Acórdão nº 07P014 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelPEREIRA MADEIRA
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. O Ministério Público deduziu acusação, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, contra os arguidos AA e BB, devidamente identificados, imputando-lhes os factos constantes da acusação pública e que, em seu entender, consubstanciam a prática pela arguida AA, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 21°, nº 1 e 24º, al. h), do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-A anexa ao mesmo diploma legal; e a prática pelo arguido BB, como cúmplice, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 21°, nº 1 e 24º, al. h), do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-A anexa ao mesmo diploma legal, em conjugação com o disposto no art. 27º do Código Penal.

Após julgamento, foi proferida sentença em que, além do mais, foi decidido absolver os arguidos do crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.p. no art. 24º, al. h) do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, de que ambos vinham acusados mas condenar a arguida AA, pela prática, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21º, nº 1 do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de cinco anos e seis meses de prisão e o arguido BB, pela prática, como autor material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21º, nº 1 do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de quatro anos e oito meses de prisão.

Inconformado, recorre ao Supremo Tribunal de Justiça no interesse dos arguidos, o Ministério Público assim delimitando conclusivamente o objecto da impugnação: 1. O douto acórdão recorrido, ao condenar os arguidos AA e BB pela prática, cada um, de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes p. e p. no art.º 21º, nº1, do Dec-Lei nº 15/93, de 22/1, violou o disposto nesse mesmo preceito e no art.º 25º do mesmo diploma, pois que deveriam ter sido os arguidos condenados pela prática do crime de tráfico de menor gravidade; 2. Sendo ambos os arguidos condenados na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, com a obrigação de, no decurso deste prazo de suspensão, os arguidos se inscrevem no Centro de Emprego competente e cumprirem o que, em termos de ocupação laboral, lhes vier a ser imposto pelos respectivos responsáveis; 3. Sendo que, relativamente à arguida AA, mesmo a manter-se o entendimento que a sua actividade configura a prática do crime de «tráfico-base» do art.º 21º existiu violação do disposto no art.º 71º do Código Penal, não se justifica a manutenção da pena de 5 anos e 6 meses de prisão que foi estabelecida, sempre devendo esta ser reduzida para 4 anos e 6 meses de prisão; 4. Pois que, no que respeita a esta arguida, a prova feita foi a de que a mesma, no período de 8 meses, procedeu a «vendas de rua» ao total de apenas 8 pessoas (a algumas apenas uma vez), visando com tal actividade, embora também obter dinheiro para a sua subsistência e a do seu companheiro (à data desempregado e acamado), a obtenção de dinheiro para compra e subsequente consumo de estupefacientes por ambos; 5. Tendo em conta ainda que é primária, que confessou os factos em sede de julgamento e desconhecendo-se qual a quantidade de estupefaciente e grau de pureza do mesmo, sabendo-se que apenas vendia pequenas doses ("muchas"), não parece estar em causa senão uma situação comum, de menor gravidade de tráfico ligado à toxicodependência; 6. Pelo que a ressocialização não passará primordialmente pela prisão - muito menos por tão dilatado espaço temporal -, antes pela tentativa de afastar a arguida do consumo, dando-lhe possibilidade, através de ocupação laboral, de se reintegrar novamente na sociedade, com a ameaça de cumprimento da pena no caso de não o fazer; 7. Pelo que se pugna pela alteração da decisão, no sentido de ser a arguida AA condenada, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. no art.º 25º, al. a) do Dec-Lei nº 15/93, de 22.1, na pena de 2 (dois) anos de prisão, suspensa pelo período de 3 (três) anos e condicionada à sua inscrição no Centro de Emprego e cumprimento do que, na área laboral, vier a ser determinado no período da suspensão, pelos responsáveis de tal Centro.

