e C condenados a pagar, solidariamente, ao Estado Português a quantia de €14.135,83 (catorze mil cento e trinta e cinco euros e oitenta e três cêntimos), acrescidos de juros legais desde a data da notificação para contestar o pedido de indemnização civil, até integral pagamento, tendo sido absolvidos quanto ao demais.

Dissentindo do decidido, impugna o distinto magistrado do Ministério do Público a decisão prolatada, tendo despedido a motivação em que verte a sua argumentação no sequente acervo conclusivo: «1ª- Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que condenou os arguidos B e C, pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, nos termos os dos artigos 14º, nº 1, 26º, 30º, nº 2 e 79º, todos do Código Penal, de 1 (um) crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. no artigo 105º, nºs. 1, 2, 4 e 6, do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei na 15/2001, de 5 de Junho, respectivamente, nas penas de 320 (trezentos e vinte) dias de multa, à razão diária de 10,00 € (dez Euros), o que perfez a multa global de 3.200,00 € (três mil e duzentos Euros) e de 160 (cento e sessenta) dias de multa à razão diária de 7,00 € (sete Euros), o que perfez a multa global de 1.120,00 €, (mil cento e vinte Euros).

  1. - Entende o Ministério Público que as penas nas quais os arguidos foram condenados deveriam ter sido as de prisão, suspensas na sua execução, mas condicionadas ao pagamento, pelos mesmos arguidos, ao Estado Português Administração Fiscal, do montante dos benefícios indevidamente obtidos; 3ª - Sendo cada vez mais crescente e presente "a banalização" e, por isso, demonstrados e conhecidos os elevados índices de criminalidade fiscal, tendo-se ainda em conta que são prementes as exigências de prevenção, quer geral, quer especial, exige-se firmeza de atitude, no confronto com a realidade actualmente patenteada nos tribunais" "e isso consegue-se de modo particularmente adequa o e eficaz com as penas de prisão"; 4ª - Razão pela qual, entende o Ministério Público que a douta Sentença a quo deveria ter aplicado aos arguidos, por serem ajustadas e equilibradas, pela prática do mencionado crime de abuso de confiança fiscal, na, forma continuada, a cada um deles, a pena de 20 (vinte) meses de prisão; 5ª - Ao assim não ter decidido, violou a douta sentença a quo o disposto nos artigos 40º, 70º e 71º, todos do Código Penal; 6ª - Penas de prisão essas que - tendo-se em conta a personalidade dos arguidos, as suas condições de vida, as condutas anteriores e posteriores ao facto punível e as circunstâncias deste mesmo facto, o percurso de vida os mesmos, a par das suas condições pessoais, económicas e sociais denotam um quadro manifestamente positivo de inserção social, de molde a justificar como razoável um juízo e prognose positiva no sentido de que a censura do facto e a ameaça da prisão serão suficientes para realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição - deverão ser: a) Ser suspensas, na sua execução, pelo período de 3 (três) anos, nos termos do disposto no artigo 50º, nºs. 1 e 5, do Código Penal e 14º, nº 1, do R.G.I.T.; b) Com a condição de esses mesmos arguidos procederem, no mesmo prazo de 3 (três) anos, ao pagamento ao Estado Português - Administração Fiscal, no mesmo prazo de 3 (três) anos subsequentes ao trânsito em julgado do douto Acórdão a proferir, da quantia de 14,783,19 € (catorze mil, setecentos e oitenta e três Euros e dezanove Cêntimos), de forma faseada, nos termos dos artigos 50º, nº 2, 3 e 4, 51º, nº 1, al. a), ambos do Código Penal e 14º, nº 1, do R . G.I.T., da quantia anual, no valor de 4,711,94 € (quatro mil setecentos e onze Euros e noventa e quatro Cêntimos); c) Devendo os arguidos vir aos Autos, anual ente por referência ao prazo referido em b), fazer prova dos pagamentos efectuados ao Estado Português Administração Fiscal.

