Acórdão nº 10215/2002-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Dezembro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMORAIS ROCHA
Data da Resolução10 de Dezembro de 2003
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, precedendo Julgamento, no Tribunal da Relação de Lisboa (V) foi condenado no Tribunal Judicial da Comarca de Sintra pela prática do crime de exploração ilícita de jogo, p.p. pelo art. 108.º do DL 422/89, com referência aos arts. 1.º, 3.º, n.º 1, 4, n.º 1, al. G) do mesmo diploma, na pena de 4 meses de prisão que se substitui por igual tempo de multa à taxa diária de 1000$00 e ainda em 60 dias de multa à mesma taxa diária, na pena única de 180 dias de multa à taxa diária de 1000$00 o que perfaz a multa de 180000$00 e a que corresponde 120 dias de prisão subsidiária.

Inconformado recorre o arguido para este Tribunal da Relação de Lisboa, retirando as seguintes conclusões da motivação: «1. O tribunal a quo entendeu que a colocação de cada máquina em cada um dos diversos estabelecimentos, entre os quais o dos autos, após acordo celebrado com os respectivos proprietários, pressupõe uma decisão autónoma e individualizada relativamente aos demais proprietários. Dessa posição discorda frontalmente o Recorrente.

  1. - Na esteira do douto acórdão da Relação de Lisboa, de 18-03-98, junto a fls. 116/135 e de 24-11-98, publicado na C.J., Ano XXIII, t 5/143, que aqui se dá por reproduzido, melhor seria entender-se que a exploração de todas as 333 máquinas importadas pelo arguido numa só ocasião (entre as quais se inclui a dos autos) foi motivada por um só desígnio e integra, objectivamente, um único crime, organizando-se um só processo e submetido a um só julgamento toda a actividade do Recorrente.

  2. - Atento o disposto no n.o 5 do art.º 29.º da C.R.P. e art.os 497º e 498.º do C.P .Civil, aplicáveis ex vi art.º 4.º do C.P .Penal, o Recorrente não poderá ser de novo julgado (e condenado) nos presentes autos, sob pena de violação do princípio ne bis in idem, devendo reconhecer-se a existência de caso julgado e proceder-se ao respectivo arquivamento, absolvendo-se o Recorrente.

  3. - Em face da factualidade provada e da decisão tomada pela M.a Juíza do tribunal a quo, no sentido de não admitir a existência de caso julgado, a sentença recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova, facilmente detectável no corpo do seu texto, o que inquina a sua viabilidade decisória e é fundamento do presente recurso, nos termos da al. c) do n.º 2 do art.º 410.º do Código de Processo Penal.

    Nestes termos e nos mais de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve a douta sentença recorrida ser revogada e ser substituída por outra que julgue procedente a invocada excepção do caso julgado, absolvendo-se o Recorrente.» Em resposta ao recurso, vem o Ministério Público junto do tribunal recorrido alegar: «1. O arguido (V), interpôs recurso da sentença que o condenou na pena de 4 meses de prisão substituída por igual tempo de multa á taxa diária de 1.000$00 e 60 dias de multa á mesma taxa e na pena única de 180 dias de multa no valor de 180.000$00 e 120 dias de prisão subsidiária, como autor material de um crime de exploração ilícita de jogos de fortuna e azar, p.p. art.º 108 do D.L.402/89 de 2.12.

  4. De acordo com jurisprudência pacifica, o âmbito do recurso é definido pelas conclusões que os recorrentes extraem das respectivas motivações.

  5. Das conclusões do recorrente, extrai-se, no que interessa e em síntese, que o recorrente já foi julgado noutros processos pelos mesmos factos, pelo que havendo erro notório na apreciação da prova, se mostra violado o principio ne bis In idem e o disposto no art.o 410-2-c) do C.P.P., pelo que o recorrente deve ser absolvido 4. Não concordamos com os argumentos invocados pelo recorrente, pelas seguintes razões: a) Não é verdade que o arguido tenha sido julgado noutros processos pelos mesmos factos. O arg. foi sim, julgado noutros processos, pela mesma actividade ilícita, o que é bem diferente.

