Acórdão nº 01340/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Julho de 2004

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução06 de Julho de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., identificada nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal da sentença proferida na Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que rejeitou o recurso contencioso de anulação do despacho proferido pelo ..., notificado à recorrente em 26 de Dezembro de 2002, formulando as seguintes conclusões: A) O presente recurso vem na sequência da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que rejeitou o recurso contencioso de anulação interposto do acto praticado pelo ..., Dr. B..., acto este através do qual se intimou a Recorrente a repor a quantia de EUR; B) Para fundamentar tal recusa, o digníssimo Tribunal a quo apontou diversos argumentos que, segundo o mesmo, seriam susceptíveis de demonstrar a existência de uma relação hierárquica entre o ... e o Ministro que tem a seu cargo a gestão global dos programas de financiamento, o que sempre implicaria que o recurso à via contenciosa fosse precedido por competente recurso hierárquico necessário; C) Para tanto, o Juiz a quo referiu que o Gestor (i) tem o estatuto de encarregado de missão, (ii) têm competência própria, mas não exclusiva, (iii) exerce funções junto do Ministro responsável pela gestão global do FSE; D) Com base naqueles fundamentos a sentença concluiu no sentido de considerar que recorrido não seria definitivo, por dele recurso hierárquico necessário.

E) Por um conjunto de razões, a Recorrente não se pode conformar com a Sentença recorrida: F) Em primeiro lugar, a Recorrente considera que o facto de a lei prever a existência de determinados poderes de controlo e supervisão do Ministro sobre o Gestor, não é suficiente para concluir pela existência de uma subordinação hierárquica. Aliás, o facto desses dois órgãos não estarem inseridos na mesma estrutura orgânica, e não ser possível encontrar o conjunto de poderes/deveres que caracterizam a relação de subordinação (pressuposto daquele meio de impugnação graciosa), leva-nos a concluir pela inexistência de tal hierarquia; G) Assim, consideramos que os actos praticados pelo Gestor são passíveis de recurso contencioso sem necessidade de prévio recurso à via graciosa; H) Por outro lado, o acto em causa visou produzir determinados efeitos (obrigatoriedade de repor a quantia reclamada, e legitimação de uma eventual compensação desta quantia com outras que a Recorrente tivesse direito a receber no âmbito do FSE) que se iriam repercutir de forma imediata na esfera jurídica da Recorrida. Efeitos esses que lesam os interesses desta mesma Recorrida.

I) Assim, ainda que aquela relação hierárquica existisse, o que não se aceita mas por mera cautela de patrocínio se pondera, a verdade é que o simples facto de o acto do Gestor ser um acto lesivo (ainda que não seja verticalmente definitivo) é por si só suficiente para determinar a sua impugnabilidade contenciosa; J) Tal conclusão, além de se extrair da letra do art. 268º, n.º 4 da C.R.P também se retira de diversa jurisprudência e doutrina; K) Por todos estes motivos, devem improceder os fundamentos constantes da sentença recorrida, devendo V. Exas decidir pela revogação da mesma e, consequentemente, ordenar ao Tribunal a quo que conheça do mérito do recurso contencioso de anulação interposto.

Não foram produzidas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal o Ex.mo Procurador -Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos, legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

  1. Fundamentação 2.1. Matéria de facto A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos: a) A Requerente é uma sociedade anónima cuja actividade consiste na prestação de serviços, estudos e consultadoria, nos domínios da formação, investigação social e recursos humanos; b) A requerente apresentou ao Instituto Nacional de Formação Turística, em meados de 1999, uma candidatura de financiamento para 7 cursos de formação profissional, a realizar no Continente e na Região Autónoma dos Açores, no âmbito da Medida 3 - Formação de Profissionais do Turismo, apoiada pelo Fundo Social Europeu (QCA 11); c) Por decisão datada de 29 de Outubro de 1999, aquele Instituto aprovou a atribuição de um financiamento à ora Requerente, no valor total de Esc. 61.967.539$00; d) Com data de 26.DEZ.02 foi enviado à requerente o ofício n.º 02982, do seguinte teor: No seguimento do ofício enviado a V, Exa, a 8 de Novembro a solicitar documentos de quitação das despesas apresentadas no pedido de pagamento de saldo e tendo em conta que nenhum documento comprovativo do efectivo pagamento nos foi enviado no prazo de 15 dias úteis, vimos informar que: - a entidade terá de repor ao Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu (DAFSE), o montante de € 49.924,03, com base no disposto na alínea e) do art.º 24 da Portaria n.º 745-A/96, de 16 de Dezembro. Para o efeito, informa-se que, de acordo com o n.º 3 do art.º 26 do Decreto Regulamentar nº 15/96 de 23 de Novembro as entidades formadoras devem restituir os montantes em causa no prazo de 30 dias a contar da notificação efectuada pelo DAFSE, após o que serão os mesmos acrescidos de juros de mora à taxa estabelecida para as dívidas fiscais ao Estado e aplicados da mesma forma.

e) o ofício referido na alínea anterior é assinado pelo Gestor B...; f) por ofício de 31-1-2003, subscrito pelo Presidente do Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, fotocopiado a fls. 84 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a recorrente foi intimada a restituir ao referido Instituo a quantia de € 49 924,03, no prazo de 30 dias.

2.2. Matéria de direito A decisão recorrida rejeitou o recurso por entender que o acto contenciosamente recorrido não era verticalmente definitivo, uma vez que do mesmo cabia recurso hierárquico necessário. Fundamentou-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, designadamente no Acórdão de 19-2-2003 (Pleno) proferido no recurso 045749, que seguiu de perto, e Acórdãos no mesmo sentido proferidos em 9-10-2002 (recurso 048011) e em 18-12-2002 (recurso 048260).

O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, neste Supremo Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, dado a sentença recorrida ter feito correcta interpretação da lei, aliás, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal (Ac. de 15-10-02, recurso 45917, 4-6-03, recurso 48235 e 0905/02), "onde a alegada inexistência de subordinação hierárquica do autor do acto impugnado é analisada e de cuja orientação não se vislumbram razões para divergir".

Este Supremo Tribunal tem vindo efectivamente a entender que as competências exercidas pelo Gestor do Programa, no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio, nos termos do Dec. Regulamentar 15/96, de 23/11, não são competências exclusivas, de forma a afastar o recurso hierárquico necessário. As razões de tal entendimento, podem ver-se no Acórdão deste Supremo Tribunal (Pleno) de 4-6-2003, recurso 905/02), com as quais concordamos inteiramente e que reproduzimos: "As competências para a suspensão, revogação e redução dos apoios de financiamento no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio (QCA) pertencem ao Gestor do Programa, nos termos do Dec. Reg. n.º 15/96, de 23/11 em conjugação com o DL. n.º 99/94, de 19/9.

Esta entidade é um órgão de gestão, integrado no Ministério do Emprego e Segurança Social e actualmente no Ministério do Trabalho e da Solidariedade e dependente deste.

De acordo com o disposto nos arts. 3º n.º 2, al. a) e 23° n.º 1 do DL n.º 99/94, de 19/4, o referido órgão visa assegurar a gestão técnica, administrativa e financeira de cada uma...

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