Acórdão nº 07A402 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Março de 2007
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 13 de Março de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "AA e Companhia (Filhos), SA", com sede em Leça da Palmeira, Matosinhos, intentou acção, com processo ordinário, contra " BB SA" (antes designada por "A... E... Agriculos, SA") com sede em Madrid, Espanha, pedindo a sua condenação a pagar-lhe, a titulo de indemnização, 155 264, 03 euros, por danos patrimoniais e não patrimoniais, pela responsabilidade pré-contratual da Ré.
Alegou que a ré incorreu em responsabilidade aquando das negociações encetadas entre ambas, com vista à aquisição pela autora da totalidade das acções da sociedade portuguesa Fábricas CC - Indústrias Transformadoras, SA, e suas participadas. A ré comprometera-se a negociar exclusivamente com a autora. Porém, veio a vender as referidas acções a uma empresa concorrente da autora, nunca a tendo informado de que se encontrava a negociar paralelamente com terceiros.
O conhecimento da venda das acções a outra empresa foi para si uma total surpresa.
Alega que teve variadas despesas durante as negociações de que pretende ser ressarcida, assim como viu a sua imagem comercial ficar diminuída na praça, por causa da não conclusão do negócio.
A ré defendeu-se dizendo que os contactos negociais entre ambas as partes foram meramente incipientes. Que as propostas negociais de ambas as partes eram de tal forma distantes, que tal justificou o abandono, sem mais, da ré e das negociações.
Para além disso, ambas as partes acordaram previamente e por escrito que as negociações podiam ser rompidas sem pré-aviso.
Na 5ª Vara Cível da Comarca do Porto a acção foi julgada improcedente.
Culminando a apelação da Autora, a Relação do Porto confirmou o julgado.
Apelou a Autora assim concluindo: 1- A Relação utilizou mal os poderes que lhe são conferidos pelo artigo 713º nº5 do CPC, pois esta norma não passa um cheque em branco à Relação.
2- A possibilidade de remissão para a sentença de 1ª instância que essa norma prevê é aplicável a questões que não sejam complexas.
3- A culpa in contrahendo, é uma questão muito debatida na doutrina e jurisprudência, a qual necessitava de um estudo muito mais aprofundado do que a simples remissão para o decidido na 1ª instância.
4- A Relação utilizou incorrectamente os poderes conferidos pelo artigo 713º nº 5 CPC.
5- Ocorreu omissão de pronúncia, porque a Relação não se pronunciou sobre as conclusões nº4 a 9º e 10º a 12º das conclusões da alegação da apelação.
6- Essas conclusões versam sobre questões sobre as quais a 1ª instância não se pronunciou e, portanto, sobre as quais a Relação deveria ter decidido, pois isso constituía o objecto do recurso.
7- Ao não apreciar nem decidir sobre estas questões que a autora lhe levou ao conhecimento, sem sede de objecto de recurso, incorreu, assim, o Acórdão recorrido na nulidade prevista no artigo 668º nº 1 d) do CPC.
8- A boa fé consiste no comportamento honesto e consciencioso, na lealdade de se conduzir, e tem um sentido ético - artigo 227º do CC.
9- A ré tinha a obrigação de informar a autora de que estava a negociar com outro empresário português desde Dezembro 2000/Janeiro 2001.
10- Ao não cumprir essa obrigação a ré violou os deveres de diligencia, zelo, lealdade, honestidade, informação e esclarecimento, tendo em vista a protecção da confiança mútua e das expectativas de cada um na condução leal e criteriosa das negociações e na conclusão do negócio.
11- A ré exigiu à autora o comportamento sigiloso quanto às negociações que estavam em curso entre ambas, enquanto nas suas costas e sem conhecimento desta, mantinha paralelamente, negociações com um empresário português concorrente da autora, tendentes à conclusão do mesmo negócio.
12- A autora tinha a justificada confiança na formalização do contrato, criada e fomentada pela própria ré, face à sua iniciativa de lhe fornecer informações confidenciais, mediante subscrição de um acordo de confidencialidade, e de nunca a ter informado que estava a negociar com outrem.
13- A ré, não obstante manter negociações com a autora entre o 1º semestre de 2000 e Março de 2001, já vinha a manter paralelamente e ao mesmo tempo, negociações desde 2000 com outro empresário português, concorrente da autora, o qual veio a celebrar o contrato que a ré negociava com a autora.
14- O abandono das negociações não foi justificado, traindo a confiança da autora no desfecho das mesmas.
15- A autora provou o facto ilícito da ré, traduzido no injustificado rompimento das negociações e paralela negociação que a autora desconhecia o que gera responsabilidade pré contratual da ré.
16- A culpa da ré na ocorrência do facto ilícito presume-se, pois estamos no domínio da responsabilidade pré contratual.
17- Estando presumida a culpa da ré, incumbia a esta a prova da inexistência de culpa sua (artigo 350º do CC), o que esta não logrou demonstrar, até porque nada alegou nesse sentido.
18- As respostas dadas aos quesitos 10º a 14º, 19º a 26º da base instrutória demonstram a existência de danos e o nexo de causalidade adequada entre estes e o acto ilícito da autora.
19- Deve a ré ser obrigada a indemnizar a autora nas quantias liquidas de 39.903,83 euros (respostas aos quesitos 10º a 14º e 20º) e de 67.344,71 euros (resposta ao quesito 24º) e ainda em quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, relativamente aos danos constantes das respostas aos quesitos 19º, 21º, 22º, 23º, 25º e 26º.
20- O acórdão recorrido e a sentença de 1ª instância fizeram incorrectas interpretações e aplicações das normas dos artigos 653º nº2 do CPC, 227º e 350º do CC.
Contra alegou a ré em defesa do Acórdão recorrido.
A Relação disse não ocorrer a nulidade arguida.
As instâncias deram por assente a seguinte matéria de facto: 1- A autora é uma sociedade que se dedica ao fabrico e comercialização de conservas de peixe.
2- A ré é uma sociedade comercial de direito espanhol que se dedica à actividade industrial no ramo alimentar.
3- A ré adquiriu, em 1995, uma participação de 95,4% no capital da sociedade portuguesa Fábricas CC - Industrias Transformadoras, SA", que desenvolve a sua actividade no sector das conservas alimentares.
4- Que por sua vez era titular da totalidade das acções de duas outras sociedades também ligadas à industria conserveira: a Fábrica DD, SA e a EE - Imperial Conserveira, SA".
5- A autora assinou o acordo de confidencialidade, junto a fls. 14 e ss, do qual consta expressamente que "ambas as partes reconhecem mutuamente o direito de a outra parte poder a qualquer momento e sem aviso prévio acabar com os contratos e negociações sobre a transacção não tendo obrigação de aceitar qualquer das propostas que respectivamente apresentem uma à outra".
6- No decurso do ano de 2000 a ré contactou a autora no sentido de esta vir a adquirir as acções da sociedade Fábricas CC - Indústria Transformadora, SA, EE, Lda. e Pátria, Lda.
7- A autora aceitou efectuar negociações com a ré tendente à celebração do negócio que consistia na aquisição da totalidade das acções representativas do...
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