Acórdão nº 07P447 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. O tribunal colectivo da 1ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia condenou: - O arguido JRMS, em autoria material e em concurso efectivo de um crime de roubo agravado do art. 210°, n.º 1 e n.º 2, al. b) do C. Penal, com referência ao art. 204.º, n. ° 2 al. f) do mesmo diploma legal, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão e de um crime de roubo agravado tentado dos art.ºs 22º, 23º, 73°, e 210° nº 1 e nº 2 b) do C. Penal, com referência ao art. 204° nº 2 1) do mesmo diploma legal, na pena de 1 ano de prisão e na pena única de 5 anos de prisão.

    - o arguido VHSP, em autoria material e em concurso efectivo de dois crimes de roubo agravado do art. 210.° n.º 1 e 2 b) do C. Penal, com referência ao art. 204." n.º 2 do mesmo diploma legal, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, por cada um deles e na pena única de 5 anos de prisão.

    - o arguido JAFC, como autor de um crime de detenção de arma proibida do art. 275° nº 1 e 3 com referência ao art. 3.° nº 1 f) do DL n.º 275-A/75 de 17/4 na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 5,00.

    Mais condenou: - o arguido/demandado JRMS a pagar ao ofendido PJCG a quantia de € 3.700,00, a título de indemnização; - o arguido/demandado VHSP condenado a pagar ao ofendido JMLO a quantia de € 3.740,0012.°, a título de indemnização.

    Inconformados com tal decisão, recorreram para a Relação do Porto os arguidos VHSP e JRMS, mas esse Tribunal Superior, por acórdão de 20 de Setembro de 2006 (proc. n.º 4029/06), negou provimento aos recursos e manteve a decisão recorrida.

    Ainda inconformado, recorre o arguido JRMS recorre para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo a revogação do acórdão recorrido, substituindo-o por acórdão que absolva o recorrente, ou quando assim se não entenda, diminuindo significativamente as penas, concluindo, para tanto, na sua motivação: 1. Ao recorrente não podem ser imputados os crimes por que foi condenado, a título de co-autoria; 2. Os restantes arguidos acusados, conjuntamente com o recorrente, foram absolvidos de tais crimes e 3. "por referência aos factos provados em 1) a 12), que os restantes arguidos... tenham tido qualquer intervenção em tais condutas em tais circunstâncias" ponto 8 dos factos não provados, ou seja, 4. que, entre outras coisas, houvesse qualquer acordo ou comunhão de esforços, ou divisão de tarefas entre eles e o recorrente, não se provando assim a acusação.

  2. Os embuçados referidos nos pontos 1 a 12 da matéria de facto provada, não são os arguidos, nem constam da acusação, bem como não consta da acusação qualquer acordo do recorrente com os embuçados, ou divisão de tarefas, ou actos praticados pelo arguido que tal indiciasse.

  3. Não há - nem estava em juízo - qualquer crime de co-autoria com os embuçados, personagens que apenas apareceram no julgamento.

  4. Não há, pois, imputação correcta e legal a nível de co-autoria.

  5. Para a imputação dos factos ao recorrente, as instâncias apenas consideraram a co-autoria, que não existe.

  6. Não foram devidamente escrutinados os depoimentos das testemunhas FN e PJCG Gonçalves, pelo que 10. há insanável ausência de fundamentação fáctica e erro notório na apreciação da prova.

  7. Inexistindo co-autoria, não se podem estabelecer os factos pelos simples "estava lá" (mesmo que o recorrente lá não tenha estado).

  8. Sem prejuízo das conclusões anteriores, as penas aplicadas são exageradas, devendo ser reduzidas.

  9. Foram violados, entre outros, os art.°s 26 do C.P. e 379 do C.P.P..

    Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal Recorrido, pronunciando-se pelo improvimento do recurso.

    Distribuídos os autos neste Tribunal a 31.1.2007, teve vista o Ministério Público.

    Colhidos os vistos, teve lugar a audiência. No seu decurso o Ministério Público sustentou que não cabe ao Supremo Tribunal de Justiça conhecer dos vícios da matéria de facto. Quanto à co-autoria, está provado que o recorrente agiu acompanhado de outras pessoas com acordo prévio e conjugação de esforços, pelo que nada obstava à sua condenação nesses termos. Quanto à medida da pena, entendeu aceitável a diminuição da pena quanto ao crime de roubo consumada e no cúmulo de cerca de 1 ano, devendo ser fixada, nesse entendimento, em 3 anos e 6 meses.

    A defesa manteve a posição assumida em sede de motivação, mas aceitou, subsidiariamente a baixa da pena proposta pelo Ministério Público. Historiou a conduta em causa, retomou a tese já desenvolvida a propósito dos "embuçados" invocados em audiência, pondo em causa a prova de um acordo prévio que exigiria o conhecimento da identidade dos outros comparticipantes. Sublinhou que não fora ele que pegara na espingarda e agredira.

    Cumpre, assim, conhecer e decidir.

    2.1.

