Acórdão nº 0113/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2011

Data19 Maio 2011
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A...SA, B... e C..., com os sinais dos autos, vieram interpor recurso para o Pleno da Secção, posteriormente convolado por despacho de fls. 713 e segs, transitado em julgado, para reclamação para a conferência, do despacho saneador proferido pela relatora do processo, a fls. 658 e segs, que declarou este STA incompetente, em razão da matéria, para conhecer da presente acção administrativa especial que as recorrentes interpuseram contra o CONSELHO DE MINISTROS, A ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA e O ESTADO PORTUGUÊS e absolveu as entidades demandadas da instância.

Terminam as suas alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A) A decisão recorrida nestes autos – trata-se do despacho saneador proferido pela 2ª Subsecção do presente Tribunal, no Processo nº113/10, em19 de Outubro de 2010 – afigura-se juridicamente nula, por verificação de um vício de omissão de pronúncia (cfr. os artº95º, nº1 do CPTA e 668º,nº1 do CPC, aplicável ex vi do disposto nos artº 1º e 140ºdo CPTA), constatável numa dupla vertente, na medida em que duas das questões que deveriam ter sido objecto de resolução pelo Tribunal ficaram totalmente desprovidas de apreciação e consequente decisão judicial.

B) Do “ saneador-sentença” objecto do presente recurso, não resulta, numa primeira linha de análise, uma apreciação e subsequente decisão do pedido, de natureza subsidiária, formulado, a final, pelo qual os AA, aqui Recorrentes, que solicitaram a condenação do Estado Português, ora Recorrido, no pagamento de uma indemnização de € 5.280.254,00, a título de “indemnização pelo sacrifício” efectivamente sofrido na sua esfera jurídica durante longos anos.

C) A subsidiariedade do pedido enunciado na alínea anterior resulta não só do petitório propriamente dito mas ainda do teor do próprio articulado, mas apesar dessa circunstância, o mesmo não foi tido em consideração pela decisão recorrida, quando o deveria ter sido, sendo igualmente de referir que o conhecimento desse pedido não ficou minimamente prejudicado pela solução dada pelo presente Tribunal quanto à alegada excepção de incompetência ( absoluta) da jurisdição administrativa para conhecer da invalidade dos actos materialmente administrativos constantes do Decreto Lei nº 170/2000, de 8 de Agosto, do Decreto Lei nº 118/2003, de 14 de Junho e da Lei nº 38/2006, de 17 de Agosto.

D) O vício de omissão de pronúncia, gerador de nulidade da decisão recorrida, verifica-se ainda, numa segunda linha de análise, na medida em que o pedido de condenação do Estado Português, a título de responsabilidade civil pelo exercício ilícito da função legislativa, foi igualmente omitido, por completo, da apreciação judicial promovida em primeira instância pelo Tribunal da causa (cfr. artº 95º, nº1 do CPTA e 668º, nº1 alínea d) do CPC, aplicável ex vi do disposto nos artº 1º e 140º do CPTA).

E) Tal pedido assume, igualmente, natureza subsidiária – resultante da letra do próprio pedido, do teor da petição inicial e de uma leitura global e integrada do articulado em presença – e o conhecimento do mesmo não ficou prejudicado pela decisão tomada pelo Tribunal quanto à questão da (suposta) excepção de incompetência absoluta da jurisdição administrativa para conhecer da invalidade jurídica dos actos materialmente administrativos ínsitos aos diplomas legais em destaque nos presentes autos.

F) Tendo o Tribunal decidido que no Decreto Lei nº170/2000, de 8 de Agosto, no Decreto Lei nº 118/2003, de 14 de Junho e na Lei nº 36/2008, de 17 de Agosto, apenas se visionam actos normativos e não actos materialmente administrativos, então deveria ter analisado a sua invalidade jurídica – dando, assim, como verificado o requisito da ilicitude e os demais pressupostos legais referidos no artº124º da petição inicial – e reconhecido o pagamento aos Recorrentes de uma indemnização pelos danos assim verificados, tudo com base no artº22º da CRP e nos termos do artº15º da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro. Ao não ter decidido nesses termos o “saneador sentença” ora objecto de recurso é nulo, nos termos das disposições legais referidas em D).