8. Relativamente ao arguido BB entende-se que o acórdão violou as mesmas disposições legais e que deverá ser igualmente alterada a sua condenação para condenação em termos idênticos aos da co-arguida AA (quer em termos de qualificação jurídica, quer em pena, quer em período de suspensão e condição de tal suspensão); 9. Pois que este arguido apenas a título subsidiário desenvolveu actividade de tráfico, limitando-se a, com vista a obter o seu sustento e estupefaciente para seu consumo, auxiliar a companheira AA - auxílio que se limitou a recortar os pedaços de plástico em que emalava as ‘muchas', nunca fazendo venda directa a terceiros, mantendo-se em casa, acamado.

11. Daqui a menor ilicitude da sua conduta, que justifica a escolha de incriminação nos termos acima mencionados, sendo que a pena deverá ser idêntica à da imposta à sua companheira por via dos antecedentes criminais que possui pela prática de crime de idêntica natureza.

Não houve resposta.

Subidos os autos, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto promoveu a marcação de data para julgamento.

As questões a decidir: 1. A qualificação jurídica dos factos - artigo 25.º ou 21.º do DL 15/93, de 22/1.

2. Medida concreta das penas que o recorrente quer ver fixadas em 2 anos de prisão suspensa por 3 anos.

2. Colhidos os vistos legais e realizada a audiência, cumpre decidir.

Factos provados A - Pelo menos desde Janeiro de 2005 e até Agosto desse mesmo ano, a arguida AA desenvolveu uma actividade de venda de heroína a terceiros, em troca da entrega por estes de determinadas quantias em dinheiro.

B - Em regra, a arguida AA cedia a heroína acondicionada em pequenos pacotes de plástico, denominados, em gíria, "muchas".

C - Para o efeito, contava com a ajuda do seu companheiro, o arguido BB, o qual recortava pequenos pedaços de plástico, nos quais procediam ao acondicionamento do estupefaciente.

D - A arguida AA fazia entregas de estupefaciente directamente aos consumidores, tendo as mesmas ocorrido na área dos concelhos de Lagoa e Portimão.

E - Para efectuar tais entregas, a arguida AA deslocava-se ao encontro dos consumidores utilizando diversos veículos motorizados, entre eles: I - um veículo automóvel de marca Renault e modelo Clio, com a Nº-0; II - um veículo automóvel de marca Renault e modelo Clio, com a matrícula Nº-1; III - um veículo automóvel de marca Opel e modelo Corsa, com a Nº-2; IV - um veículo automóvel de marca Renault e modelo 5, com a Nº-3; e V - um ciclomotor com a matrícula Nº-4.

F - Pelo menos nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2005, a arguida AA cedeu heroína a CC, em troca da entrega por este da importância de 10 € por cada pacote desse estupefaciente.

G - Fê-lo pelo menos por seis vezes e em diversas localidades, designadamente, em frente da Escola do ... e na Local-B.

H - Até ao fim de Junho de 2005, a arguida AA cedeu heroína a DD, em várias ocasiões e locais de Lagoa, designadamente, junto ao Centro de Saúde, no Local-C e na Urbanização ..., em troca da entrega, por esta última, da quantia de 10 € por cada pacote de heroína.

I - No período referido em A) supra, a arguida AA, com uma regularidade diária, recebia dinheiro de EE e, em contrapartida, entregava-lhe heroína, à razão de um pacote desse estupefaciente por cada 10 € entregues por EE.

J - No dia 13 de Julho de 2005, a arguida AA recebeu 40 € de EE, para que aquela adquirisse heroína, para ambas, em Local-D.

L - Dirigiram-se ambas a Local-D na viatura automóvel de marca Renault e modelo Clio, com a matrícula Nº-1, indo a arguida AA a conduzir a viatura.

M - Chegadas a Local-D, a arguida AA dirigiu-se a local não apurado e, ao regressar, deu um pacote de plástico a EE, contendo heroína com o peso líquido global de, pelo menos, 0,102 gramas.

N - No dia 10 de Maio de 2005, em frente ao supermercado ..., no ..., a arguida AA cedeu heroína a FF, conhecido por "...", em troca da entrega por...

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