Acórdão nº 06A3716 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 2006
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "Empresa-A" intentou acção, com processo ordinário, contra AA, BB, CC, DD e EE pedindo a sua condenação solidária a pagarem-lhe a quantia de 98.317.746$00, a titulo de honorários, ou, pelo menos 48.584.000$00, acrescidos de juros à taxa legal desde a citação.
Alegou, nuclearmente, que os Réus a encarregaram de lhes prestar serviços que permitissem o aproveitamento e valorização de um seu terreno, comprometendo-se os Réus a pagarem os serviços prestados, despesas e honorários.
Os Réus contestaram dizendo, em síntese, ter havido cumprimento defeituoso e pedindo a condenação da Autora a pagar-lhes 90 000 000$00 e 5 000 000$00 para reparação dos danos que lhes causou e a sua condenação como litigante de má fé.
O Circulo Judicial de Santo Tirso julgou a acção parcialmente procedente e improcedente a reconvenção e condenou os Réus a pagarem à Autora 18333,33 euros, com juros deste a citação.
Apelaram Autora e Réus.
A Relação do Porto negou provimento ao recurso da Autora e deu parcial provimento à apelação dos Réus absolvendo-os da totalidade do pedido.
A Autora pede revista.
E conclui assim as suas alegações: - Quanto ao acórdão recorrido peca ele por não retirar as adequadas ilações e conclusões de direito face à matéria dada como assente e à própria caracterização jurídica que faz da relação negocial sub júdice.
- A matéria dada como provada é bastante e necessária á procedência da acção.
- A matéria importante e relevante para a procedência da acção é a constante das alíneas a) e pp).
- A definição da prestação da Autora, que é pressuposto essencial da decisão propalada no acórdão recorrido, é errada e encontra-se viciada.
- Face á matéria dada como assente, surge claro que os RR solicitaram á A. a realização de um conjunto de trabalhos e serviços genéricos da sua especialidade - facto reconhecido até por confissão e constante nomeadamente da alínea v) dos factos provados.
- Onde estão descritos um conjunto de serviços que não se esgotam na figura do loteamento ou na sua aprovação, nomeadamente estudos de ocupação de solo, negociações com a Câmara da Maia e os seus serviços.
- Esta é uma realidade inequívoca face ainda à matéria dada como assente e abundantemente expressa nas alíneas h), i), j), v), x), z), dd), ee), ff), gg), hh) etc, dos factos assentes.
- Se está demonstrado que a intenção dos RR era obter, da CM da Maia, a permissão de uma área superior de construção para o seu terreno; que solicitaram á A. um conjunto de serviços da sua especialidade, análises previas, estudos de ocupação do solo, negociações com a edilidade, etc., é inequívoco que o objecto da prestação da A. não se confundia, nem se confundiu, com a elaboração de um mero projecto de loteamento.
- Basta ler-se o teor da alínea z) dos factos provados, em especial expressão "...nomeadamente..." para se poder concluir que o pedido de loteamento constante da alínea qq) é diferente de muitos outros serviços que o A. realizou para os RR.
- A A. não se obrigou nem se tinha de obrigar a realizar outros trabalhos específicos - isso ficaria ao seu livre critério e discriminação porque resulta da sua independência técnica.
- Estando-se em presença, como é o caso, de um contrato de prestação de serviços, no que concerne à prestação da A. o núcleo fáctico do referido contrato tem apenas dois elementos essenciais - a prestação de um trabalho intelectual ou manual e a obtenção de um resultado.
- O resultado era (e foi) a obtenção por parte da A., para o terreno dos RR, de autorização de uma área de construção superior á permitida inicialmente pela CM da Maia - 33.000m2.
- Este desiderato solicitado pelos RR foi integralmente cumprido pela A. que logrou aprovar uma área de 56.952m2 de construção para o referido terreno.
- De facto, antes da intervenção da A. a CM da Maia permitia apenas 33000m2 de construção, e depois aprovou com o parecer do Eng. HH uma área de 56.954m2.
- É evidente que o parecer do Sr. Eng. HH surge após o estudo de ocupação do terreno dos RR e a defesa teórica do índice de construção do mesmo proposto pela A. fixando a possibilidade do índice de construção em 56.952 m2 - e não é efeito automático do PDM.
