Acórdão nº 202/08.1TBACN-A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | LOPES DO REGO |
Data da Resolução | 09 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA – Urbanizações, Turismo e Construções, S.A. deduziu oposição à execução contra si intentada por BB – Investimentos e Imobiliário, S.A., tendo como título executivo uma escritura pública de compra e venda de imóvel, sujeita a condição resolutiva que – na sua óptica – se teria inteiramente verificado, determinando, de acordo com os documentos complementares que juntou, o pagamento dos valores pecuniários clausulados para a ineficácia do negócio, exigidos da executada. A oposição deduzida fundou-se na invocação da falta de título executivo e, no plano substancial, na inexistência do crédito pecuniário dado à execução, sustentando-se que a executada teria cumprido integral e tempestivamente todas as obrigações contratuais a que se vinculara – não se tendo, consequentemente, verificado a condição resolutiva do negócio, - e invocando ainda que a actuação da exequente, ao ter por resolvido o negócio, sempre traduziria censurável abuso de direito.
A exequente contestou a oposição, impugnando a argumentação deduzida, sustentando, nomeadamente, que a condição resolutiva se deveria ter por efectivamente preenchida, por a executada não ter logrado inscrever em tempo no registo predial o aditamento ao alvará de loteamento a que se vinculara em prazo peremptório, pugnando pelo prosseguimento da execução.
A oposição foi julgada procedente pela sentença proferida em 1ª instância: o tribunal não se pronunciou sobre a questão da invocada falta de título executivo, apreciando, porem, o mérito da oposição deduzida, considerando: - por um lado, por interpretação do negócio jurídico que estava na base do litígio, que nele se não consignaria, afinal, como condição resolutiva contratualmente fixada, a omissão da tempestiva inscrição no registo predial do aditamento ao alvará de loteamento pretendido pela exequente: o que efectivamente condicionaria a satisfação dos fins, pretendidos pelas partes, e a que o prédio se destinava seria, apenas e tão somente, o registo camarário de tal alteração ao dito alvará, pelo que, tendo este específico acto de registo tido lugar antes da data em que deveria operar automaticamente a referida condição resolutiva, o negócio ter-se-ia consolidado, não se desencadeando, em consequência, o efeito resolutivo em que assentava o débito exequendo; - por outro lado, e subsidiariamente, que sempre seria de qualificar como abusivo, nos termos do art. 334º do CC, o exercício dos direitos emergentes da consumação da invocada condição resolutiva, por lesão do princípio da confiança.
Inconformada com tal sentido decisório, apelou a exequente : sem ter suscitado a nulidade por omissão de pronúncia que decorreria do absoluto silêncio acerca da questão da pretensa falta de título executivo, impugnou a apelante o decidido quanto ao mérito da causa , sustentando que se teria verificado a condição resolutiva acordada e que nenhum acto abusivo ou violador da boa fé se lhe poderia imputar.
A Relação começou por fixar na data de 28/1/2008 o momento em que operaria a condição resolutiva contratualmente acordada.
Passando a interpretar o contrato celebrado, concluiu que a vontade real das partes seria no sentido de a dita condição resolutiva se reportar à inscrição no registo predial do acto de aditamento ao alvará pretendido pelas partes, sendo este facto - e não o mero registo de tal alteração no âmbito da própria autarquia – que condicionava a eficácia do negócio jurídico em litígio ; ora, não tendo tido lugar até essa data a inscrição no registo predial da pretendida alteração ao alvará de loteamento, impunha-se a conclusão de que o negócio deveria considerar-se automaticamente resolvido, nos termos convencionados pelas partes.
Por outro lado, entendeu a Relação que não poderia imputar-se à exequente qualquer actuação, quer na altura da celebração do negócio sujeito a cláusula resolutiva, quer no decurso do prazo de 6 meses da pendência da condição, quer no momento em que operou a condição resolutiva, qualquer comportamento abusivo ou censurável.
E, em consonância com tal entendimento, a Relação julgou procedente a apelação, revogando a decisão recorrida e declarando a oposição improcedente.
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Inconformada com tal decisão, interpôs a executada a presente revista, encerrando-a com as seguintes conclusões que, como é sabido, lhe delimitam o objecto: 1ª. A recorrente alegou junto da Ia Instância, para além da não verificação da resolução da compra e venda e da existência de abuso de direito da exequente, outros fundamentos de oposição, designadamente a inexistência de titulo executivo, fundamentos esses que, cada um deles por si só, são conducentes à procedência da oposição, prejudicando a procedência de um o conhecimento dos demais.
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A sentença de Ia Instância julgou a oposição procedente por abuso de direito do exequente, abstendo-se de tomar conhecimento dos demais fundamentos de oposição por julgar ta! conhecimento prejudicado pela solução dada ao litígio (v. artigo 660°/2 do CPC).
