Acórdão nº 226/06 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Setembro de 2006
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 27 de Setembro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
No processo n.º 18/05.7GECBR que corre termos no DIAP de Coimbra e tendo em vista a suspensão provisória do processo, o Ministério Público remeteu os autos ao Mm.º Juiz de Instrução para efeitos do disposto no art.º 281.º, n.º 1 do Código de Processo Penal [ Diploma de que serão as disposições a referir sem menção de origem] que declarou a sua discordância com a proposta apresentada.
Inconformado com o decidido, vem o Ministério Público impugná-lo, concluindo assim a respectiva motivação: 1.º “Nos termos do disposto no art.º 281.º n.º 6 do CPP e por se entender que as circunstâncias do caso e suas características não eram de molde a que prosseguisse a acção, pronunciou-se o MP, com base no requerimento da vítima, pela suspensão dos autos pelo prazo de 8 meses, sem que se tenha tomado em consideração os pressupostos do n.º 1 do artº 281° do CPP.
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O Meritíssimo Juiz de Instrução do Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra proferiu, nos referenciados autos, despacho, onde discordou do requerimento de suspensão provisória do inquérito, alegando que, "embora à primeira vista se apresentem como preenchidos quase todos os pressupostos para que se possa decidir pela suspensão provisória, um se mostra ausente, cujo é a ausência de antecedentes criminais do arguido", ou seja, que tendo o arguido antecedentes criminais, não se verifica assim um dos requisitos do n.º 2 do artº 281.º do CPP, o que desde logo inviabiliza o recurso ao mecanismo da suspensão provisória do processo 3.° Porém, em nosso entendimento, a decisão em crise não aplicou o direito de forma correcta, por não ser a que melhor se adequa ao tipo legal e à própria mens legislatoris 4.° Com a publicação da Lei 7/2000 de 27 de Maio, que atribuiu natureza pública ao ilícito, foi introduzido no corpo do artº 281.º do CPP o seu actual n° 6, que prevê que o MP "pode ainda decidir-se, sem prejuízo do disposto no n.º 1, pela suspensão provisória do processo a livre requerimento da vítima, tendo em especial consideração a sua situação e desde que ao arguido não haja sido aplicada medida similar por infracção da mesma natureza " Com a expressão "sem prejuízo do disposto no n° 1 "pretendeu o legislador autonomizar a suspensão do inquérito nos termos do n.º 6, dos requisitos do n.º 1 do art° 281.º do CPP, ou seja, a intenção do legislador foi a de que, em inquéritos onde se indicie a prática de crimes de maus-tratos entre cônjuges, o M P "sem prejuízo de que", caso se verifiquem os requisitos do n.º 1 (e a vítima nada requeira) possa propor ele próprio a aplicação do instituto da suspensão provisória do processo (como já podia,) poder propor, também, caso exista livre requerimento da vitima, a suspensão do inquérito, tendo somente em consideração os requisitos do n° 6, estes substancialmente menos exigentes.
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Não obstante a natureza pública do crime, são os interesses da vítima que estão sobretudo em jogo e a iniciativa em requerer, livremente, a suspensão do inquérito corresponderá, a maior parte das vezes, a um menor desvalor do resultado, que faz atenuar as necessidades de intervenção do direito penal, pelo que a verificação dos requisitos do artº 281° n.º 6, só por si, garante os fins de protecção da vítima e de condenação social e efectiva da conduta 7 ° A interpretação da norma nos termos em que o M.mo Juiz o faz levaria a que, sem o requerimento da vítima, fosse necessária a averiguação dos requisitos do n.º 1 do artº 281 ° do CPP (cinco) e com o referido requerimento e consequente diminuição da necessidade da intervenção penal, os cinco requisitos passassem para oito, dificultando, ou mesmo inviabilizando, a aplicação do instituto que de semi-público passaria a ter, para além da natureza pública, uma muralha de protecção quase inexpugnável.
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Na verdade, só esta interpretação das normas conflituantes permite o necessário o compromisso entre a natureza pública do crime e as exigências e interesses da mulher, (caso a sua vontade seja livre e esclarecida).
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Assim, na sequência da tese que perfilhamos e que foi consagrada pelo legislador, a suspensão a requerimento da vitima conforme o n.º 6 do art.º 281° do CPP mais não será do que "uma válvula de escape do sistema criado e que nela se insere" pois, sem pôr em causa natureza pública do crime, permite harmonizar os sensíveis interesses conflituantes, conferindo assim a este tipo legal uma natureza pública sui generis.
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Assim, salvo o devido respeito por opinião contrária, deveria o Mm.º JIC ter dado o seu aval à...
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