    Mas neste processo o que se discutiu foi uma concreta factualidade, paralela de outras, mas distinta, porque demarcadamente situada no espaço e no tempo, consequente de decisões criminosas plurimas e volitivamente autónomas. Que não encontra correspondência ou conexão em qualquer factualidade já eventualmente julgada.

    Logo, o objecto processual destes autos, é diferente do objecto processual de outros processos congéneres em que o arguido tenha participado como agente do mesmo tipo de crime.

    1. Não há qualquer erro notório na apreciação da prova, sendo certo que, para que tal se verificasse, mister seria que a percepção do erro, que se reporta conceptualmente á matéria de facto e não á de direito, como parece pretender o recorrente, resultasse dos próprios termos da decisão recorrida de forma óbvia ao chamado homem médio, isto é, que no plano do entendimento racional das coisas, as premissas de que o tribunal partiu, por absurdas e contraditórias não pudessem conduzir ás conclusões alcançadas.

    2. A prova produzida em julgamento, foi analisada de forma séria e ponderada pelo tribunal, que formou a sua convicção livremente, segundo as regras técnico Jurídicas temperadas pelas regras de experiência de vida. que concluiu que o arguido cometeu o crime porque foi condenado, fundamentando basta e suficientemente tal conclusão.

    3. Assim foi o arguido correctamente condenado.

  6. Conclui-se assim, que não merece censura a douta sentença recorrida, pelo que mesma se deverá manter, conforme se demonstrou.

    Deve portanto negar-se provimento ao recurso e confirmar-se a sentença recorrida.» Neste Tribunal da Relação de Lisboa o Exmo. Procurador-Geral Adjunto apôs o seu visto.

    Colhidos os vistos e realizada a audiência, cumpre apreciar e decidir.

    Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 410.º do Código de Processo Penal, são as seguintes as questões objecto do presente recurso: - erro na apreciação da prova e consequente caso julgado; e, - da unidade ou pluralidade de crimes.

    Em bom rigor estas questões estão entre si interligadas porquanto a procedência de uma acarreta a procedência da outra e, por seu turno, a improcedência de uma a improcedência da outra.

    Quanto à primeira questão - erro na apreciação da prova e consequente caso julgado -, ela é equacionada da seguinte forma pelo recorrente: «A M.a juíza do tribunal a quo, a fls. 580, deu como provado que A máquina dos autos denominada "BABY GUM" fazia parte do das 333 máquinas que o arguido recebeu das 400 que importou, em princípios de Junho de 1994 (...).

    No que directamente respeita à problemática da excepção do caso julgado, analisada em sede de enquadramento jurídico-penal, verifica-se que a M.a Juíza subscritora da douta decisão recorrida entende que (...) a colocação de cada máquina em cada um dos diversos estabelecimentos, entre os quais o dos autos, após acordo celebrado com os respectivos proprietários, pressupõe uma decisão autónoma e individualizada relativamente aos demais proprietários.

    Significa isto que o crime em causa se consuma com a colocação à disposição do público e não com o acto de importação, ainda que com a finalidade de colocar as máquinas importadas para exploração.

    (...) Ora, é por demais patente que o que motiva a conduta do Recorrente é, apenas e só, a ideia final de colocar as máquinas em exploração.

    Assim, e s. m. o., discorda-se de que o acto de colocar um lote de máquinas (importadas em simultâneo) em exploração, constitua vários actos, tantos quanto o número de máquinas efectivamente exploradas. Por esta via de raciocínio, igualmente, ter-se-ia de considerar tantos actos de importação consoante o número de máquinas importadas. Tal, salvo o devido respeito, não merece acolhimento.

    A ser assim, atendo o disposto no n.o 5 do art.º 29.º da Constituição da República Portuguesa e art.os 497.º e 498.º do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi art. o 4.º do Código de Processo Penal, o Recorrente não poderá ser de novo julgado (e condenado) nos presentes autos, sob pena de violação do princípio ne bis in idem, devendo proceder-se ao respectivo arquivamento.

    Por todo o exposto e na sua sequência lógica, acresce ainda dizer que, atendendo à matéria de facto dada como provada e cujo...

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