Acórdão nº 06S2960 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em 5 de Agosto de 2004, no Tribunal do Trabalho de Almada, AA intentou a presente acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, pedindo a condenação da ré: (a) a respeitar o crédito de horas de que é titular enquanto dirigente sindical; (b) a pagar-lhe a quantia de 1.231,73 euros e as que se vencerem por idênticos descontos que a ré venha a fazer-lhe por faltas dadas para o exercício das suas funções sindicais a partir de Maio de 2004 e até final.

Fundamentando o pedido, o autor alega que é trabalhador da ré desde 1984, sendo membro da direcção do CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal desde 1998, bem como membro da direcção da Delegação Local de Setúbal do mesmo Sindicato, e que a ré lhe descontou na retribuição os dias que faltou ao abrigo das suas funções de dirigente sindical, «considerando tais faltas como justificadas sem retribuição».

A ré contestou, alegando, no essencial, que apenas os dirigentes nacionais de órgãos do sindicato com competência executiva podem beneficiar do crédito de quatro dias mensais atribuído pela lei, sendo que o autor não pertence a qualquer órgão do sindicato com semelhante competência.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que, considerando que «o A. enquanto membro da Direcção do CESP não pode gozar o crédito mensal de 4 dias sem perda de retribuição», mas já lhe assiste esse direito na qualidade de membro da direcção da Delegação Local dos Concelhos do Sul do Distrito de Setúbal do mesmo Sindicato, julgou a acção procedente e condenou a ré «a pagar ao A. a quantia de € 1.231,73, bem como as quantias que tenha entretanto descontado na retribuição do A. por faltas deste dadas para exercício das suas funções sindicais e dentro do limite de 4 por mês» e, ainda, «a respeitar o crédito de horas concedido pelo artigo 22.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 215-B/75, de 30 de Abril, e de que o A. é titular como membro da Direcção da Delegação Local dos Concelhos do Sul do Distrito de Setúbal e enquanto mantiver tal qualidade».

  1. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou procedente, por considerar que «não é aceitável a interpretação acolhida na sentença recorrida de que aos dirigentes sindicais das Delegações Locais assiste o crédito de 4 dias mensais sem perda de retribuição», tendo alterado a sentença recorrida naquele preciso segmento e absolvido a ré de todos os pedidos.

    É contra esta decisão que o autor se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: 1) De harmonia com o artigo 47.º, n.º 2, dos estatutos do CESP, na redacção então vigente (BTE, 3.ª série, n.º 14/1998), são órgãos dirigentes do Sindicato a direcção, a direcção nacional, a mesa da assembleia geral, o conselho nacional, o conselho fiscal e as direcções regionais e locais; 2) A direcção do CESP, para usar a terminologia das normas jurídicas definidoras do crédito de tempo para a actividade sindical, era exercida simultaneamente por órgãos centrais (direcção, direcção nacional) e por órgãos regionais ou locais (direcção regional, direcção local) e nenhum órgão central do CESP tinha a competência directiva completa; 3) As direcções das delegações locais tinham competência e atribuições directivas e executivas próprias, não atribuídas à direcção nacional; 4) Não deve o tribunal, sob o pretexto de interpretar a mens legislatoris subjacente aos preceitos legais reguladores do crédito de horas, questionar afinal a forma de auto-organização directiva que tal ou tal associação sindical escolheu como adequada: se os estatutos atribuem às direcções locais competências directivas e executivas próprias, os membros desses órgãos gozam do crédito de horas reconhecidos aos dirigentes sindicais; 5) O acórdão recorrido violou, designadamente, o disposto no artigo 22.º, n.º 2, do DL 215-B/75, de 30 de Abril, o artigo 505.º, n.º 1, do Código do Trabalho e a cláusula 3.ª, n.º 2, do AE Brisa (BTE, 1.ª série, n.º 21/2002).

    Em contra-alegações, o recorrido veio defender a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de ser concedida a revista, parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

  2. No caso vertente, a única questão suscitada reconduz-se a saber se o autor, para o exercício das suas funções de membro da direcção da «Delegação Local de Setúbal» do CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal, designada, a partir de 2002, «Delegação Local dos Concelhos do Sul do Distrito de Setúbal», beneficia de um crédito de quatro dias por mês, mantendo o direito à remuneração correspondente.

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1. O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) O A. trabalha por conta da R., sob sua autoridade e direcção, desde 15 de Junho de 1984; 2) O A. tem atribuída a categoria profissional de Operador de Posto de Portagem, cujas funções vem exercendo; 3) O A. aufere, ultimamente, desde 1 de Março de 2004, uma retribuição mensal composta pelas seguintes prestações, além do subsídio de refeição e do abono de falhas: retribuição base, € 733,00; diuturnidades, € 122,92; subsídio de turno, € 158,00; 4) Antes de Março de 2004, o A. auferia uma retribuição mensal composta pelas seguintes prestações, além do subsídio de refeição e do abono de falhas: retribuição base, € 713,00; diuturnidades, € 119,42; subsídio de turno, € 152,00; 5) O A. foi eleito membro da Direcção do CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal para o triénio de 1998-2001; 6) Qualidade que manteve no triénio de 2002-2005; 7) Para além deste cargo, o A. tem sido desde 1998 membro da Direcção da «Delegação Local de Setúbal», que, desde 2002, tem a denominação de «Delegação Local dos Concelhos do Sul do Distrito de Setúbal»; 8) O A. faltou ao serviço para exercício das suas funções de dirigente sindical nos seguintes dias: 06/02/2002; 09, 11 e 26/10/2002; 14/11/2002; 09, 19 e 20/03/2003; 06/05/2003; 29/06/2003; 12 e 18/07/2003; 09, 22, 27 e 28/09/2003; 30/10/2003; 2 dias de Dezembro de 2003; 9 e 27/01/2004; 14 e 20/02/2004; 2 dias de Março de 2004; 1 dia de Abril de 2004; 9) A R. descontou na retribuição do A. aquelas faltas, no montante total de € 1.231,73; 10) Sempre o A. comunicou as referidas faltas de acordo com o estabelecido no n.º 3 do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 215-B/75, de 30 de Abril; 11) Às relações laborais entre as aqui partes é aplicável o Acordo de Empresa BRISA, publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 21/2002, celebrado entre a R. e diversas associações sindicais, entre as quais a FEPCES, na qual está representado o CESP; 12) O CESP viu os seus estatutos publicados no BTE, 3.ª Série, n.º 14/1998.

    Os factos materiais fixados pelo tribunal recorrido não foram objecto de impugnação pelas partes, nem se vislumbra que ocorra qualquer das situações que permitam ao Supremo alterá-los ou promover a sua ampliação (artigos 722.º, n.º 2, e 729.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil), por conseguinte, será com base nesses factos que há-de ser resolvida a questão suscitada no presente recurso.

  3. Antes de mais, importa determinar o regime jurídico aplicável ao crédito de horas e faltas dos...

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