Acórdão nº 969/07.4TAPRD-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelRICARDO COSTA E SILVA
Data da Resolução11 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 969/97.4TAPRD-B.P1 Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto, I.

  1. Em 2010/02/18, no processo de instrução n.º 969/97.4TAPRD-B, do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Paredes, foi proferida a decisão instrutória de não pronúncia, que, na parte que interessa, a seguir reproduzimos: «(…) «I.

    «Tiveram origem os presentes autos de instrução no requerimento da Assistente B… que, inconformada com o despacho final de inquérito que determinou o arquivamento dos autos relativamente aos crimes de dano e de alteração de marcos, p. e p., pelos artigos 212° n° 1 e 216° n° 1, respectivamente, do Código Penal, veio requerer a pronúncia do arguido pela prática de tais ilícitos.

    «Para tanto alega, em síntese, que houve uma diligência essencial para a descoberta da verdade que não foi promovida, o exame ao local, que comprovou nos autos com a documentação adequada a propriedade do terreno que foi invadido e onde se situavam os pinheiros abatidos que aliás ainda lá se encontram deitados por terra com as raízes à vista e teria sido fácil comprovar os locais exactos dos muros, dos marcos e a localização dos dois pinheiros abusivamente abatidos. Mais alega que forneceu fotogramas esclarecedores das destruições efectuadas e prova indiciária inequívoca de quem foi o mandante.

    «Conclui pela pronúncia do arguido pela prática dos aludidos crimes de dano e de alteração de marcos, p. e p., pelos artigos 212° n° 1 e 216° n° 1, respectivamente, do Código Penal.

    «II.

    «O requerimento de abertura de instrução aduzido aos autos pela assistente foi admitido [cfr. fls. 378], por preencher os requisitos estipulados no art. 287° do Código de Processo Penal.

    «A assistente requereu como diligências instrutórias a realizar pelo tribunal a inspecção ao local, e que ali fossem inquiridas a assistente bem como as duas testemunhas arroladas, bem como que fosse requerido ao Sr. Procurador da República no sentido de apurar das razões da existência de dois despachos contrários que objectivamente a prejudicaram e da possibilidade e viabilidade de apurar o responsável, o que viu ser parcialmente deferido, nos termos e com os fundamentos que melhor constam dos despachos constantes dos autos a fls. 378-379 e 387.

    «O Tribunal determinou ainda oficiosamente, em momento prévio à realização do debate instrutório, a tomada de declarações ao arguido, bem como a deslocação ao local onde ocorreram os factos participados, como o comprova a acta de fls. 412 a 417 e a acta que antecede.

    «III.

    «Não se vislumbrando qualquer outro acto instrutório cuja prática revestisse interesse para a descoberta da verdade e finalidades da presente instrução, procedeu-se à realização de debate instrutório, com observância do formalismo legal, no decurso do qual a assistente C… juntou documentos, agora constantes dos autos a fls. 418 a 429, como o comprova a respectiva acta.

    «IV.

    «O tribunal é competente.

    «A instrução foi requerida por quem para tal tem legitimidade.

    «Não há nulidades, excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

    «V.

    «A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

    «Com o requerimento de abertura de instrução a parte define o âmbito desta, sem que com isso limite os poderes do juiz quanto às diligências probatórias a efectuar para averiguar dos factos alegados.

    «Resulta do art. 286°, n°1 do Código de Processo Penal que "A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.".

    «A instrução destina-se a obter, parafraseando Germano Marques da Silva (in Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo Jurídico), "o reconhecimento jurisdicional da legalidade ou ilegalidade processual da acusação, a confirmar ou não a acusação deduzida, para o que o juiz tem o poder-dever de a esclarecer, investigando-a autonomamente".

    «Do preceito transcrito deduz-se, por conseguinte, que no caso de instrução requerida pelo assistente, como sucede nos presentes autos, o que se pretende é que o Juiz investigue os factos descritos no requerimento instrutório e se os julgar indiciados e nada mais obstar ao recebimento da acusação pronunciará o arguido por esses factos (artigos 308º e 309°). Não há lugar a uma nova acusação; o requerimento do assistente actuou como acusação e, assim, se respeita formal e materialmente a acusatoriedade do processo.

    «Aqui o essencial é apenas que os factos do crime pelos quais o assistente pretende a pronúncia tenham sido objecto do inquérito, sob pena de nulidade processual e consequente inadmissibilidade legal da instrução (art. 287° n° 3 do Código de Processo Penal).

