Acórdão nº 04P3432 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2004
Data | 15 Dezembro 2004 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Na 2ª Vara Criminal de Lisboa foi submetida a julgamento em processo comum com intervenção de tribunal colectivo (nuipc 20/02.OS9LSB), entre outros, a arguida AA, identificada no processo, sendo condenada como autora material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no artigo 21°, n° l, do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro, de que vinha acusada; na pena de seis anos de prisão.
Recorreu para o tribunal da Relação, o qual, todavia, e no que agora releva, negou provimento ao recurso, mantendo a decisão da 1ª instância.
2. Não se conformando, recorre agora para o Supremo Tribunal de Justiça, fundamentando o recurso nos termos da motivação que apresentou, e que faz terminar com a formulação das seguintes conclusões: 1ª - O Tribunal a quo, tal como a 1ª instância incorreu em vícios previstos no art° 410, n°2, do CPP.
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- De facto consta expressamente do texto da decisão recorrida, que existe contradição na decisão proferida peia 1ª instância, quando fundamenta o facto provado segundo o qual a recorrente lançou produto estupefaciente da janela , dizendo que os produtos tinham a mesma natureza, dimensão e peso (por embalagem).
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-Todavia, não obstante tal constatação, não retirou da mesma as devidas ilações, tendo por isso incorrido em erro notório e não tendo a arguida sido absolvida.
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- É que, ao contrário do que consta da fundamentação da decisão recorrida, o depoimento da testemunha de acusação BB "não surge com um carácter meramente adjuvante ou complementar", bem pelo contrário.
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- Uma vez que o referido depoimento foi essencial para formação da convicção do Tribunal o que resulta desde logo da "hierarquia" estabelecida, foi o primeiro a ser referido, mencionando-se que era o coordenador de toda a operação.
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- Acresce que, também ao contrário do que consta da decisão recorrida, o depoimento do agente CC não foi apreciado de forma crítica e só assim se explica a importância que lhe foi conferida.
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O Tribunal da Relação a exemplo da 1ª instância, não se socorreu, como a lei impõe do princípio do in dúbio pro reo, cuja [...] não aplicação deste princípio consubstancia um vicio de erro notório na apreciação da prova, previsto no art° 410°, n°2, alínea c), do CPP.
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- O mesmo se diga mutatis mutandis quanto ao facto provado, segundo o qual a recorrente agiria em co-autoria com os restantes 9ª Pois que, o princípio supra referido também foi violado uma vez que o tribunal a quo fundamentou esse facto em intercepções telefónicas tendo olvidado que a recorrente não foi interveniente nas mesmas, mas sim outros arguidos que a ela, supostamente, se refeririam.
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- Para além de que a mesma nunca foi vista em vigilâncias e foi condenada não por aquilo que supostamente fez, mas por aquilo terceiros disseram que ela faria.
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- Termos em que deve este Venerando Tribunal decretar os aludidos vícios e absolver a arguida Se assim não for entendido, o que se admite embora sem conceder, sempre a recorrente considera incorrecta a qualificação jurídica 12ª - De facto e tal como pugnou na motivação do recurso interposto para o Tribunal da Relação, entende a recorrente que, no máximo a respectiva conduta é susceptível de ser subsumida à previsão do n° 2 do artº 30º do citado diploma legal.
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- Consta do texto da decisão recorrida, nomeadamente do 1° parágrafo da página 71 do acórdão "a sua função era a de depositária da droga".
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- Assim sendo, o Tribunal concede que a conduta da recorrente se limitava a guardar a droga.
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- Todavia, e ao contrário do expendido pelo tribunal recorrido, a conduta da recorrente subsume-se no tipo do artº 30º, pois apenas consentiu que outrem, dono do estupefaciente, utilizasse a sua casa para o guardar.
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- É evidente que enquanto depositário o agente, neste crime tem acesso ao estupefaciente, sendo que a tónica se coloca no facto de este ser propriedade de outrem que não o agente que disponibiliza o local.
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Termos em que a pronuncia deverá ser convolada para este ilícito e arguida condenada em pena nunca superior a 2 anos de prisão.
Se assim não for entendido, 18ª - A conduta da recorrente, conforme referido anteriormente, e de resto consta do texto da decisão recorrida, era a mera depositária da droga.
