Acórdão nº 2707/03-1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSÉNIO ALVES
Data da Resolução18 de Maio de 2004
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 2707/03 ACORDAM, EM AUDIÊNCIA, OS JUÍZES QUE COMPÕEM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I. No Proc. Comum Singular que, com o nº 606/00.8GTSTR, corre termos no ... Juízo Criminal de ..., o arguido A. ... foi julgado e condenado, pela prática de um crime de homicídio negligente p.p. pelo artº 137º, nº 1 do CP, na pena de 14 meses de prisão; como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 5 meses de prisão e na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 7 meses; em cúmulo jurídico, na pena única de 16 meses de prisão.

Inconformado, recorreu o arguido extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: I. Da prova produzida em audiência de julgamento não resultou provado que a taxa de álcool de que o arguido era portador foi, por si só, causa do acidente, sendo a única referência e fundamento feitos na douta sentença recorrida, o que equivale a falta de fundamentação, o que determina a nulidade, ou caso assim não se entenda, II. Não foi tomada em conta na decisão a versão do arguido, segundo a qual este havia sido encandeado por um veículo que circulava em sentido contrário.

  1. O acidente ficou a dever-se ao encandeamento que, associado ao mau estado do piso, provocou a saída da estrada para a berma enlameada.

  2. A vítima não levava posto o cinto de segurança, o que contribuiu para as lesões que determinaram a sua morte.

  3. O arguido não contribuiu de forma exclusiva para a produção do acidente nem para o resultado morte que lhe sobreveio, VI. Pelo que, não poderia ter-lhe sido imputada culpa exclusiva.

  4. A pena aplicada ao arguido não deveria ter sido a de prisão efectiva.

  5. A personalidade do arguido, o seu comportamento anterior e posterior aos factos permitem a formulação de prognóstico favorável de que a censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição, IX. Pelo que deveria ter sido aplicada a suspensão da execução da pena de prisão, prevista no art° 50°, n° 1, do C.P..

  6. Podendo ser acompanhada de imposição de deveres, regras de conduta ou do regime de prova previsto no art° 53° do mesmo Código.

  7. Igualmente foi-lhe aplicada a sanção acessória de inibição de conduzir em medida muito superior à da sua culpa.

  8. A douta sentença recorrida violou, assim, o disposto nos art°s 410°, n° 2, als. a) e c), 50°, n° 1 e n° 2, 53°, 70°, todos do Código Penal, XIII. Pelo que deve ser alterada, modificando-se a matéria de facto em crise e substituindo-se a pena de prisão pela suspensão da execução da pena de prisão, bem como alterando-se a sanção de inibição de conduzir para período não superior a 4 meses.

    Admitido o recurso, respondeu o Digno Magistrado do MºP sustentando a sua improcedência e formulando as seguintes conclusões: 1. Face à factualidade dada como provada, não se verificam qualquer um dos vícios previstos no artigo 410.° n.° 2 do Código de Processo Penal.

    1. O crime de condução de veículo em estado de embriaguez praticado pelo arguido é punível com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 200 dias (sic), conforme dispõe o art.° 292 ° do Código Penal .

    2. O crime de homicídio negligente previsto e punível pelo artigo 137.° n.° 1 do Código Penal é punível com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 360 dias.

    3. Cabe ao julgador determinar, dentro daquelas medidas abstractas e em função dos critérios estabelecidos no art° 71 ° do Código Penal, qual a pena concreta a aplicar ao arguido.

    4. É totalmente legítima a aplicação de pena de prisão efectiva quando as circunstâncias do caso revelem que a aplicação de medida não detentiva de liberdade se mostra inadequada a satisfazer as exigências de prevenção do crime e a ressocialização do arguido.

    5. No caso dos autos as finalidades da punição não se realizam de forma adequada e suficiente com a aplicação de medida não detentiva de liberdade.

    6. A sanção acessória aplicada mostra-se correctamente doseada atenta a factualidade provada.

    7. No caso vertente é manifesto que a condenação anterior não se mostra suficiente para afastar o Arguido da prática de actividades ilícitas, pelo que se justifica plenamente a sua condenação em pena de prisão efectiva.

  9. Em sentido oposto vai o Parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto nesta Relação, o qual - considerando embora que a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação, no que concerne ao nexo causal entre a condução sob o efeito do álcool e a produção do acidente - face à documentação da prova entende que este Tribunal deve modificar a matéria de facto apurada, dando como não provado tal nexo causal, em obediência ao princípio in dubio pro reo, absolvendo-se o arguido no que ao crime de homicídio negligente diz respeito.

