Acórdão nº 102/09.8GAAVZ.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução04 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da comarca de Alvaiázere, em processo comum com intervenção do Tribunal Singular, foram os arguidos JF... e ZB…, com os demais sinais nos autos, julgados e ABSOLVIDOS da prática de um crime de injúria, previsto e punido pelo art. 181º, n.º 1, do Código Penal, que lhes foi imputado na acusação particular deduzida pelos assistentes MS.. e DM.., e que nos termos do preceituado no art.º 285º, n.º 3 do Código de Processo Penal, a fls 83, o Magistrado do Ministério Público, acompanhou nos seus precisos termos.

Foram ainda absolvidos do pedido de indemnização civil formulado pelos demandantes civis.

* Inconformados com a decisão, recorreram os assistentes, concluindo a sua motivação do modo seguinte: “1ª - A sentença em recurso ao não imputar, no relatório, a cada um dos arguidos dois crimes de injúrias nas pessoas dos assistentes conforme consta da acusação particular, viola o disposto no artigo 374º n.º 1 C) do C.P.P., pelo que nos termos do artigo 380º e 379º do C.P.P. tem que ser corrigida.

  1. - Quando do decurso da audiência de discussão e julgamento se tenham provado os elementos relativos ao dolo, não pode o Tribunal “a quo” incluí-los na matéria de facto não provada pelo facto dos mesmos não terem sido alegados na acusação.

  2. - A decisão sob recurso apreciou mal a prova produzida em Julgamento quanto ao dolo, porquanto aquele resultou provado em sede de audiência de discussão e Julgamento conforme melhor consta da transcrição dos depoimentos em 2) da motivação do presente recurso.

  3. - Daí os elementos relativos ao dolo, incluídos na sentença, na matéria de facto não provada, “que os arguidos tivessem agido de forma livre, deliberada, e consciente, com o propósito conseguido de ofender os assistentes na sua honra e consideração, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei” ,terem que passar para a matéria dos factos provados.

  4. - E assim ser modificada a decisão nos termos do disposto no artigo 431º b) do C.P.P., por referência ao disposto no artigo 412º n.º 3 a) e b) do C.P.P.

  5. - E os arguidos condenados pelos dois crimes de injúrias, respectivamente, conforme vinham acusados e no pedido de indemnização civil respectivo.

    Ou quando assim se não entenda, 7ª - Tendo resultado os elementos do dolo no decurso da audiência, o Tribunal “ a quo” ao incluí-lo na matéria de facto não provada, por não constar da acusação particular está a por em causa e a violar o disposto no artigo 339º n.º 4 e 368º n.º 2 do C.P.P.

  6. - Dado que a decisão sob recurso considerou provados os factos em que a acção dos arguidos se desenrolou, pontos 1 a 7 da matéria de facto provado.

  7. - E o elemento subjectivo resulta como extrapolação daqueles factos dados como provados, da confissão dos arguidos, da prova produzida na audiência, dos assistentes terem imputado aos arguidos o crime de injúrias – art.º 181º do C.P. e da conjugação das regras comuns.

  8. - E porque da matéria de facto dada por provada não consta que os arguidos não se tenham apercebido do sentido típico de tais expressões.

  9. - Pelo menos conformaram-se os arguidos com a possibilidade de injuriarem os assistentes.

  10. - Assim e tendo em conta uma das finalidades primarias do processo penal – a Realização da Justiça – 13ª - Deveria o Tribunal “a quo” ter lançado mão do disposto no artigo 358º do C.P.P. e notificado os arguidos do elemento do dolo que resultou do decurso da audiência de discussão e Julgamento.

  11. - Esses elementos não configuram uma alteração substancial dos factos da acusação particular, pois não imputam aos arguidos crime diverso daquele por que vêm acusados, nem agravam dos limites máximos das sanções aplicáveis.

  12. - Com efeito a acusação dos autos ao ter omitido o dolo, é tão só deficiente.

  13. - Pelo que em obediência ao princípio da conservação dos actos imperfeitos, a sentença “a quo” violou o disposto no artigo 358º do C.P.P., pelo que é nula a decisão.

    Termos em que com o mui douto suprimento de Vªs Exªs que se invoca, deve ser revogada a sentença recorrida e pela via do art. 431º b) do C.P.P. ser julgada procedente e provada a acusação bem como o respectivo pedido de indemnização cível ou por via da nulidade invocada por violação do art.º 358º do C.P.P., ser ordenado ao Tribunal “a quo” a introdução na acusação dos elementos referentes ao dolo e o julgamento repetir-se a partir daí com as legais consequências.” * O MP respondeu ao recurso interposto no sentido da sua improcedência, concluindo que a omissão, ainda que involuntária, do elemento subjectivo do ilícito, nomeadamente, a descrição fáctica que não comporta a conclusão lógica da representação do evento típico e da intenção de actuação por parte do agente, no texto acusatório comporta violação legal do disposto nos arts. 283° e 285°, do C. P. Penal que, não sendo invocada anteriormente, em sede do conhecimento das nulidades, irregularidades ou outras questões prévias não inibe, porém, o juiz de as conhecer mesmo na fase de julgamento, desde que antes não tenha havido pronúncia expressa sobre a matéria já que "em processo penal, a declaração tabelar de inexistência de questões prévias impeditivas do conhecimento do fundo" da causa "(...) não faz caso julgado." - cfr. Ac. da Rel. Évora, de 1.2.1994, CJ XIX, 1, 294. Ao desconsiderar, por não provada, a conduta dolosa dos arguidos, somos de parecer que a Mma Juiz 'a quo' não violou qualquer preceito legal, pelo que a sentença recorrida não merece censura.” * O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação apôs o visto.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art. 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

    * Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    II - FUNDAMENTAÇÂO Constitui entendimento pacífico que são as conclusões das alegações dos recursos que delimitam o respectivo objecto e o seu âmbito, sem prejuízo das questões que são de conhecimento oficioso. É no quadro assim delimitado que o tribunal deve resolver as questões que lhe sejam submetidas a apreciação, obviamente com excepção das que tenham ficado prejudicadas pela solução de outras.

    É também entendimento pacífico que “As questões que são submetidas ao tribunal constituem o thema decidendum, como complexo de problemas concretos sobre que é chamado a pronunciar-se, os quais devem constituir as questões específicas que o tribunal deve, como tal, abordar e resolver, e não razões, no sentido de argumentos, opiniões e doutrinas expostas pelos interessados na apresentação das respectivas posições (cf., entre outros, Acs. do STJ de 30-11-2005, Proc. n.º 2237/05, de 21-12-2005, Proc. n.º 4642/02, e de 27-04-2006, Proc. n.º 1287/06).” – Ac STJ de 16-09-2008.

    Assim, considerando o objecto do recurso definido pelas conclusões da motivação, as questões a decidir são: 1 - omissão no relatório da sentença da imputação a cada um dos arguidos de dois crimes de injúrias nas pessoas dos assistentes conforme consta da acusação particular, 2 - erro de julgamento quanto aos factos integradores do dolo 3 - omissão do dolo na acusação 4 - violação do disposto no artigo 358º do C.P.P.

    * * * Decisão Recorrida (com relevo para a apreciação do recurso): “ (…) FACTOS PROVADOS 1. No dia 08 de Abril de 2009, pelas 15h30m, no Lugar dos W..., e nas imediações da casa de habitação dos arguidos, mais concretamente quando os assistentes e um filho destes se encontravam a caminho de um seu terreno agrícola, que...

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