Acórdão nº 1/06.5IDGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelCALV
Data da Resolução01 de Junho de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: Nos presentes autos de processo comum, com intervenção de tribunal singular, o ministério Publico acusou: - MG..., casado, e residente em … Fornos de Algodres, - IK..., casado, e residente em … Fornos de Algodres, - TT…, Lda., Fornos de Algodres, imputando-lhes a prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, sendo a sociedade arguida ainda por referência ao disposto nos artigos 7º e 12º do RGIT e de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT.

*** Efectuado o julgamento foi proferida a seguinte decisão: I – quanto ao arguido MG...: a) absolver o mesmo da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT; b) condenar o mesmo pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão; c) suspender a execução da pena de prisão aplicada pelo período de 4 (quatro) anos na condição deste, em idêntico período, proceder ao pagamento das prestações tributárias em falta, no montante de €144.665,23 e acréscimos legais nesse período, à taxa em vigor, indiciando-se a contagem deste prazo após trânsito da presente condenação; d) condenar o mesmo nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.

*** II– quanto ao arguido IK...: a) absolver o mesmo da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT; b) condenar o mesmo pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão; c) suspender a execução da pena de prisão aplicada pelo período de 4 (quatro) anos na condição deste, em idêntico período, proceder ao pagamento das prestações tributárias em falta, no montante de €144.665,23 e acréscimos legais nesse período, à taxa em vigor, indiciando-se a contagem deste prazo após trânsito da presente condenação; d) condenar o mesmo nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.

*** III – quanto à sociedade TT... – LDA.

  1. absolver a mesma da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT; b) condenar a mesma pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, por referência ao disposto nos artigos 7º e 12º do RGIT, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa à taxa diária de €5,00, no total de €2.500,00; d) condenar a mesma nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.

*** 2. Não concordando com a decisão proferida, vieram quer o arguido MG...

, a fls. 984/1008 e depois 1078/1102, quer o arguido IK...

(fls. 1012/1069), interpor recurso da mesma.

Assim, 2.1.

O arguido MG..., formulou nas respectivas motivações, as seguintes (transcritas) conclusões: “1° O arguido IK... nunca exerceu qualquer acto de gerência na sociedade arguida, cabendo esta única e exclusivamente ao recorrente.

  1. É nula a Audiência de Julgamento nos termos do art. 363º do C.P.P., por a gravação ela mesma, ser em diversas partes imperceptível, restringindo, desta feita, o direito de recurso do arguido, consagrado no art. 32, n.º 1 da C.R.P.

  2. O arguido não se apropriou do valor apurado a título de IVA referido nos pontos 13 e 14 da matéria de facto dada como provada, nem, consequentemente, a fez reverter em seu proveito próprio, nem no da sociedade arguida.

  3. Na verdade, arguido, na qualidade de sócio-gerende da TT... _ Lda., nunca procedeu à venda dos veículos elencados nos pontos 21, 22 e 23 da matéria de facto dada como provado.

  4. Do mesmo modo, também não recebeu qualquer tipo de pagamento na concretização dos negócios acima referidos, nomeadamente, no negócio que envolveu a aquisição por parte da W... do imobilizado do qual era detentora a sociedade arguida.

  5. Na verdade, os veículos nunca chegaram a entrar na sua esfera jurídica do arguido, pois, encontravam-se sujeitos a um contrato de Leasing, cujo locador era a X...

  6. O que sucedeu foi apenas um acerto de contas que envolveu terceiros, neste caso, a sociedade proprietária do imobilizado, a X..., não sendo, deste modo, retido qualquer valor a título de IVA.

  7. Não existe qualquer documento, nomeadamente, nenhuma factura, que prove que a arguida tenha vendido os bens à W....

  8. Apenas existe registos da contabilidade, embora incompleta, encontrada nos computadores da sociedade arguida, e contas correntes, não valendo estes como factura, pois apenas reflectem movimentos contabilísticos e não vendas nas quais tenha sido retido IVA.

  9. A contabilidade da sociedade arguida encontrava-se completamente desorganizada, sendo apenas reconstituída até Agosto de 2004, pelo que seria impossível apurar-se, sem dúvida inultrapassável, o montante devido a título de IVA nos períodos elencados no ponto 13 da matéria de facto dada como provada, sem recorrer a métodos indiciários.

  10. Desta forma, é nula, quanto a esses factos, a sentença por violação das normas que proíbem a utilização de métodos indiciários em sede de direito Penal.

