Acórdão nº 01267/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2005

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução26 de Abril de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1 - A…, id. a fls. 2, interpõe recurso contencioso de anulação do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO DA SAÚDE, de 15.03.2002, "que decidiu, no uso de competências delegadas, a exclusão da comparticipação do medicamento LANTIGEN B - solução oral com o código 8525006 (1 frasco com 18ml); solução oral com o código 8525014 (2 frascos com 18ml cada); solução oral com o código 8525022 (3 frascos com 18ml cada).

Sustenta em síntese que o despacho recorrido, ao aplicar o Despacho nº 22.651/2000 (que extravasa os limites da sua norma habilitante) na decisão de exclusão da comparticipação, é ilegal por violar o artº 7º nº 1 al. a) do DL 118/92 2 - Na resposta que apresentou a entidade recorrida sustenta a improcedência do recurso.

3 - Em alegações a recorrente formulou as seguintes CONCLUSÕES: A - Em 9 de Maio de 2003, por carta do Conselho de Administração do INFARMED, foi a ora Recorrente notificada, do acto administrativo praticado pelo Senhor Secretário de Estado da Saúde que decidiu a exclusão da comparticipação do medicamento LANTIGEN B - solução oral com o código 8525006 (1 frasco com 18ml); solução oral com o código 8525014 (2 frascos com 18ml cada); solução oral com o código 8525022 (3 frascos com 18ml cada).

B - Tal acto administrativo é anulável porquanto não respeitou o regime legal de descomparticipação de medicamentos, presente no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92, de 25 de Junho ("Comparticipação do Estado no Preço dos Medicamentos"), com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 305/98, de 7 de Outubro, pelo Decreto-Lei n.º 270/2002, de 2 de Dezembro, violando, assim, frontalmente a lei, sendo tal Despacho igualmente lesivo dos direitos e interesses legalmente protegidos da Recorrente, na qualidade de titular da AIM do LANTIGEN B.

C - A A... é directamente prejudicada por tal decisão, pois deixará de auferir os notórios benefícios económicos decorrentes da comercialização de um medicamento com o preço de venda ao público comparticipado, caso a decisão em questão nos presentes autos produza os seus efeitos.

D - O Despacho n.º 22651/2000 é inválido por violar a Lei, ou seja, por não cumprir o disposto no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92, dado que foi emitido em sentido oposto àquele quadro normativo, tornando assim a decisão de exclusão de comparticipação do medicamento LANTIGEN B ilegal, por enfermar do vício de violação de lei.

E - O Despacho ora em questão extravasou os limites da sua norma habilitante, a saber, o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 205/2000, que veio desenvolver a regulação do procedimento de reavaliação sistemática, pois tendo o Despacho n.º 22651/2000 natureza jurídica regulamentar - dado que corresponde a um comando jurídico unilateral, emitido no exercício de um poder público de autoridade, dispondo de modo geral e abstracto sobre as situações a que se aplica, estando sujeito ao princípio da legalidade -, este não poderia derrogar, modificar ou revogar a lei.

F - Não obstante os princípios supra expostos, o Despacho n.º 22651/2000 desrespeitou frontalmente o regime legal de descomparticipação (maxime por razões ligadas à eficácia terapêutica do medicamento) contido nas alíneas do n.º 1 do artigo 7.º, pois não se limitou a desenvolver o regime da exclusão da comparticipação, presente no preceito acima mencionado, como lhe ordenara o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 205/2000, tendo-se aventurado na criação de um novo critério de descomparticipação de um medicamento (o critério da qualidade da "prova científica apresentada").

G - Contudo, em nenhuma das alíneas do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92 se prevê que a comparticipação possa ser retirada consoante o critério da qualidade da "prova científica apresentada", pelo que o disposto no n.º 1 do Despacho n.º 22651/2000 é ilegal com fundamento em violação de lei.

H - Existindo uma tipicidade legal em matéria de exclusão da comparticipação que a Administração deverá respeitar quando reavalia um medicamento, ou seja, uma enunciação normativa fechada dos pressupostos do acto de exclusão da comparticipação presentes no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92, a comparticipação corresponde a um acto constitutivo de direitos ou interesses legalmente protegidos, que não pode naturalmente ser posto em causa, sob pena de ser ilegítimo e ilegal, por uma decisão discricionária posterior da Administração, sem que a mesma demonstre, perante o destinatário desse acto, o porquê e a legitimidade de tal decisão.

I - Decorre do acima exposto que, sendo o Despacho n.º 22651/2000 ilegal, o Despacho ora em apreço é também ele, consequentemente inválido.

