Acórdão nº 044163 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Dezembro de 2002

Magistrado ResponsávelPIRES ESTEVES
Data da Resolução12 de Dezembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A..., economista, com domicílio na Rua ..., nº..., Lisboa, interpôs o presente recurso contencioso de anulação da deliberação do Conselho de Ministros, de 14/5/1998, que atribuiu à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa o direito de organizar e explorar o jogo "Totogolo", em exclusivo, em todo o território nacional, por estar inquinada com vários vícios.

Nas suas alegações o recorrente formula as seguintes conclusões: "1) Toda a matéria de excepção invocada na contestação da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e na resposta de Sua Excia. o Primeiro Ministro contraria o que já foi decidido no Acórdão deste Supremo tribunal de 15 de Junho, proferido nos presentes autos; 2) O único argumento «novo» é invocado por Sua Excia. o Primeiro-Ministro no artº 11º da sua resposta: que a competência para julgar a matéria dos autos pertence ao tribunal de Comércio e não `Jurisdição Administrativa; 3) A Lei Orgânica e de Funcionamento dos Tribunais Judiciais, que criou os tribunais de comércio, foi aprovada pela Lei nº3/99, de 13 de Janeiro, e entrou em vigor posteriormente à interposição do recurso contencioso dos autos, em 25/8/98, não sendo, por isso, aplicável ao recurso sub judice; 4) A recorrida particular, Santa Casa de Misericórdia de Lisboa, advoga a ilegitimidade da recorrente, com base no argumento desta não ser titular do registo da marca nacional nº327.196, cujo pedido de registo, entretanto, foi recusado; 5) Apesar disso, importa considerar que o recurso não se baseou exclusivamente na violação do direito a essa marca, mas também, na titularidade da recorrente sobre o registo de marca nacional nº 308.331, «TOTOGOLO» - registo este que está em pleno vigor -, razão por que a legitimidade da recorrente mantém-se; 6) Não se verifica a «inutilidade superveniente da lede» invocada no artº 13º e segs. da resposta do Conselho de Ministros, posto que a recorrente (man)tem interesse legítimo na defesa da sua marca nacional nº308.331, «TOTOGOLO»; 7) A deliberação recorrida foi tomada pelo Conselho de Ministros (restrito) em 14 de Maio de 1998, e inserida no DL. nº225/98, publicado no Diário da República, Série I-A, de 17/7/98 e tornou-se executória em 14 de Agosto de 1998 - data em que foi publicada e entrou em vigor a Portaria nº525/98, de 14/8; 8) Cerca de 3 anos antes da deliberação recorrida, em 16 de Março de 1995, o recorrente requereu ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial o registo de marca nacional nº308.331, que é caracterizada pela expressão de fantasia «TOTOGOLO», e se destina a assinalar ‘produtos de impressão (impressos, jornais, e periódicos), livros, papel e artigos de papel, cartão e artigos de cartão' (Classe 16ª); 9) E por despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial de 6/3/1996 (proferido cerca de 2 anos antes da deliberação recorrida), esse Instituto decidiu conceder ao recorrente o referido registo da marca «TOTOGOLO», para assinalar os produtos acima referidos; 10) A deliberação recorrida viola os direitos de marca atribuídos ao recorrente por esse registo e enferma de vários vícios administrativos, razão por que deve ser declarada a nulidade da mesma, ou, caso assim não o entenda, deve ser anulada; 11) O Conselho de Ministros decidiu sobre matéria administrativa estranha às suas respectivas atribuições no Decreto-Lei nº225/98, de 17/7; 12) Logo no artº 1º nº1 do aludido decreto-lei é concedido à recorrida particular «o direito de organizar e explorar, em regime de exclusivo para todo o território nacional, um jogo denominado ‘Totogolo'»; 13) Esta decisão não constitui um acto normativo, pois não possuindo as características de abstracção e de generalidade, definidoras de um dado comando como norma jurídica, antes consubstancia uma decisão individual e concreta, ou seja, um acto materialmente administrativo - neste sentido, vide, o Acórdão deste Supremo tribunal de 15 de Junho de 1999, proferido nestes mesmos autos; 14) Esse acto administrativo atribui à recorrida particular - e apenas a ela - o exclusivo de utilização do sinal distintivo «Totogolo» para assinalar os suportes («bilhetes» ou impressos) de um jogo; 15) Essa decisão viola os direitos de propriedade e de exclusivo de utilização da expressão fantasia «TOTOGOLO», que o recorrente anteriormente adquiriu através do registo da marca; 16)O Conselho de Ministros proferiu essa decisão ao arrepio do procedimento especial do registo de marca, previsto e regulado no artº 165º e segs. do Código da Propriedade Industrial; 17)Não obstante claridade da lei sobre o modo (e o processo) de aquisição/concessão do direito de propriedade e do exclusivo de utilização de uma marca, o Conselho de Ministros atribuiu à recorrida particular, em exclusivo para todo o território, o direito de assinalar um jogo e os respectivos bilhetes e impressos com a expressão de fantasia »Totogolo», com total «indiferença» pelo