Acórdão nº 541/06.6GCVT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | FERNANDO CHAVES |
Data da Resolução | 22 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório Nestes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular, após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença que, além do mais, decidiu: a) Condenar o arguido Luís S... pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de menor gravidade previsto e punido pelo artigo 25.º, a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/1, com referência ao disposto no artigo 21.º, n.º 1, do mesmo diploma, na pena de 15 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 15 meses, a contar do trânsito em julgado da sentença; b) Ordenar que, após o trânsito em julgado, seja restituída ao arguido Luís S... a quantia de € 900,00 apreendida nos autos, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 186.º e sem prejuízo do disposto no n.º 4 do mesmo artigo do Código de Processo Penal.
Inconformado com a referida decisão na parte em que não declarou perdido a favor do Estado o dinheiro apreendido e ordenou a sua restituição ao arguido, o Ministério Público dela interpôs recurso, concluindo a sua motivação nos seguintes termos (transcrição): “1) O arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p pelo art 25º, al. a) do DL n.º 15/93, de 22/01, com referência ao art. 21º do mesmo diploma, na pena de 15 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 15 meses.
2) O art. 35º, n.º 1 do DL 15/93, de 22/01, alterado pela Lei 45/06, de 03/09, preceitua que são declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de uma infracção prevista no presente diploma ou que por esta tiverem sido produzidos.
3) O Ministério Público entende que deveria ter sido dado como provada a proveniência do dinheiro que foi apreendido ao arguido - venda de estupefacientes - sendo este o concreto ponto de facto que, salvo o devido respeito, se considera incorrectamente julgado (art. 412º, n.º 3, al a) do CPP).
4) A Mma. Juiz a quo ao dar como não provada esta proveniência não atendeu à prova realizada e entrou em contradição com a própria motivação da fundamentação de facto e com a decisão (art. 410º, n.º 2, al b) do CPP).
5) Se o arguido detém produto estupefaciente para venda, também detém € 900 (novecentos euros) como resultado de vendas já efectuadas.
6) Assim, tal como a Mma. Juiz a quo se serviu de uma presunção judicial para conforme a própria motivação da douta sentença dar como provado que o arguido detinha 243 doses diárias, devidamente diferenciadas e acondicionadas, num recinto de um festival de música, local bastante frequentado por consumidores, e que diz “afigurou-se ao tribunal que a única versão lógica e razoável é a ( ) de que o arguido detinha haxixe para venda”, teria que manter este mesmo raciocínio lógico e razoável de que ninguém leva € 900 (novecentos euros) em dinheiro seja para onde for, quanto mais para um festival de música em Vilar de Mouros, e muito menos leva esse dinheiro acondicionado em 2 notas de cinquenta euros, 31 notas de vinte euros, nove notas de dez euros e 18 notas de cinco euros!!! 7) Do depoimento dos agentes e do relatório social, conjugado com a apreensão na altura da detenção, quer de 243 doses de haxixe perfeitamente individualizadas e acondicionadas, quer do dinheiro e da forma como este estava dividido, resulta prova bastante que este último provinha de vendas já efectuadas, e como tal deve ser declarado perdido a favor do Estado.
8) O arguido que de forma irregular foi exercendo as profissões de trolha e pescador, nunca auferiu mais do que € 700 (setecentos euros) por mês, máximo que aufere apenas desde Janeiro de 2009, logo, o único raciocínio lógico, é que não tinha dinheiro para adquirir 243 doses de haxixe e ainda ter «dinheiro de bolso» no valor de € 900 (novecentos euros).
9) Das conclusões 6, 7 e 8 resultam as concretas provas que impõem, no nosso entendimento, decisão diversa da recorrida (art. 410º, n.º 3, al b) do CPP) - Actas de julgamento, a fls. 287 e 314, não se indicando as concretas passagens nos termos do art. 412º, n.º 4 do CPP, porque não se discorda do consignado quanto a elas na motivação, apenas se entendendo que a Mma. Juiz a quo tal como concluiu que o arguido destinava o produto à venda, também deveria ter concluído que o dinheiro apreendido resultava de vendas já efectuadas, o que é diferente de estar a vender no concreto momento da detenção e apreensão.