J - O Despacho ora recorrido recaiu sobre a proposta de descomparticipação elaborada pelo INFARMED no âmbito do procedimento de reavaliação, tendo aquela proposta aplicado o Despacho n.º 22651/2000.

L - O INFARMED, contrariamente ao disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92, não demonstrou, como lhe competia, que a eficácia terapêutica do LANTIGEN B era reduzida, tendo aplicado sem reservas o disposto nos n.os 1 a 4 do Despacho n.º 22651/2000.

M - Ao exposto acresce que, todo o procedimento desenvolvido pelo INFARMED é insusceptível de fundamentar uma decisão de exclusão da comparticipação com base na alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 118/92, pois esse procedimento apenas reflecte que a Administração não dispôs de elementos suficientes que lhe permitissem no caso concreto decidir a exclusão da comparticipação do LANTIGEN B, porquanto não conseguiu demonstrar a reduzida eficácia terapêutica desse medicamento.

N - Contrariamente ao alegado pela Recorrida (cfr. artigos 20.º a 33.º da resposta), nos termos da lei, não compete à A..., enquanto interessada, apresentar os estudos comprovativos da eficácia e eficiência do LANTIGEN, até porque nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 6.º e das alíneas a) e b) do artigo 22.º da Lei Orgânica do INFARMED da "Lei Orgânica do INFARMED"), incumbe, em especial, ao INFARMED "assegurar a elaboração de estudos e pareceres relativos à acessibilidade e utilização dos medicamentos no sistema de saúde", e integram a Área de Coordenação de Informação e Utilização de Medicamentos de que o INFARMED dispõe, "a observação da oferta e da procura e da acessibilidade dos medicamentos, produtos de saúde e seus circuitos" bem como "a produção de informação para a decisão de acordo com os limites técnicos científicos disponíveis" (sublinhado nosso).

O - Do acima exposto resulta estar demonstrado que, contrariamente ao alegado pela Recorrida, competiria ao INFARMED, e não à Recorrente, realizar os estudos comprovativos da falta de eficácia e eficiência do LANTIGEN B, aquando da avaliação do mesmo para efeitos de decisão de exclusão de comparticipação, porquanto, nos termos das disposições supra referidas, tal Instituto possui competência para tanto, estando igualmente dotado dos meios necessários para a realização de tais estudos.

P - Conclui-se, pois, que o Despacho recorrido ao aplicar o Despacho n.º 22651/2000, na decisão de exclusão da comparticipação, é também ele inválido por violar o artigo 7.º n.º 1 alínea d) do Decreto-Lei n.º 188/92.

Nestes termos, requerer-se a anulação do Despacho do Senhor Secretário de Estado da Saúde, de 15 de Março de 2002, que veio decidir a exclusão da comparticipação do medicamento LANTIGEN B, por o mesmo, apoiando-se num regulamento ilegal (Despacho n.º 22651/2000), violar a lei.

4 - Contra-alegando a entidade recorrida mantém a posição anteriormente assumida na resposta, no sentido da improcedência do recurso.

5 - O M.º P.º emitiu parecer a fls. 171 cujo conteúdo se reproduz, no sentido do não provimento do recurso já que a decisão recorrida não enferma dos vícios que lhe são imputados.

Cumpre decidir: 6 - MATÉRIA DE FACTO: Com interesse para decisão, resulta dos autos o seguinte: A - Ao abrigo do disposto no artº 4º da Lei 14/2000, de 8 de Agosto, foi desencadeado pelo INFARMED o processo de "Reavaliação dos Medicamentos que constam da Lista de Medicamentos Comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde" (doc. de fls. 29).

B - Entre os medicamentos reavaliados no âmbito daquele processo de reavaliação inclui-se o medicamento "LANTIGEN B", relativamente ao qual em 10.01.2001 foi elaborado um "relatório", que termina nos seguintes termos: "Conclusões: Não foram identificados estudos.

Classificação de evidência científica (Despacho nº 22651/2000 - 2ª série D. R.) Evidência científica tipo. Não avaliável" - doc. de fls 44 - (anexo I), cujo conteúdo se reproduz).

C - Tendo sido notificada a recorrente, titular da comercialização do aludido medicamento, de acordo com os artº 100º e 101º do CPA, do sentido provável da decisão que o INFARMED se propunha tomar - intenção de descomparticipar o referido medicamento - veio a mesma opor-se à proposta de deliberação, enviando a "seguinte documentação adicional: (i) Revisão...

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