procedimento administrativo especial aplicável ao registo de marcas; 18) O Governo possui atribuições nem competência administrativa para atribuir direitos privativos de propriedade industrial, independentemente de registo: 19) Essas atribuições e competências pertencem ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial, nos termos do Código da Propriedade Industrial e da Lei Orgânica do I.N.P.I., aprovada pelo Decreto Regulamentar nº17/90, de 30/6; 20)À data da deliberação recorrida esse Instituto tinha uma Direcção de Serviços de Marcas, com competência para «realizar os actos relativos à concessão dos registos de sinais distintivos de comércio» - artº 12º nº1 al.c) do mencionado diploma orgânico; 21) Actos esses que, como é evidente, são vinculados, sendo praticados com estrita observância do processo gracioso especial de registo de marca, regulado pelos arts. 181º a 203º do Código da Propriedade Industrial; 22) A deliberação impugnada foi proferida no âmbito de atribuições e competências estranhas ao Conselho de Ministros, e invadindo as atribuições e competências conferidas ao INPI, que é um instituto público dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa; 23) Motivos por que a deliberação recorrida enferma da nulidade prevista no artº 133º nº2 al.b) do CPA e se pede, consequentemente, que seja declarada essa nulidade; 24) O Conselho de Ministros atribuiu à recorrida particular - à margem do procedimento registral a todos aplicável -, o exclusivo da utilização da expressão de fantasia «Totogolo», para assinalar um jogo e os respectivos bilhetes e impressos - cfr. artº 2º nºs 1, 4, 5 e 6 do DL. nº255/98, de 17/7 e artº 5º da Portaria nº 525/98, de 14/8; 25) O recorrente é proprietário da marca «Totogolo», que tem devidamente registada no INPI sob o nº308.331, para assinalar «produtos de impressão (impressos, jornais e periódicos), livros, papel e artigos de papel, cartão e artigos de cartão»; 26) O CM facultou à recorrida particular a utilização da expressão de fantasia «Totogolo», para denominar (assinalar) precisamente os mesmos produtos (bilhetes/impressos) a que se destina a marca registada «Totogolo» do recorrente; 27) O CM conhecia - ou tinha a obrigação de conhecer - os direitos de propriedade industrial do recorrente sobre o sinal distintivo registado «Totogolo»; 28) Os respectivos actos constitutivos foram publicados nos termos da lei, no Boletim da Propriedade Industrial, que é um apêndice do Diário da República; 29) A utilização pela recorrida particular da expressão «Totogolo» para assinalar os produtos «Totogolo» para que está registada a marca anteriormente registada do recorrente, constitui uma gravíssima violação dos seus direitos de propriedade industrial e de exclusivo; 30) Essa violação dos direitos do recorrente é tanto mais grave quando envolve, inevitavelmente, a prática dos crimes de concorrência desleal (previsto e punido pelo artº 260º, al. a) do CPI), e de contrafacção de marca (previsto e punido pelo artº 264, als. a), c) e e) do CPI); 31) A deliberação recorrida deve ser declarada nula por envolver a prática dos crimes de concorrência desleal e de contrafacção de marca - artº 133º nº2 al.c) do CPA; 32) A mesma deliberação foi proferida sem observar as prescrições legais relativas ao procedimento administrativo gracioso de atribuição de exclusivos de utilização de sinais distintivos destinados a assinalar produtos ou serviços, ou seja, o processo de registo de marca regulado nos arts. 181º a 203º do CPI; 33) A deliberação tomada com ofensa de todos os princípios gerais do procedimento administrativo - como o da iniciativa, da comunicação aos interessados do início do procedimento, do inquisitório, da audiência dos interessados, etc., - enferma, salvo melhor opinião, de nulidade por natureza; 34) À data da deliberação recorrida, a competência para a atribuição de direitos privativos de propriedade industrial estava conferida ao Presidente do INPI, que a podia delegar - o que aconteceu: cfr. despacho de delegação de poderes de 15/12/96, publicado no DR, II Série, nº1, de 2/1/96; 35)O CM não possuía competência administrativa para atribuir para atribuir à recorrida particular o exclusivo da utilização do sinal distintivo do comércio «Totogolo», para assinalar um jogo e os respectivos impressos e bilhetes, sem observância dos ditames legais que conformam o procedimento gracioso especial do registo de marca, que são os previstos e regulados no CPI; 36) Razões por que a deliberação recorrida enferma do vício de incompetência (relativa) e, por consequência, deve ser anulada; 37) Por via da deliberação recorrida foi atribuída à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa o exclusivo, para todo o território nacional, do uso da expressão «Totogolo» - que reproduz a marca registada nº308.331, «Totogolo» do recorrente - para ‘denominar' precisamente os mesmos produtos a que esta marca do recorrente serve para assinalar; 38)O CM violou o direito de propriedade e de exclusivo de utilização do sinal distintivo caracterizado pela expressão de...

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