Acórdão nº 047973 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Setembro de 2002

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução26 de Setembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., S.A., interpôs recurso contencioso do despacho conjunto do Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas e do Senhor Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, assinado pelo primeiro em 15-12-2000 e pelo segundo em 9-2-2001, que lhe atribuíram uma indemnização decorrente da aplicação das leis da Reforma Agrária no valor de 90.699.429$00.

O Senhor Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e Pescas respondeu entendendo que não ocorrem os vícios que a recorrente imputa ao acto recorrido.

A recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1 - A indemnização a que se referem os autos é devida pela privação temporária do uso e fruição de prédios rústicos indevidamente expropriados e ocupados.

2 - Neste processo, e em concreto, está em causa a indemnização pelo valor de valor de uma cortiça extraída e comercializada em 1977, 83, 84 e 86.

3 - A cortiça extraída em 1977 e 83 no prédio da recorrente constitui um fruto pendente, à data da ocupação do prédio em 05/12/75, art. 212 do C.C. e art. 9 n.º 3 e 5 do Decreto-Lei 2/79 de 09/01.

4 - Os frutos pendentes são indemnizados por valores de 94/95, art. 3 c) da Portaria 197-A/95.

5 - A cortiça extraída em 1984 e 86 paga à recorrente por valores históricos do ano da sua extracção, deve igualmente ser indemnizada por valores de 94/95, como acontece com os demais bens indemnizáveis no âmbito da Reforma Agrária, art. 2 n.º 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

6 - Trata-se de uma indemnização devida pelos lucros cessantes que o proprietário deixou de auferir, o qual deve ser colocado na mesma situação, caso não se tivesse verificado a ocupação e expropriação do prédio. Recs. 44.044 44.146 (Pleno) 7 - Esta indemnização está subtraída ao princípio nominalista, devendo ser reconstituída a situação que existiria se não tivesse ocorrido a expropriação e ocupação do prédio, art. 562 do C.P.C. e Rec. 44.146 8 - A indemnização em causa corresponde ao princípio de que o valor do bem expropriado deve ser calculado, em momento tão próximo quanto possível da data em que a indemnização vem a ser fixada e paga.

9 - Não seria justo que o expropriado além do prejuízo sofrido pela privação do bem viesse ainda a suportar os prejuízos emergentes do atraso da fixação e pagamento da indemnização.

10 - Seria profundamente injusto fixar uma indemnização sem atender à actualização do rendimento do prédio, quando são decorridos mais de 25 anos de privação desse rendimento.

11 - Não existe proximidade temporal entre a privação do rendimento da cortiça e o pagamento da sua indemnização, tendo decorridos mais de 25 anos da data da sua extracção e comercialização por parte do Estado.

12 - As indemnizações da Reforma Agrária "serão fixadas com base no valor real e corrente desses bens e direitos..." de modo a assegurar uma justa compensação pela privação dos mesmos bens e direitos, art. 7 n.º 1 do Decreto-Lei 199/88 de 31/05.

13 - A indemnização para ser justa tem de garantir ao expropriado o valor real do bem no momento do pagamento.

14 - Todos os bens e direitos objecto de indemnização da Reforma Agrária, foram actualizados para preços correntes ou valores de 94/95, art. 11 n.º 5 e 6 do Decreto-Lei 38/95 de 14/02, art. 2 n.º 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

15 - A cortiça extraída em 1977 e 83, tendo a natureza de fruto pendente, teria assim de ser indemnizada por valores de 94/95, art. 3 c) da Portaria 194-A/95 16 - A cortiça extraída em 1984 e 86 é igualmente indemnizável por valores de 94/95 em analogia com o que se passa relativamente aos demais bens indemnizáveis, art. 2 n.º 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

17 - A Lei 80/77 de 26/10 e o Decreto-Lei 213/79 de 14/07 só são aplicáveis as indemnizações pela perda de património.

18 - Os juros previstos no art. 24 da Lei 80/77 apenas são aplicáveis às indemnizações pela perda de património, art. 1 n.º 2 da Portaria 197-5/95 de 17/03 e não à indemnização pela privação temporária do uso e fruição que é o caso dos presentes autos.

19 - Mesmo que fosse aplicável à indemnização pela privação do uso e fruição o disposto no art. 24 da Lei 80/77, o acréscimo decorrente dessa aplicação ao valor da cortiça reportada a 1977,83, 84 e 86, nunca atingiria o valor real e corrente por forma a alcançar a justa indemnização, como é imposto pelo art. 7 n.º 1 do Decreto-Lei 199/88.