    E conhecendo São as seguintes as questões suscitadas pelo recorrente: - incorrecto julgamento do facto, insanável ausência de fundamentação fáctica e erro notório na apreciação da prova (conclusões 9.ª a 11.ª) - actuação em co-autoria (conclusões 1.ª a 8.ª e 11.ª) - Medida da pena (conclusão 12.ª) Vejamos, em primeiro lugar, as questões referentes ao incorrecto julgamento do facto, insanável ausência de fundamentação fáctica e erro notório na apreciação da prova.

    Sustenta a este propósito o recorrente que não foram devidamente escrutinados os depoimentos das testemunhas FN e PJCG (conclusão 9), pelo que há insanável ausência de fundamentação fáctica e erro notório na apreciação da prova (conclusão 10) e inexistindo co-autoria, não se podem estabelecer os factos pelos simples "estava lá" (mesmo que o recorrente lá não tenha estado) (conclusão 11).

    Parece o recorrente esquecer que a questão de facto está já arrumada, tendo sido objecto de um duplo exame, de um duplo grau de jurisdição, cujo resultado não cabe ao Supremo Tribunal de Justiça agora sindicar.

    Com efeito, tem decidido o Supremo Tribunal de Justiça, a uma só voz (cfr. por todos, o Ac. de 8/2/2007, proc. n.º 159/07-5), que para conhecer de recurso interposto de um acórdão final do tribunal colectivo relativo a matéria de facto, mesmo que se invoque qualquer dos vícios previstos no art. 410.º do CPP é competente o tribunal de Relação. Nos recursos interpostos da 1.ª Instância ou da Relação, o Supremo Tribunal de Justiça só conhece dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, por sua própria iniciativa e, nunca, a pedido do recorrente, que, para tal, terá sempre de dirigir-se à Relação, que, nos termos do art. 428.º, n.º 1 conhece de facto e de direito.

    Em relação às decisões na al. d) do art. 432.º o âmbito dos poderes de cognição do Supremo Tribunal é fixado na própria alínea e não no art. 434.º do CPP, o que significa, que, mesmo relativamente aos acórdãos finais do tribunal colectivo, o recurso para o Supremo só pode visar o reexame da matéria de direito.

    Com efeito, e como este Tribunal tem insistentemente proclamado, em regra, «o recurso da decisão proferida por tribunal de 1.ª instância interpõe-se para a relação» (art. 427.º do CPP). E só excepcionalmente - em caso «de acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito» - é que é possível recorrer directamente para o STJ (art.ºs 432.º, d), e 434.º).

    Ora, como resulta do exposto, o presente recurso - proveniente da Relação (e não, directamente, do tribunal colectivo) - visa, no ponto em causa, fundamentalmente, o reexame de matéria de facto e não exclusivamente, o reexame da matéria de direito (art.º 434.º do CPP) que, no caso do Supremo Tribunal de Justiça exige a prévia definição (pela Relação, se chamada a intervir) dos factos provados.

    E, no caso, a Relação - avaliando a regularidade do processo de formação de convicção do tribunal colectivo a respeito dos factos impugnados no recurso - manteve-os, definitivamente, no rol dos «factos provados».

    De resto, a revista alargada prevista no art. 410.º, n.ºs 2, e 3 do PP, pressupunha (e era essa a filosofia original, quanto a recursos, do Código de Processo Penal de 1987) um único grau de recurso (do júri e do tribunal colectivo para o STJ e do tribunal singular para a Relação) e destinava-se a suavizar, quando a lei restringisse a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito (o recurso dos acórdãos finais do júri ou do colectivo; e o recurso, havendo renúncia ao recurso em matéria de facto, das sentenças do próprio tribunal singular), a não impugnabilidade (directa) da matéria de facto (ou dos aspectos de direito instrumentais desta, designadamente «a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não devesse considerar-se sanada»).

    Essa revista alargada para o Supremo deixou, por isso, de fazer sentido - em caso de prévio recurso para a Relação - quando, a partir da reforma processual de 1998 (Lei 59/98), os acórdãos finais do tribunal colectivo passaram a ser susceptíveis de impugnação, «de facto e de direito», perante a Relação (art.ºs 427.º e 428.º n.º 1).

    Hoje, pretendendo-se impugnar um acórdão final do tribunal colectivo: - se visar exclusivamente o reexame da matéria de direito (art. 432.º d), dirige o recurso directamente ao Supremo Tribunal de Justiça; - ou, se não visar exclusivamente o reexame da matéria de direito, dirige-o, «de facto e de direito», à Relação , caso em que da decisão desta, se não for «irrecorrível nos termos do art. 400.º», poderá depois recorrer para o STJ (art. 432.º).

    Só que, nesta hipótese, o recurso - agora, puramente, de revista - terá que visar exclusivamente o reexame da decisão recorrida (a da Relação) em matéria de direito (com exclusão, por isso, dos eventuais vícios, processuais ou de facto, do julgamento de 1.ª instância), embora se admita que, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto ostensivamente insuficiente, fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias detectadas por iniciativa do Supremo para além do que tenha de aceitar-se já decidido definitivamente pela Relação, em último recurso, aquele se abstenha de conhecer do fundo da causa e ordene o reenvio nos termos processualmente estabelecidos.

    O...

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