    «A instrução a requerimento do arguido é uma manifestação do direito de defesa, disponível, que exercerá conforme entender, mas a instrução a requerimento do assistente é fundamentalmente uma garantia, garantia para o arguido de que não será submetido a julgamento senão quando se verifiquem os pressupostos legais e garantia da legalidade da decisão do Ministério Público, findo o inquérito1.

    «O assistente não pode requerer a abertura da instrução em relação a pessoa contra a qual o Ministério Público não deduziu acusação, se o inquérito não foi dirigido contra essa pessoa2.

    «A instrução consubstancia, assim, um "direito ao juiz" (Souto Moura, Inquérito e Instrução, in Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, Almedina, pág. 122), no sentido de que representa, constitucionalmente, a judicialização da fase preparatória (cfr. art. 32° da Constituição da República Portuguesa) __________________ «1 Vide Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo Jurídico, pág. 140.

    «2 Neste sentido se pronunciou o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão datado do dia 30/01/2008, no âmbito do processo 0716298, disponível no endereço electrónico www.dgsi.pt.

    _________________ «Configura-se, assim, como fase processual sempre facultativa - n°. 2 do art. 286° do Código Penal - destinada a questionar a decisão de arquivamento ou de acusação deduzida.

    «Como facilmente se depreende do citado dispositivo legal, a instrução configura-se no Código de Processo Penal como actividade de averiguação processual complementar da que foi levada a cabo durante o inquérito e que, tendencialmente, se destina a um apuramento mais aprofundado dos factos, da sua imputação ao agente e do respectivo enquadramento jurídico-penal.

    «O art. 308°, n° 1, do C.P.P., estipula que "Se até ao encerramento da instrução tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário profere despacho de não pronúncia.".

    «Na base do despacho de não pronúncia, para além da insuficiência de indícios necessariamente consubstanciada na inexistência de factos, na sua não punibilidade, ausência de responsabilidade ou na insuficiência da prova para a pronúncia, poderão ainda estar motivos de ordem processual, ou seja, a inadmissibilidade legal de procedimento ou vício de acto processual.

    «Já no que toca ao despacho de pronúncia, a sustentação deverá buscar-se, como vimos, na suficiência de indícios, tidos estes como causas ou consequências, morais ou materiais, recordações e sinais de um crime e/ou do seu agente que sejam captadas durante a investigação.

    «Por sua vez, no dispositivo do art. 283°, n° 2, do mesmo diploma legal, consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou medida de segurança.

    «Por indícios suficientes tem de entender-se "aqueles elementos que, logicamente relacionados e conjugados, facultem um conjunto persuasivo na pessoa que os examina, sobre a existência de facto punível, de quem foi o seu autor e da sua culpabilidade, ou ainda, mais precisamente, quando já em face deles seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição" (Ac. Relação de Coimbra de 09 de Março de 1988, in Col. Jur., Tomo II, pág. 84 e art.° 283.°, n.° 2, do Código de Processo Penal).

    «Ainda sobre aquele conceito legal escreve o Prof. Figueiredo Dias 3 - os indícios só serão suficientes e a prova bastante quando, já em face dela, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição.

    «Acrescenta este autor que logo se compreende que a falta delas (provas) não possa de modo algum desfavorecer a posição do arguido: um "non liquet" na questão da prova.., tem de ser sempre valorado a favor do arguido.

    «Na jurisprudência, a interpretação desse conceito é resumido pela Relação de Coimbra4 da seguinte forma - para a pronúncia, não é preciso uma certeza da existência da infracção, mas os factos indiciários devem ser suficientes e bastantes, por forma que, logicamente relacionados e conjugados, formem um todo persuasivo de culpabilidade do arguido, impondo um juízo de probabilidade do que é imputado.

    «Neste sentido se pronunciou o S.T.J.5, que definiu "indiciação suficiente" como aquela que resulta da verificação suficiente de um conjunto de factos que, relacionados e conjugados, componham a convicção de que, com a discussão ampla em audiência de julgamento, se poderão vir a provar em juízo de certeza e não de mera probabilidade, os elementos constitutivos da infracção porque os agentes virão a responder.

    «Recentemente também a Relação do Porto, em acórdão datado de 22/10/20086, se pronunciou no sentido de que são suficientes os indícios, para efeitos de pronúncia, como de acusação, quando a probabilidade de condenação seja maior que a de absolvição, sendo que a probabilidade de condenação é maior que a de absolvição quando, num juízo de...

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