20 - Os juros a que se reporta o art. 24 da Lei 80/77 de 26/10 são remuneratórios, não se destinando a atender a qualquer actualização da moeda. Rec. 44.146 21 - Os juros previstos no art. 24 da Lei 80/77, são igualmente aplicáveis aos demais componentes indemnizatórios actualizados para valores de 94/95. Rec. 46.298 22 - É a própria entidade recorrida que expressamente o reconhece, na DECLARAÇÃO junta aos autos, e que a Lei 80/77 não se aplica à indemnização pela privação temporária do uso e fruição dos prédios expropriados.

23 - As normas de direito internacional sobre indemnizações por expropriação, acolhidas no direito constitucional, art. 8 e no direito interno, preâmbulo do Decreto-Lei 199/88 e bem assim as normas do ordenamento jurídico português sobre indemnizações, impõem a actualização dos danos à data da respectiva liquidação e pagamento.

24 - O art. 62 n.º 2 da Constituição da República é aplicável às indemnizações da Reforma Agrária como entendeu o Acórdão do Pleno da Secção do STA de 17/05/2000, Recurso 44.144. e Rec. 46. 298 (Secção) 25 - A redacção do art. 62 resultante da 4ª revisão constitucional ao eliminar a expressão "fora dos casos previstos na Constituição", determina a aplicação desta disposição constitucional às indemnização pela expropriação no âmbito da Reforma Agrária.

26 - É no entanto irrelevante e constitui uma falsa questão, fazer depender a actualização da cortiça ou de qualquer outro bem indemnizável, para o seu valor real e corrente, de não aplicação do art. 62 n.º 2 da Constituição da República ou da aplicação do art. 94 do mesmo diploma fundamental.

27 - Valor real e corrente, só existe um, ou seja,, o valor do bem a indemnizar actualizado para data do pagamento ou tão próximo quanto possível, por forma a reintegrar no património do expropriado o quantum de que foi desapossado, art. 7 n.º 1 do Decreto-Lei 199/88.

28 - Pela Constituição da República, os critérios de avaliação e direitos a indemnizar têm de respeitar os princípios de Justiça, Igualdade e Proporcionalidade.

29 - Todos estes princípios se encontram ausentes no acto recorrido quando negou a actualização da cortiça extraída em 1977, 83, 84 e 86 para valores de 94/95.

30 - O critério de cálculo da indemnização defendido pelo acto recorrido ao não proceder à actualização da cortiça, é incompatível com o princípio da justa indemnização consignada, no art. 62 n.º 2 da. CR? e contraria o disposto no art. 3 c) da Portaria 197-A/95 de 17/03 .

31 - O acto recorrido por errada interpretação dos dispositivos normativos da Lei Especial das indemnizações da Reforma. Agrária, aponta o princípio da igualdade do art. 13 n.º 1 da Constituição.

32 - A recorrente, no que se refere à não actualização da cortiça foram tratadas de forma particularmente desfavorável e sem qualquer fundamento legal, relativamente a outros cidadãos que receberam os bens indemnizáveis actualizados e os valores da cortiça logo após as devoluções dos prédios ou entrega da reserva.

33 - Uma coisa é receber o valor da. cortiça em 1977, 83, 84 e 86 e outra bem diferente é receber esse valor em 2002, decorridos mais de 25 anos da data do inicio da privação do rendimento e 16 anos após a última extracção.

34 - O acto recorrido ao não proceder à actualização da cortiça,, por erro de interpretação violou o disposto no art. 1 n.º 1 e n.º 2 e art. 7 do Decreto-Lei 199/88 de 31/05, o art. 5 n.º 2 d) e art. 14.º 1 do mesmo diploma, na redacção do Decreto-Lei 38/95 de 14/02, o art. 2 n.º 1 e art. 3 c) da Portaria 197-A/95 de 17/03, o art. 133 n.º 2 d) do CPA e os arts. 10º e 551º do Código Civil.

35 - A interpretação que o acto recorrido fez do art. 24º da Lei 80/77 de 26/10, como fundamentação para a não actualização da cortiça, ter-se-á de considerar, nessa parte inconstitucional uma vez que viola o disposto nos arts. 62 n.º 2 e 13º n.º 1 da Constituição da República por colocar a recorrente em situação de manifesta desigualdade relativa aos demais titulares de indemnização da Reforma Agrária, que receberam os seus bens por valores actualizados, nomeadamente a cortiça após a devolução dos prédios expropriados e ocupados.

36 - O acto recorrido ao não aceitar o princípio de actualização...

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