Acórdão nº 06P4465 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2007

Data18 Janeiro 2007
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO 1.

No 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Cascais, foi julgado pelo tribunal de júri o arguido AA, acusado pela prática de um crime de receptação, do art. 231.º, um crime de falsificação de documento, do art. 256.º, n.º 1, um crime de omissão de auxílio, do art. 200.º, n.ºs 1 e 2, um crime de sequestro, do art. 158.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), um crime de roubo, do art. 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), um crime de condução perigosa, do art. 291.º, n.º 1, alínea b), sendo todos os artigos indicados do Código Penal (CP), e ainda um crime de condução de veículo-automóvel sem a respectiva habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.º, n.º 2 do DL n.º 2/98, de 3/1.

No final, o arguido foi condenado apenas pelo crime de sequestro simples (art. 158.º, n.º 1), pelo crime de condução perigosa e por um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143.º, n.º 1 do CP, nas penas, respectivamente, de: - 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; - 8 (oito) meses de prisão; - 8 (oito) meses de prisão.

Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão.

O arguido foi ainda condenado a pagar à ofendida/demandante a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data da decisão até ao pagamento integral.

  1. Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso para este Supremo Tribunal, concluindo a sua motivação: 1 - O arguido escolheu defensor a fls. 848, direito que encontra consagração Constitucional directa, sem necessidade de regulamentação: nos termos do artigo 32 n.º 3 da Constituição da Republica Portuguesa: "O arguido tem o direito de escolher defensor e a ser assistido por ele em tidos os actos do processo (…)". Por Despacho de 15.12.2005, o Tribunal indeferiu a pretensão do arguido.

    A negação expressa da possibilidade de ser o defensor escolhido pelo arguido (a fls. 848) a defendê-lo em Julgamento, configura uma violação grave do diploma fundamental e ainda uma nulidade insanável, vícios que vão aqui expressamente arguidos, para todos os devidos e legais efeitos.

    2 - O Tribunal recorrido, ao não permitir que o arguido escolha defensor (oficioso) com escritório na Comarca, violou os artigos 39º e 40º da Lei 34/2004 de 29/07 e do artigo 61º n.º 1 alínea d do CPP, sendo certo que os deveria ter interpretado, permitindo que o arguida escolhesse como defensor o escolhido a fls. 848, conforme vontade por ele manifestada.

    3 - A interpretação dos artigos 39º e 40º da Lei 34/2004 de 29/07 e do artigo 61 n.º 1 alínea d do CPP, não permitindo que um arguido em Processo Penal escolha defensor (oficioso) implica uma grave violação dos artigos 13º, 20º e 32º da Constituição de República Portuguesa.

    4 - Havendo acordo expresso em termos de aceitação do patrocínio (oficioso) entre o arguido e o Advogado escolhido por aquele, o direito à escolha de defensor (constitucionalmente previsto no art. 32º n.º 3 CRP), não pode sofrer qualquer limitação, designadamente orgânica (decorrente da nomeação de quem estiver de escala) ou geográfica, decorrente do facto de o defensor (oficioso) escolhido ter ou não domicílio na comarca em que corre termos o processo em causa, sob pena de se interpretar os arts. 39º e 40º da Lei 34/2004 e art 31º do CPP, em violação do art. 32º n.º 3 da Constituição de República Portuguesa.

    5 - O Tribunal recorrido, ao não permitir que o arguido escolha defensor (oficioso), interpretou os artigos 39º e 40º da Lei 34/2004 de 29/07 e do artigo 61º n.º 1 alínea d do CPP, em violação dos artigos 13º, 20º e 32º da Constituição de República Portuguesa.

    6 - O Tribunal recorrido, deveria ter interpretado os artigos 39º e 40º da Lei 34/2004 de 29/07 e o artigo 61º n.º 1 alínea d do CPP, em conformidade com os artigos 13º, 20º e 32º da Constituição de República Portuguesa, permitindo que o arguido escolha defensor (oficioso), independentemente da comarca do País, onde o defensor tenha o seu domicílio profissional.

    7 - Ao obrigar o arguido a constituir mandatário, como obrigou, ao ter decidido não validar a escolha de fls. 848, o Tribunal interpretou os artigos 39º e 40º da Lei 34/2004 de 29/07 e o artigo 61º n.º 1 alínea d do CPP, em violação dos artigos 13º, 20º e 32º da Constituição de República Portuguesa.

    8 - O Acórdão recorrido padece de falta de fundamentação em relação ao aqui recorrente já que não ousou demonstrar (em termos de lógica comunicacional) que medida é que, de acordo com a prova produzida, entendeu que o ora recorrente, cometeu os crimes por que foi condenado, para efeitos de preenchimento dos tipos de ilícito respectivos.

    9 - Mais nenhuma testemunha corroborou com o que foi dito por BB, sendo certo que esta testemunha confirmou que viveu em casa do arguido.

    10 - A testemunha BB, declarou em audiência "namorei com o ... e vivi em casa do ... algum tempo" Cassete 3, lado 1, volta 0456 a 0863, o que leva a concluir pelo consentimento de BB em relação à conduta do arguido.