10) Isso para além da prova que resulta do auto de apreensão de fls. 5.
11) Pelo que a sentença recorrida violou pois o art. 35º do DL 15/93, de 22/01 e os arts. 186º, n.º 1, 374º, n.º 2, 379º e 410º, n.º 2, al. b), do C. Processo Penal.
* Nesta medida, revogando a sentença recorrida na parte em que ordenou a restituição do dinheiro apreendido ao arguido e substituindo-a por outra que o declare perdido a favor do Estado, farão V. Exas., a costumada e esperada JUSTIÇA.”.
* O arguido respondeu ao interposto recurso, tendo concluído nos seguintes termos (transcrição): “1- Não se provou, nem sequer de forma indiciária, qual a proveniência do dinheiro apreendido ao arguido, (900,00€).
2- Pelo contrário, foi dado como não provado, que o arguido tivesse sido surpreendido a vender produto estupefaciente a consumidores, ou que tal comércio fosse a sua exclusiva ou principal fonte de rendimentos; 3- Do igual modo, foi dada como não provada a proveniência da quantia em dinheiro que lhe foi apreendida.
4- Pelo que deve considerar-se, sem com tal violar qualquer regra da experiência comum, que o dinheiro apreendido ao arguido poderia ter tido qualquer outra proveniência que não o tráfico de estupefacientes.
5- Há, pelo menos, uma dúvida razoável acerca da proveniência do dinheiro que o arguido possuía ou seja acerca de se se trata de um produto da infracção praticada.
6- Circunstância que, ao abrigo do Principio "In dubio pro Reo" deve ser favorável ao arguido, pelo que, não podia ser outra a decisão a proferir pelo Tribunal A Quo.
7- Acresce que, para que o dinheiro, enquanto resultado ou produto da infracção, pudesse ser declarado perdido a favor do Estado, tal como dispõe o artigo 109.º do Código Penal, era necessário que pudesse oferecer sério risco de ser usado para o cometimento de novos factos ilícitos típicos, o que não foi sequer alegado e muito menos demonstrado.
8- O que tudo conjugado deve conduzir à improcedência do Recurso e confirmação, nos seus precisos termos, da Douta Sentença recorrida, que não merece qualquer reparo.
ASSIM DECIDINDO, FARÃO V.aS EX.aS A HABITUAL JUSTIÇA!”.
* Nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, sufragando a posição assumida pela Magistrada do Ministério Público na 1ª instância, emitiu parecer no sentido de que o recurso merece provimento.
No âmbito do disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, o arguido nada disse.
Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.
* II - FUNDAMENTAÇÃO 1. Da sentença recorrida consta o seguinte quanto à factualidade provada e não provada, assim como no que diz respeito à respectiva motivação (por transcrição): “II-FUNDAMENTAÇÃO I-FACTUAL FACTOS PROVADOS: Em 23.07.2006, cerca das 04h10m, no Parque de Campismo de Vilar de Mouros, enquanto decorria o festival de música, ao aperceber-se da presença de agentes de autoridade policial, o arguido levou a mão ao bolso das calças e lançou algo ao solo.
Suspeitando dessa atitude, o arguido foi abordado por agentes da Guarda Nacional Republicana, foi revistado, tendo-lhe sido apreendidas vinte e oito “bolotas” e um pequeno pedaço de um produto sólido castanho, que aparentava ser “haxixe”.
Submetidas a exame laboratorial, no LPC-PJ verificou-se se tratavam de 28 bolsas de um produto vegetal prensado, com o peso de 132, 003/L, cuja substância activa presente era Cannabis (resina), com o peso líquido global de 121,712 gramas; suficiente para 243 doses, calculadas segundo a Portaria nº 94/96.
No decurso da revista realizada ao arguido, foi-lhe, ainda, apreendida a quantia de Euros 900,00 (novecentos...
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