  11. Em tudo o que se concluiu até agora, o mesmo se aplica quanto aos pontos 24 e 25 da matéria de facto dado como provada.

  12. De facto, o arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca procedeu à venda do imobilizado Supra citado à Y....

  13. Também nunca receberam qualquer quantia relativa a esse negócio, como se pode comprovar pelo facto de não existir nos autos qualquer título de pagamento feito por parte da Y... à TT..., 15º Na realidade, os veículos nem sequer eram propriedade da sociedade arguida, sendo antes aquela da locadora financeira BES Leasing, pelo que não seria possível vender um bem que não lhe pertencia.

  14. O que sucedeu foi que a Y... liquidou a dívida existente da TT... para com a locadora financeira, passando a ser aquela proprietária dos veículos em questão, não havendo, neste particular, lugar ao pagamento de IVA.

  15. O mesmo de dirá do negócio com a JT..., referido nos pontos 26 e 27 da matéria de facto dada como provada.

  16. O arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca vendeu os semi-reboques referidos nos pontos supra citados à JT....

  17. Na verdade, os veículos tinham reserva de propriedade a favor da JT..., pelo que seria impossível serem vendidos à sociedade que era, ela mesma, proprietária, até integral pagamento dos mesmos, o que não sucedeu.

  18. Consequentemente, não foi retido qualquer valor a título de IVA.

  19. Nestes termos, não tendo sido retido qualquer valor a título de IVA nas vendas referidas nos pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da matéria de facto dada como provada, e, sendo o restante montante de imposto devido apurado com recurso a métodos indiciários, impõe-se a absolvição do arguido.

  20. A douta Sentença violou os artigos 32º, n.º1 da C. R. P., 363º do C.P.P.

Termos em que deve ser dado integral provimento ao presente recurso: -declarando-se nula a Audiência de Julgamento por violação do artigo 363º do C.P.P - absolvendo-se o arguido da prática em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança p.p. pelo art. 105º do R.G.I.T., aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, n.º2 e 79º do Código Penal, Como é de JUSTIÇA ” *** 2.2.

Por sua vez, o arguido IK..., formulou nas respectivas motivações, as seguintes (transcritas): “1) É nula a Audiência de Julgamento nos termos do art. 363º do C.P.P., por a gravação da mesma, ser em diversas partes imperceptível, restringindo, desta feita, o direito de recurso do arguido, consagrado no art. 32, n.º 1 da C.R.P.

2) O artº. 95º da lei nº 53-A/2006, de Dezembro, alterou o artº. 105º, nº 4, do R.G.I.T., aditando-lhe a alínea b), de tal modo que, enquanto na redacção primitiva a não entrega da prestação tributária (mesmo que declarada) dentro do prazo de 90 dias a contar do prazo legal da entrega da referida prestação, configurava, sem mais, uma infracção criminalmente punível, já face à Lei nova [al. b) do nº 4 do art.º 105º] uma tal omissão de entrega da prestação durante o referido prazo de 90 dias, deixou de constituir uma infracção criminalmente punível.

3) O artº. 95º da lei nº 53-A/2006 é uma lei despenalizadora, dado que retirou a qualificação de infracção criminalmente punível a factos que, segundo a lei antiga, eram considerados criminalmente puníveis.

4) A conclusão impõe-se, quer a "exigência" constante da al. b) seja qualificada como condição objectiva de punibilidade, quer como elemento do tipo de ilícito do crime de abuso de confiança fiscal - entendimento sustentado pelo Prof. Taipa de Carvalho, com o qual se concorda (neste sentido Prof Taipa de Carvalho e Ex.ma Senhora Doutora Juíza Desembargadora Isabel Pais Martins - obra e Ac. citados).

5) Por tal motivo, a douta decisão recorrida deveria ter absolvido o co-arguido IK... e, não o tendo feito, violou o artº. 105º, nºs. 1 e 4, als. a) e b), do R.G.I.T. e arts, 2º, nº 2, do C.P ..

6) Acresce ainda que o arts. 95º da lei nº 53-A/2006, que acrescentou a al. b) do nº 4 do artº. 105º do R.G.I.T., modificou o tipo de ilícito e conforme já foi referido introduziu uma nova condição de punibilidade: "4.- Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se: a. Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega da prestação; b. A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após a notificação para o efeito".

7) Ora no caso sub-judice...

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