G) A decisão recorrida incorreu ainda num erro de julgamento, porquanto, por reporte à pretensão impugnatória dos Recorrentes, prevaleceu a tese de que não se afigura possível vislumbrar quaisquer actos materialmente administrativos no Decreto Lei nº170/2000, de 8 de Agosto, no Decreto Lei nº 118/2003, de 14 de Junho e na Lei nº38/2006, de 17 de Agosto e nessa medida a jurisdição administrativa seria materialmente incompetente para apreciar a legalidade/inconstitucionalidade de tais disposições normativas de cariz legal.

H) O teor real e concreto dos actos formalmente legislativos identificados foi, com o devido respeito, olvidado pela decisão recorrida, com desconsideração do disposto no artº268º, nº4 da CRP – que permite a impugnação de quaisquer actos, independentemente da sua forma – o qual constitui uma concretização do princípio basilar da tutela jurisdicional efectiva, com assento geral no artº20º, nº1 da CRP.

I) No caso concreto, tendo em vista derrogar, de modo sucessivo, o prazo máximo legalmente admissível para a fixação de medidas preventivas – previsto na Lei dos Solos – o Estado Português ( entendido em sentido amplo), lançou mão de um conjunto de actos materialmente administrativos que visaram produzir efeitos em situações individuais e concretas: (i) as áreas sujeitas a tais medidas encontram-se identificadas – tratam-se das zonas correspondentes aos terrenos delimitados pelos “Quadros A e B”, que figuram em anexo ao Decreto Lei nº31-A/99; (ii) os respectivos destinatários são determináveis, atendendo, desde logo, aos registos públicos de titularidade dos terrenos em questão.

J) Eventuais mudanças de titularidade dos terrenos/lotes em causa podem sempre ocorrer numa economia livre e na qual inexistem, por regra, restrições aos negócios jurídicos inter-privados, mas tais eventos – de natureza incerta – não colocam, minimamente, em causa a qualificação das medidas preventivas em apreço enquanto actos materialmente administrativos.

K) A identificabilidade dos proprietários dos terrenos em questão, à data da emissão das medidas preventivas, era, de facto, uma realidade – e não apenas uma eventualidade, como se diz na decisão recorrida – e a identificação dos futuros e sempre eventuais destinatários das medidas preventivas, não tinha, nem podia ocorrer à data da prática desses actos, pois o que releva são os seus destinatários reais ( e não os destinatários hipotéticos) e os destinatários contemporâneos (e não vindouros) da tomada dessas decisões.

L) No entanto, cabe notar que a existência de registos públicos de propriedade, junto das conservatórias de registo predial respectivas, permite, nos termos da lei, promover uma identificação subjectiva e permanente, em termos rigorosos, da respectiva titularidade dos imóveis em questão, o que significa que os potenciais destinatários dessas medidas são passíveis de identificação ao longo do tempo, com o que improcede in totum o “ argumento pilar” da decisão recorrida.

M) Na medida em que foi negado aos Recorrentes a apreciação da decisão da validade jurídica dos actos materialmente administrativos em presença nestes autos, assiste-se à preterição do disposto no artº4º, nº1, alínea c) do ETAF e no artº52º, nº1 do CPTA e ainda, como se referiu, das garantias constitucionais inerentes aos artº268º, nº4 e 20º, nº1, ambos da CRP.

N) Constitucionalmente é inadmissível o entendimento, expresso na decisão recorrida, segundo o qual a dúvida “ em casos de actos mistos de difícil qualificação (actos gerais e concretos)”, “deve ser resolvida a favor da normatividade” (cfr. pág. 6 da decisão...

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