- A matéria da alínea qq) deve entender-se como uma das partes de um todo, ou seja, deve entender-se que os RR incumbiram TAMBÉM a A. de elaborar um pedido de loteamento com vista a suportar a sua pretensão (aumento da capacidade construtivo do seu terreno).
- Não está dado como provado que a A. tivesse de realizar quaisquer outros trabalhos para os RR e portanto, em boa verdade, o que se passou a partir da aprovação camarária de 10/12/98 é matéria estranha ao pactuado entre as partes.
- Para mais, no caso dos autos em que a A. estava a prestar aos RR determinados serviços da sua especialidade, sem deles nada receber e muito especialmente a partir do momento em que se tornou inequívoco que os RR não pretendiam cumprir a sua contra prestação, nem tão pouco pagar à A. adequado preço.
- Sendo certo que está provado que os RR se comprometeram a pagar os serviços da A., ao preço justo e de mercado, conforme as tabelas, os usos e costumes do sector.
- A A. dispôs-se a, em substituição de tal preço, aceitar ser paga através da entrega dos projectos definitivos de arquitectura para o terreno dos RR.
- Tendo os RR aceite expressamente ou pelo menos tacitamente tal declaração inequívoca de vontade a qual nunca repudiaram, nem negaram nos termos expostos.
- Aliás, os RR ao longo de mais de 2 anos, face àquela declaração da A., com plena consciência, aceitaram o desenvolvimento dos trabalhos que esta lhes prestou, sem qualquer contrapartida, nada lhe pagando, nem a titulo de despesas, nem a titulo de honorários.
- Estes factos e comportamentos produzidos ao longo do tempo, de carácter afirmativo, representam verdadeira declaração negocial expressa dos RR de aceitação do ajuste de honorários proposta pela A.
- E tanto assim é que os RR, após 2 anos, vieram dizer que não se comprometiam entregar-lhe os projectos finais de arquitectura.
- Mas ainda que se entenda que tais actos e comportamentos dos RR não devem ser entendidos como declaração negocial expressa de aceitação, têm sempre de o ser como declaração negocial tácita.
- Com efeito, o comportamento dos RR só pode revelar inequívoco acordo ao ajuste de honorários proposto pela A.
- Aliás ressalvado o devido respeito, no caso, o puro silencio dos RR deve valer como declaração negocial de aceitação.
- De facto, num contrato de prestações de serviço - como o dos autos - se previamente, ou durante a execução do contrato, o prestador comunicar ao cliente a forma ou o montante da contraprestação deste, para assim obter prévio ajuste, se este com tal não concordar, deve declará-lo inequívoca e expressamente.
- Mesmo perante o incumprimento dos RR a A continuou a prestar-lhe os seus serviços.
- A A. face a este incumprimento contratual dos RR, não estaria obrigada sequer ao cumprimento da sua prestação (mesmo considerando que ainda não a havia cumprido - que havia), desde logo face à previsão legal da excepção de não cumprimento - artigos 428º e ss do CC.
- Mais ainda, nestas circunstancias, se outra protecção legal não tiver a posição da A. e se, porventura, assistisse aos RR o eventual direito de não pagarem a sua prestação, o seu exercício sempre cairia na alçada do abuso de direito.
- Por fim, e de outro modo e ainda subsidiariamente, se assim não fosse, o não pagamento da prestação a cargo dos RR, também estaria proibido por lei, ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa.
- Os RR não cumpriram a sua prestação no modo pactuado e não obstante a A. ter continuado os seus trabalhos, ainda assim, os RR recusaram-se a pagar-lhe o preço correcto de acordo com as tabelas e os usos e costumes do sector.
- No que diz respeito à quantificação dos serviços efectivamente prestados existem no caso tarifas profissionais ainda que de aplicação "oficiosa" ou por usos e costumes do sector, recomendadas de resto pela própria ordem dos arquitectos que tutela a actividade técnica da A.
- E quanto a esta matéria a prova essencial só poderá reconduzir-se ao laudo de honorário o qual faz um cálculos dos honorários perante o trabalho efectivamente executado pela A. tendo por base no entanto e também os cálculos de honorários para elaboração dos projectos de arquitectura definitivos.
- Perante o incumprimento dos RR, atento o pactuado entre as partes e o resultado obtido, deve a A. receber o valor integral que seria legitimo e adequado cobrar (a pagar pelos RR) pela realização dos projectos definitivos de...
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