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- Não se entendendo que os factos devem ser qualificados pelo ilícito p. e p no n° 2 do art° 30º do DL . 15/93 de 22/01, devem sê-lo pelo crime previsto na alínea a) do art° 25º do mesmo diploma legal.
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- Assim, tal circunstância, simples guarda patenteia, no entender do recorrente, considerável diminuição da ilicitude.
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Termos em que deve a condenação da arguida ser convolada para o crime previsto no art° 25º, alínea a) e condenada em pena não superior a dois anos de prisão.
Se assim não for entendido, e embora sem conceder, sempre a recorrente discorda, 22ª - Da pena concreta aplicada à recorrente, afigura-se-nos exagerada não só em termos absolutos, mas também e sobretudo em termos relativos.
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- Acresce que, o tribunal recorrido, considerou e bem, como não provado que os objectos em ouro tivessem sido adquiridos com proventos do tráfico, motivo peio qual ordenou que lhe fossem restituídos.
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Ora tal facto, de per si, deveria ter repercussão na medida concreta da pena, o que não aconteceu.
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- A correcta ponderação das atenuantes que a seu favor militam e bem assim a harmonização com as penas aplicadas aos co-arguidos, deverá conduzir á aplicação em concreto de pena não superior a 4 anos e 6 meses de prisão.
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- O acórdão recorrido violou os Artigos, 410°, n°2, als. b) e c), e principio do in dúbio pro reo todos do CPP, art° 30º, n° 2, e 25º, alínea a), do Dl. 15/93, de 22/01 e arts. 29° e 71º do Código Penal.
Termina pedindo o provimento do recurso.
O magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo, respondendo à motivação, conclui pela total improcedência do recurso, e entende que deve ser mantido o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação.
3. Neste Supremo Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto teve intervenção nos termos do artigo 416º do Código de Processo Penal (CPP).
Foram produzidas alegações escritas.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto considera relativamente ao «vício» da matéria de facto, que a jurisprudência uniforme deste STJ é no sentido de não poderem constituir objecto de recurso o para este mesmo Tribunal, que a arguida era, detentora (e co-proprietária) dos estupefacientes, ficando, assim, afastada a incriminação do n° 2 do art. 30º, e também a aplicação do art. 25° deve ser recusada., quer pelo intuito puramente lucrativo que movia a arguida, quer pela quantidade de cocaína encontrada, sugerindo inequivocamente um nível de tráfico de dimensão apreciável, pelo que não é possível integrar os factos numa situação de menor gravidade.
No que respeita à medida da pena, considera que assiste alguma razão a recorrente, pois sendo ela embora uma co-autora, a sua conduta, embora essencial dentro do plano criminoso, é de alguma forma subalterna, relativamente à dos co-arguidos, aceitando que a pena deve ser reduzida para próximo do mínimo legal.
A recorrente reafirma nas alegações a posição que desenvolveu na motivação.
Colhidos os vistos, o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
4. As instâncias consideraram provada a seguinte matéria de facto: Em data anterior a 1 de Abril de 2002, os arguidos DD, também conhecido por "...", o seu "cunhado" EE, a AA também conhecida por "..", [...], decidiram proceder à venda de produtos estupefacientes (após reformulação da matéria de facto pela Relação) ; Obtendo, para o efeito, a posterior colaboração da arguida FF, companheira do DD, do GG, também conhecido por "..." e, esporadicamente, do arguido HH; Agindo todos eles em conjugação de esforços e de vontades; Porém, as movimentações dos arguidos chegaram ao conhecimento da DCITE da PJ, onde se dava conta de que na Rua João Nascimento Costa, lote ... andar, lado direito e 1° andar, lado esquerdo, nesta cidade e comarca, três indivíduos conhecidos por "...", "..." e "...", este último residente no lote .....° andar, letra D, da referida artéria, se dedicavam à comercialização de produtos estupefacientes; No dia 17 de Abril de 2002, o arguido DD foi visto, pelas 18h30m, na Rua João Nascimento Costa, a ser abordado por um indivíduo do sexo feminino, com aspecto de dependente de produtos estupefacientes; Após breve diálogo entre ambos, o arguido encaminhou-a para a entrada do Lote 6, donde veio a sair passado pouco tempo, em passo apressado; No dia seguinte, o arguido DD é visualizado por agentes da PSP a encaminhar indivíduos com aspecto de dependentes de produtos estupefacientes para o interior do...
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