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Tendo o Tribunal da Relação optado por não fazer uso do regime de substituição previsto no art. 715° do CPC, estaria obrigado a seguir a via da remessa dos autos à Ia instância para conhecimento das demais questões que constituíam fundamento da oposição e não foram julgadas em Ia Instância por o seu conhecimento ter ficado prejudicado.
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Não tendo a Relação ^feito uso do regime de substituição previsto no art. 715° do CPC, estava adstrita a tomar conhecimento do objecto do recurso dentro dos limites do conteúdo da sentença de Ia Instância, pelo que, ao ter decidido, para além da questão do abuso de direito, a improcedência da oposição na sua globalidade, o acórdão recorrido enferma de excesso de pronuncia, sendo nulo ex vi dos artigos 668°/l/d) e 716° do CPC.
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- A entender-se que o Tribunal da Relação não excedeu o âmbito dos seus poderes cognoscitivos ao decidir pela improcedência da oposição - o que aqui se pondera por cautela a titulo subsidiário - o acórdão recorrido enferma de nulidade por omissão de pronúncia acerca da questão da inexistência do título executivo suscitada como fundamento da oposição (v. arts. 668°/l/d) e 716° do CPC) e de absoluta falta de fundamentos (v. art. 688°/l/b) e 716° do CPC).
6a. Se por absurdo se entendesse que o Tribunal da Relação "conheceu" e julgou a questão da falta de título executivo, julgando-a improcedente – o que aqui se admite apenas e só por mera cautela - tal decisão enfermaria de erro de julgamento, pois no caso dos autos não existe titulo executivo que possa suportar o processo executivo em curso e a pretensão executiva, já que para tanto o documento "tem que constituir ou certificar a existência da obrigação, não bastando que preveja a constituição desta" (cfr. ANTUNES VARELA, e OUTROS, Ob. e Loc. CitsV "te/n que certificar, sem dependência de condição, a existência da obrigação do devedor para com o credor/' (cfr. Ac. do STJ, de 02/12/2004, no Proc. n° 04B2118 e jurisprudência aí citada, in www.dgsi.pt.).
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Ao julgar verificada a condição resolutiva aposta pelas partes na escritura de compra e venda, entendendo que a previsão da realização do registo do aditamento do alvará aí referida se reporta ao registo predial e não ao registo camarário que se provou ter sido tempestivamente feito, o acórdão recorrido enferma de erro de julgamento violando por errada interpretação e aplicação o disposto nos artigos 236° a 239° do Código Civil, normativos que imporiam o entendimento expresso na sentença de Ia Instância.
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A não se entender sustentar a interpretação sustentada pela douta sentença de Ia Instância, deverão os autos baixar para ser ampliada a matéria de facto (artigo 729° CPC), de forma a apurar o sentido da declaração das partes ao referirem-se ao "registo do aditamento" do alvará, esclarecendo se se pretenderam comprometer aí com o registo camarário (como foi quesitado, veio a ser provado e foi entendido na Ia Instância), ou com o registo predial como foi entendido no acórdão recorrido.
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Em face dos factos provados, o comportamento da recorrida ao resolver o contrato de compra e venda invocando a verificação da apontada cláusula resolutiva por falta de registo do aditamento ao alvará de loteamento, quando acompanhou todo o procedimento de licenciamento da alteração ao loteamento levado a efeito pela Recorrente, sendo conhecedora da existência deliberação de alteração ao loteamento, das cedências de terrenos que tiveram de ser feitas e das obras de urbanização que foram realizadas, sempre corresponderia ao uso anómalo de um direito, pelo que, decidindo o contrário, o acórdão recorrido enferma de erro de julgamento violando por errada interpretação e aplicação o disposto no artigo 334° do Código Civil.
NESTES TERMOS, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, com as legais consequências.
A recorrida pugna pela manutenção do acórdão recorrido.
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Uma vez que se mostrava suscitada a questão da nulidade do acórdão, a Relação apreciou-a antes da subida do recurso, sustentando, por um lado, que não constituiria nulidade por omissão de pronúncia a não apreciação da questão da inexistência de título executivo, já que a apelante não havia cumprido o ónus decorrente do preceituado no nº2 do art. 684º-A do CPC, arguindo na sua alegação, a título subsidiário, a nulidade da sentença que decorreria do silêncio sobre tal questão procedimental, a qual teria ficado precludida, não podendo ser recolocada no âmbito da presente revista; considerou ainda a Relação que, no caso dos autos, estando em causa a exequibilidade de um documento autêntico, ela sempre decorreria do preceituado no art. 50º do CPC, sendo o valor probatório do título executivo complementado pelos documentos juntos pela exequente ao requerimento executivo.
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As instâncias fizeram assentar a solução jurídica do pleito na seguinte matéria de facto: 1. Nos autos principais de execução foi apresentada, como título executivo, a escritura pública de compra e venda...
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