Acórdão nº 0441/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Janeiro de 2006

Data17 Janeiro 2006
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em subsecção, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1.

A... e outros, todos com os sinais nos autos, intentaram, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, contra o Estado Português e o Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (INGA), acção declarativa de condenação sob a forma ordinária para efectivação de responsabilidade civil extracontratual.

Alegaram, em síntese, que as penalizações que lhes foram aplicadas em virtude de terem excedido os limites da superfície de base regional de regadio fixados para a campanha de 96/97, nos termos do n.º 6 do art. 2.° do Regulamento (CEE) n.° 1765/92, resultaram de omissão e negligência do R. Estado. Estruturaram a sua alegação no facto do R. Estado ter apresentado à Comissão Europeia um Plano de Regionalização relativo à Campanha de Comercialização de 96/97 que reduzia para cerca de metade a área destinada às culturas arvenses de regadio que não o milho em relação às áreas declaradas para as mesmas culturas nos três anos precedentes (93/94, 94/95 e 95/96) e no facto de, não obstante ter tido conhecimento em Agosto de 95 de que o Plano apresentado daria origem a graves penalizações para os agricultores das culturas arvenses referidas, o R. Estado nada ter feito nem solicitado à Comissão Europeia a modificação ou alteração do status quo anterior.

Terminaram pedindo a condenação do R. Estado no pagamento de uma indemnização no valor global de Esc. 429.393.152$00 (correspondente à diferença entre os montantes pagos pelo INGA de Setembro de 96 a Março de 97 a título de pagamentos compensatórios e os montantes que seriam pagos aos AA. caso, na comercialização de 96/97, não tivessem ocorrido as penalizações referidas) acrescido de juros de mora vincendos sobre a quantia de Esc. 381.892.896$00, desde 01.02.98 até integral pagamento.

1.2.

O Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa começou por se declarar incompetente, por estar em causa matéria exorbitante da jurisdição administrativa, mas tal decisão foi revogada pelo acórdão deste STA de fls. 1336 e seguintes.

1.3.

Por despacho saneador de fls. 1412 e segts., foi julgada procedente a excepção de ilegitimidade passiva do R. INGA - Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola, sendo ele absolvido da instância.

1.4.

Os autores interpuseram recurso dessa decisão.

1.5.

Por sentença de fls. 1921-1949, a acção foi julgada improcedente por não provada e o Estado Português absolvido do pedido.

1.6.

Inconformados os autores deduziram recurso.

1.7.

Sob convite, os recorrentes manifestaram manter interesse no recurso do despacho de fls. 1412.

1.8.

As alegações produzidas no recurso do despacho de fls. 1412 culminaram com as seguintes conclusões (nesta, como nas demais transcrições, nem sempre se atende à formatação, marcações e notas de rodapé constantes no original): "1. Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou procedente a excepção de ilegitimidade passiva do R. INGA absolvendo-o da instância nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artº. 288º do Código de Processo Civil.

  1. Parte a decisão proferida de um pressuposto que radica numa diferença de tratamento legislativo entre a relação processual singular e as relações processuais plurais.

  2. Porém, a solução inicialmente pensada e adoptada pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12.12 foi abandonada pelo Decreto-Lei n.º 180/96 de 25.09.

  3. Ou seja o legislador acabou por não estabeleceu diferenças entre o tratamento que conferiu à legitimidade no que respeita à relação processual singular e aquela que foi dispensada em relação às relações processuais plurais.

  4. A titularidade do interesse em demandar e do interesse em contradizer apura-se, sempre que o pedido afirme (ou negue) a existência de uma relação jurídica (ainda para que, com base nela, se constituir, pela sentença - constitutiva -, nova relação jurídica entre as partes), pela titularidade das situações jurídicas (direito, dever, sujeição, etc.) que a integram: legitimados são então os sujeitos da relação jurídica controvertida, como estatui o n.º 3 do art.º 26.

  5. E se é certo que o n.º 2 do art.º 4 do Decreto-Lei n.º 48051 de 21 de Novembro de 1967 refere que "se houver pluralidade de responsáveis é aplicável o disposto no art.º 497º do Código Civil", ou seja, é solidária a sua responsabilidade, como muito bem refere o Tribunal a quo, deve dizer-se que o n.º 1 do art.º 517º do Código Civil não deixa margem para dúvidas: "a solidariedade não impede que os devedores solidários demandem conjuntamente o credor ou sejam por ele conjuntamente demandados".

  6. O Tribunal a quo referiu, com base no pressuposto que se explicitou que, "nenhum facto concreto' referiram (os AA.J quanto a essa alegada participação ou colaboração. Como, em face de tudo o que acima se expôs, não baste alegar a existência da relação jurídica, é necessário concretizá-la através da alegação dos pertinentes factos, a inexistência destes no que tange à responsabilidade do INGA determina, não a ineptidão mas a ilegitimidade passiva deste réu".