    11 - Os factos descritos nos pontos 10 a 17 não permitem concluir que o arguido cometeu o crime de sequestro, para efeitos do preenchimento do respectivo ilícito.

    12 - Da prova produzida em audiência, não foi possível concluir que o ora recorrente praticou um único crime.

    13 - Não existem elementos seguros (designadamente outros elementos de prova) que permitam que o Tribunal condene o recorrente pela pratica dos restantes factos descritos na acusação.

    14 - O Acórdão recorrido errou manifesta e notoriamente na apreciação da prova, já que, pela prova produzida, não deveria ter dado como provado que o recorrente praticou os factos constantes da acusação.

    15 - O Tribunal recorrido violou assim o artigo 355º do CPP, já que não valem em Julgamento quaisquer provas que não tenham sido produzidas ou examinadas em audiência.

    16 - Não tendo absolvido o arguido, o Tribunal recorrido violou o art. 355º do CPP, tendo o interpretado o aludido preceito em violação do P.

    In Dúbio Pro Reo, enquanto corolário do P. da Presunção de Inocência do Arguido, consagrado no art. 32º n.º 2 da Constituição da República 17 - O Acórdão recorrido, apesar de extenso, não fez uma exposição dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, em termos de permitir a condenação do recorrente pelo crime por que foi condenado. Tudo em violação do disposto nos artigos 97º n.º 4 e 374º do CPP, bem como do art. 668º do CPC aplicável por força do disposto no art.º 4 do CPP 18 - Tais insuficiência e contradição, constituindo os vícios enunciados nas alíneas a) e b) do nº2 do artigo 410º do Código de Processo Penal (de conhecimento oficioso, Ac. do Plenário das Secções do STJ de 19.10.1995, in D.R.1-A Série de 28.12.1995) determinam a anulação do julgamento efectuado e o consequente reenvio do processo para novo julgamento, ou quando assim se não entenda, para prolação de novo acórdão que leve em conta que se alegou.

    19 - Se se entender o contrário, o Tribunal ao condenar o arguido numa pena efectiva (tão elevada) de dois anos e dois meses, entende o recorrente (um jovem com 24 anos sem antecedentes criminais relevantes à data da pratica dos factos) que nunca lhe poderia ser aplicada uma pena efectiva mas apenas uma pena suspensa na sua execução, interpretando correctamente os artigos 50º, 71º, 77º, 79º, todos do Código Penal.

    20 - Ao não explicar por que é que não suspendeu a execução da pena aplicada (inferior a três anos de prisão) o Tribunal recorrido incorreu em omissão de pronuncia, violando o art. 374º do CPP, o que consubstancia uma nulidade da sentença (art. 379º n.º 1 alínea c do CPP), preceitos que deveriam ter sido aplicados, mediante a explicação da razões que levaram à não suspensão da execução da pena.

    21 - De facto, prevendo a lei a possibilidade de aplicação de uma penas mais baixas, o Tribunal violou o P. da Culpa e os artigos 40º, 50º, 70º, 71º, 72º, 73º do CP, sendo certo que deveria ter interpretado tais preceitos, aplicando ao arguido uma pena mais baixa, suspensa na sua execução.

    22 - O Tribunal recorrido não ousou demonstrar nem fundamentar o nexo de causalidade existente entre os factos que levaram à condenação do arguido e o montante por que foi condenado a título de indemnização civil. Nesta parte o Acórdão recorrido violou também o disposto no art 374º n.º 2 ao não explicar em que medida é que o arguido deve ser condenado, como foi, naquela montante e não noutro.

    23 - Estranha-se também que o Acórdão recorrido seja omisso quanto à condenação de BB, nas custas pelo decaimento do pedido cível. De facto, tendo peticionado 10 mil Euros e vencido em 1500 Euros (decaindo em 8500 Euros), não se vislumbra por que é que não foi condenada em custas pelo decaimento. O Tribunal violou o disposto nos arts. 520º e 523º do CPP, sendo certo que o deveria ter interpretado, condenando BB pelas custas do decaimento do pedido cível. Termina pedindo a sua absolvição ou, quando assim se não entenda, a aplicação uma pena muito inferior à aplicada, suspensa na sua execução, atenta a idade e ausência de antecedentes relevantes.

  2. Respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido: 1ª. Ao contrário do alegado, com má fé, pelo recorrente, o Mm.º Juiz titular do processo, por um lado, não recusou, tout court, a nomeação de defensor escolhido pelo arguido, mas sim declarou-se incompetente de o fazer, face à Lei 34/2004, de 29 de Julho, entendendo, aliás, que essa Lei derrogou o art. 66º, n.º 3, do CPP, sendo certo, aliás, que, mesmo nesse caso, não foi - como não foi - alegada justa causa para a substituição da defensora oficiosa oportunamente nomeada; 2ª.

    Aliás, se o recorrente não recorreu de tal despacho (e podia fazê-lo), fazendo, pois, com que aquela decisão transitasse, ou se não se socorreu do meios apontados pelo Mm.º Juiz titular do processo para a resolução da questão suscitada...

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