  2. - Ao assim não ter decidido, violou a douta sentença a quo o disposto nos artigos 50º, nºs, 1 a 5 e 51º, nº 1, al. a), do mesmo Código, bem assim, o disposto no artigo 14º, nº 1, do RGIT; 8ª - Pelo que a douta Sentença a quo deverá ser substituída por outra que condene os arguidos nos termos acima exarados.

  3. - No exercício da acção penal e consequente formulação de pedido cível formulado, o qual tem por fundamento ou causa de pedir a prática de um crime, o Ministério Público está objectivamente isento de custas; 10ª - Ao ter não isentado o Estado Português do pagamento das custas devidas pelo decaimento relativamente ao pedido cível formulado, violou-se na douta Sentença a quo o disposto no artigo 2º, nº 1, al. a), do Código das Custas Judiciais, o disposto nos artigos 3º, nº1, als. a) e e) e 5º, nº 1, al. a), ambos da Lei nº 60/98, de 27 de Janeiro, por referência aos artigos 7º, 71º, 76, nº 3 e 77º, nº 1, todos do Código do Processo Penal».

Nesta instância o Exmo. Senhor Procurador-geral Adjunto é de parecer que: «Começando pela discordância do Exmo. magistrado recorrente relativa à decisão que condenou o Estado nas custas pelo decaimento parcial do pedido cível adrede à presente acção penal, o que sobre ela se nos oferece é que não é assim tão claro e é até muito duvidoso seu acolhimento legal favorável.

E isto na consideração de que, como defende Salvador da Costa (in CCJ Anotado), a isenção a que se refere o artigo 2,º nº 1, al. a) do das Custas Judiciais não se reporta à actividade judiciária que o Ministério Público desenvolve no âmbito da representação o Estado, ou de outras pessoas colectivas de direito público ou de particulares a quem o Estado Colectividade deva protecção, mas às acções e/o procedimentos para os quais dispõe de legitimidade própria, de que são exemplos, entre outras, as acções de investigação de maternidade e paternidade e as execuções multas ou coimas, o que manifestamente não é o caso dos autos.

De igual modo dúvidas temos em perfilhar entendimento expresso por esse mesmo magistrado quanto à necessidade e, para a realização dos fins da punição, se não quedar por simples penas d multa e se avançar para aplicação aos arguidos de penas de prisão, a que suspensas na sua execução mas condicionadas ao pagamento benefícios indevidamente obtidos (artigo 14º, nº 1 do RGIT).

É que, embora razões de prevenção geral possam existir, face à banalização da prática de ilícitos da natureza do ora implicado (abuso de confiança fiscal), desde logo na região de Leiria, que tem vindo a expressar um elevado índice de criminalidade fiscal, ao que parece em sectores mais expostos à concorrência internacional e às consequências do mercado globalizado, ainda assim, e até por isso, falece, a nosso ver, proporcionalidade e adequação a um maior rigor punitivo. E isto considerando o desvalor relativo dos actos em causa, que relevam de um incumprimento de valores não muito elevados (daí a incriminação do nº 1 e não nº 5 do artigo 105º do RGIT) e o facto de estarmos perante delinquentes primários, bem integrados que nenhum aproveitamento pessoal tiveram do incumprimento dos deveres fiscais a que, como responsáveis pela empresa, estavam obrigados e que, algo censuravelmente, procuraram gerir - com algum facilitismo, é certo - uma conjuntura já de si difícil se não mesmo insuperável.

Por isso que o nosso parecer vai assim no sentido do improvimento».

A dissensão manifestada e que constituía o miolo do sentido centrava-se em duas questões concretas, a saber: a) – Individualização judicial da pena; b) – responsabilidade pelas custas proporcionais ao decaimento no pedido civil, por parte do demandante Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional. E dissemos “centrava-se”, porque entretanto veio a ser dado à estampa a Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, vulgarmente apodada de “orçamento do Estado para 2007” que produziu alterações ao tipo de ilicito desenhado no artigo 105º do RGIT. A alteração produzida, nomeadamente, o aditamento de uma nova alínea ao n.º 4 do...

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