  7. Mas se assim é, deveria o Tribunal a quo ter lançado mão do art.º 508º do C.P.C. e, em particular, do seu n.º 3, que deve ser interpretado em conjugação com a alínea b) do nº 1 da mesma disposição.

  8. Como refere, aliás, a jurisprudência dominante:"O poder conferido ao juiz no artigo 508º, nº 3, do Código de Processo Civil é um poder-dever de prevenir as partes sobre as deficiências ou insuficiências das suas alegações ou do pedido, designadamente quando as partes, em vez de alegarem factos concretos, se limitam a usar de expressões com mero significado técnico-jurídico (Cfr. Ac. da Rel. Do Porto de 25.06.98 in Bol. do Mm. da Just., 478, 456).

  9. Aliás, idêntica solução é adoptada pelo n.º 2 do art.º 265º do C.P.C. que refere sem margem para dúvidas que "O juiz providenciará, mesmo oficiosamente, pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando estiver em causa alguma modificação subjectiva da instância, convidando as partes a praticá-los" 11. Deste modo, sendo a ilegitimidade de alguma das partes excepção dilatória, nos termos e para os efeitos da alínea e) do art.º 494º do C.P.C. e pressuposto processual por aplicação do n.º 1 do art.º 288º, deveria o Juiz providenciar, mesmo oficiosamente, pelo suprimento da eventual falta, nos termos do n.º 2 do art.º 265º, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância.

  10. Uma vez que nada disto foi efectuado, a decisão em causa violou os preceitos citados nas conclusões da presente alegação, o que se alega para todos os efeitos legais.

    Nestes termos e em face de todo o exposto, Deve o presente recurso ser julgado integralmente procedente por provado, revogando-se o despacho recorrido e substituindo-se por outro que julgue improcedente a excepção de ilegitimidade passiva invocada pelo R. INGA ou que, subsidiariamente, determine o suprimento dos pressuposto processual da ilegitimidade nos termos e para os efeitos do n. 3 do art.º 288 aplicável ex vi do art. 265º n.º 2 do C.P.C. ou, em alternativa, que seja proferido despacho que convide os AA. ao suprimento da insuficiência/imprecisão na exposição da matéria de facto alegada nos termos e para os efeitos do art.º 508º do C.P.C., pois só assim será Direito e JUSTIÇA".

    1.9.

    O INGA contra-alegou, concluindo: "1. A questão da responsabilidade conjunta ou solidária não é relevante para a boa decisão do presente recurso que se deverá centrar somente na questão da legitimidade.

  11. Ora, o Agravado INGA não tem, nos termos do art° 26° CPC, interesse directo em contradizer - já que nenhum pedido contra ele foi deduzido pelos Autores e ora Agravantes nem na p.i. nem na réplica, não lhe advindo da eventual procedência da acção qualquer prejuízo.

  12. Se dúvida houvesse que não há, então subsidiariamente ter-se-ia que averiguar se face à causa de pedir, tal como ela é alegada pelos Autores e ora Agravantes e sempre articulado com o pedido deduzido, o Agravado INGA é ou não titular dessa relação.

  13. Sendo que o Agravado INGA também não é titular da relação material controvertida tal como prefigurada pelos AA. e Agravantes uma vez que estes não imputam qualquer facto ilícito, nem assacam responsabilidade ao R. INGA ou dele pedem uma indemnização, mas sim exclusivamente ao R. Estado.

  14. Não está em causa uma situação de insuficiência ou deficiência na exposição da matéria de facto alegada, mas uma situação de ilegitimidade que não comporta a aplicação do artigo 508°, n° 3 C.P.C (que de resto se traduz em um despacho não vinculado).

  15. Ao admitir a aplicação do artigo 508°, n° 3 C.P.C. ao presente caso, permitir-se-ia uma alteração simultaneamente subjectiva e objectiva da instância, legalmente inadmissível.

  16. A ineptidão é uma questão precípua à da aferição da legitimidade e respeita ao fundamento jurídico concreto do direito invocado ou da pretensão deduzida perante o tribunal, sendo que a sua apreciação positiva preclude a apreciação da questão da legitimidade, como resulta do estabelecido no artigo 288° C.P.C. e conjugado com o artigo 660°, n° 1 CPC.

  17. Não faz sentido, salvo o devido respeito, estar-se a falar em insuficiência de factos e sanação dos mesmos nos termos do art° 508°, n° 3 CPC quando a mesma causa de pedir não foi posta em causa na relação com a pretensão deduzida a não ser metodologicamente e instrumentalmente para analisar e decidir da questão da legitimidade.

  18. Daí ser igualmente insustentável o pedido de ou o convite a que alude o art° 508°, n° 3 C.P.C., porquanto directamente não se está a pôr em causa a insuficiência da causa de pedir como fundamento do direito invocado, mas apenas o interesse em contradizer por parte do R. INGA, face a esse pedido e essa causa de pedir.

  19. Também não faz sentido, salvo o devido respeito, o pedido formulado pelos Agravantes em sede de recurso, de se determinar o...

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