    Cumprido o disposto no artº 417º, nº 2 do CPP, o arguido não respondeu.

    Realizado exame preliminar e colhidos os vistos, teve lugar a audiência.

    Cumpre decidir.

  10. É a seguinte a factualidade apurada em 1ª instância: A) No dia 27 de Novembro de 2000, cerca das 20.30 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro misto de matrícula .... na Estrada Nacional n° 362 entre Tremês e Santarém no sentido Tremês - Santarém.

    1. Antes de iniciar a condução, o arguido havia ingerido bebidas alcoólicas, sendo portador da taxa de álcool no sangue de 2,76 gramas por litro.

    2. Ao km 41,5 da referida via e quando descrevia uma curva para a sua direita, o arguido não conseguiu controlar a trajectória do veículo que conduzia em razão da diminuição de capacidades que o referido estado de embriaguez lhe causava, tendo o veículo saído da faixa de rodagem para o lado direito e embatido com a parte da frente numa barreira aí existente.

    3. No veículo referido fazia-se transportar como passageiro ... que em consequência do descrito evento sofreu traumatismo vértebro-medular e craneo-encefálico, lesões que foram causa directa e necessária da sua morte ocorrida no mesmo dia.

    4. Ao conduzir o veículo depois de ter ingerido bebidas alcoólicas agiu o arguido livre e voluntariamente, sabendo tal actuação proibida e punida.

    5. Sabia o arguido que, estando sob o efeito do álcool, não se encontrava na posse de todas as capacidades necessárias ao exercício da condução.

    6. Não previu o arguido que dessa diminuição de capacidades pudesse resultar a verificação do acidente que veio a acorrer e a possibilidade da ocorrência de danos pessoais, nomeadamente a morte de terceiros.

    7. Por sentença do Tribunal judicial de ... de 9 de Abril de 1999 0 arguido foi condenado pela autoria de um crime de condução em estado de embriaguez na pena de 70 dias de multa à taxa diária de 800$00 e em proibição de conduzir cuja execução foi suspensa.

    8. Tais penas foram declaradas extintas por despacho de 15.5.2000 em razão do pagamento no que respeita à multa e do decurso do prazo de suspensão no que respeita à proibição de conduzir.

    9. Exerce a actividade profissional de pedreiro por conta própria, auferindo quantia mensal não inferior a 500 euros.

    10. - Vive com a sua mulher que é operária fabril, auferindo cerca de 350 euros mensais e dois filhos de 8 e 20 anos de idade, estando ambos a seu cargo.

    11. Habita com a família assim constituída em casa arrendada por cerca de 125 euros mensais.

    12. Tem a 4ª classe do ensino primário.

    E o tribunal recorrido fundamentou, desta forma, a sua convicção: "A convicção do Tribunal baseou-se na ponderação e análise dos seguintes meios de prova: - as declarações prestadas pelo arguido em audiência admitindo os factos relativos à condução sob o efeito do álcool mas negando que o acidente se tivesse devido a esse facto embora não fornecendo outra explicação para a produção do mesmo (referiu encadeamento provocado por veículo que seguia em sentido contrário sem precisar se este trazia os máximos ligados); - o depoimento da testemunha ..., cabo da GNR que se deslocou ao local do acidente e elaborou a respectiva participação, apenas no que concerne ao que verificou nessa deslocação e fez constar daquela; - os depoimentos das testemunhas ... e ..., pessoas que conhecem o arguido, no que concerne à situação pessoal e em complemento do que o próprio declarou; - o teor do certificado de registo criminal que se encontra nos autos; - o teor dos documentos de fls. 3 a 7 e 44 a 45 nos quais se inclui o relatório da autópsia efectuada ao sinistrado falecido; - o teor do assento de óbito de fls. 47.

    Perante os referidos elementos probatórios e considerando que taxa de álcool no sangue da ordem em causa diminui por forma drástica as capacidades necessárias ao exercício da condução, não se suscitaram dúvidas ao tribunal de que o acidente retractado tem como única explicação e motivo esse facto e ainda assim seria na eventualidade de se ter verificado a circunstância aludida pelo arguido (encadeamento)".

  11. Posto que houve documentação das declarações prestadas oralmente em audiência, este tribunal conhecerá de facto e de direito.

    São as conclusões extraídas pelo recorrente da sua motivação que delimitam o âmbito do recurso - artº 412º, nº 1 do CPP.

    Em concreto, são as seguintes as questões suscitadas pelo recorrente: A) falta de prova do nexo causal entre a condução sob o efeito do álcool e a produção do acidente; B) incorrecta aplicação...

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